O art. 32, § 2º da lei 4.591/64 já passou por diversas transformações legislativas. Quando editada a Lei de Incorporação Imobiliária, o dispositivo aduzia que os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas "serão também averbáveis à margem do registro de que trata este artigo"[1].
Em 2001, com a edição da MP 2.221/01, o dispositivo foi alterado para determinar a irretratabilidade dos referidos instrumentos, bem como para conferir direito real oponível a terceiros e direito à adjudicação compulsória[2]. Ao ser convertida na lei 10.931/04, a redação foi brevemente alterada, sem grandes modificações[3].
O dispositivo cumpria bem o seu papel, sobretudo ressaltando (ainda que desnecessariamente em razão da obviedade) a irretratabilidade do contrato. Por isso causou alguma surpresa quando a MP 1.085/22, determinou a revogação do dispositivo.
Alguns colegas, de maneira informal, afirmaram que talvez a ideia do legislador tenha sido adequar o art. 32 § 2º à lei 13.786/18. Isso porque a referida Lei (intitulada como 'Lei dos Distratos'), dentre as suas diversas inclusões, permitiu o exercício do retrato do contrato, com a possibilidade do exercício do direito de arrependimento pelo adquirente (art. 67-A, § 10º) e, portanto, o contrato não seria mais absolutamente irretratável, o que justificaria a revogação.
Contudo, em nosso entendimento, não havia qualquer contrariedade entre os dispositivos porque, o art. 67-A, § 12º elucidava a questão declarando que "transcorrido o prazo de sete dias a que se refere o § 10º deste artigo sem que tenha sido exercido o direito de arrependimento, será observada a irretratabilidade do contrato de incorporação imobiliária, conforme o disposto no § 2º do art. 32". O sistema, em nossa opinião, era coeso.
O fato é que após a edição da MP 1.085 e a revogação do art. 32 § 2º, parte respeitada da doutrina, a exemplo do Prof. Carlos E. Elias de Oliveira, passou a defender que os contratos referidos no dispositivo não seriam mais irretratáveis, mesmo após o transcurso do prazo do direito de arrependimento. Segundo o autor, teria sido decretado o "fim da irretratabilidade compulsória dos contratos de alienação das unidades autônomas" o que permitiria ao adquirente ficar "livre para resilir o contrato por motivos pessoais (como eventual emergência financeira), sem necessidade de justificativas"[4].
Respeitosamente, discordamos do posicionamento do colega Carlos Elias de Oliveira. Até porque, embora momentaneamente o art. 32 § 2º tenha sido revogado, nunca houve a revogação do art. 67-A, § 12º, que ainda determina que uma vez transcorrido o prazo conferido para o exercício do direito de arrependimento, o contrato é irretratável.
Ademais, a irretratabilidade é de suma importância no âmbito da incorporação imobiliária e foi justamente o principal fundamento para a edição da intitulada Lei do Distrato. Retomemos e relembremos essa questão.
É verdade que no âmbito da incorporação imobiliária, embora as partes, regra geral, estabeleçam a irretratabilidade da avença, com o passar dos anos, a jurisprudência passou a permitir a iniciativa unilateral de alguns adquirentes que, embora não apontassem culpa atribuível ao vendedor, buscavam a extinção do contrato de promessa de compra e venda. Na maioria dos casos, eram adquirentes que manifestavam à incorporadora o desejo de extinguir a avença em razão de dificuldades financeiras.
A respeito do tema, José Osório de Azevedo Junior[5] foi um dos primeiros a tratar da "questão particularmente difícil" para saber "se o próprio compromissário comprador que deixou de pagar o preço pode tomar a iniciativa de dar o contrato por resolvido e pedir a devolução das prestações pagas".
A questão, de fato, não era simples de resolver. Se, por um lado, a promessa de venda e compra, assim como os demais contratos em geral é instrumento irretratável, não permitindo a mera desistência, o que fazer nas situações em que o adquirente não possui mais condições de prosseguir adimplindo as prestações?
Nesse sentido, nos anos 1990, surgiram os primeiros acórdãos no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que passaram a admitir que mesmo sendo o inadimplemento fato imputável ao devedor, a ação poderia ser de sua iniciativa, porque a imputação seria de culpa e não dolo. Em voto de relatoria do próprio Des. José Osório de Azevedo Junior[6], entendeu-se pela possibilidade de "vencimento antecipado do contrato" quando houvesse "motivo eticamente justificável" para a extinção contratual.
No mesmo sentido, julgados do Superior Tribunal de Justiça também permitiam a iniciativa do adquirente para extinguir unilateralmente o contrato, com destaques para acórdãos de relatoria do Min. Ruy Rosado de Aguiar Júnior[7] que, em sua obra[8] também manifestou a possibilidade de o devedor propor ação para resolver o contrato quando fundamentasse o seu pedido na "[...] superveniente modificação das circunstâncias, com alteração da base objetiva do negócio. É o que tem sido feito com muita intensidade relativamente a contratos de longa duração para aquisição de unidades habitacionais, em que os compradores alegam insuportabilidade das prestações".
Contudo, referidos julgados eram, nos anos 1990, quase inexpressivos e aplicados, na maioria das vezes, quando havia comprovada impossibilidade de cumprimento das obrigações financeiras dos adquirentes[9].
