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05/06/2019

Artigo - Primeiras impressões sobre o projeto de lei n° 120/2017 – que dispensa a apresentação de carta de anuência dos confrontantes no georreferenciamento de imóveis rurais – Por João Arthur Siqueira da Silva Costa

Primeiras impressões sobre o projeto de lei n° 120/2017 – que dispensa a apresentação de carta de anuência dos confrontantes no georreferenciamento de imóveis rurais

Autor: João Arthur Siqueira da Silva Costa – Oficial de Registro de Imóveis de Passa Quatro/MG e pós-graduando em Direito Notarial e Registral pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus.

Peço licença a vocês, colegas registradores e profissionais estudiosos da geomensura, para tentar contribuir um pouco com a discussão acerca dos efeitos da inclusão do § 10 no artigo 176 da Lei n° 6.015/73, que se aproxima…

A despeito de ter tramitado sem a necessária atualização de sua numeração (já há um § 10 no artigo 176 que foi acrescido pela Lei n° 13.777/18), eis o texto do referido § 10:

“§ 10. Para a identificação de que tratam os §§ 3° e 4° deste artigo, fica dispensada a anuência dos confrontantes, bastando para tanto a declaração do requerente de que respeitou os limites e confrontações.”(NR)

Assim, penso que a ciência da retificação de área em nada será alterada, porque não houve alteração do artigo 225 e do artigo 213 da LRP…

Ouso a dizer que parte da notícia veiculada em uma das páginas do site do Senado Federal, de que “O projeto (PL 7.790/2014, na Casa de origem) determina que, com a dispensa da anuência expressa dos confrontantes para realização dessa descrição georreferenciada, bastará a declaração do próprio requerente de que respeitou os limites e as confrontações” não retrata fielmente a iminente alteração legislativa que se avizinha…

Creio ser importante lembrarmos do inciso II, § 11 do art. 213 da LRP, pois, desde do início da vigência da Lei n° 10.931/04, já não dependia de retificação a adequação da descrição de imóvel rural às exigências dos arts. 176, §§ 3° e 4°, e 225, § 3°, da referida LRP…

E, era fácil entender o motivo da desnecessidade de retificação…

Bastava depreender, em uma interpretação sistemática com os demais dispositivos da mesma LRP, que a norma do citado § 11 se refere exclusivamente a uma das retificações do inciso I do artigo 213, de modo que, estando a área e as medidas perimetrais do imóvel em ordem, a inclusão das coordenadas georreferenciadas seria praticada por retificação unilateral, conforme previsto na alínea “d” do citado inciso I do artigo 213…

“d) retificação que vise a indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georeferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais;”

Todavia, como se sabe, a necessidade de os imóveis rurais serem georreferenciados surgiu com a Lei n° 10.267/01, regulamentada pelo Decreto n° 4.449/02…

De forma que, passados quase dois anos da regulamentação da Lei n° 10.267/01, foi editada a Lei n° 10.931/04, que alterou substancialmente o procedimento de retificação de registros no Registro de Imóveis…

Assim, é preciso dizer que, com o advento da Lei n° 10.267/01, as nossas instituições representativas identificaram um óbice à sua aplicação: caso não houvesse mais uma adequação à LRP (que viria pela Lei n° 10.931/04) somente seria possível a aplicação das novas normas dos artigos 176 e 225 (então atualizados pela Lei n° 10.267/01) se houvesse retificação judicial da descrição do imóvel…

No entanto, desde a sua edição, o Decreto n° 4.449/02 (ainda não tinha sido aprovada a Lei n° 10.931/04) já previa a DRL no § 6° do artigo 9°:

“§ 6° A documentação prevista no § 5° deverá ser acompanhada de declaração expressa dos confinantes de que os limites divisórios foram respeitados, com suas respectivas firmas reconhecidas.”

Os colegas mais antigos vão lembrar de que, agora já na vigência da Lei n° 10.931/04, o INCRA controlava o procedimento de certificação de georreferenciamento ismicuindo-se nas atribuições do Registro de Imóveis, pois não expedia a referida certificação sem que o responsável técnico remetesse a ele, INCRA, as DRLs junto com o Memorial Descritivo e demais documentos…

Penso, conquanto respeite as vozes contrárias, que a proximidade do novel § 10 do artigo 176 somente fará com que a certificação de georreferenciamento seja aceita no RI sem que sejam exigidas DRLs dos confrontantes…

Vejam que o texto do referido artigo 10 não mencionou o artigo 225 da LRP, restringindo-se a afirmar que “para a identificação de que tratam os §§ 3° e 4° deste artigo, fica dispensada a anuência dos confrontantes”…

No entanto, os citados §§ 3° e 4° do artigo 176 dizem respeito exclusivamente aos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, lembrando também que a identificação de que trata o § 3° passou a ser obrigatória para efetivação de registro, em qualquer situação de transferência de imóvel rural, nos prazos fixados por ato do Poder Executivo…

