Sociedade de propósito específico (SPE) com patrimônio de afetação, próprio para um determinado empreendimento, não se sujeita à recuperação judicial, pois tal tipo de patrimônio é independente daquele do incorporador. Portanto, não responde por dívidas estranhas às da empresa.
Ricardo Villas Bôas Cueva lembrou que 3ª Turma do STJ firmou entendimento sobre impossibilidade de SPEs integrarem recuperação judicial
José Alberto/STJ
Com esse entendimento, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Ricardo Villas Bôas Cueva revogou os efeitos de decisão anterior para impedir o prosseguimento da recuperação judicial da incorporadora João Fortes Engenharia em relação às SPEs com patrimônio de afetação. O magistrado também proibiu a homologação dos planos de recuperação apresentados até o julgamento definitivo do recurso especial. A decisão é de 6 de junho.
Em maio de 2020, a 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro aceitou o pedido de recuperação judicial da João Fortes Engenharia. O grupo, composto por 63 empresas e conhecido por sua atuação no setor imobiliário há quase 70 anos, acumula dívida estimada em R$ 1,3 bilhão.
O Banco Bradesco interpôs agravo de instrumento contra a decisão. A instituição financeira argumentou que as sociedades de propósito específico do grupo não deveriam integrar a recuperação judicial. Isso porque elas têm patrimônio de afetação. E o Enunciado 628 da VIII Jornada de Direito Civil estabeleceu que os patrimônios de afetação não se submetem à recuperação judicial da controladora. O Bradesco também pediu a divulgação dos bens dos administradores e controladores das SPE.
A 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro excluiu, em outubro de 2020, as SPE com patrimônio de afetação da recuperação judicial da João Fortes Engenharia. Porém, a incorporadora recorreu ao STJ, e Cueva concedeu liminar para suspender a decisão do TJ-RJ porque a Corte não tinha entendimento consolidado sobre a questão.
O cenário mudou em maio, quando a 3ª Turma do STJ negou recurso especial ajuizado pelo grupo Esser contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que indeferiu o seu pedido de recuperação judicial. Os ministros concluíram que as sociedades de propósito específico que atuam na atividade de incorporação imobiliária e administram patrimônio de afetação estão submetidas a um regime criado pela Lei de Incorporações (Lei 4.591/1964) que as torna incompatíveis com a recuperação judicial.
Com base nessa decisão, o Bradesco, representado pelo escritório ASBZ Advogados, pediu a revogação da liminar. Em sua decisão, Ricardo Villas Bôas Cueva apontou que, no julgamento da 3ª Turma, ainda que não se tenha proclamado a absoluta impossibilidade de submissão das SPEs com patrimônio de afetação à recuperação judicial, ficou estabelecido que o patrimônio afetado não pode ser contaminado pelas outras relações jurídicas estabelecidas pelas sociedades do grupo.
Além disso, a 3ª Turma decidiu que os créditos oriundos dos contratos de alienação das unidades imobiliárias, assim como as obrigações decorrentes da atividade de construção e entrega dos referidos imóveis, são insuscetíveis de novação.
“Diante desse contexto, mostra-se temerária, antes da decisão definitiva acerca do tema em debate, a homologação de planos de recuperação judicial nos quais foi proposto o parcelamento da dívida em prestações trimestrais, por implicar novação das condições inicialmente pactuadas”, disse o ministro.
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RCD no REsp 1.958.062
Fonte: Conjur