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22/02/2021

Clipping – Tribuna de Minas - JF tem aumento no número de divórcios extrajudiciais durante a pandemia

Entre julho e dezembro de 2020, dissoluções matrimoniais cresceram 18% em relação ao mesmo período de 2019; maior convivência é um dos fatores apontados

Em meio à pandemia da Covid-19, a convivência contínua dentro de casa está sendo apontada por especialistas como um dos possíveis fatores responsáveis pelo aumento no número de divórcios em 2020. O cenário, que foi percebido em todo o país, não é diferente em Juiz de Fora. Um levantamento do Colégio Notarial do Brasil-Seção Minas Gerais (CNB/MG) indica que ocorreram 123 divórcios extrajudiciais – procedimentos realizados diretamente em cartórios de notas – de julho a dezembro de 2020. O número é 18% maior do que o registrado no segundo semestre de 2019, quando ocorreram 104 dissoluções na cidade.

Ainda de acordo com o levantamento, a variação de um ano para o outro é de 16 pontos percentuais acima da média histórica estadual, que indicava aumento médio de 2% nos divórcios em cartórios desde 2011, ano seguinte ao início do divórcio direto no Brasil, permitido pela Emenda Constitucional nº 66/2010. Concomitantemente, no estado, também foi observado crescimento nos números de divórcios extrajudiciais. No segundo semestre de 2020 foram realizadas 4.547 dissoluções, 11% a mais do que as 4.105 ocorrências no mesmo período do ano anterior.

Conforme o presidente do Colégio Notorial, a ‘quarentena’ imposta pela pandemia está relacionada aos motivos apontados pelos casais. “Chama a atenção que a motivação desses divórcios estejam ligados à convivência, uma vez que as pessoas se viram obrigadas a estar em casa por mais tempo. Acreditamos que os efeitos psicológicos de estar nessa situação há quase um ano possa ter fragilizado o psicológico e resultado nesses problemas de convivência”, explica Eduardo Calais. De acordo com ele, em muitos casos, os relacionamentos já tinham algum desgaste e, com o maior tempo dentro de casa, o rompimento veio como consequência.

‘Moro com um estranho’

O psicólogo clínico e professor de Psicologia da Estácio JF, Ernani Gomes, que também é especialista em Terapia Cognitiva Sexual, explica que tanto nas clínicas, quanto em artigos, é possível observar que há demandas de casais em razão da pandemia, não só em Juiz de Fora e em Minas Gerais, como também em outros estados.

“Atribuo isso às condições dadas pela pandemia. Há uma série de questões, como filhos em casa, crianças que não estão no colégio, as divisões que supostamente existiam e ficaram diferentes. Há demandas como a de mulheres que reclamam de uma sobrecarga de trabalho doméstico, porque seus parceiros não estão fazendo a sua parte. Esse convívio tem gerado conflitos”, explica Ernani.

Com os meses de contato mais próximo, os relatos, segundo o professor, passaram a conter queixas como “moro com um estranho” ou “não conheço mais meu parceiro” e até “moro com uma pessoa que achei que conhecesse e não conheço mais”. Casais que ficavam mais tempo juntos nos fins de semana, em geral, e dividiam poucas horas no início e ao fim do dia, com o isolamento, passaram a trabalhar em casa, e essa proximidade teria trazido brigas, discussões e, em casos mais graves, violência física e psicológica. Nesse sentido, os divórcios também se tornam uma forma de romper com essas situações, de acordo com ele.

Por outro lado, o professor também pontua que há casos de pessoas que passaram a viver juntas ou se uniram por questões relacionadas também ao surto de Covid-19, como indivíduos que passaram os primeiros meses fora de suas cidades e acabaram ficando na residência de seus parceiros.

