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12/12/2014

Jurisprudência - Imóveis rurais - Área de reserva legal - Averbação realizada nos moldes do art. 17, VI, da Lei Estadual 14.209/02

REEXAME NECESSÁRIO EX OFFICIO E APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMÓVEIS RURAIS - ÁREA DE RESERVA LEGAL - AVERBAÇÃO REALIZADA NOS MOLDES DO ART. 17, VI, DA LEI ESTADUAL 14.309/2002 - INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO ÓRGÃO ESPECIAL DO TJMG - SUPERVENIÊNCIA DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL (LEI 12.651/12) - ALTERAÇÃO NO REGIME DE COMPENSAÇÃO (ART. 66) - ÁREAS COMPENSADAS PERTENCENTES AO MESMO BIOMA - LEGALIDADE - LICENCIAMENTO AMBIENTAL - REGULARIDADE - OUTORGA DE USO DE RECURSOS HÍDRICOS - NECESSIDADE NÃO COMPROVADA - CADASTRAMENTO DE USO INSIGNIFICANTE - OBRIGATORIEDADE - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE 

- Ainda que a compensação da área de reserva legal tenha sido realizada nos moldes do art. 17, VI, da Lei Estadual 14.309/02, posteriormente declarado inconstitucional pelo Órgão Especial do TJMG, deve ser mantido o ato registral, ante a comprovação de que as áreas compensadas pertencem ao mesmo bioma, conforme autorizado pelo art. 66 do novo Código Florestal. 

- Deve ser julgado improcedente o pedido formulado pelo Ministério Público Estadual quando os proprietários dos imóveis demonstram que já possuem a autorização ambiental de funcionamento. 

- Não comprovada a configuração de qualquer das hipóteses descritas nos incisos I a V do art. 12 da Lei Federal 9.433/97, deve ser julgado improcedente o pedido ministerial de condenação dos réus na obrigação de obterem outorga de uso de recursos hídricos relativamente a imóveis rurais destinados à cultura de cana-de-açúcar, devendo-se, contudo, impor o cadastramento obrigatório de uso insignificante junto ao IGAM, nos termos do art. 26 da Portaria 49/2010. 

Sentença parcialmente reformada em reexame necessário ex officio. Recurso de apelação prejudicado. 

Apelação Cível nº 1.0701.12.021375-9/003 - Comarca de Uberaba - Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Apelados: Antônio Roberto Sandoval Filho, Silvana Magno dos Santos Sandoval - Relatora: Des.ª Teresa Cristina da Cunha Peixoto 

ACÓRDÃO 

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em reformar parcialmente a sentença, em reexame necessário e julgar prejudicado o recurso de apelação. 

Belo Horizonte, 13 de novembro de 2014. - Teresa Cristina da Cunha Peixoto - Relatora. 

NOTAS TAQUIGRÁFICAS 

DES.ª TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO - Cuida-se de "ação civil pública" ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face de Antônio Roberto Sandoval Filo e Silvana Magno dos Santos Sandoval, alegando que os réus são proprietários dos imóveis rurais matriculados sob os nos 12.161,12.162, 29.248, 30.259, 30.381, 48.157, 48.010 e 48.976, cujas reservas legais foram averbadas em áreas fora da bacia hidrográfica, com amparo na Lei Estadual 14.309/2002, a qual já foi declarada inconstitucional pelo TJMG, não tendo tais imóveis sido atingidos pela modulação de efeitos na ação direta. Outrossim, afirma que, mesmo com o advento do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), a situação dos requeridos permanece irregular, já que citado diploma padece de inconstitucionalidade, por implicar retrocesso social na proteção do meio ambiente. Noutro passo, afirma que os demandados não providenciaram o licenciamento ambiental e o pedido de outorga de uso de recursos hídricos, necessários para o desempenho de quaisquer atividades nas propriedades rurais, requerendo que sejam condenados a "providenciarem a averbação das áreas de reserva legal dos imóveis rurais objetos das matrículas nos 12.161, 12.162, 29.248, 30.259, 30.381, 48.157, 48.010 e 48.976", bem como "a obtenção do devido licenciamento ambiental e da outorga para uso do recurso hídrico ou cadastro de uso insignificante junto ao IGAM - Instituto Mineiro de Gestão das Águas" (itens A e B, f. 15/16). 

Os réus contestaram às f. 240/257, alegando que, na qualidade de proprietários dos imóveis rurais mencionados na exordial, promoveram a compensação de reserva legal com áreas do mesmo bioma, tal como autorizado pelo novo Código Florestal. Asseveram que esse diploma não padece de inconstitucionalidade, por proteger suficientemente o meio ambiente. Informam que os imóveis são utilizados para plantação de cana-de-açúcar, já devidamente licenciadas e dispensadas de obtenção de outorga de uso de recursos hídricos. 

