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08/11/2013

Ação anulatória de registro público - Citação por edital - Réu em local incerto e não sabido - Nomeação de curador especial - Certidões e registros cartorários - Presunção de veracidade

AÇÃO ANULATÓRIA DE REGISTRO PÚBLICO - CITAÇÃO POR EDITAL - RÉU EM LOCAL INCERTO E NÃO SABIDO - POSSIBILIDADE - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL - DEFESA POR NEGATIVA GERAL - ART. 302, PARÁGRAFO ÚNICO - INAPLICABILIDADE DO ÔNUS DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA - CERTIDÕES E REGISTROS CARTORÁRIOS - FÉ PÚBLICA - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE

- Se o réu é conhecido, mas se encontra em local incerto, imperiosa se mostra sua citação editalícia.

- Após a citação por edital, há de ser nomeado curador especial ao réu, a fim de se resguardar o seu direito à ampla defesa e ao contraditório.

- Ao curador especial não é imposto o ônus da impugnação específica, não excluindo, no entanto, a necessidade de o curador especial apresentar fatos e requerer provas tendentes à desconstituição das alegações da parte contrária.

- Certidões e registros cartorários gozam de fé pública, fazendo presumir serem verdadeiros os fatos ali consignados, de modo que, se não existirem nos autos provas robustas o suficiente para eliminar a presunção atribuída aos documentos, meras alegações não serão o bastante.

- Preliminares rejeitadas e recurso não provido.

Apelação cível nº 1.0427.10.000474-1/001 - Comarca de Montalvânia - Apelante: Marcos Roberto Mota - Apelados: Antonio Francisco da Mota e outros, Marialva França Mota - Relator: Des. Alvimar de Ávila

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em rejeitar as preliminares e negar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 25 de setembro de 2013. - Alvimar de Ávila - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. ALVIMAR DE ÁVILA - Trata-se de recurso de apelação interposto por Marcos Roberto Mota, nos autos da ``ação anulatória de registro público de imóvel c.c. liminar, ajuizada em seu desfavor por Antônio Francisco da Mota e Marialva França Mota, contra sentença que acolheu o pedido inicial e determinou o cancelamento do registro em comento (f. 76/77).

O apelante alega, em suas razões recursais, que era sabido pelo autor que ele não seria encontrado no endereço indicado na inicial, por estar, à época, recolhido em penitenciária na Capital Federal, sendo, também, fato de conhecimento do juízo a quo. Aduz que a certidão do oficial de justiça, no cumprimento do mandado de citação no endereço informado na inicial, é absolutamente inverídica ao relatar que a mãe do réu informou que estaria residindo em Coribe/BA, declarando que ela sequer foi procurada pelo referido oficial, já que, desde 08.02.2010, não residia no endereço relatado, quando se mudou para Juvenília/MG. Afirma que a assinatura do Sr. Edilson Pereira da Silva no documento de f. 40-v foi firmada a próprio punho pela subtabeliã daquele cartório de notas. Sustenta que é inverídico, ainda, o teor do documento de f. 49, porquanto não tramitou qualquer processo perante a comarca de Santa Maria da Vitória visando à anulação da procuração de f. 43/44. Por esses motivos, e em razão da temerária citação por edital levada a efeito nos autos, argumenta que houve cerceamento de defesa, pois a contestação por negativa geral impossibilitou ao apelante que apontasse os fatos mencionados. Por fim, entendendo ser nula a citação por edital, já que não esgotados os esforços para sua citação pessoal, requerendo, pois, que seja dado provimento ao recurso, para reformar a sentença recorrida, declarando nula a citação pela via editalícia e devolvendo o prazo para apresentação de defesa (f. 79/86). Junta os documentos de f. 87/92 e f. 94.

Os apelados apresentaram contrarrazões às f. 97/101, pugnando pelo não provimento do recurso, acompanhadas dos documentos de f. 102/106.

Torno sem efeito, por oportuno, a decisão de f. 111/112, já que o recurso foi devidamente preparado à f. 96.

Conheço do recurso, por estarem presentes os pressupostos de sua admissibilidade.

Não assiste razão ao apelante quando alega a nulidade da citação por edital.

A regra geral é proceder à citação na própria pessoa demandada, ante a importância do jus vocatio, autorizando, todavia, a Lei Processual Civil, em seu art. 231, inciso II, que ordene essa diligência por edital quando a pessoa estiver em lugar incerto ou ignorado. Elucida, a propósito, Moniz de Aragão, que legítimo é o uso dessa modalidade de citação:

``[...] de pessoas conhecidas, que residam em lugar incerto mas conhecido, como é o caso de quem muda para uma cidade grande ou nesta se transfere de casa e não se sabe onde fica situada a nova residência... é morar em lugar conhecido; mas não se sabendo o endereço, a pessoa estará em lugar incerto, por não ser possível localizá-la sem conhecer o nome da rua e o número da casa onde mora [...] (ARAGÃO, Moniz de. Comentários ao Código de Processo Civil, I-I/277/278).

