Duas pessoas, desimpedidas, em convivência pública, contínua e duradoura, com objetivo de constituição de família, vivem um namoro ou uma união estável? Bem, os conceitos objetivos aqui descritos podem ser comuns a ambos os casos, o que vem gerando grandes discussões e enormes conflitos judiciais. Eis a questão.
Os complicadores são vários. Um, é o fato de que para ser reconhecida a união estável não é mais exigido um prazo mínimo de convivência, nem morar sob o mesmo teto (súmula 382 do STF) ou sequer ter filhos em comum. Outro, existirão relacionamentos longevos reconhecidos apenas como namoro e relacionamentos breves reconhecidos apenas como união estável. Complicado, não?
Mais complicado fica quando não se tratam de jovens nubentes, mas de pessoas maduras, com sólido patrimônio, vida financeira estável, separados ou viúvos, que pretendem apenas namorar, sem intenção de constituir nova família.
Ocorre que, enquanto os elementos objetivos que diferenciam a união estável e o namoro são pequenos, as consequências jurídicas entre os dois são enormes. A união estável se configurará como uma entidade familiar, com direitos entre os companheiros, como partilha de bens, direito a alimentos, direitos sucessórios, pensão previdenciária etc. Já entre os namorados, em tese, restarão apenas os bons momentos e as lembranças.
Então, para diferenciar os institutos restou apenas o elemento subjetivo, qual seja: o animus de constituir família. No namoro o animus se caracteriza por um projeto de família futura, enquanto na união estável a família já está constituída.
Contudo, diferenciar o namoro da união estável por meio de critério subjetivo não é tarefa simples, principalmente, se, ao término da relação, não há consenso entre os envolvidos ou, em caso de morte, não há consenso entre os herdeiros, o que pode gerar longas e desgastantes demandas judiciais.
Assim, a declaração de vontade expressa do casal é o caminho mais seguro para evitar questionamentos, o que pode ser feita mediante contrato de convivência na união estável, cuja confecção por meio de escritura pública é o mais aconselhável, pois enfraquece posterior alegação de vícios de consentimento. Quanto aos namorados muito se fala do contrato de namoro, a despeito dos debates quanto a sua eficácia jurídica.
Em suma, respeitada a lei, para que a vontade da pessoa impere e o seu desejo, mesmo com o advento da morte, seja respeitado, o melhor é deixá-lo consignado, determinado, registrado, como no antigo brocardo verba volant, scripta manent (as palavras voam, os escritos permanecem).
*Ana Vasconcelos Negrelli é advogada da área de Direito de Família do Martorelli Advogados.
Fonte: CNB/SP