Mapas e guias não estão disponíveis para turistas dos parques nacionais de Aparados da Serra e Serra Geral
CAMBARÁ DO SUL (RS). Num país com 5.570 municípios, sediar um dos 68 parques nacionais é digno de destaque. A cidade gaúcha Cambará do Sul é sede de duas unidades da categoria. Ambas com cânions espetaculares, paredões verticais com mais de 700 metros de altura. Ambas com os mesmos chefe, conselho consultivo e plano de manejo – o documento que descreve a região protegida e lista quais investimentos devem ter prioridade. A separação dos dois parques – Aparados da Serra e Serra Geral – é causada pela falta de regularização de terras e processos judiciais que se arrastam há mais de 60 anos, em mais um exemplo da burocracia que prejudica os visitantes.
No Programa Parques da Copa, as duas unidades estão incluídas sob o guarda-chuva de Aparados da Serra. Esta é, de fato, a mais equipada. Tem portaria, guaritas, centro de visitantes e mirantes. Mas a lista de carências também é grande. Os atendentes são mal treinados e falam somente português – e a comunicação é fundamental, em um local onde o nevoeiro surge de uma hora para outra e compromete a contemplação dos cânions. Não há mapas ou abrigos. As trilhas são pouco sinalizadas e há apenas uma estimativa de quanto tempo dura cada percurso, ignorando o ritmo de cada pessoa. O único restaurante fechou anos atrás, porque as goteiras pingavam sobre a refeição dos turistas.
- Não é fácil se deslocar pelo parque. Conseguimos poucas informações – lamenta a turista alemã Karola Prinz, que, junto ao seu marido, tentava, sem sucesso, se localizar num dos painéis dispostos no centro de visitantes. Embora seja fluente em inglês, nenhum dos cinco atendentes próximos a ela conseguia orientá-la. -Desembarcamos em Montevidéu em abril e estamos subindo a América do Sul, ora de bicicleta ora de ônibus. Foi mais fácil andar na mata no Uruguai. Lá conseguimos mais mapas e pessoas que capazes de indicar as trilhas.
Criado em 1992, 35 anos depois de Aparados, o Parque da Serra Geral só tem guarita e estacionamento. O controle de visitantes é feito por apenas um fiscal, que se limita a anotar a placa dos carros e quantas pessoas há em cada veículo.
Sem orientação, e com a conivência de algumas operadoras de turismo, os aventureiros ultrapassam as cercas que separam a área plana dos cânions de seus desfiladeiros. Em apenas três horas, O GLOBO flagrou dez turistas que ignoraram os limites de segurança.
Outro grande problema de Aparados e Serra Geral é a falta de regularização fundiária. Em Aparados, 38% do parque são constituídos por áreas particulares; em Serra Geral, 73%. A trilha de uma unidade à outra, que teria 11 quilômetros, é um sonho ainda não consumado. As propriedades que estão no caminho não foram adquiridas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação (ICMBio), órgão do governo federal responsável pela gestão dos parques nacionais. Na falta de um percurso direto, os visitantes precisam dar a volta por Cambará do Sul, um trajeto duas vezes maior.
De 40 atrações previstas, só 8 implantadas
Concluído em 2004 pelo Ibama, o plano de manejo de Aparados da Serra previa 40 atrações no parque e em seu vizinho. Até agora, apenas oito saíram do papel. Uma das iniciativas previstas é uma trilha vertical no cânion do Itaimbezinho, cuja altura máxima é de 720 metros. Existe a proposta de que um elevador seja instalado na região.
- É uma área de alta sensibilidade ecológica. Não há qualquer segurança de que um dia isso acontecerá – assegura o chefe dos parques, Deonir Zimmermann. – A forma como o plano de manejo foi construído é um tanto quanto fora da realidade. Partiu-se do princípio de que há uma situação fundiária ideal, e isso não existe. Temos processos de desapropriação iniciados em 1960.
Um dos integrantes do grupo que coordenou a criação do plano de manejo, José Olímpio Junior defende a criação de novas trilhas na unidade:
- Há espaço para implantar outras trilhas em Aparados, assim como para a concessão de serviços à iniciativa privada. É um movimento ainda visto com resistência em muitos parques, como se o lucro obtido daí pervertesse a lógica de preservação do meio ambiente.
Os 72 mil turistas recebidos em Aparados no ano passado renderam R$ 418 mil. Algumas propriedades localizadas dentro deste parque e em Serra Geral valem mais o dobro disso.
Três anos atrás, a Justiça Federal aprovou a indenização proposta pela gestão do parque a alguns proprietários de terra nas unidades de conservação. O processo, no entanto, não determinava que áreas deveriam ser entregues aos parques. A determinação judicial, então, não foi efetivada.
Como muitos gestores de parques nacionais, Zimmermann queixa-se da falta de funcionários em seus parques. Atualmente, o ICMBio tem seis analistas ambientais e um técnico em Aparados. Zimmermann quer, pelo menos, dez analistas e oito técnicos. O acúmulo de funções impede que a equipe circule frequentemente pela unidade. Durante todo o ano passado, Aparados só recebeu 57 fiscalizações em campo. Serra Geral, 89.
Para Michel Bregolin, coordenador do curso de Turismo da Universidade de Caxias do Sul, Aparados e Serra Geral são marcados pela ausência de empreendedorismo e pela pouca sintonia das unidades com as cidades ao redor:
- Qualquer estudo de potencial turístico leva em conta a raridade da atração. A existência de cânions é muito restrita, portanto aqueles que estão dentro de nossos parques deveriam ter visibilidade internacional. O tempo de permanência do visitante e seu consumo na região seriam maiores se houvesse novas atrações, hoje proibidas, como escaladas.