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05/09/2019

IBDFAM: Em relação paralela reconhecida como união estável, mulher tem direito a 25 por cento do patrimônio

Uma relação simultânea ao casamento foi reconhecida, recentemente, como união estável paralela pela 2ª Vara Cível da Comarca de Teixeira de Freitas, na Bahia. A sentença, do juiz Humberto José Marçal, considerou os 30 anos de relacionamento, mantido entre 1981 e 2011, com início anterior ao matrimônio do homem com outra mulher.

Foi atribuído à requerente 25% do patrimônio adquirido ao longo do período em que estiveram juntos. Além disso, ela receberá uma pensão alimentícia de 25 salários mínimos, superior aos 10 salários que já recebia desde 2013 - arbitrados em agravo de instrumento interposto perante o Tribunal de Justiça da Bahia.

A união paralela era conhecida por toda a comunidade de Teixeira de Freitas. Com a requerente, o homem teve três filhos - mesmo número da prole constituída com a esposa. Os irmãos, de mães diferentes, se reconheciam como tal e estudavam na mesma escola. Cada família sempre soube da existência da outra, tanto que os álbuns de fotos continham registros dos dois grupos familiares.

A decisão do juiz, proferida em julho deste ano, deu relevância, ainda, ao fato de que o homem proibiu a requerente de exercer qualquer profissão ao longo do tempo em que estiveram juntos, responsabilizando-se por seu sustento. Imóveis urbanos e rurais e veículos eram adquiridos em nome dela, não só para compor seu patrimônio, mas também para futura comercialização.

Árvore genealógica

O polo passivo argumentou com a impossibilidade jurídica de reconhecimento da união estável. Afinal, o Código Civil estabelece requisitos para tanto, sendo um deles a inexistência de impedimento para o casamento, conforme o parágrafo 1º do artigo 1.723.

A advogada Annita Beatriz Duda Santos, procuradora do caso, lembra que não existem regras específicas no ordenamento jurídico brasileiro sobre casos de união paralela ou simultânea. “Reconhece-se como entidade familiar a união configurada na convivência pública (não clandestina), contínua (não eventual) e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família”, esclarece.

O caso ocorrido em Teixeira de Freitas se insere nesse contexto, como ficou demonstrado em provas documentais e testemunhos. Considerou-se fotos das três décadas de união, a árvore genealógica das duas entidades familiares, a declaração fornecida à Receita Federal pelo requerido, a dependência da requerente em seu plano de saúde, entre vários outros documentos.

Testemunhas afirmaram, ainda, que a mulher era apresentada à sociedade como esposa legítima e frequentava os eventos sociais da cidade. Era convidada a apadrinhar casamentos e batizados juntamente com o requerido.

“A importância de assegurar o reconhecimento de uma união paralela como união estável é demonstrar que é um relacionamento perfeitamente idêntico a qualquer outro. São famílias formadas por livre escolha (com base no princípio da liberdade), têm como base o amor e geram filhos que são frutos dessa escolha”, defende Annita.

Segundo a advogada, tal reconhecimento assegura à companheira o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, prevista na Constituição Federal. “As controvérsias da presente demanda são que o requerido não reconhece a união por uma questão meramente patrimonial, baseando-se no fato de ainda não existir previsão expressa no ordenamento jurídico”, explica.

Uniões paralelas ainda enfrentam discriminação

Annita Santos se opõe ao termo “extraconjugal”. “A expressão é pesada, se refere àquela ou àquele que vive na clandestinidade, a(o) amante. O que não é o caso de união paralela/simultânea, estabelecida com o objetivo de constituição de família”, explica. Ainda assim, ela entende que ambas as formas de relacionamento enfrentam discriminação na seara de Direito das Famílias.

A decisão do juiz Humberto José Marçal considera a estrutura machista que permitiu se tornarem comuns as relações extraconjugais e as famílias simultâneas mantidas por homem, sem que o ordenamento jurídico reserve grandes direitos a essas relações “não-oficiais”. As mulheres, em contrapartida, até outrora classificadas como “concubinas”, eram expostas a todo tipo de constrangimentos e preconceitos.

No texto, o magistrado considerou artigo da advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do IBDFAM, que defende: “Finda a relação, comprovada a concomitância com um casamento, impõe-se a divisão do patrimônio acrescido durante o período de mantença do dúplice vínculo. É necessária a preservação da meação da esposa, que se transforma em bem reservado, ou seja, torna-se incomunicável. A meação do varão será dividida com a companheira, com referência aos bens adquiridos durante o período de convívio.”

“Os legisladores ainda ‘fecham os olhos’ para o que é normal e mais corriqueiro do que imaginável para a grande maioria das pessoas”, afirma Annita. “Porém, no âmbito jurídico, juízes e desembargadores estão analisando o caso concreto ao invés de aplicar a letra fria da Lei. Mas ainda falta essa análise humana e pessoal por parte do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.”

Desta forma, segundo Annita, suprime-se qualquer hierarquia entre os tipos de união. “As pessoas são livres para fazer as suas escolhas, se relacionar e decidir qual tipo de família querem constituir, mas toda essa liberdade traz responsabilidade. Quando a responsabilidade se ausenta em uma das partes, torna-se necessária a presença do estado-juiz”, defende.

Fonte: IBDFAM


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