SANCIONADA EM NOVEMBRO, A NOVA LEI DA ADOÇÃO DIMINUIU OS PRAZOS NA TENTATIVA DE DAR AGILIDADE AO PROCESSO. TERÁ PRIORIDADE QUEM ACEITAR ADOTAR GRUPO DE IRMÃOS.
O Senado levou apenas 42 dias para aprovar, em 25 de outubro, um projeto de lei que busca justamente amenizar a angustiante espera de crianças e candidatos a pais adotivos. A nova lei (13.509/2017) foi sancionada 28 dias depois pelo presidente Michel Temer, com alguns vetos.
Enquanto a ação legislativa e a sanção se desenrolavam, quase nove mil crianças e jovens aguardavam na fila para serem acolhidos por uma família. Em contrapartida, cerca de 43 mil possíveis pais conferiam suas posições na fila para recebimento de crianças.
Segundo o Cadastro Nacional de Adoção, quase 62% das crianças têm entre nove e 17 anos, enquanto 95% dos candidatos a pais preferem crianças até oito anos de idade. Destes, mais da metade não aceita ficar com os irmãos do adotando.
— Eu percebi que era um projeto muito maduro e reformulado depois de ampla discussão. Quando isso acontece, o ideal é colocar logo em votação. Até porque, se qualquer coisa fosse mudada, a matéria teria de voltar para a Câmara, o que faria aumentar a demora — explica a senadora Marta Suplicy (PMDB-SP), referindo-se ao PLC 101/2017 (número recebido no Senado), de autoria do deputado Augusto Coutinho (SD-PE).
O projeto resultou de uma consulta pública feita pelo Conselho Nacional da Criança e do Adolescente (Conanda) em 2016. O levantamento durou 90 dias e o texto obtido a partir das contribuições serviu de inspiração para a proposição de Coutinho, mas igualmente para um projeto, ainda em análise no Senado, o PLS 223/2017, apresentado pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG).
Marta Suplicy (PMDB-SP), relatora do PLC 101/2017, observa que muitas crianças em idade preferencial para adoção envelhecem a espera de um novo lar e acabam entrando na pré-adolescência ou adolescência com chances remotas de conseguirem um lar.
Sandra Lúcia, servidora pública do Distrito Federal, habilitada a adotar uma criança desde 2014, relata o longo caminho que já percorreu para realizar o sonho de ser mãe:
— Eu completei 3 anos de habilitação no dia 24 de novembro e estou à espera do meu sonho ser realizado, não importando se será menino ou menina. Para mim o importante é ser mãe.
Mas o cumprimento dos prazos previstos na nova lei, no entanto, gera dúvidas. A juíza Joyre Sobrinho, titular da Vara de Família e Infância da Comarca de Novo Gama do Goiás, alerta que é preciso investimento na estrutura do Judiciário para o cumprimento dos prazos.
— A maioria das Varas de Infância do Brasil inteiro está defasada. O processo de adoção é delicado e tem inúmeras variáveis. Então, às vezes o andamento de um processo não é o ideal por falta de estrutura — pondera a magistrada.
O advogado Hugo Teles, do Grupo Aconchego, que dá apoio à convivência familiar e comunitária e tem projetos voltados à adoção, concorda com Joyre Sobrinho:
— O Judiciário agora precisa se aparelhar. Tem que se estruturar com todo o sistema da Infância e Juventude. Caso contrário, esses prazos certamente não serão cumpridos.
Atualmente, há mais de 55 mil crianças e adolescentes vivendo em instituições de acolhimento, à espera da conclusão do processo de destituição do poder familiar, que é o desligamento da criança de sua família natural. A lei veio para mudar essa situação, trocando a prioridade para a volta da criança à família de origem em prol do interesse da criança e do adolescente em se inserir numa família estruturada.
O período máximo de acolhimento institucional, em abrigos, não poderá se prolongar por mais de um ano e seis meses, salvo por autorização de um juiz. A duração máxima do estágio de convivência que antecede a adoção em território nacional, antes sem prazo, foi fixada em 90 dias.
— São comuns histórias de crianças que chegam ao abrigo, passam o início da adolescência e com 18 anos têm que ir embora sem que sua situação seja definida. Então, quando a lei estabelece prazos, ela define a situação — explica Hugo Teles.
— Essas crianças que estão nos abrigos gostariam de ter um lar, mas é tanta burocracia que elas não conseguem ser adotadas. Demora tanto tempo para chegar ao cadastro nacional, que elas crescem e muitas famílias se desinteressam desse processo. Essa nova lei foca nesse gargalo para agilizar os procedimentos relacionados à destituição do poder familiar e à adoção de crianças e adolescentes — enfatiza Marta Suplicy.
Já o prazo para que as famílias inscritas se habilitem à adoção, também fica limitado a 120 dias, prorrogáveis por igual período mediante decisão judicial. É aí que o então pretendente à adoção será reconhecido como pai e o adotado como filho. Antes, não havia um tempo determinado e famílias reclamavam da incerteza.
No caso de adoção internacional, a lei determina que esse prazo deverá oscilar entre 30 e 45 dias, prorrogáveis uma única vez, também por decisão judicial.
VETOS
Algumas tentativas de encurtar os passos para adoção, porém, foram vetadas pelo presidente Michel Temer, quando da sanção da Lei 13.509/2017. O Planalto vetou dispositivos como o que autorizava o cadastro para a adoção de recém-nascidos e crianças mantidas em abrigos que não fossem procuradas pela família biológica em até 30 dias.
O presidente considerou o prazo “exíguo” e “incompatível” com a sistemática do Estatuto da Criança e do Adolescente sobre a busca da família extensa.
“Além disso, é insuficiente para se resguardar que a mãe não tenha agido sob influência do estado puerperal [pós-parto] e que, assim, possa ainda reivindicar a criança”, justificou o presidente.
O projeto enviado a Temer também buscava obrigar que todo jovem inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional teria sua situação reavaliada, no máximo, a cada três meses. “O governo federal entendeu que, embora louvável, a redução do prazo para reavaliação representaria sobrecarga às atividades das equipes interprofissionais dos Serviços de Acolhimento, podendo comprometer a realização e a eficácia do trabalho em outras tarefas essenciais”, contrapôs o Palácio do Planalto.
Para Hugo Teles, esse trecho vetado prejudica a eficácia da Lei:
— Eu critico esse veto porque ele vai na contramão do espírito da lei. Se a falta de pessoal é justificativa para que o ideal não ocorra, então o legislativo deveria se contentar com a realidade atual.
O projeto aprovado havia estabelecido, ainda, que interessados em adotar não podiam ser pessoas que participassem do programa de apadrinhamento. Nessa modalidade de relação com crianças e adolescentes, paralela ao programa de adoção, as famílias podem manter períodos de convivência intermitentes e contribuir para a educação ou o entretenimento dos apadrinhados. Esse trecho também foi vetado pelo presidente, sob a justificativa de que eliminar os padrinhos do rol de pretendentes traria prejuízos a crianças e adolescentes com remotas chances de adoção.
Fonte: Agência Senado