Com efeito, não há, por outro lado, qualquer indicação de que o procedimento de especialização/retificação de registro, para alteração ou inserção de medidas perimetrais em descrição de imóvel rural, tenha sido afetado pela Lei que será remetida à sanção presidencial…

Em resumo, se o Memorial Descritivo georreferenciado, que contém a “Certificação de Georreferenciamento” com código alfanumérico, não inovar as medidas perimetrais constantes da matrícula do imóvel, dispensadas estarão as DRLs dos confrontantes…

Mas, se o MD “certificado” (como dito, que contém a certificação) inovar as medidas perimetrais do imóvel (mesmo sem alteração de área), s.m.j., continuará a existir a necessidade de o interessado obter as anuências dos confrontantes, porém, agora, somente com a aposição de suas assinaturas no MD e na planta topográfica, como, aliás, está consignado no texto do inciso II do já citado artigo 213…

Com todo respeito aos congressistas, mas, se a intenção deles era outra, então, erraram! Mas, se sua intenção era desfazer a obrigação criada pela regulamentação proporcionada pelo Decreto n° 4.449/02, atingiram em cheio o seu propósito!

E diga-se de passagem: se os artigos 225 e 213 da LRP tivessem sido objeto de modificação para que alterações ou inserções perimetrais nas descrições dos imóveis não necessitassem mais de anuência dos confrontantes, haveria a instalação de uma insegurança jurídica sem precedentes, lembrando que a retificação, de acordo com o artigo 212 da mesma LRP, ainda pode ser feita judicialmente, mas, sempre com a citação de todos os confrontantes!

Obviamente que não há “coisa julgada” em âmbito administrativo, mas, o procedimento extrajudicial de retificação deve proporcionar efetiva segurança jurídica, já que ínsito o interesse coletivo!

Se não se pensasse que a segurança jurídica seria alcançada por intermédio do procedimento extrajudicial, porque, então, haveria a desjudicialização da retificação?

Assim, creio que interpretar-se que a simples declaração do proprietário, prevista na “Lei” que será remetida à sanção presidencial, que acresce o § 10 ao artigo 176 da LRP, seja suficiente para praticar-se a especialização/retificação da descrição do imóvel na matrícula, com as devidas inserções das medidas perimetrais, é, no mínimo, desconsiderar todo o resto do sistema registral, e, no máximo, uma afronta à segurança jurídica que é um princípio constitucional…

Portanto, de acordo com o artigo 213, II, da LRP, não é a diferença de área que ditará a necessidade ou não de retificação de área, mas, sim, a necessidade de alteração ou de inserção de medidas perimetrais na matrícula do imóvel…

Acostumo a dizer, aos utentes do serviço que vêm ao balcão, que uma coisa é um terreno de 10m de frente e fundos X 30m de cada lado e outra coisa é um terreno de 30m de frente e fundos X 10m de cada lado…

E, se tivermos que alterar ou até que inserir alguma medida perimetral, por conta do princípio da segurança jurídica, não podemos aceitar uma simples declaração unilateral do proprietário… os confrontantes devem ser consultados…

Imaginem o problema que será quando um proprietário vier furioso ao cartório dizendo que um determinado confrontante (aquele sujeito que georreferenciou o seu imóvel e, por conta disso, averbou sem anuência as novas medidas perimetrais do MD certificado em sua matrícula) invadiu o seu terreno e, desaforadamente, apresentou-lhe uma certidão do Registro de Imóveis para infirmar a sua reclamação e argumentar que, face à referida certidão, os limites dele (confrontante) é que estão corretos…

Pelos fundamentos que lhes passei, alguém poderá entender que o confrontante não consultado conseguirá obter uma indenização do Oficial? Se a resposta tiver a mínima possibilidade de ser positiva e levando em consideração os estritos fundamentos acima, então, realmente, penso que a aplicação da nova norma que se aproxima deve ser feita somente no caso que lhes aventei…

Aliás, se preponderar o entendimento que o artigo 213, inciso II, da LRP continua aplicável e que para ser possível a averbação do certificado de georreferenciamento sem anuência dos confrontantes, a mesma não poderá ser praticada se houver alteração ou inserção de alguma medida perimetral da matrícula, o prejudicado virá atrás do Oficial…

No mesmo prisma da responsabilização, não podemos olvidar do § 14 do citado artigo 213: “Verificado a qualquer tempo não serem verdadeiros os fatos constantes do memorial descritivo, responderão os requerentes e o profissional que o elaborou pelos prejuízos causados, independentemente das sanções disciplinares e penais”, pois os valorosos, sérios e competentes profissionais que, a partir da vigência da lei que se aproxima, prestarão serviços de georreferenciamento, não merecem ser demandados por confrontantes eventualmente prejudicados por culpa ou dolo do proprietário que indicou a ele – profissional responsável técnico – os limites e confrontações a serem levantados topograficamente…

Alguém tem alguma dúvida disso?

 Fonte: Portal Agrimensura


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