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30/01/2014

APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA -TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE DE IMÓVEL - REGISTRO DO TÍTULO TRANSLATIVO JUNTO AO CARTÓRIO COMPETENTE - INOCORRÊNCIA - RECONHECIMENTO DA PROPRIEDADE DE FATO DO MERO POSSUIDOR DA COISA - IMPOSSIBILIDADE - PERMANÊNCIA D

- O impetrante, para ter legitimidade ativa, há de ser o titular do direito individual ou coletivo, líquido e certo, para o qual pede proteção pelo mandado de segurança. 

- A propriedade de bem imóvel, por meio de título translativo, somente se transfere mediante o seu registro no Cartório de Imóveis competente, de modo que, enquanto não houver o registro, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel, nos termos do art. 1.245, caput e § 1º, do CC. 

- Não pode o adquirente possuidor do imóvel, ao argumento de ser o seu proprietário de fato, valer-se da via do writ para pedir a sua exclusão do levantamento realizado pelo Fisco Estadual sobre o acervo patrimonial do terceiro alienante, único e verdadeiro dono do bem, até que o título translativo celebrado pelas partes seja efetivamente registrado junto ao Cartório competente. 

Apelação Cível nº 1.0145.12.048498-8/001 - Comarca de Juiz de Fora - Apelante: Leonardo Cordeiro - Apelado: Estado de Minas Gerais - Autoridade coatora: Superintendente Regional da Fazenda Estadual de Juiz Fora - Relator: Des. Bitencourt Marcondes 

ACÓRDÃO 

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em negar provimento ao recurso de apelação. 

Belo Horizonte, 28 de novembro de 2013. - Bitencourt Marcondes - Relator. 

NOTAS TAQUIGRÁFICAS 

DES. BITENCOURT MARCONDES - Trata-se de recurso de apelação interposto à sentença proferida pelo Dr. Marcelo Cavalcanti Piragibe Magalhães, Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias da Comarca de Juiz de Fora, que, nos autos do mandado de segurança preventivo impetrado por Leonardo Cordeiro contra ato a ser praticado pelo Superintendente Regional da Fazenda do Estado de Minas Gerais/Juiz de Fora, denegou a segurança pleiteada. 

Na sentença (f. 77/82), o Juiz de primeiro grau entendeu que a via do writ não pode ser utilizada como sucedâneo recursal contra futura e incerta constrição judicial que recaia sobre o bem imóvel objeto do contrato de compra e venda celebrado entre o impetrante e a empresa J&M Jeans Ltda. 

Ademais, salientou que o fato de o bem em questão encontrar-se arrolado pelo Fisco Estadual, em razão de débitos tributários da pessoa jurídica contratante, não impossibilita o adquirente de se valer dos atributos do domínio em sua plenitude e, portanto, não pode ser considerado como uma limitação ao seu direito de propriedade. 

Com tais fundamentos, denegou a segurança pleiteada e condenou o impetrante ao pagamento das custas processuais. 

Irresignado, o impetrante interpôs recurso de apelação (f. 84/88), aduzindo, em síntese, que: 

a) em que pese o arrolamento, sob o prisma jurídico, não constituir óbice ao exercício das faculdades inerentes ao domínio, não se deve ignorar que, do ponto de vista fático, esse instituto afeta sobremaneira a possibilidade de alienação do bem arrolado; 

b) o patrimônio do impetrante, pessoa alheia à obrigação tributária, não pode ser alcançado para satisfazer os débitos da pessoa jurídica de quem adquiriu o imóvel descrito na inicial, razão pela qual eventual constrição para a garantia do crédito do Fisco Estadual, de plano, há de ser compreendida como ilegal e abusiva ao direito de propriedade do adquirente. 

Ao final, requer o provimento do recurso, para que, reformando-se a sentença, seja a autoridade coatora compelida a se abster de arrolar o imóvel descrito na inicial, bem como de emanar qualquer ato limitador ou restritivo do direito de propriedade do impetrante sobre o bem. 

O Estado de Minas Gerais, em contrapartida, apresentou contrarrazões (f. 89/91), pugnando pelo desprovimento do recurso. 

Às f. 99/103, parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, manifestando-se pela confirmação da sentença, por seus próprios fundamentos. 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. 

Versam os autos sobre mandado de segurança preventivo impetrado por Leonardo Cordeiro, visando compelir o Superintendente Regional da Fazenda do Estado de Minas Gerais/Juiz de Fora a se abster de arrolar o imóvel descrito na inicial, como medida para acautelar a satisfação de crédito tributário que o Fisco Estadual possui em virtude de relação obrigacional com terceiro, bem como de emanar qualquer ato limitador ou restritivo de seu direito de propriedade. 