Com o passar dos anos, todavia, em algum desvio jurisprudencial, tornaram-se mais comuns as decisões judiciais que permitiam a extinção do vínculo contratual em razão de pleito unilateral formulado pelo adquirente não apenas quando este discordava dos valores envolvidos para retenção, mas, também, em situações em que o comprador se mostrava meramente insatisfeito com a aquisição.
Em alguns casos, embora as provas indicassem que o comprador tinha recursos para prosseguir com a contratação, mesmo não havendo inadimplemento do incorporador, a ação era julgada procedente para extinguir o contrato, tal como se fosse uma faculdade dos contratantes seguirem vinculados ao contrato. Nesses termos, fácil identificar julgados que, a exemplo disso, permitiam, a 'resilição unilateral' do compromisso de compra e venda por 'conveniência do comprador'[10].
Assim, a jurisprudência, sobretudo a partir de 2009, passou a acolher o pedido do adquirente para a extinção do vínculo contratual, sem a necessidade de serem comprovados maiores fundamentos. Em determinada decisão judicial, chegou-se a dizer que "quanto ao desejo de rescindir o contrato, temos que este é garantido a qualquer parte integrante de um acordo, já que ninguém é obrigado a manter-se no cumprimento de um negócio ao qual não mais lhe interessa[11]".
A respeito do tema e em razão dos casos que se avolumavam, algumas súmulas foram editadas. Nesse sentido, cite-se a Súmula 1 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[12], publicada em 2010 e a Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça[13], publicada no ano de 2015.
Tal como bem pontuado por Francisco Loureiro[14], referidas súmulas não deveriam ser interpretadas como permissão para a extinção unilateral do vínculo contratual, como se todo contrato contivesse um direito potestativo de arrependimento sem prazo.
Mas enquanto o mercado imobiliário atravessava o 'boom imobiliário' (2008 a 2013, principalmente), os julgados que determinavam a extinção do vínculo contratual sem fundamento não incomodavam sobremaneira os incorporadores: uma vez determinada a cessação contratual, havia enorme mercado de novos adquirentes buscando recomprar a coisa. Assim, além de reter parte do pagamento realizado pelo adquirente, revendiam o bem em bases superiores ao primeiro contrato.
Contudo, a partir de 2014/2015, com o agravamento da crise no setor[15], os pedidos de extinção contratual dispararam, sem que os incorporadores encontrassem novos interessados em readquirir o bem. A jurisprudência permissiva para a extinção do vínculo contratual passou a trazer maiores prejuízos financeiros às incorporadoras e comprometer o fluxo de caixa dos empreendimentos[16]. Como se pode imaginar, a possibilidade de o adquirente, após alguns meses da aquisição, simplesmente desistir (havendo ou não justificável motivação) do contrato enquanto a obra encontra-se em andamento, eleva sobremaneira o risco contratual do incorporador[17].
Na alocação de riscos desse contrato, o incorporador parte do pressuposto que o contrato é irretratável, cabendo apenas a resolução por inadimplemento das partes, com o consequente pagamento dos encargos e multas decorrentes do descumprimento. É a partir da irretratabilidade contratual que o incorporador se obriga perante toda uma coletividade para a construção de empreendimento e entrega de futuras unidades, porque pressupõe que receberá os valores definidos no contrato ao longo do curso da obra. Naturalmente, se a força obrigatória do pacto sofre mitigação, o risco contratual do incorporador é majorado demasiadamente.
Se ao longo da construção, por exemplo, um terço ou a metade dos adquirentes resolve, pura e simplesmente, comunicar ao incorporador a desistência do vínculo, requerendo a devolução de parte dos valores pagos, além de o incorporador deixar de receber os valores prometidos pelos adquirentes e que seriam utilizados na execução da obra, ainda ficaria desprovido de recursos caso obrigado à devolução imediata de valores. Evidentemente que a mitigação da irretratabilidade do pacto desnatura a álea normal dos riscos a que o incorporador se sujeitou.
Até porque a facilidade de rompimento do contrato permitiu que uma classe de adquirentes passasse a especular a aquisição imobiliária. Assim, quando deflagrada a crise do mercado imobiliário a partir de 2014, diversos compradores pleitearam o desfazimento do vínculo, não em razão de impossibilidade de adimplir o preço, mas por não julgar mais o contrato conveniente. Segundo Francisco Loureiro[18], "[...] a jurisprudência se tornou cada vez mais permissiva, admitindo que promissários compradores pedissem a extinção do contrato não por impossibilidade superveniente, mas por mero desinteresse, convertendo hipótese inicial de resolução em resilição".
Prevalecendo o entendimento que o referido contrato admite a resilição unilateral, a irretratabilidade do instrumento fica ameaçada e, consequentemente, a sustentação financeira da incorporação imobiliária. Como bem referido por Roberta Maia[19], "a irretratabilidade é relevante aos pactos imobiliários justamente para impedir que o adquirente, após fazer contas, concluir que sairia mais barato inadimplir do que cumprir"[20].
Foi nesse sentido que a lei 13.786/18 foi editada, ou seja, com o objetivo de limitar os inúmeros pedidos de extinção dos contratos ausentes de fundamento, bem como reforçar a irretratabilidade do contrato, nos termos do já mencionado art. 67-A, § 12º da lei 4.591/64.
