O artigo “A sucessão hereditária com bens situados no exterior” integra a seção “Contribuição estrangeira” da 34ª edição da Revista IBDFAM - Famílias e Sucessões. A autoria é da advogada Ana Luiza Nevares, vice-presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM.
O trabalho analisa a competência do Brasil sobre bens da pessoa falecida situados em países estrangeiros, bem como a incidência de imposto de transmissão causa mortis sobre ditos bens. A autora ainda pondera sobre a importância dos acordos e tratados internacionais diante do número crescente de sucessões hereditárias com elementos em outros países.
“Cada país tem a sua regulamentação em relação à sucessão de bens situados ali. A coerência nesses casos é seguir a lei que impera em cada território. Em cada país que a pessoa tiver deixado bens, vai haver uma sucessão com regras próprias daquele local. Em alguns, aplica-se a lei do domicílio do autor da herança, como acontece no Brasil; em outros, aplica-se a lei da nacionalidade”, observa Ana Luiza.
Globalização das famílias
O tema está em voga, de acordo com a advogada. “Com a globalização das famílias, ou seja, com a circunstância real de que as famílias estão, cada vez mais, viajando, se mudando e adquirindo patrimônio no exterior, carecemos de acordos internacionais que possam disciplinar a sucessão hereditária”, observa.
O artigo ressalta a importância desses tratados, que dispõem obrigações recíprocas e cooperação jurídica entre países. Algo semelhante ao que acontece na União Europeia, cujo regulamento sobre sucessões (nº 650/2012), em vigor desde 2015, facilitou transmissões sucessórias transnacionais.
“Muitos dos países que integram a União Europeia assinaram um acordo que simplifica a sucessão internacional. Há uma interação maior entre eles e as pessoas podem escolher a lei que regulamentará sua sucessão, se de nacionalidade ou de domicílio”, comenta Ana Luiza.
Segundo a advogada, muitos brasileiros têm se mudado para Portugal, o que potencializa a necessidade de acordos internacionais por aqui. “A rigor, os bens situados em Portugal não são contabilizados para uma sucessão no Brasil e vice-versa”, analisa a advogada.
“Poderíamos ter um acordo entre Brasil e Portugal que regularizasse ou equacionasse essa situação, prevendo, por exemplo, o reconhecimento de uma decisão de partilha proferida no outro país de forma mais automática por força da sucessão, além de acordos sobre a tributação do patrimônio e sobre o cômputo ou não desses bens em território diferente”, propõe Ana Luiza.
Impostos de transmissão
A advogada critica a cobrança do imposto de transmissão causa mortis sobre ditos bens. “A Constituição prevê que seja instituído, através de lei complementar, o imposto de transmissão causa mortis sobre bens situados no exterior. Essa norma nunca foi promulgada. Não existe uma lei federal complementar que regulamente a matéria”, avalia a autora.
Ela conta que alguns estados, por conta da ausência de uma legislação federal, vêm criando suas próprias leis a respeito. “Existe uma discussão sobre a constitucionalidade dessas leis estaduais, uma vez que a matéria deveria ser regulamentada por uma lei federal, de natureza complementar”, aponta Ana Luiza.
A ausência de determinações deveria impedir, na visão de Ana Luiza, a cobrança na transmissão causa mortis sobre bens situados no exterior. “O Brasil não tem jurisdição para estabelecer o destino desse bem por força de uma sucessão hereditária. Se o País não pode falar o que deve acontecer com o bem situado no exterior, então o imposto não deveria ser cobrado”, argumenta.
“O que acontece é uma bitributação, porque também no país em que esse bem estiver, a pessoa herdeira também terá que pagar impostos”, assinala a advogada.
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Fonte: IBDFAM