Na peça pórtica, o impetrante sustenta ser proprietário da área rural de 1.050 m2 (um mil e cinquenta metros quadrados), situada na Colônia Santa Maria, Distrito de Santana do Campestre, Município de Astolfo Dutra/MG, adquirida em 15 de setembro de 2011, por meio da escritura pública de compra e venda firmada com a pessoa jurídica J&M Jeans Ltda. (f. 09/10). 

Por meio desse documento, registrado no Cartório de Paz e Registro Civil e Notas da cidade de Astolfo Dutra/MG, alega ter sido concluída a alienação do bem, revelando-se acertados consensualmente o preço e o objeto do negócio. Como consequência da transação, o adquirente ingressou na posse do imóvel, passando a dispor de todas as faculdades inerentes ao domínio do bem. 

Embora tenha adquirido o imóvel descrito acima, o impetrante aduz que não pôde transferir para si a propriedade do bem junto ao Cartório de Registro competente, em virtude da necessidade de demarcar e averbar área de reserva legal, conforme a disciplina do Código Florestal, o que já estaria sendo providenciado pelo proprietário "da totalidade da terra onde se situa o imóvel" (f. 04). 

Sucede que, ao ver do impetrante, essa condição para transferência do título imobiliário não pode ser suficiente para descaracterizar o fato de o bem haver ingressado em seu patrimônio jurídico, tendo em vista que ``já atua com animus domini na área de terras adquirida' (f. 04). 

Seguindo sua narrativa, salienta que, "gozando do estado de proprietário do imóvel mencionado, [...] vê ameaçado o seu patrimônio em razão de ato da Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais" (f. 04), já que, em virtude da alienante do bem J&M Jeans Ltda. possuir débitos tributários com o Fisco Estadual, o imóvel que lhe foi alienado, equívoca e ilegalmente, teria sido arrolado juntamente com o acervo patrimonial da empresa, como forma de acautelar a satisfação do crédito estatal. 

Em suma, o impetrante entende que o seu direito de propriedade com relação ao imóvel descrito na inicial encontra-se ameaçado por ato da autoridade coatora, uma vez que, "sem ter qualquer envolvimento com a dívida tributária da alienante, não pode [...] ter arrolado um bem que se encontra em sua esfera patrimonial" (f. 05). 

Ora, como se sabe, a propriedade de bem imóvel, por meio de título translativo, somente se transfere mediante o seu registro no Cartório de Imóveis competente, de modo que, enquanto não houver o registro, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel, nos termos do art. 1.245, caput e § 1º, do CC 

``Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. 

§ 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel'. 

No caso em tela, tendo em vista que o título translativo celebrado entre o impetrante e a empresa J&M Jeans Ltda. não pôde ser registrado junto ao Cartório de Imóveis em virtude de pendências no que diz respeito à demarcação e instituição de reserva legal, conforme impõe a disciplina do Código Florestal, a questão é que a propriedade do bem permanece no patrimônio jurídico da empresa J&M Jeans Ltda., de modo que somente ela teria legitimidade para pleitear sua exclusão do arrolamento realizado pelo Fisco Estadual. 

Em outras palavras, tendo em vista que o impetrante, para ter legitimidade ativa, há de ser o titular do direito individual ou coletivo, líquido e certo, para o qual pede proteção pelo mandado de segurança (MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 67.), não pode o adquirente possuidor do bem, ao argumento de ser o seu proprietário de fato, pedir a sua exclusão do levantamento realizado pelo Fisco Estadual sobre o acervo patrimonial da empresa alienante J&M Jeans Ltda., única e verdadeira proprietária do imóvel, até que o título translativo celebrado pelas partes seja efetivamente registrado junto ao Cartório competente. 

Por fim, ressalte-se que o ora impetrante, em razão de sua posição de possuidor, poderá se valer de via impugnativa própria, no caso de seu direito vir a ser lesado por eventual constrição judicial que recaia sobre o bem imóvel descrito na inicial. 

Dessa forma, tendo em vista que o impetrante não guarda pertinência subjetiva com a lide, em razão do princípio da substitutividade recursal, denego a segurança, mas com fulcro no art. 6º, § 5º, da Lei nº 12.016/2009, c/c o art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil. 

Conclusão. 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso. 

Custas recursais, pelo impetrante, ora apelante. 

DES. ALYRIO RAMOS - De acordo com o Relator. 

DES. ROGÉRIO COUTINHO - De acordo com o Relator. 

Súmula - NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.


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