Casos ocorrem após homens não quererem se submeter a DNA ou, ainda, quando, realizado o teste positivo, se recusa ao reconhecimento
O que significa ter o nome do pai na certidão de nascimento? Para muitos, é a afirmação de uma história, de uma identidade, de uma origem. Mas, para quase 50 mil pessoas que recorreram aos tribunais brasileiros em 2025, porém, essa afirmação se transformou em uma batalha judicial — um confronto para garantir o reconhecimento paterno que lhes foi negado.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelam que, neste domingo (10/8), Dia dos Pais, muitos brasileiros e brasileiras não terão motivos para celebrar. Entre as razões, está a recusa ou a dúvida do pai em reconhecer o vínculo biológico.
Entenda
Somente no primeiro semestre deste ano, 48.241 ações pedindo investigação de paternidade foram protocoladas em todos os tribunais do país, segundo a plataforma do CNJ. O volume equivale a uma média de 266 processos por dia — ou 11 por hora.
O procedimento é adotado quando há ausência de registro paterno na certidão de nascimento. Na maioria dos casos, é movido pelas mães ou pelos próprios filhos, já adultos, em busca não apenas de direitos como pensão alimentícia e herança, mas também de reconhecimento e pertencimento.
Os pedidos judiciais, cada vez mais comuns, evidenciam que a paternidade, muitas vezes, ainda precisa ser imposta judicialmente diante da recusa do suposto pai em reconhecer voluntariamente. E não se trata de um problema recente: desde 2020, já são 482.345 ações que tramitam ou tramitaram nos tribunais do país sobre o tema.
Direito fundamental
Para a advogada Tatyanna Costa Zanlorenci, especialista em direito de família, o reconhecimento da paternidade é mais do que uma formalidade: é um direito fundamental. Ela cita que a filiação assegura não apenas laços afetivos, mas também direitos civis como herança, benefícios previdenciários, uso do sobrenome paterno, acesso à história familiar e pensão alimentícia.
“Isso a gente tem que ter bem em mente quando fala sobre essas ações de parentalidade, de paternidade, lembrando que a paternidade pode ser exercida de forma biológica ou socioafetiva. Cada vez mais o ordenamento jurídico está caminhando para se adequar às transformações que acontecem na nossa sociedade”, diz a especialista.
A advogada lembra que, mesmo diante da recusa ou ausência do suposto pai, a lei garante meios para assegurar o vínculo, como a realização de exame de DNA com parentes próximos — possibilidade prevista na Lei nº 14.138/2021. “O ordenamento jurídico tem avançado para se adequar às mudanças da sociedade, reconhecendo que o afeto também constrói família e merece a mesma proteção da filiação biológica”, diz.
Segundo ela, a importância desse reconhecimento vai além do aspecto jurídico. “Saber de onde veio e ter esse laço reconhecido é fundamental para a identidade e a dignidade da pessoa”, afirma Tatyanna.
Já o advogado Lucas Menezes, especialista em direito de família, lembra que o Congresso Nacional hoje pretende elaborar um projeto que visa tornar o procedimento menos burocrático.
“Pela proposta, se a mãe indicar o suposto pai, ele deverá registrar o filho ou realizar exame de DNA para comprovar que não é o genitor. Caso se recuse, seu nome será incluído no registro, e caberá a ele ir à Justiça para provar o contrário”, detalha.
Para o especialista, mudanças no procedimento de investigação de paternidade têm como objetivo equilibrar responsabilidades e acelerar os resultados. “Essa inversão da lógica busca garantir mais efetividade ao reconhecimento da paternidade e corrigir um desequilíbrio histórico: sempre foi a mãe quem arcou com os prejuízos da ausência paterna”, explica.
Até junho deste ano, as ações de reconhecimento da paternidade somaram 29.228 casos. É um procedimento prévio, administrativo, consensual e sem custos, que tem o objetivo de produzir prova de paternidade de forma simples e rápida — sem a necessidade de judicialização.
Pais ausentes
Dados do Portal da Transparência do Registro Civil, na seção Pais Ausentes, mostram que, desde janeiro deste ano, nasceram 1.508.063 pessoas no Brasil. Dessas, 64.776 não têm o nome do pai na certidão — o equivalente a 4,29% dos registros.
A maior concentração está no Sudeste, tanto no número total de nascimentos quanto no de pais ausentes, seguido por Nordeste, Sul, Norte e Centro-Oeste.
O levantamento considera dados de 1º de janeiro a 8 de agosto e é administrado pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), responsável por reunir informações de nascimentos, casamentos e óbitos registrados em todos os cartórios do país.
Fonte: Metrópoles