Mas o agravamento da situação financeira dos adquirentes, sobretudo em tempos de pandemia, reascendeu a discussão. Embora exista forte corrente jurisprudencial que defende que as questões pessoais do devedor, seu empobrecimento, sua doença, sua perda de capacidade física ou psíquica, não são admitidas como fundamento para fins de exoneração obrigacional ou mesmo revisão da avença[21], por outro lado, no âmbito da incorporação imobiliária, há diversos julgados que autorizam a extinção do contrato, quando o adquirente manifesta impossibilidade de cumprir a avença[22].
Para nós, o inadimplemento contratual das obrigações dos contratantes no contrato de promessa de compra e venda na incorporação imobiliária é bem definido, ou seja, descumprimento do pagamento do preço (obrigação de dar) e descumprimento relacionado à entrega e construção do empreendimento (obrigação de fazer).
Em princípio, a eventual dificuldade do incorporador em seguir com a obra não lhe autoriza pedir a extinção do vínculo. Ultrapassado o prazo de carência e tendo se comprometido a executar a obra, compete ao incorporador entregar as unidades, ainda que tenha que obter crédito extraordinário perante instituições financeiras ou adotar outras medidas (que não comprometam, claro o patrimônio de afetação). Se a mão de obra encareceu, se os insumos para a construção tiveram preços majorados ou se a incorporadora passa por dificuldades financeiras, nada disso, regra geral[23], pode alterar a obrigação de entrega da coisa. Para nós, a perda ou diminuição da capacidade financeira empresarial ou o aumento da taxa de esforço no cumprimento obrigacional não podem ser considerados fundamentos para a resolução ou revisão do contrato por onerosidade excessiva[24].
Da mesma forma, a alegação de dificuldade financeira do adquirente, também em princípio, não lhe permite ter a iniciativa de pleitear a extinção do vínculo. Descumprido o contrato e estando em mora o adquirente, a pretensão para a extinção da promessa será do incorporador, credor da obrigação. Isso porque, ainda que o adquirente esteja em mora, o credor pode manifestar o interesse em manter o vínculo, inclusive entregando a unidade ao adquirente, mas cobrando a dívida via ação judicial correspondente.
O fato é que mesmo antes da edição da MP 1.085, sempre houve corrente doutrinária que entendia que em caso de dificuldade para o prosseguimento do pagamento das parcelas do preço, estando ou não em mora, o adquirente poderá ter a iniciativa de propor ação de resolução contratual, desde que comprove que não tem mais condições financeiras de adimplir sua obrigação. O fundamento para tal resolução seria o vencimento antecipado do contrato (anticipatory breach)[25] que também evitaria o agravamento do prejuízo do adquirente com a demora no pleito resolutório, além de ser medida que prestigiaria a boa-fé[26].
Nos contratos em geral, o direito brasileiro vem admitindo o incumprimento antecipado do contrato tal como nos revelam os estudos de Ruy Rosado de Aguiar Júnior[27] e Judith Martins-Costa[28]. O instituto, especificamente na perspectiva do compromisso de compra e venda de imóveis, é analisado por Luiz Philipe Tavares de Azevedo Cardoso. Para o autor, em razão da função social do contrato, o adquirente que se encontra em "impossibilidade relativa" para prosseguir com o pagamento, poderia propor a ação de resolução, estando ou não inadimplente[29].
Em síntese: o contrato perdeu sua função social ao se deparar um dos contratantes com uma impossibilidade relativa de continuar honrando os pagamentos e, assim, obter definitivamente o bem a que se visava, como também para o outro contratante, que se vê diante de situação de provável ausência de pagamento do que lhe era devido, trazendo-lhe prejuízos evidentes, consistentes na ausência da remuneração correspectiva à prestação que se obrigou, fazendo-o ver frustrada também a finalidade contratual para o que se propusera.
Luiz Philipe Tavares de Azevedo Cardoso[30] ainda ressalva que "se é o próprio devedor que o alega, sua declaração de inadimplir deve vir acompanhada de alguma impossibilidade de prestar. Se não, sua conduta configura mero arrependimento, violação direta do pacta sunt servanda".
Francisco Eduardo Loureiro[31] também registra que o fundamento para permitir a resolução do contrato por iniciativa do devedor não é a inconveniência do promitente comprador com o contrato firmado, mas, sim, a comprovada impossibilidade de cumprir a obrigação. Ademais, nesse sentido, o magistrado sugere nova forma de interpretação para a Súmula 543, do STJ[32].
Muito recentemente, o Superior Tribunal de Justiça permitiu que adquirente de imóvel, que embora adimplente, mas tendo comprovado sua incapacidade para prosseguir no cumprimento da obrigação, tomasse a iniciativa para resolver o contrato de compra e venda com pacto adjeto de alienação fiduciária por quebra antecipada do contrato, mas sujeitando-se às consequências da lei 9.514/97 pela sua conduta culposa[33]. Não é objetivo deste artigo tratar da controversa questão envolvendo a possibilidade (ou não) de extinção de contrato de compra e venda com pacto de alienação fiduciária. Contudo, verifica-se que o STJ admitiu a possibilidade de o devedor ter a iniciativa para pleitear a extinção do contrato com fundamento na alegação que não teria condições em prosseguir no pagamento, desde que respeitado o rito da lei 9.514/97.