Consoante se verifica à f. 65 dos autos, o oficial de justiça declarou que não localizou o réu, pois, segundo sua mãe, este residia, à época, em Coribe/BA, sem saber informar seu endereço.

Nesse ponto, cumpre ressaltar que, apesar da alegação de que tal contato não ocorreu, as certidões dos oficiais de justiça gozam de fé pública e somente são descaracterizadas mediante prova em contrário, consoante se extrai da seguinte anotação de Theotônio Negrão:

``A certidão do oficial de justiça tem fé pública (STF-RT 500/260 e RF 261/219; RJTJESP 99/245). Prevalece até prova em contrário (Bol. AASP 1.367/50, RJTAMG 20/248; TFR-6ª Turma, AC 94.640-RJ,...), desde que robusta (RJTJESP 98/316) ou inequívoca (TFR-4ª Turma, AC 97.356-MG,...) (NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 28. ed, nota 1 ao art. 143).

Ora, a declaração da mãe do réu de f. 92 não é suficiente a elidir a veracidade de tal certidão, pelo contrário, sopesando as afirmações, se mostra muito mais razoável questionar acerca da veracidade da declaração da mãe do apelante, que tem interesse direto ou indireto no resultado desta demanda, do que sobre a certidão do oficial, que é um auxiliar do juízo, totalmente neutro, a quem a causa não trará qualquer proveito.

Havendo, pois, certidão do oficial de justiça atestando a incerteza e a ignorância sobre o paradeiro do réu, tem-se que o caso se enquadra perfeitamente nas hipóteses dos arts. 231, II, e 232, I, ambos do CPC.

Sobre o tema, a anotação de Humberto Theodoro Júnior:

``Não é preciso que o oficial se transforme em investigador minucioso do paradeiro do réu. Basta que ele procure no endereço indicado pelo autor e ali não encontre nem obtenha informação de seu paradeiro. O autor, também, quando não conheça o paradeiro atual do réu, não está obrigado a realizar investigações custosas e exaustivas para localizá-lo, antes de requerer a citação por edital. O que não se admite é apenas a citação maliciosa por essa via extraordinária (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 20. ed. v. I).

Além disso, o argumento de que o réu se encontrava recolhido em penitenciária na cidade de Brasília caiu por terra diante dos documentos colacionados pelos apelados nas contrarrazões. O apelante estava, na verdade, cumprindo prisão domiciliar, e, inclusive, não foi encontrado nos endereços constantes da sua ficha de verificação domiciliar, ou seja, seu paradeiro era totalmente desconhecido.

Adequada se mostra, então, a citação por edital do réu em local incerto e não sabido, razão pela qual rejeito a preliminar de nulidade de citação.

Posto isso, passo à análise da alegação de cerceamento de defesa.

Uma vez citado o réu por meio de edital, necessária se mostra a nomeação de curador especial para exercer sua defesa nos autos, a teor do que dispõe o art. 9, II, do CPC, com o seguinte teor:

``Art. 9º O juiz dará curador especial:

I - ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste colidirem com os daquele;

II - ao réu preso, bem como ao revel citado por edital ou com hora certa.

Com efeito, no caso dos presentes autos, foi nomeado curador especial ao réu citado por edital, múnus exercido pelo advogado Fabrício Falcão Ornelas, que apresentou contestação por negativa geral (f. 70).

Conforme preconiza o art. 302 do CPC, parágrafo único, ``ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Ministério Público não se aplicam o ônus da impugnação específica dos fatos.

Não obstante, apesar da não imposição do ônus da impugnação específica, esta não exclui a necessidade de o curador especial apresentar fatos, provas e argumentos tendentes à desconstituição das alegações da parte contrária, essenciais, até mesmo, à fixação dos pontos controvertidos.

Pois bem.

Intimadas as partes para especificarem provas (f. 74), os autores requereram o julgamento antecipado da lide, e o curador especial, por sua vez, representando o réu, requereu a produção de prova testemunhal e pericial.

Vê-se, pois, que, apesar da defesa por negativa geral, o curador não se omitiu nos autos, pleiteando a produção das provas que a seu ver eram necessárias ao esclarecimento da causa.

O Magistrado, no entanto, entendeu que o feito não demandava prova oral e que os documentos apresentados bastavam para o seu desfecho, aplicando, pois, o art. 130 do CPC.

De fato, sendo o Juiz o destinatário da prova, cabe a ele determinar quais serão necessárias à formação do seu convencimento, podendo ordenar a sua realização de ofício ou a requerimento da parte, a qualquer tempo, bem como indeferir aquela que entender dispensável.

