Obra escrita pelo desembargador Marcelo Rodrigues traz jurisprudência atualizada ao regime jurídico adotado durante a pandemia de Covid-19
Elaborada pelo desembargador Marcelo Rodrigues, presidente da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), a mais recente edição do livro Tratado de Registros Públicos e Direito Notarial trata com profundidade as novas doutrinas incorporadas em diversas atribuições, com um olhar atento para as atividades notariais e de registro. A obra traz análises dos provimentos da Corregedoria Nacional de Justiça, de decisões de Registros Públicos e enunciados de Direito Civil. E você já pode adquirir a sua no site da Juspodivm.
Com um conhecimento amplo na área notarial e de registro, diversas obras publicadas sobre o assunto e um acompanhamento próximo aos serviços extrajudiciais, o desembargador atuou na comissão de atualização e ampliação do novo Código de Normas e coordena o núcleo das atividades notariais e de registros da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef). O magistrado falou com o CORI-MG sobre as inovações trazidas pelo Provimento 93/2020 e o papel dos cartórios para a sociedade.
Em junho, o TJMG lançou o novo Código de Normas. Como avalia as inovações introduzidas pelo provimento para a área registral imobiliária?
A partir da atualização e aperfeiçoamento da consolidação normativa mineira do extrajudicial, com a publicação do Provimento Conjunto 93/2020, percebe-se uma clara evolução na estruturação formal do capítulo destinado aos serviços prestados pelos Registros de Imóveis de Minas Gerais.
De início, está expresso o princípio da simplificação, cujo objetivo é permitir que os interessados alcancem o ato registral, flexibilizando formalidades que não são da essência do ato ou negócio jurídico e que muitas vezes impedem o acesso ao registro, criando situações de informalidade e insegurança jurídica. Neste sentido, a título de exemplo, foram eliminadas exigências descabidas de reconhecimento de firma nos atos mencionados. Em simetria, restaram dispensadas a averbação de cancelamento do registro de compromisso de compra e venda quando ocorrer o registro da escritura definitiva, desde que observado o princípio da continuidade, assim como a averbação do cancelamento do usufruto quando ocorre a venda da plena propriedade conjuntamente pelo nu-proprietário e o usufrutuário.
Foram esclarecidos os requisitos necessários à irradiação da publicidade ativa, oriunda dos livros do RI, incluindo os termos de encerramento, a partir da redação atual do art. 1º da Lei dos Registros Públicos. De igual modo, tratou-se de formatar lacunas na confecção da escritura pública, com reflexos no registro imobiliário, nos casos de arrendamento de imóvel rural efetuado por estrangeiro residente ou autorizado a funcionar no Brasil, imprimindo indispensável padronização, em simetria com a legislação federal pertinente, tal como se vê em vigor atualmente. Ainda neste tema, restou simplificada a escrituração do imóvel, bem como a qualificação registral, quando não há modificação perimetral no imóvel objeto de registro.
Abreviou-se e simplificou-se a tramitação do título no Livro I – Protocolo, alegadamente nas situações em que sucediam protocolos em janelas sobrepostas e respectivos cancelamentos, quando submetidos a pendências diversas. Essa anomalia acabou, dado restar expresso, doravante, que independentemente da quantidade de atos a serem praticados, cada título gera um mesmo e único protocolo, com o respectivo número de ordem. Ao ser elaborada nota de exigência, foram igualmente simplificados os procedimentos internos da serventia, suprimindo redundâncias e, por desdobramento, a prática de atos desnecessários.
A sistemática na averbação da reclassificação das hipotecas também foi aprimorada. A exemplo das averbações premonitórias, em se cuidando de títulos judiciais, na ausência de algum dos requisitos legais – salvo o pagamento dos emolumentos devidos –, o oficial praticará o ato e oficiará ao juízo da ordem, solicitando-lhe os dados faltantes para posterior averbação complementar de ofício, no propósito de se eliminar ruídos de comunicação. A abertura de matrícula na nova circunscrição será obrigatoriamente comunicada ao Ofício de Registro de origem, mensalmente, por meio do malote digital ou Central Eletrônica de Registro de Imóveis, em que será averbada de ofício tal circunstância, de modo a prover segurança e celeridade na comunicação e redução dos impactos ambientais do envio físico.
No caso do pacto antenupcial, foi facilitado o acesso dos títulos ao registro, desburocratizando o procedimento. Evita-se que a parte tenha de se descolar para inúmeros cartórios para registrar o pacto em seu primeiro domicílio conjugal, o que resultava em uma desmedida oneração.
A normativa também foi adequada à sistemática da Lei dos Registros Públicos (arts. 234 e 235), que diferencia fusão de matrículas e unificação de imóveis. Em relação ao testamento e ao instrumento de cessão de direitos hereditários (títulos que não são aptos ao registro em sentido estrito), a norma foi ajustada para se adequar ao princípio da continuidade. Cuidamos de padronizar a emissão das certidões em inteiro teor, em resumo ou em relatório, conforme quesitos, requisitos para a confecção de escrituras públicas a respeito de imóveis. Os procedimentos do registro no parcelamento de imóvel rural para fins urbanos restaram também aprimorados. E, muito mais, com destaque para a completa atualização do procedimento de Regularização Fundiária de Interesse Social, com enorme alcance em benefício da população mineira.
Na sua visão, qual a importância da desjudicialização de alguns serviços que agora podem ser executados pelas serventias?
Trata-se de algo mais profundo do que simplesmente desjudicializar. Implica na mudança de paradigmas seculares a respeito da vocação finalística do Poder Judiciário e de uma ampla evolução na cultura da população brasileira, com reflexos na atuação dos operadores do Direito. Assim, esse movimento, iniciado ainda timidamente nos anos 1970, implica em verdadeira desopressão do Judiciário brasileiro, um dos mais demandados do planeta.
O Judiciário deve ocupar-se no reduzido tempo socialmente útil que possui em processos litigiosos, nas ações que exijam a produção de prova pericial, em que existem menores e/ou os poderes públicos e respectivas empresas e autarquias públicas nos polos processuais. O extrajudicial, por sua vez, deve voltar-se cada vez mais à resolução inicial dos procedimentos não contenciosos, que não envolvem direitos de terceiros e não demandam a produção de provas demoradas e onerosas.
Como os avanços tecnológicos impactam na prestação das atividades executadas pelos cartórios?
Os cartórios extrajudiciais constituem a memória de um povo e de uma nação, são guardiões do tempo. Neste viés, é importante manter intacta a ponte para o passado. Não obstante, devem voltar o olhar para o futuro, investir em preparação jurídica continuada e igualmente no emprego da tecnologia e do aparato que isso representa. Poucas atividades sobreviverão, sobretudo no contexto das novas gerações, se não estiverem preparadas adequadamente para o mundo digital e a próxima singularidade que estamos na iminência de testemunhar a partir da implantação da internet 5G e, com ela, os primeiros passos da inteligência verdadeiramente artificial.
Fonte: CORI/MG