Em Portugal, o Supremo Tribunal de Justiça também confere a possibilidade de o contrato ser resolvido antes do prazo quando o promitente comprador apresenta "recusa inequívoca e categórica em cumprir", hipótese em que "a mora converte-se em incumprimento definitivo" e "assiste então, ao promitente comprador o direito de resolver o contrato-promessa [...]"[34]. Em outro julgado mais recente, o mesmo tribunal confirmou que "a recusa (ou declaração) séria, certa, segura e antecipada de não cumprir (ou o comportamento inequívoco demonstrativo da vontade de não cumprir ou da impossibilidade ante do tempo de cumprir) equivale ao incumprimento (antes do termo), dispensando a interpelação admonitória"[35].
Naturalmente que o inadimplemento antecipado do contrato na hipótese de empobrecimento implica em atribuição de culpa para o adquirente. Assim, ainda que não esteja em mora, ou seja, mesmo não tendo havido o descumprimento contratual, o instituto do vencimento antecipado pode dar legitimidade para que o adquirente obtenha a resolução do contrato. Contudo, a perda da sua capacidade financeira e consequente impossibilidade de cumprir sua obrigação, tal como já verificado anteriormente, é questão subjetiva do próprio adquirente. Não caberá, portanto, exoneração do vínculo sem culpa, mas, sim, resolução culposa. Assim, nessa hipótese, o adquirente está sujeito às consequências da lei 4.591/64, no que diz respeito ao descumprimento contratual do promitente comprador e aos percentuais legais da cláusula penal (art. 67-A).
Para nós, reiteramos que as questões subjetivas do adquirente, a princípio, não importam em redução da cláusula penal, devendo ser aplicadas as consequências referidas. Aliás, justamente em razão de a lei 13.786/18 ter regulado as consequências para a resolução de contrato de promessa compra e venda na incorporação imobiliária, é que se defende a superação da Súmula 543, do Superior Tribunal de Justiça[36].
Em resumo: na incorporação imobiliária, a manutenção do vínculo é muito relevante para o desenvolvimento da obra, a considerar que os valores pagos pela coletividade são utilizados justamente na construção da edificação. O arrependimento posterior ao prazo legal não confere ao adquirente a possibilidade resilir unilateralmente o contrato. A dificuldade financeira do adquirente pode levá-lo ao inadimplemento absoluto e, nessa hipótese, a resolução culposa do contrato seguirá às consequências da lei 13.786/18.
Justamente nesse sentido, parece-nos mais do que acertada a decisão legislativa final que, no apagar das luzes, em razão de emenda apresentada no Senado, resolveu por manter o art. 32, § 2º, da lei 4.591/64, o que, num silêncio eloquente, significa a manifestação cabal da irretratabilidade do referido instrumento e sua importância para a incorporação imobiliária.
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[1] O texto original do art. 32, § 2º determinava: "Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas, serão também averbáveis à margem do registro de que trata êste artigo".
[2] O texto do art. 32, § 2º, quando da edição da MP 2.221/2001 dispunha: "Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas são irretratáveis e, uma vez registrados, conferem direito real oponível a terceiros, atribuindo direito a adjudicação compulsória perante o incorporador ou a quem o suceder, inclusive na hipótese de insolvência posterior ao término da obra".
[3] Na edição da Lei 10.931/2004, a redação ficou assim ajustada: "Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas são irretratáveis e, uma vez registrados, conferem direito real oponível a terceiros, atribuindo direito a adjudicação compulsória perante o incorporador ou a quem o suceder, inclusive na hipótese de insolvência posterior ao término da obra".
[4] Segundo o autor: "[...] Revoga-se dispositivo que previa a irretratabilidade dos contratos de alienação de unidades autônomas, norma que se endereçava tanto ao adquirente quanto ao incorporador. Com essa revogação, fica aberto o debate para a retratação do contrato, seja por parte do adquirente, seja por parte do incorporador. Tal nos parece salutar, pois as condições negociais para a retratação serão ajustadas pelas partes, com estipulação de multas. Além disso, o Poder Judiciário tenderá a coibir resilições unilaterais meramente oportunistas das incorporadoras (como as destinadas a revender o imóvel por um preço maior), pois o abuso de direito é um obstáculo à resilição unilateral (artigos 187 e 473 do Código Civil). De mais a mais, com a revogação em pauta, o adquirente fica livre para resilir o contrato por motivos pessoais (como eventual emergência financeira), sem necessidade de justificativas. Antes da revogação, o cabimento da resilição unilateral era objeto de controvérsia". OLIVEIRA, Carlos E. Elias. Análise detalhada da Medida Provisória 1.085/2021 e sugestões de ajustes.
Disponível aqui. Acesso em 14.06.2022.
[5] AZEVEDO JÚNIOR, José Osório. Compromisso de compra e venda. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 205.