Indeferida a medida liminar pela decisão interlocutória de f. 447, mantida pelo acórdão de f. 609/623. 

Impugnação às f. 452/470. 

Na sentença de f. 714/725, o MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Uberaba julgou improcedente o pedido inicial. 

Inconformado, o Parquet interpôs o recurso de apelação de f. 729/744, sustentando que a compensação de reserva legal deve observar os critérios traçados pela Lei Estadual 14.309/2002, e não pela Lei Federal 12.651/2012 ou pela Lei Estadual 20.922/2013, as quais padecem de inconstitucionalidade, por violarem o princípio da proibição do retrocesso da proteção dos direitos socioambientais. Outrossim, afirma que mesmo esses diplomas impõem o dever de averbação da reserva legal em 20% (vinte por cento) da área do imóvel, sem contar as áreas de preservação permanente. Aduz que tal averbação deve se dar à margem do registro, salvo quando realizada junto ao CAR - Cadastro Ambiental Rural. Por fim, reafirma a necessidade do licenciamento ambiental e da outorga de uso de recursos hídricos. 

Os apelados ofertaram as contrarrazões de f. 747/779, pugnando pela manutenção da sentença ou, subsidiariamente, pela conversão do julgamento em diligência, a fim de que seja realizada prova pericial destinada a comprovar o ganho ambiental obtido com a compensação realizada pelos réus. 

Os autos foram distribuídos por prevenção derivada do Agravo de Instrumento nº 1.0701.12.021375-9/001, vindo conclusos (f. 796/799). 

Em seu parecer de f. 802/816, a douta Procuradoria-Geral de Justiça opina pela reforma da sentença em reexame necessário, julgando-se procedentes os pedidos iniciais. 

Procedo de ofício ao reexame necessário, por analogia ao art. 19, caput, da Lei 4.717/65, na linha da jurisprudência já pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 1219033/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, j. em 17.03.2011; REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, j. em 19.05.2009). 

Também conheço do recurso de apelação, porque presentes seus pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade. 

Feito o necessário resumo do caso, observo que a matéria controvertida cinge-se a definir se a compensação de reserva legal realizada pelos requeridos em seus imóveis rurais é legal e se há eventuais irregularidades relativas ao licenciamento ambiental e à outorga de uso de recursos hídricos, à luz da legislação ambiental de regência.

Nesse mister, registro, inicialmente, que as certidões imobiliárias constantes dos autos demonstram que os réus são proprietários de imóveis situados no Município de Água Comprida, Comarca de Uberaba, matriculados sob os nos 48.010 (Fazenda Bálsamo, f. 22/25), 29.248 (Fazenda Guarirobas - f. 28/29), 48.157 (Fazenda São Sebastião do Bálsamo - f. 30/34), 12.161 (Fazenda São João - f. 50/54), 12.162 (Fazenda Nossa Senhora Aparecida - f. 55/60), 30.259 (Fazenda Rio Grande - f. 63/64), 30.381 (Fazenda Covanca - f. 65/67) e 48.976 (Fazenda Santa Teresa - f. 73/76). 

Tais documentos informam que os recorridos, visando a regularizar as áreas de reserva legal averbadas em todas as mencionadas propriedades, utilizaram-se de áreas da Fazenda Almecegas, situadas no Município de Bonito de Minas, Comarca de Januária/MG, como forma de compensação, consoante expressamente autorizado pelo art. 17, inciso VI, da Lei Estadual 14.309/2002: 

``Art. 17. O proprietário rural fica obrigado, se necessário, a recompor, em sua propriedade, a área de reserva legal, podendo optar entre os seguintes procedimentos: 

[...] 

VI - aquisição, em comum com outros proprietários, de gleba não contígua e instituição de RPPN, cuja área corresponda à área total da reserva legal de todos os condôminos ou co-proprietários, condicionada a vistoria e aprovação do órgão competente; [...]. 

