JURISPRUDÊNCIA MINEIRA
JURISPRUDÊNCIA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL - OBRIGAÇÃO DE FAZER - INSTITUIÇÃO DE CONDOMÍNIO - CONTRATO - DESCUMPRIMENTO
- A previsão contratual de que uma das partes deverá instituir condomínio deve ser interpretada conforme a intenção das partes, no caso, em que se trata de condomínio edilício.
- A lei não determina que todo condomínio edilício disponha de áreas comuns consideráveis e úteis para que possa ser instituído.
Apelação Cível nº 1.0476.13.001400-6/001 - Comarca de Passa-Quatro - Apelante: José Ênio Carneiro Mendes - Apelada: Nadyr Rodrigues Carneiro - Relator: Des. Alexandre Santiago
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento ao recurso.
Belo Horizonte, 1º de fevereiro de 2017. - Alexandre Santiago - Relator.
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
DES. ALEXANDRE SANTIAGO - Trata-se de apelação interposta contra a sentença proferida pelo MM. Juiz da Vara Única de Passa-Quatro, que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer e Adjudicação Compulsória proposta pelo apelante, José Ênio Carneiro Mendes, contra a apelada, Nadyr Rodrigues Carneiro, julgou improcedentes os pedidos iniciais.
O apelante pede a reforma da decisão, ao argumento de que o contrato firmado com a apelada foi expresso em impor a ela a obrigação de instituir o condomínio no imóvel, correndo por conta dela os custos para tal. Aduz que nunca se propôs a adquirir percentual do imóvel, mas sim uma loja individualizada, e que o registro dessa aquisição depende da instituição do condomínio. Requer, ainda, que lhe seja adjudicado o imóvel em questão para posterior transcrição junto ao CRI. Por fim, afirma que não é necessária a existência de área comum para que se institua o condomínio.
Devidamente intimada, a apelada apresentou contrarrazões às f. 207/214.
É o relatório.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Insurge-se o apelante contra a v. sentença de f. 186/188, que julgou improcedentes os pedidos iniciais, por considerar que não cabe a instituição de condomínio edilício sem que haja áreas comuns.
O apelante argumenta que a lei não determina que somente será possível a instituição do condomínio no caso de haver áreas comuns, e que nunca teve a intenção de adquirir parte percentual do imóvel, mas sim uma loja devidamente individualizada no compromisso de compra e venda. Afirma que há previsão expressa no compromisso de compra e venda de que a responsabilidade pela instituição do condomínio será da apelada.
Sobre o condomínio edilício, diz o Código Civil:
``Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.
§ 1º As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio.
§ 2º O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos.
§ 3º A cada unidade imobiliária caberá, como parte inseparável, uma fração ideal no solo e nas outras partes comuns, que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio.
§ 4º Nenhuma unidade imobiliária pode ser privada do acesso ao logradouro público.
§ 5º O terraço de cobertura é parte comum, salvo disposição contrária da escritura de constituição do condomínio.
Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial:
I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns;
II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns;
III - o fim a que as unidades se destinam.''
Vê-se, portanto, que a lei não determina que a área comum de um edifício deva ser ``área considerável e de utilidade'', como fez constar em sua decisão o il. Magistrado a quo. Dessa maneira, o fato de que, no presente caso, a área comum aos condôminos limita-se ao telhado comum e parede-meia, não impede a instituição do condomínio edilício.
Ademais, constou expressamente do contrato de promessa de compra e venda o seguinte:
``1ª) O objetivo deste compromisso é a transação comercial de:
a) Imóvel comercial e respectivo terreno urbano medindo 48,50 m² (quarenta e oito metros e cinquenta decímetros quadrados) ou a metragem que vier a ser levantada por profissional competente, a ser individuado por instituição de condomínio;
a.1) As despesas com a instituição de condomínio (Planta, Memorial Descritivo e emolumentos e taxas cartorárias) correrão por conta da compromitente vendedora.''
De fato, como afirma a apelada, não há a previsão expressa de que o referido condomínio a ser instituído será o edilício, e que se pode instituir condomínio com o simples registro da compra e venda de parte do imóvel. Entretanto, não se pode olvidar o que dispõe o art. 112 do Código Civil:
``Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.''
De fato, para instituição de condomínio sobre a coisa, basta a sua propriedade em comum. Entretanto, a partir do momento em que o contrato firmado entre as partes especifica que a promitente vendedora, ora apelada, deverá arcar com as despesas com a instituição de condomínio, dentre elas as referentes à planta e ao memorial descritivo, observa-se que a intenção das partes era instituir um condomínio edilício, com a individualização das unidades autônomas.
Dessa maneira, tendo o apelante comprovado que, até o momento, a apelada não cumpriu com a sua obrigação contratual, não obstante ter sido notificada para tanto, e tendo o apelante comprovado a quitação integral do preço do imóvel, devem ser julgados procedentes os seus pedidos iniciais, com a condenação da apelada à obrigação de fazer, referente à instituição do condomínio edilício, a fim de possibilitar ao apelante o registro da aquisição da propriedade de uma das unidades autônomas, o que deve ser feito, no caso em apreço, em função da instalação da lide, por meio de adjudicação compulsória.
O contrato firmado entre as partes prevê, ainda, a possibilidade de cobrança de 20% sobre o valor total do contrato, a título de honorários advocatícios, caso uma das partes seja obrigada a ingressar com ação judicial para o seu cumprimento (Cláusula 3.5 - f. 14). Dessa maneira, também deve ser acolhido o pedido de condenação da apelada ao pagamento da referida multa.
Pelo exposto, dou provimento ao recurso, para julgar procedentes os pedidos iniciais, condenando a apelada à obrigação de fazer, consistente na instituição do condomínio edilício no imóvel em questão, com a individualização das unidades autônomas, dentre elas a que foi adquirida pelo apelante, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (mil reais), limitada a R$100.000,00 (cem mil reais). Por consectário legal, adjudico-a de forma a proceder à transcrição na matricula do imóvel, após a comprovação do pagamento dos impostos correspondentes.
Condeno a apelada a pagar ao apelante, ainda, multa de 20% sobre o valor do contrato, que equivale a R$26.000,00 (vinte e seis mil reais), que deverá ser acrescida de juros moratórios de 1% a partir da citação e correção monetária a partir do ajuizamento da ação.
Condeno a apelada ao pagamento das custas e despesas processuais, inclusive as recursais, bem como honorários advocatícios ao patrono do apelante, que fixo em 12% sobre o valor da condenação.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Alberto Diniz Júnior e Shirley Fenzi Bertão.
Súmula - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.
Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico - MG