[6] Nos termos do julgado: "[...] no caso dos autos, contudo, é certo que o autor não comprovou a impossibilidade da prestação, em termos técnico-jurídicos. Caso contrário, seria viável, em tese, o afastamento de sua responsabilidade, nos termos do artigo 865, 1ª parte, do CC. Assim, fica-se com a afirmação inicial de que o inadimplemento ocorreu por fato imputável ao devedor. Mas a imputação é de mera culpa ao contratar. Não há qualquer sinal de dolo por parte dos autores. Resulta claro dos autos que a negativa de pagamento se deu em razão de empecilhos econômicos e não com finalidades escusas de causar dano ao vendedor, ou por mera malícia de não pagar porque não quer, mesmo tendo meios para tanto, sem risco de ruína. De qualquer forma, a culpa é suficiente para deixar o devedor em situação de responsabilidade. Mas responsabilidade atenuada, sempre que possível, pois resulta claro de todo o sistema do Código de Defesa do Consumidor - e particularmente de seu artigo 53 - que um de seus objetivos é evitar que uma aquisição pouco amadurecida possa levar o adquirente ao desastre econômico". (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação Cível n. 38.024.4/7, j. 18/06/1998, Boletim AASP 2.079).
[7] Vide, por exemplo: "[...] a nulidade de pleno direito da cláusula de decaimento, que prevê a perda da totalidade das prestações pagas pelo promissário comprador em caso de inadimplemento, também se reconhece quando a ação é de iniciativa do comprador" (Superior Tribunal de Justiça, REsp 109.331, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar Júnior, j. 24/02/1997). No mesmo sentido: "O compromissário comprador que deixa de cumprir o contrato em face da insuportabilidade da obrigação assumida tem o direito de promover ação a fim de receber a restituição das importâncias pagas. Embargos de divergência conhecidos e recebidos, em parte". (EREsp 59.870/SP, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/04/2002, DJ 09/12/2002, p. 281).
[8] AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor (resolução). 2. ed. Rio de Janeiro: Aide, 2004. p. 165.
[9] Nesses termos, vide "O compromissário comprador que deixa de cumprir o contrato em face da insuportabilidade da obrigação assumida tem o direito de promover ação a fim de receber a restituição das importâncias pagas. Embargos de divergência conhecidos e recebidos, em parte". (EREsp 59.870/SP, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/04/2002, DJ 09/12/2002, p. 281).
[10] "[...] a lei consumerista autoriza a resilição do compromisso de compra e venda por conveniência do comprador (artigos 6º, V, 51, II, 53 e 54). No mesmo sentido vem a Súmula 1 desta corte" (TJSP; Apelação 1037516-86.2014.8.26.0506; Relator (a): Galdino Toledo Júnior; Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ribeirão Preto - 10ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/11/2018; Data de Registro: 14/12/2018).
[11] TJSP. Processo n. 1075104-84.2014.8.26.0100. 23ª Vara Cível do Foro Central. Analisei a referida decisão em GOMIDE, Alexandre Junqueira. Tempos de incertezas. Fim da vinculação das partes aos contratos? Migalhas. Publicado em 10/12/2015. Disponível aqui. Acesso em: 11 jul. 2021).
[12] Súmula 1. "O compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem".
[13] Súmula 543: "Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento".
[14] Segundo o autor: "Com respaldo em entendimento pretoriano consolidado em duas súmulas de jurisprudência (543 do STJ e 1 do TJSP), passou a se entender, de modo equivocado, que o promitente comprador, ao seu único e exclusivo critério, tem a opção entre executar ou denunciar (desistir) do contrato [...]" (LOUREIRO, Francisco. Alguns aspectos dos contratos de compromisso de venda e compra de unidades autônomas futuras e o Código de Defesa do Consumidor. In: AMORIM, José Roberto Neves; ELIAS FILHO, Rubens Carmo. O direito e a incorporação imobiliária. São Paulo: [s.n.], 2016. Disponível aqui. Acesso em: 13 set. 2021. p. 15). Em outro artigo, o mesmo autor destacou "[...] não se tolera, por exemplo, que determinado promitente comprador, solvente e que reúna recursos para honrar com o pagamento do saldo devedor, simplesmente desista da execução do contrato e peça a sua resolução, porque o negócio deixou de ser economicamente atraente, em virtude da depreciação do preço de mercado atual do imóvel, em confronto com o preço convencionado no momento da celebração, devidamente atualizado". (LOUREIRO, Francisco. Compromisso de compra e venda de unidades autônomas: distinção entre impossibilidade de cumprimento e desistência do adquirente, à luz das Súmulas 543 do STJ e 1 do TJSP. Opinião jurídica 4: direito imobiliário. São Paulo: Secovi-SP, 2016. p. 39). Ainda o mesmo autor, em outra oportunidade, afirmou que "[...] os verbetes da Súmula 1 do TJSP e da Súmula 543 do STJ podem criar a falsa impressão de que o promitente comprador tem o direito potestativo e imotivado de simplesmente denunciar de modo unilateral o contrato de promessa de venda e compra, se este não for mais de seu interesse". (LOUREIRO, Francisco. Três aspectos atuais relativos aos contratos de compromisso de venda e compra de unidades autônomas futuras. In: GUERRA, Alexandre Daranhan de Mello (coord.) Estudos em homenagem a Clóvis Beviláqua por ocasião do centenário do Direito Civil codificado no Brasil. São Paulo: Escola Paulista da Magistratura, 2018. vol. 2. p. 716).
[15] No ano de 2015, o volume de empréstimos para aquisição e construção de imóveis caiu 33%, em comparação a 2014, e teve queda de 36% nas unidades contratadas. Ver mais em: CRÉDITO para casa própria tem queda de 33% em 2015, mostra Abecip. ABECIP na mídia. Publicado em 26/01/2016. Disponível aqui. Acesso em: 10 ago. 2019.
