Relator votou pela manutenção da certidão, mas houve divergência reconhecendo a possibilidade de anulação quando comprovados erro no registro e ausência de relação socioafetiva.
A 4ª turma do STJ começou a julgar ação que discute a anulação de um registro de paternidade, ajuizada após a morte do pai registral. No processo, os herdeiros alegam que o vínculo foi reconhecido com base em erro, sem qualquer relação biológica ou socioafetiva entre o pai e o filho registrado.
O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Raul Araújo.
O caso
O julgamento em análise trata de pedido de anulação de registro de nascimento. Após o falecimento do pai registral, sua filha buscou desconstituir a paternidade de outro filho registrado, alegando que não havia vínculo biológico nem socioafetivo entre eles.
A alegação central era a de que o registro teria sido feito com base em erro ou falsidade, já que o homem registrado como pai não seria, de fato, o genitor da criança.
Voto do relator
No julgamento, o ministro Antonio Carlos Ferreira observou que o pai registral já havia ajuizado ações anteriores, uma anulatória e outra negatória de paternidade, ambas extintas, a primeira por decadência e a segunda em razão da coisa julgada.
Diante disso, a atual demanda, apresentada sob a forma de ação declaratória de nulidade, seria, na visão do relator, uma tentativa de contornar esses obstáculos processuais.
O ministro destacou que a controvérsia girava em torno da existência, ou não, de erro na lavratura do registro.
No entanto, concluiu que não havia vício na certidão, já que o registro foi realizado pela mãe da criança e não pelo pai. Assim, eventual equívoco do pai não teria repercussão no ato formal, que foi regularmente praticado.
Ressaltou ainda que não havia elementos que indicassem má-fé da mãe no momento da declaração, admitindo-se inclusive que ela própria pudesse ter sido induzida em erro.
Dessa forma, o relator entendeu que o registro civil não apresentava nulidade.
O ministro Marco Buzzi acompanhou o relator.
Divergência
Entretanto, o ministro João Otávio de Noronha divergiu do relator.
Para Noronha, o art. 1.604 do Código Civil permite que qualquer interessado com legitimidade, e não apenas o pai registral, busque a anulação, desde que demonstrados dois requisitos indispensáveis: prova robusta de erro ou coação no reconhecimento da paternidade e ausência de vínculo socioafetivo entre pai e filho.
O ministro destacou que, no caso concreto, esses requisitos estariam presentes. Segundo ele, o pai registral acreditava, de forma equivocada, ser o pai biológico, tendo sido induzido em erro no momento do registro.
Mais tarde, ao descobrir a verdade, ajuizou diversas ações tentando anular a paternidade, o que reforçaria sua intenção de não manter o vínculo jurídico.
Além disso, as provas produzidas nos autos indicariam inexistência de relação socioafetiva, pois não havia registros de convivência, demonstrações de afeto ou reconhecimento público de filiação.
O ministro enfatizou que a divergência entre paternidade biológica e registral, por si só, não basta para a anulação, mas quando somada à ausência de afeto e ao erro comprovado, justifica a medida.
Assim, concluiu que não seria possível manter o vínculo de filiação em desacordo com a realidade fática e biológica, votando pelo não provimento do recurso especial e, portanto, pela manutenção da decisão que anulou o registro.
Fonte: Migalhas