Ocorre que a norma extraída do texto normativo supratranscrito foi objeto de controle pelo Órgão Especial deste eg. TJMG, que, no julgamento da ADI 1.0000.07.456706-6/000, declarou a sua inconstitucionalidade material, em acórdão assim ementado: 

``Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 17, incisos V, VI e VII, § 6º, da Lei Estadual 14.710/2004. Política florestal e de proteção à biodiversidade no Estado. Art. 19, incisos V e VII, § 6º, do Decreto Estadual 43.710/04. Regulamento. Reserva legal. Inconstitucionalidade manifesta. Extrapolação de competência suplementar. Disciplina contrária à legislação federal de regência. Ofensa ao art. 10, inciso V, § 1º, I, da Constituição Estadual. Representação acolhida. Vício declarado. - A recomposição da reserva legal em imóveis rurais a ser implementada mediante compensação, consoante a legislação federal de regência, somente é possível se se der por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia (TJMG - Órgão Especial - ADI 1.0000.07.456706-6/000 - Relator: Des. Roney Oliveira - Relator p/ o acórdão: Des. Herculano Rodrigues - Data do julgamento: 27.08.2008).

Registre-se que os efeitos de tal decisão foram modulados pelo Órgão Especial em sede de aclaratórios, nos seguintes termos: 

``Embargos de declaração em ação direta de inconstitucionalidade. Alegação de existência de omissões no acórdão. Procedência parcial. Pleito de modulação dos efeitos no tempo da declaração de inconstitucionalidade não apreciado. Embargos acolhidos nesse ponto. Alcance da decisão delimitado. - Tendo efeito erga omnes a decisão do Tribunal de Justiça em sede de ação direta de inconstitucionalidade em face da Constituição do Estado, no caso de acolhimento da representação, com a consequente declaração de inconstitucionalidade da norma impugnada (o que importa na proclamação de sua nulidade), a sua retirada do mundo jurídico, com eficácia retroativa à data do início de sua vigência, ou outra data fixada na decisão, se faz no âmbito mesmo em que ela surgiu e atua, qual seja no âmbito estadual - o que impede que, por haver a norma deixado de existir na esfera de ordenamento que integrava, seja reavivada em face da Carta Magna federal, questão cujo objeto já não mais existe. - Os embargos de declaração, como cediço, não têm o caráter de reavaliação da valoração das teses apresentadas, de reapreciação do julgado. Certo é, também, que não configura lacuna o fato de não haver o acórdão comentado cada um dos argumentos levantados pelas partes, quando, no contexto geral da decisão, está nítido o afastamento de todos eles. - Tendo sido o acórdão omisso quanto ao pleito de modulação dos efeitos retrospectivos da declaração de inconstitucionalidade, sopesadas a boa-fé, a segurança jurídica e a questão ambiental imanente, é de acolher os embargos para excluir do alcance da decisão as RPPNs efetivamente criadas e publicadas sob a égide da legislação estadual objeto da representação, mencionadas na parte dispositiva do acórdão. [...] Assim, sopesados esses aspectos, tenho que a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade é necessária, mas deve se limitar à preservação das reservas particulares do patrimônio natural efetivamente criadas e cujos atos já haviam sido publicados, tal como propõe a Procuradoria-Geral de Justiça. De acordo com os esclarecimentos do Instituto Estadual de Florestas, anexados à manifestação da Procuradoria (Ofício nº 61/DG/SISEMA, datados de 12 de maio deste ano - f. 852/853 dos autos), foram criadas e publicadas sob a égide das normas declaradas inconstitucionais, estando em fase final de averbação, aguardando o desfecho desta ação direta, as RPPNs `Reserva Triângulo I, `Vereda da Caraíba, `Aldeia, `Porto do Cajueiro e `Cotovelo. As RPPNs relacionadas nos itens 2 (`Vale da Luciânia e `Reserva Água Limpa) e 3 (`Almas, `Almas I, `Almas II e `Pissarrão) do aludido ofício, tratando-se de áreas situadas na mesma bacia hidrográfica, não serão alcançadas pela declaração de inconstitucionalidade. As demais reservas, referidas nos itens 4 (`Almecegas/Rio Pandeiros, `Almecegas, `Reserva do Gibão e `Gibão) e 5 (`Triângulo II A, `Triângulo II B, `Triângulo II C e `Triângulo II D), cujos processos de criação se achavam em estágio mais atrasado, não serão preservadas dos efeitos desta decisão. Nesses termos, acolho, parcialmente, os embargos opostos pelo Estado de Minas Gerais e pela Assembleia Legislativa, apenas para, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99, modular os efeitos no tempo da declaração de inconstitucionalidade dos incisos V, VI e VII do art. 17 da Lei Estadual 14.309/02 e dos incisos V e VI, e § 6º do Decreto 43.710/03, declarando que não serão alcançadas pelo caráter retrospectivo da decisão apenas as RPPNs `Reserva Triângulo I, `Vereda da Caraíba, `Aldeia, `Porto do Cajueiro e `Cotovelo (TJMG - Órgão Especial - ED 1.0000.07.456706-6/001 - Relator: Des. Herculano Rodrigues - Data do julgamento: 12.08.2009). 