[16] André Abelha e Olivar Vitale advertem que em 2015 o índice de pedidos para extinção do contrato (amigável ou judicial) superava 40%, ou seja, de cada cem contratos firmados, quarenta eram extintos por iniciativa dos adquirentes. (ABELHA, André; VITALE, Olivar. Súmula 453 do STJ: por que revisá-la? Revista IBRADIM de Direito Imobiliário. n. 5. dezembro de 2020. p. 29).
[17] Como bem referido por Roberta Mauro Medina Maia, "[...] uma vez resolvido o contrato -, estando em ascensão o valor do metro quadrado no contexto anterior à crise iniciada em 2014, o incorporador depositava em juízo o valor das parcelas pagas pelo adquirente, se necessário fosse, após delas deduzir o montante a ser retido em virtude da cláusula penal, e na sequência, alienava a unidade a terceiros. No entanto, a partir de 2014, com o início da crise econômica no país, de modo generalizado, o mercado imobiliário desaqueceu, e o valor do metro quadrado desvalorizou-se. Com isso, diversos adquirentes de unidades autônomas, mesmo adimplentes, optaram por desistir do negócio, por não mais considerá-lo economicamente vantajoso, impondo aos incorporadores que com eles celebrassem o distrato de tais unidades, ou seja, novo pacto, destinado ao desfazimento do anterior". (MAIA, Roberta Mauro Medina. Irretratabilidade e inexecução das promessas de compra e venda: notas sobre a Lei 13.786/2018. In: TERRA, Aline de Miranda Valverde; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz (coord.). Inexecução das obrigações: pressupostos, evolução e remédios. vol. I. Rio de Janeiro: Processo, 2020. p. 557).
[18] LOUREIRO, Francisco Eduardo. Incorporação imobiliária e contrato de compromisso de compra e venda em tempos de pandemia da COVID-19. In: MALFATTI, Alexandre David; GARCIA, Paulo Henrique Ribeiro; SHIMURA, Sérgio Seiji (coord.). Direito do Consumidor: reflexões quanto aos impactos da pandemia de Covid-19. Edição especial de 30 anos de vigência do CDC. vol. 2. São Paulo: Escola Paulista da Magistratura, 2020. p. 530.
[19] MAIA, Roberta Mauro Medina. Irretratabilidade e inexecução das promessas de compra e venda: notas sobre a Lei 13.786/2018. In: TERRA, Aline de Miranda Valverde; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz (coord.). Inexecução das obrigações: pressupostos, evolução e remédios. vol. I. Rio de Janeiro: Processo, 2020. p. 554.
[20] Ainda segundo a autora: "[...] reduzida a expectativa de auferir lucro com o negócio, era mais conveniente distratá-lo, perdendo até 25% (vinte e cinco por cento) das parcelas pagas em benefício da incorporadora (promitente vendedora), do que ultimar a aquisição do imóvel, suportando a depreciação do metro quadrado e assumindo o custo do condomínio e IPTU de unidade que provavelmente ficaria desocupada: em razão da crise, o estoque de imóveis vagos subiu consideravelmente, fato que contribuiu também para a redução do valor dos aluguéis". (MAIA, Roberta Mauro Medina. Irretratabilidade e inexecução das promessas de compra e venda: notas sobre a Lei 13.786/2018. In: TERRA, Aline de Miranda Valverde; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz (coord.). Inexecução das obrigações: pressupostos, evolução e remédios. vol. I. Rio de Janeiro: Processo, 2020. p. 560).
[21] Há corrente jurisprudencial firme cujo entendimento é no sentido de que situações tais como crise financeira, doença ou desemprego não são consideradas fatos que permitem a revisão. A esse exemplo, já se decidiu que "O contrato de financiamento imobiliário se enquadra como tipicamente oneroso e comutativo, sabendo perfeitamente as partes, e de antemão, as obrigações pelas quais se responsabilizam. Logo, sujeitá-lo à aplicação incondicional de correspondência aos recursos do devedor implicaria transformá-lo num contrato aleatório. O agente financeiro passaria a ser uma espécie de securitizador das contingências pessoais a que está sujeito o contratante, o que evidentemente levaria ao desequilíbrio da relação negocial". (TJSP, Apelação Cível 1033949-54.2017.8.26.0114; Relator (a): Gilberto dos Santos; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Privado; Foro de Campinas - 7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19/07/2018; Data de Registro: 20/07/2018). No mesmo sentido: (TJSP, Apelação Cível 1000921-25.2019.8.26.0438; Relator (a): Maria de Lourdes Lopez Gil; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Penápolis - 3ª Vara; Data do Julgamento: 26/11/2019; Data de Registro: 26/11/2019); (TJSP; Apelação Cível 1001548-62.2017.8.26.0191; Relator (a): Miguel Brandi; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ferraz de Vasconcelos - 2ª Vara; Data do Julgamento: 13/11/2019; Data de Registro: 18/11/2019).