Psicólogo orienta investir em diálogo

O diálogo é uma das bases fundamentais mais importantes de qualquer relacionamento, segundo o psicólogo Ernani Gomes, não só no setor amoroso, mas também no social. “Quando recebo alguma fala de paciente sobre morar com um estranho é, justamente, sobre essa falta de diálogo que já existia.” As divisões e acordos estipulados não funcionavam mais na prática e não eram tratados. Com mais tempo e com diálogo inexistente, as questões que não se resolviam se tornaram brigas e desentendimentos.

Até mesmo os atendimentos on-line com terapeutas foram dificultados, conforme o especialista, porque, em alguns casos, as pessoas não encontravam um espaço em casa que pudesse oferecer um momento privativo para a realização do atendimento, “justamente porque um parceiro não entendia o porquê do outro buscar a terapia e não tinha um espaço em que a sessão pudesse ser feita com privacidade. Quando retomei os atendimentos presenciais em setembro, algumas pessoas tinham parado porque não tinham esse espaço e relatavam demandas semelhantes a essa.”

Ainda de acordo com o psicólogo, estava evidente que as conversas importantes entre os casais estavam sendo ‘varridas para debaixo do tapete’. “Isso ocorre em vários setores do relacionamento: filhos, trabalho, divisão do dinheiro, a vida sexual que não havia mais ou existia apenas para cumprir tabela. Os diálogos eram para resolver problemas práticos, como o pagamento de uma conta, algo com os filhos, e o relacionamento ficou de lado.”

Por isso, para o especialista, a solução passa pela valorização do diálogo. “É muito importante não procrastinar assuntos pessoais. Na pandemia, o grau de importância de muitas coisas se sobressaiu: trabalho, vida financeira, filhos, por exemplo. Os assuntos mais íntimos do casal ficam de lado, e eles viram colegas de apartamento.” Para isso, segundo ele, é preciso olhar mais para dentro de casa e conversar com outras pessoas, não para pedir conselhos, mas só para se ouvir e não guardar mágoas, além de buscar falar sobre seus pensamentos e sentimentos.

“(É preciso) diálogo das duas partes, não existe diálogo de mão única. Um deles tenta, mas os dois precisam querer. É preciso expor tudo o que pensa, o que frustrou, o que não gostou. Muitas vezes se espera um determinado comportamento do outro, mas o outro não sabe o que o parceiro está esperando. Então é importante dar abertura para falar, chegar a um acordo, porque a gente ainda não lê a mente do outro”, comenta.

Procedimento on-line pode facilitar processo

Já para o presidente do Colégio Notarial, Eduardo Calais, há outro catalizador para as demandas de casais que pode ter contribuído para o aumento nos divórcios extrajudiciais, que é a possibilidade de realizar a dissolução do matrimônio de forma on-line. Para que isso seja possível, o casal deve estar de comum acordo com a decisão e não ter pendências judiciais com filhos menores ou incapazes. A partir da entrada no cartório, se os eventuais impostos estiverem recolhidos, nos casos de partilha de bens, o divórcio pode ser feito em até 24 horas.

Nessas condições, todo o processo pode ser realizado de forma totalmente on-line na plataforma e-Notariado. Nela, o casal, em posse de um certificado digital emitido de forma gratuita por um Cartório de Notas, poderá declarar e expressar sua vontade por meio de uma videoconferência.

Pelo mesmo dispositivo é possível realizar testamentos, inventários, uniões estáveis, escrituras de compra e venda e muitos outros atos. Os valores são os mesmos praticados nos serviços presenciais e regulamentados em tabela definida por lei estadual.

Esta modalidade, segundo Eduardo, se consolida para o pós-pandemia, porque parte de uma procura anterior ao surto. “É uma tendência que vai permanecer, porque já se consolidava como uma demanda social. Evita filas, aglomerações. Conseguimos chegar a essa facilitação promovendo segurança jurídica e confiança, por meio de um sistema robusto e de fácil acesso.” A avaliação, segundo ele, é de êxito, tanto por parte dos cartórios, quanto pela população que tem tido acesso ao serviço.

Fonte: Tribuna de Minas


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