Conforme se infere do trecho do voto condutor do aresto, a área denominada "Almecegas/Rio Pandeiros" não foi abarcada pela modulação dos efeitos - o que, inclusive, é expressamente reconhecido no Ofício nº 0153/2009/GT/SISEMA emitido pelo IEF/MG (f. 35/36) -, tornando inválida a compensação empreendida pelos requeridos. 

Ocorre que, com a superveniência do novo Código Florestal (Lei 12.651), editado em 25.05.2012 e alterado pela Lei 12.727/2012, o regime de proteção da reserva legal sofreu significativas inovações, sobretudo quanto ao sistema de compensação, que passou a ser tratado da seguinte forma pelo art. 12, inciso II, c/c o art. 66, inciso III, § 5º, inciso IV, § 6º, incisos I, II e III: 

``Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei: 

[...]

II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento); [...].

``Art. 66. O proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de julho de 2008, área de Reserva Legal em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua situação, independentemente da adesão ao PRA, adotando as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente: 

[...]

III - compensar a Reserva Legal. 

[...]

§ 5º A compensação de que trata o inciso III do caput deverá ser precedida pela inscrição da propriedade no CAR e poderá ser feita mediante: 

[...]

IV - cadastramento de outra área equivalente e excedente à Reserva Legal, em imóvel de mesma titularidade ou adquirida em imóvel de terceiro, com vegetação nativa estabelecida, em regeneração ou recomposição, desde que localizada no mesmo bioma. 

[...]

§ 6º As áreas a serem utilizadas para compensação na forma do § 5º deverão:

I - ser equivalentes em extensão à área da Reserva Legal a ser compensada;

II - estar localizadas no mesmo bioma da área de Reserva Legal a ser compensada;

III - se fora do Estado, estar localizadas em áreas identificadas como prioritárias pela União ou pelos Estados; 

[...].

Segundo se percebe, o novo Código Florestal difere substancialmente do antigo (Lei 4.771/65), que autorizava ao proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta nativa, natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensão inferior ao estabelecido em lei a adoção da medida de compensação de reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertencente ao mesmo ecossistema e localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento (art. 44, III). 

Afinal, no novo texto legal, a compensação não mais é permitida apenas em relação às áreas que pertençam ao mesmo ecossistema e que estejam localizadas na mesma microbacia, mas quanto a todas aquelas que estejam localizadas no mesmo bioma. 

Nessa toada, deve ser afastada a tese suscitada pelo autor de que a citada Lei 12.651/2012 seria inconstitucional nesse ponto, por ofender o princípio da vedação do retrocesso ambiental, pelo qual, uma vez reconhecido o direito, recai sobre o Estado não só a obrigação de efetivá-lo, como a proibição de diminuí-lo ou suprimi-lo, não se podendo desconstituir as conquistas já alcançadas pela coletividade. Afinal, ao cotejar as Leis 4.771/65 e 12.651/2012, constato não ter ocorrido qualquer diminuição do âmbito de proteção do meio ambiente no que concerne à reserva legal, uma vez que o novel diploma legal continua a impor aos proprietários de imóvel rural a obrigação de manter preservado e intacto 20% (vinte por cento) da área total do bem. 

Feito esse registro, cumpre esclarecer que o "Relatório de Avaliação da Relevância Ecológica" de f. 353/369, elaborado pelo IEF - Instituto Estadual de Florestas, informa que a "Fazenda Almecegas" se situa nas margens do Rio Pandeiros, Município de Rio Bonito/MG, e possui tipologia vegetal predominante de cerrado, englobando as variantes "campo cerrado", "cerrado stricto sensu e "campo úmido" (f. 356). 

Por outro lado, é possível aferir do "laudo técnico para caracterização de bioma" de f. 424/426, cujo teor não foi impugnado pelo órgão ministerial (f. 452/470), que as propriedades situadas no Município de Água Comprida (Fazendas São João, Nossa Senhora Aparecida, Rio Grande, Guarirobas, Covanca, Bálsamo e Santa Teresa) possuem tipologia de vegetação, espécies de fauna e flora locais, bem como tipos de solo também característicos do cerrado, o que é corroborado pelos documentos de f. 46 e 115, ambos emitidos pelo IEF/MG.

Logo, restando incontroverso que os imóveis estão localizados no mesmo bioma, Cerrado, entendo que a compensação de reserva legal realizada pelos requeridos atende ao comando do art. 66 do novo Código Florestal. 