[22] "[...] Constitui entendimento sedimentado neste Tribunal o direito do promitente comprador rescindir o contrato em decorrência de falta superveniente de condições financeiras, assegurado, neste caso, o retorno ao status quo ante e a retenção de percentual à promitente vendedora de forma a fazer frente aos prejuízos sofridos com gastos de administração, publicidade e pelo tempo de ocupação do bem [...]" (TJSP; Apelação Cível 1013435-98.2018.8.26.0032; Relator (a): Rodolfo Pellizari; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de Araçatuba - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/06/2020; Data de Registro: 30/06/2020). No mesmo sentido: COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Resolução contratual - Desistência do adquirente por dificuldades financeiras - Possibilidade - Inteligência da Súmula 01 deste E. Tribunal de Justiça - Sentença que reconhece o direito dele de reaver o preço, com retenção, pela alienante, de 20% do que foi pago - Recurso dos autores pretendendo a redução para 10% - Descabimento - Valor fixado na sentença que se afigura razoável para ressarcir os prejuízos da ré - Redução que não se justifica - Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1001417-54.2018.8.26.0320; Relator (a): Marcus Vinicius Rios Gonçalves; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de Limeira - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 13/05/2020; Data de Registro: 13/05/2020)
[23] Dizemos regra geral porque, a depender da extraordinariedade do evento, também o incorporador poderia pleitear a revisão do contrato, com fundamento no art. 317, do Código Civil.
[24] Havendo patrimônio de afetação e ocorrendo a decretação de falência ou insolvência civil do incorporador, a comissão de representantes também poderá optar em alienar as acessões construídas ou destituir o incorporador (art. 31-F, da Lei 4.591/1964).
[25] Como bem apontado por Joana Farrajota, o vencimento é tradicionalmente apontado como "[..] verdadeiro ponto de viragem na vida do crédito, na medida em que corresponde ao momento em que este se torna exigível e, portanto, em que a obrigação deva ser cumprida [...] A doutrina da anticipatory breach vem desafiar essa concepção, afirmando que pode haver incumprimento tanto antes como depois do vencimento da obrigação". Ao tratar da referida teoria no direito inglês, aponta o paradigmático caso Hochster v. de la Tour responsável por influenciar a ordem jurídica inglesa e permitir que a doutrina majoritária entenda que haverá "rejeição clara e definitiva do contrato, realizada seja através de uma recusa de cumprimento seja através da adopção de um comportamento que torne o cumprimento muito difícil ou impossível, antes do vencimento da obrigação, configura uma situação de incumprimento antecipado, conferindo à contraparte o direito de exercer as faculdades que a lei reserva para o incumprimento". (FARRAJOTA, Joana. A resolução do contrato sem fundamento. Coimbra: Almedina, 2015. p. 68 e seguintes). A respeito do tema na doutrina brasileira, cite-se, ainda, SCHREIBER, Anderson. Revisitando a tríplice transformação do adimplemento. In: TERRA, Aline de Miranda Valverde; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz (coord.). Inexecução das Obrigações. Pressupostos, evolução e remédios. vol. II. Rio de Janeiro: Processo, 2021. p. 1-40.
[26] Mais do que uma medida de boa-fé, João Calvão da Silva afirma que o devedor teria a obrigação de tornar evidente por fatos a intenção e a possibilidade de cumprir pontualmente, sob pena de violar a legítima expectativa ou confiança do credor no adimplemento da prestação. Assim, não apenas o devedor poderia pedir o vencimento antecipado, comprovando que não irá adimplir, como também o credor poderia fazê-lo: "não há razão para manter o credor vinculado, até o vencimento, a uma relação jurídica que, em virtude de declaração séria, certa e segura, ante diem, de não cumprir do devedor". (SILVA, João Calvão da. Sinal e contrato-promessa. 14. ed. Coimbra: Almedina, 2018. p. 128).
[27] AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. Extinção dos contratos por incumprimento do devedor (resolução). 2. ed. Rio de Janeiro: Aide, 2004. p. 123 e seguintes.
[28] Segundo Judith Martins-Costa "O chamamento da figura do inadimplemento antecipado, em caráter excepcional (porque excepciona o princípio da pontualidade), exige a presença de três requisitos, todos eles cumulativos e de obrigatória presença, a saber: (a) tratar-se de uma violação grave do contrato, caracterizadora de uma 'justa causa' à resolução; (b) haver plena certeza de que o cumprimento não se dará até o vencimento; (c) agir culposamente o devedor, ao declarar que não vai cumprir, ou ao se omitir quanto à execução do contrato, permanecendo inerte de modo que nada, em seu comportamento, revele a disposição para a prática dos atos de execução". (MARTINS-COSTA, Judith. A recepção do incumprimento antecipado no direito brasileiro: configuração e limites. Revista dos Tribunais. vol. 885. julho de 2009. p. 34).
[29] "[...] Em síntese: o contrato perdeu sua função social ao se deparar um dos contratantes com uma impossibilidade relativa de continuar honrando os pagamentos e, assim, obter definitivamente o bem a que se visava, como também para o outro contratante, que se vê diante de situação de provável ausência de pagamento do que lhe era devido, trazendo-lhe prejuízos evidentes, consistentes na ausência da remuneração correspectiva à prestação que se obrigou, fazendo-o ver frustrada também a finalidade contratual para o que se propusera". CARDOSO, Luiz Philipe Tavares de Azevedo. Inadimplemento antecipado do contrato no direito civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 175.
