Marcelo de Rezende Campos Marinho Couto A Medida Provisória 656, de 07 de outubro de 20141 , e que entra em vigor em 07 de novembro de 20142 , positiva em nosso ordenamento o princípio da concentração na matrícula, cuja existência já era reconhecida na doutrina nacional há algum tempo, e recepcionada pelo Código de Normas Extrajudicial do Estado de Minas Gerais 3. De acordo com este princípio, todas as ocorrências relevantes ao imóvel, ou aos titulares dos direitos reais, devem ser lançados na matrícula, como forma de possibilitar a publicidade ampla e garantir interesses de terceiros. Com esta nova norma de conduta, dar publicidade ao ato de seu interesse é DEVER do interessado, seja ele o autor de uma ação de cobrança, o Poder Público em relação às restrições administrativas (incluindo tombamento e desapropriação), o credor nas ações executivas, ou o adquirente de qualquer direito real sobre o imóvel, na hipótese de não registrar seu título. E esta publicidade deve-se dar através da inscrição do ato na matrícula do imóvel, e não através de publicações fictas em Diários Oficiais, editais, etc. A publicidade que vale é a obtida através do lançamento na matrícula imobiliária, onde deverão se concentrar tais informações. Visando uma adequação à nova sistemática normativa, a Medida Provisória estabeleceu o prazo de dois anos para que as partes (interessado, Poder Público, Judiciário) encaminhem as informações aos Cartórios de Registros de Imóveis dos atos já existentes, sendo que os novos atos, praticados a partir de 07.11.2014, já devem ser objeto de averbação imediata na matrícula, sob pena de inoponibilidade a terceiros. A busca da informação em fonte única (matrícula imobiliária) contribuirá em muito para dar maior segurança aos negócios jurídicos celebrados, diminuindo os riscos do adquirente e do credor, possibilitando diminuição nos prazos para lavratura de escrituras, redução dos juros imobiliários, gerando maior confiança em todo o sistema registral. Segundo o Governo, esta mudança fará com que o Brasil suba seis posições no ranking do Banco Mundial sobre melhores ambientes para negócios4 . Importante, ainda, salientar, que embora pareça que a norma diga respeito apenas a ações judiciais e restrições administrativas, uma leitura atenta nos mostra que qualquer titular de direito real não registrado correrá grande risco ao não providenciar o imediato registro de seu título. É bastante comum a prática de compra e venda mediante “contrato de gaveta”, ou a venda “por procuração” (onde o proprietário outorga procuração pública ao comprador para assinar escritura de compra e venda). Nestes casos, ao aplicarmos a nova regra, o que deveria prevalecer: uma penhora decorrente de dívida do antigo proprietário (que já alienou por contrato de gaveta ou procuração) ou a transação feita anteriormente, mas não levada a registro? A nosso ver, com a mudança da sistemática, que encontra amparo nos princípios da eticidade e solidarismo social, na função social e econômica da propriedade, bem como na cláusula geral de boa-fé objetiva, não cabe mais privilegiar a pessoa desidiosa e individualista, em detrimento de quem agiu em conformidade com os ditames sociais, praticando conduta diligente e pautada pela boa-fé. Na concorrência entre o “adquirente de boa-fé” que não registrou seu título e no credor de boa-fé que registrou sua penhora, deve-se, em princípio, privilegiar este último. A partir do momento que migramos, em definitivo, do conceito oitocentista de boa-fé subjetiva, para a nova ordem da boa-fé objetiva, como norma de conduta social, não podemos considerar como “adquirente de boa-fé” quem oculta seu título (não o levando a registro), descumprindo a lei, deixando de recolher os impostos de transmissão, impedindo que terceiros saibam que possui patrimônio (frustrando inclusive interesses de possíveis credores). 2 Conforme parágrafo primeiro do artigo 8o da Lei Complementar 95/1998: “A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subseqüente à sua consumação integral.” 3 Provimento 260/CGJ/2013, art. 621:“IX - da concentração, a possibilitar que se averbem na matrícula as ocorrências que alterem o registro, inclusive títulos de natureza judicial ou administrativa, para que haja uma publicidade ampla e de conhecimento de todos, preservando e garantindo, com isso, os interesses do adquirente e de terceiros de boa-fé.” 4 Notícia veiculada na Folha de São Paulo em 21.10.2014. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/191634-lei-que-agiliza-registro-de-imovel-levara-dois-anos-para-ter-efeito.shtml>. Acesso em: 01 nov. 2014. |