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12/08/2014

Artigo: Novos cartórios e averbações em velhas matrículas - Marco Antonio de Oliveira Camargo

Provavelmente uma das disposições mais interessantes da Lei dos Registros Públicos (Lei 6015/73) e menos utilizadas com a intensidade que dela se espera é a constante do inciso I do artigo 169.

O dispositivo,  muito  simples e de uma inteligência facilmente compreendida, tem a seguinte redação:

Art. 169. Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no cartório da situação do imóvel, salvo:

I – as averbações, que serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se refiram, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição; (grifei)


O objetivo do legislador, ou seja, a inteligência da norma,  é muito claro. O que se pretende é garantir que a nova matrícula do imóvel, a ser aberta no cartório da nova circunscrição,  já em sua abertura, venha a contemplar todos os dados eventualmente necessários à qualificação daquele imóvel, sob o aspecto real e pessoal.

A Lei 6015, em sua redação atual, prevê expressamente 22 tipos possíveis de atos de averbação e, curiosamente, dentre eles existe um a ser praticado “ex-officio” pelo oficial registrador. Trata-se da averbação  dos nomes dos logradouros, decretados pelo Poder Público  (cf. alínea 13 do inciso II do artigo 167).

A denominação de vias públicas, embora não seja algo realmente incomum, não se compara, sob o aspecto da frequência de sua ocorrência, com outros tipos de situações que de alguma forma alteram o registro em seus elementos fundamentais e que, por tal motivo, necessitam ter acesso franqueado ao registro imobiliário.

Muito mais comum e frequente é a alteração de estado civil e outras circunstâncias  com influência na qualificação das pessoas envolvidas no ato do registro.

Exemplos não faltam na prática dos notários e registradores: o proprietário que, ao adquirir o imóvel, era solteiro, contrai casamento e se divorcia, sem nunca ter promovido qualquer alteração em seu registro. Uma pessoa, de menor idade, ao receber pagamento de herança, não tem em seu registro de propriedade nenhum elemento de qualificação pessoal além da filiação e da situação de incapacidade civil existente no momento da sucessão.

Enfim, as pessoas vivem e na dinâmica de suas vidas, geralmente se esquecem de atualizar suas informações pessoais junto ao registro de seus bens imóveis. Entretanto, cedo ou tarde, tal providência deverá ser obrigatoriamente tomada.

Embora não seja de ocorrência muito comum é fato que ocorrem desmembramentos de área territorial de uma circunscrição imobiliária e que, em tal situação, certamente existirá no registro imobiliário do cartório  que sofreu o desfalque, muitos registros e matrículas efetivamente desatualizados.

A criação de uma nova circunscrição imobiliária inegavelmente gera conseqüências que se prolongam no tempo e que demandam das partes afetadas (os oficiais de registro imobiliário e a população em geral) uma postura de tranqüilidade e sabedoria.

A importância de atualizar a situação imóvel antes da abertura de nova matrícula junto à nova circunscrição imobiliária é, como já afirmado anteriormente, necessária para que os  destinatários das informações ali registradas tenham acesso à situação atual do imóvel e de seu proprietário.

Abrir uma nova matrícula com dados desatualizados para em seguida proceder à averbações de qualificação pessoal, de denominação de via pública, retificação de descrição de imóvel; ou ainda aberta a matrícula, providenciar o transporte dos ônus existentes e, imediatamente, promover a averbação de seu cancelamento,  realmente não é interessante para o usuário do serviço público delegado.

O que parece  tão óbvio e coerente, entretanto, na prática pode não acontecer muito pacificamente.

Infelizmente é comum ocorrer uma certa resistência por parte do oficial, que “perdeu” território de sua circunscrição, em facilitar a realização destes atos de averbação junto ao seu cartório, pois é notório que atos de averbação,  apesar de potencialmente complexos e de grande repercussão registrária, não resultam em rendimentos equivalentes ao que seriam auferidos com os atos de registro de transmissão ou oneração da proprieda imobiliária.

Por outro lado, é possível também a existência de uma certa incompreensão por parte do titular da nova circunscrição, por entender que aquele registrador, ao praticar atos de averbação em imóvel que atualmente não pertencem mais à sua circunscrição, estaria, ilegitimamente apropriando-se de competência que não mais lhe assistiria.

Ambas as posturas não levam em consideração o interesse público e a própria inteligência da Lei.

Este despretensioso artigo pretende apenas chamar a atenção do público usuário do serviço e dos colegas que eventualmente enfrentam esta situação de transição e transporte de matrículas e registros, de uma circunscrição originária para uma nova circunscrição, que a inteligência de lei é a simplificação, a maior clareza e eficiência possível para o Registro Imobiliário do país.

Que o titular do “novo cartório” incentive o titular do “antigo” a facilitar ao máximo a realização de todas as averbações que mostrem necessárias e que ele, “antigo” titular aceite com sabedoria e resignação este encargo que a ele compete realizar.

As futuras gerações agradecem (e a legalidade estrita também).


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