O Código de Processo Civil é claro ao afirmar, em seu art. 130, que:

``Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

Dessa forma, resta claro que o destinatário da prova é o Julgador, que tem a liberdade e o dever de indeferir as provas desnecessárias, mormente quando o conjunto probatório dos autos apresenta-se suficiente para a formação do seu convencimento e à apuração da verdade real.

Theotônio Negrão, em Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 36ª edição, Editora Saraiva, 2004, registra:

``Em matéria de julgamento antecipado da lide, predomina a prudente discrição do magistrado, no exame da necessidade ou não da realização de prova em audiência, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a necessidade de não ofender o princípio basilar do pleno contraditório (STJ - 4ª Turma, REsp 3.047-ES, rel. Min. Athos Carneiro, j. 21.08.90, não conheceram, v.u., DJU 17.09.90, p. 9.514).

No caso dos autos, a produção da prova testemunhal ou pericial em nada mudaria o resultado da demanda, visto que os documentos colacionados são mais que suficientes para a elucidação da causa.

É a jurisprudência nesse sentido:

``Agravo de instrumento. Ação de indenização. Prova testemunhal. Indeferimento. Cerceamento de defesa. Inocorrência.

A produção de provas é destinada ao juiz, de modo que a ele incumbe, de acordo com o artigo 130 do CPC, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Agravo não provido (TJMG - 10ª Câmara Cível, Agravo nº 1.0024.05.775098-6/001, rel. Des. Roberto Borges de Oliveira, j. 10.10.2006, p. 24.11.2006).

``Despejo c/c cobrança. Aluguéis. Simulação do contrato de locação. Inocorrência. Aplicação da lei 8.245/91. Julgamento antecipado. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Não-aplicação do código de defesa do consumidor. Excesso de cobrança. Matéria decidida. Litigância de má-fé. Inocorrência.

[...]

O juiz é o destinatário da prova, devendo guardar adstrição ao seu livre convencimento, competindo-lhe determinar as provas úteis à instrução do feito, até mesmo ex officio, afastando as diligências que entender inúteis ou meramente protelatórias sem que, com isso, incorra em cerceamento de defesa. [...] (TAMG - 7ª Câmara Cível, Apelação nº 385.043-5, rel. Juiz Unias Silva, j. 13.03.2003).

Com efeito, as provas trazidas aos autos pelos autores são escrituras públicas, certidões e registros cartorários que gozam de fé pública, fazendo presumir serem verdadeiros os fatos ali consignados, de modo que se não existem provas robustas o suficiente para contestar a presunção atribuída aos documentos, meras alegações não são o bastante.

Vejamos o que dispõe o Código de Processo Civil, em seu art. 364:

``Art. 364. O documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que ocorreram em sua presença.

Assim, conclui-se que as razões da apelação do réu se mostram um tanto surreais, na medida em que todos teriam agido de forma ardilosa em seu desfavor, imputando à tabeliã a falsificação de assinatura e de registros do cartório; ao oficial de justiça a falta com a verdade ao certificar as informações colhidas no cumprimento do mandado; ao próprio juízo, alegando que era sabido que o réu encontrava-se recluso, quando, na verdade, estava em prisão domiciliar e sequer era encontrado nos endereços indicados.

De qualquer forma, colocando de lado a questão da veracidade dos documentos e informações questionados pelo apelante, fato é que a transferência no registro do imóvel se deu de forma notoriamente fraudulenta, sendo necessária, portanto, sua anulação. É que, conforme se denota da procuração outorgada pelos autores ao Sr. José Roberto Barros Godoy (f. 31/32), o referido instrumento somente teria validade após a quitação da dívida dos apelados junto ao Banco do Nordeste, o que comprovadamente não aconteceu, como faz prova o documento de f. 35, que atesta que em 30 de abril de 2002 ainda havia prestações vencidas do contrato.

Tal fato levou os autores à revogação por meio de escritura da procuração de f. 31/32 (f. 40/41).

Ademais, a procuração em causa própria em nome do réu/apelante, título que lhe garantiu o Registro do Imóvel em questão (f. 46), foi anulada, de ofício, pelo Juiz de Direito da Comarca de Santa Maria da Vitória/BA, por ausência da assinatura do suposto outorgante, como comprova o documento de f. 49.

Portanto, não há como acolher as razões recursais do apelante, devendo ser mantido o decisum a quo.

Pelo exposto, rejeito as preliminares e nego provimento ao recurso, mantendo a r. sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Custas recursais pelo apelante.

DES. SALDANHA DA FONSECA - De acordo com o Relator.

DES. DOMINGOS COELHO - De acordo com o Relator.

Súmula - REJEITARAM AS PRELIMINARES E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.


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