[30] CARDOSO, Luiz Philipe Tavares de Azevedo. Inadimplemento antecipado do contrato no direito civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 42.
[31] "A realidade é que o entendimento dos Tribunais, consolidado em centenas ou milhares de Acórdãos e súmulas de jurisprudência, ao afirmarem o cabimento da resolução do contrato de compromisso de compra e venda por iniciativa do promitente comprador inadimplente, partem da premissa da impossibilidade de cumprimento pelo adquirente, e não de sua mera inconveniência. [...] Disso decorre que não se tolera, por exemplo, que determinado promitente comprador, solvente e que reúna recursos para honrar com o pagamento do saldo devedor, simplesmente desista da execução do contrato e peça a sua resolução, porque o negócio deixou de ser economicamente atraente, em virtude da depreciação do preço de mercado atual do imóvel, em confronto com o preço convencionado no momento da celebração, devidamente atualizado". (LOUREIRO, Francisco. Três aspectos atuais relativos aos contratos de compromisso de venda e compra de unidades autônomas futuras. In: GUERRA, Alexandre Daranhan de Mello (coord.) Estudos em homenagem a Clóvis Beviláqua por ocasião do centenário do Direito Civil codificado no Brasil. São Paulo: Escola Paulista da Magistratura, 2018. vol. 2. p. 718).
[32] A sugestão de interpretação da Súmula 543, do STJ, por Francisco Loureiro é a seguinte: "O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, invocando e demonstrando impossibilidade superveniente do pagamento do preço, que não se confunde com arrependimento ou desinteresse, pode pedir a resolução do contrato e reaver as quantias pagas, admitidas a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem". (sublinhado no original). (LOUREIRO, Francisco. Três aspectos atuais relativos aos contratos de compromisso de venda e compra de unidades autônomas futuras. In: GUERRA, Alexandre Daranhan de Mello (coord.) Estudos em homenagem a Clóvis Beviláqua por ocasião do centenário do Direito Civil codificado no Brasil. São Paulo: Escola Paulista da Magistratura, 2018. vol. 2. p. 722).
[33] Nesse sentido, RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESOLUÇÃO DE CONTRATO COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL (LOTE) GARANTIDA MEDIANTE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AUSÊNCIA DE CULPA DO VENDEDOR. DESINTERESSE DO ADQUIRENTE. 1. Controvérsia acerca do direito do comprador de imóvel (lote), adquirido mediante compra e venda com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia, pedir a resolução do contrato com devolução dos valores pagos, não por fato imputável à vendedora, mas, em face da insuportabilidade das prestações a que se obrigou. 2. A efetividade da alienação fiduciária de bens imóveis decorre da contundência dimanada da propriedade resolúvel em benefício do credor com a possibilidade de realização extrajudicial do seu crédito. 3. O inadimplemento, referido pelas disposições dos arts. 26 e 27 da Lei 9.514/97, não pode ser interpretado restritivamente à mera não realização do pagamento no tempo, modo e lugar convencionados (mora), devendo ser entendido, também, como o comportamento contrário à manutenção do contrato ou ao direito do credor fiduciário. 4. O pedido de resolução do contrato de compra e venda com pacto de alienação fiduciária em garantia por desinteresse do adquirente, mesmo que ainda não tenha havido mora no pagamento das prestações, configura quebra antecipada do contrato ("antecipatory breach"), decorrendo daí a possibilidade de aplicação do disposto nos 26 e 27 da Lei 9.514/97 para a satisfação da dívida garantida fiduciariamente e devolução do que sobejar ao adquirente. 5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (REsp 1867209/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/09/2020, DJe 30/09/2020).
[34] Supremo Tribunal de Justiça, Recurso de Revista n. 08264, Data do acórdão: 07/01/1993. Rel. Sampaio da Silva.
[35] Supremo Tribunal de Justiça, Recurso de Revista n. 4913/05, Data do acórdão: 02/04/2010. Rel. Oliveira Rocha. Ainda no âmbito do direito português, Joana Farrajota manifesta que "[...] a maioria da doutrina e jurisprudência nacionais, reconhecendo que a recusa antecipada de cumprimento afecta o regular funcionamento do contrato, é sensível à necessidade de facultar ao credor instrumentos para reagir a esta perturbação antes mesmo do vencimento da obrigação em causa, permitindo-lhe reajustar os planos inicialmente concebidos". (FARRAJOTA, Joana. A resolução do contrato sem fundamento. Coimbra: Almedina, 2015. p. 68 e seguintes).
[36] Nesse sentido, vide CHALHUB, Melhim Namem; GOMIDE, Alexandre Junqueira. Resolução de promessas de venda no contexto da incorporação imobiliária. Evolução legislativa e precedentes. Revista IBRADIM de Direito Imobiliário. Ano 3. Dezembro 2020. n. 5. p. 174-190 e ABELHA, André; VITALE, Olivar. Súmula 453 do STJ: por que revisá-la? Revista IBRADIM de Direito Imobiliário. n. 5. Dezembro de 2020. p. 27-48.
Alexandre Junqueira Gomide: Mestre em Direito pela USP e pela Faculdade de Direito de Lisboa. Sócio de Junqueira Gomide & Guedes Advogados Associados. Colaborador do Blog Civil & Imobiliário.
Fonte: Migalhas