Por Daniele Gazel e Heloisa Rosas
O nome é a nossa primeira referência social, e, muitas vezes, por si só, torna-nos único em um universo de bilhões. Todos recebemos um nome ao nascer (muitas vezes até mesmo antes de nascer) e gostando dele em maior ou menor grau, em princípio, com ele seguimos até o fim da vida.
De acordo com a Lei de Registros Públicos (LRP), a alteração do nome pode ser realizada independentemente de motivação, se dentro do primeiro ano após a maioridade civil (entre o aniversário de 18 anos e o de 19 anos) [1], ou com motivação, mediante ação judicial para retificação do Registro Civil e ouvido o Ministério Público [2], seja pelo decurso do prazo acima ou por justificativa do interessado.
Em relação às pessoas transexuais e transgêneros, na última década houve um relevante avanço na legislação, de modo a possibilitar a escolha de serem reconhecidas por seus apelidos públicos notórios, isto é, com a inclusão do nome social, ou requerer a retificação do registro público, sendo esta segunda hipótese de forma mais célere que a originalmente prevista na LRP [3] [4].
Por nome social, entende-se o apelido pelo qual a pessoa transexual ou transgênero é conhecida publicamente. Neste caso, a pessoa permanece com seu registro civil inalterado com indicação nos documentos de identidade (RG, CPF, CNH) para que, publicamente, esta pessoa seja anunciada e reconhecida pelo nome escolhido. Isto é, o nome social não substitui o nome constante no Registro Civil e demais cadastros de uma pessoa, mas apenas se acrescenta aos documentos de identificação um outro nome, demonstrando à sociedade como aquela pessoa deseja ser reconhecida e intitulada. A inclusão e a eventual posterior exclusão do nome social, podem ser feitos a qualquer tempo, inclusive menores de idade, com a ressalva que para estes a solicitação é firmada pelos pais.
Já a alteração do nome no Registro Civil para pessoas transexuais ou transgêneros, uma vez atingida a maioridade, poderá sempre ser requerida diretamente ao Registrador do Registro Civil, e, inclusive, ser requerida conjuntamente com a alteração do gênero biológico ou a exclusão de tal dado do Registro Civil.
Tanto na ação judicial de jurisdição voluntária prevista na LRP, como no procedimento excepcional para pessoas transexuais ou transgêneros, para a alteração de nome no Registro Civil, o interessado deverá apresentar certidões que comprovem a inexistência de apontamentos judiciais.
Após a alteração, nova certidão de Registro Civil será lavrada, constando os dados da certidão anterior para controle interno.
Neste cenário, sendo emitida uma nova certidão de nascimento e, consequentemente, todos os demais documentos a ela atrelados, questão fundamental é: como ficam as pesquisas nominais para análise de apontamentos judiciais, como no caso de alienação de bens imóveis?
Se a alteração for apenas para inclusão de nome social, entendemos que nada muda, e a pesquisa continua a ser realizada com base no nome indicado no Registro Civil.
De outro lado, em caso de alteração efetiva do nome no Registro Civil, a apresentação de certidões em um processo de substituição apenas indica que não existiam apontamentos em face do interessado, mas não garante, de forma alguma, que alguma ação venha a ser contra ele distribuída futuramente. Nesta hipótese, então, recomendamos, observado o prazo prescricional, a pesquisa nas duas denominações.
E, se há necessidade de pesquisa nas duas grafias, como saber, então, se uma pessoa alterou seu nome perante o Registro Civil?
Ora, se a pessoa adquiriu um bem imóvel com o nome e depois o alterou, esta alteração deverá constar da matrícula imobiliária sob pena de caracterizar desrespeito ao princípio da publicidade e da continuidade registral de atos e, com esta informação, não há dúvida do que pesquisar e da abrangência da due diligence.
Entretanto, se esta alteração não for passível de ser identificada na própria matrícula do imóvel, recomenda-se a inserção de declaração genérica em contrato, para resguardar a boa-fé, e a solicitação de certidão de nascimento atualizada para verificação da constância de averbação.
O avanço e a desburocratização na alteração de nome e, consequentemente, de cadastros sociais e documentos de identificação, principalmente para transexuais e transgêneros, foi um passo importantíssimo para o pleno exercício da cidadania e da vida em sociedade. Contudo, para processos de due diligences, tal possibilidade se torna mais um ponto de alerta para as pesquisas necessárias para se adquirir um imóvel e fazer desta operação boa, firme e valiosa.
[1] LRP. Artigo 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.
[2] LRP. Artigo 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009).
[3] Decreto nº 10.977 de 23 de fevereiro de 2022. Artigo 13. O nome social será incluído mediante requerimento, nos termos do disposto no Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016.§ 1º A inclusão do nome social ocorrerá: I - mediante requerimento escrito e assinado do interessado; II - com a expressão “nome social”; III - sem prejuízo da menção ao nome do registro civil da Carteira de Identidade; e IV - sem a exigência de documentação comprobatória. §2º O nome social poderá ser excluído por meio de requerimento escrito do interessado.
[4] Decreto nº 10.977 de 23 de fevereiro de 2022. Artigo 13. O nome social será incluído mediante requerimento, nos termos do disposto no Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016. §1º A inclusão do nome social ocorrerá: I - mediante requerimento escrito e assinado do interessado; II - com a expressão “nome social”; III - sem prejuízo da menção ao nome do registro civil da Carteira de Identidade; e IV - sem a exigência de documentação comprobatória. §2º O nome social poderá ser excluído por meio de requerimento escrito do interessado.
Daniele Gazel é sócia do escritório VBD Advogados.
Heloisa Rosas é associada do escritório VBD Advogados.
Fonte: Conjur