De igual maneira, não subsiste a pretensão ministerial no que concerne ao licenciamento ambiental e à outorga para uso dos recursos hídricos. 

Com efeito, o caderno probatório demonstra que as Fazendas São João (f. 429), Nossa Senhora Aparecida (f. 431), Rio Grande (f. 435), Guarirobas (f. 433), São Sebastião do Bálsamo (f. 439), Bálsamo (f. 441) e Santa Teresa (f. 443) possuem autorização ambiental de funcionamento emitida pela Semad/MG, com validade até 20.10.2015, ao passo que a Fazenda Covanca (f. 437) prescinde de tal autorização e/ou licenciamento, devido ao seu pequeno porte e potencial poluidor. 

Já no que tange à outorga de uso de recursos hídricos, cumpre transcrever o art.12 da Lei Federal 9.433/97 (Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos): 

``Art. 12. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos:

I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo; 

II - extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo; 

III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final; 

IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; 

V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. 

§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em regulamento:

I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;

II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;

III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes. 

§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei, obedecida a disciplina da legislação setorial específica. 

Do mesmo teor o art. 18 da Lei Estadual 13.199/99 (Dispõe sobre a política estadual de recursos hídricos): 

``Art. 18. São sujeitos a outorga pelo poder público, independentemente da natureza pública ou privada dos usuários, os seguintes direitos de uso de recursos hídricos:

I - as acumulações, as derivações ou a captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, até para abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;

II - a extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo;

III - o lançamento, em corpo de água, de esgotos e demais efluentes líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;

IV - o aproveitamento de potenciais hidrelétricos;

V - outros usos e ações que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água. 

§ 1º Independem de outorga pelo poder público, conforme definido em regulamento, o uso de recursos hídricos para satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais distribuídos no meio rural, bem como as acumulações, as derivações, as capacitações e os lançamentos considerados insignificantes. 

§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica ficam condicionadas a sua adequação ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na forma do disposto na Lei Federal nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, e ao cumprimento da legislação setorial específica. 

Ora, na espécie, tratando-se de fato constitutivo do direito do autor (art. 333, I, CPC), cabia ao Parquet comprovar que a atividade de exploração de cana-de-açúcar com e sem queima nos imóveis de propriedade dos réus demanda o uso significativo de recursos hídricos, não se podendo presumir tal obrigação pela simples natureza da atividade, de modo que, inexistindo qualquer prova nos autos de que o caso concreto se enquadre nas hipóteses descritas nos incisos I a V do art. 12, descabe impor a obrigação de obtenção de outorga. 

Contudo, não se deve desconsiderar que, mesmo nos casos de uso insignificante de recursos hídricos, é preciso que o proprietário do imóvel efetue o cadastramento junto ao IGAM - Instituto Estadual de Gestão das Águas, de modo a obter a Certidão de Registro de Uso Insignificante da Água, nos termos do art. 26 da Portaria 49/2010: 

``Art. 26. Será obrigatório o cadastramento dos usos de recursos hídricos considerados insignificantes, respeitados os critérios aprovados pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos, até a definição dos critérios por Unidade de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos - UPGRH, pelo respectivo comitê de bacia, no âmbito do plano diretor de recursos hídricos, a fim de se assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de acesso à água. 

Destarte, em reexame necessário, reformo parcialmente a sentença, para condenar os réus à obrigação de efetuarem o cadastramento dos usos de recursos hídricos considerados insignificantes junto ao IGAM, de modo a obterem a respectiva Certidão de Registro de Uso Insignificante da Água relativamente aos imóveis rurais situados no Município de Água Comprida, Comarca de Uberaba, matriculados sob os nos 48.010 (Fazenda Bálsamo, f. 22/25), 29.248 (Fazenda Guarirobas - f. 28/29), 48.157 (Fazenda São Sebastião do Bálsamo - f. 30/34), 12.161 (Fazenda São João - f. 50/54), 12.162 (Fazenda Nossa Senhora Aparecida - f. 55/60), 30.259 (Fazenda Rio Grande - f. 63/64), 30.381 (Fazenda Covanca - f. 65/67) e 48.976 (Fazenda Santa Teresa - f. 73/76). 

Prejudicado o recurso de apelação.

Sem custas e honorários.

Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Alyrio Ramos e Rogério Coutinho. 

Súmula - REFORMARAM PARCIALMENTE A SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO EX OFFICIO E JULGARAM PREJUDICADO O RECURSO DE APELAÇÃO.


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