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04/12/2020

CNB/MG realiza entrevista exclusiva com o senador Antonio Anastasia

Parlamentar falou sobre atuação da Comissão Mista da Desburocratização, que propunha medidas de desjudicialização dos procedimentos de divórcio, separação, extinção de união estável, inventário e partilha, além da missão dos cartórios em todo o território nacional.

Reeleito para o governo de Minas Gerais, Antonio Anastasia (PSD-MG) deixou o cargo em 2014 para disputar uma vaga no Senado. O político foi eleito senador, com 56,73% dos votos válidos, para o período 2015/2023, e atua como vice-presidente do Senado Federal – eleito para Comissão Diretora 2019/2020 – e como membro titular da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) -. Em entrevista ao Colégio Notarial do Brasil – Seção Minas Gerais (CNB/MG) o senador fala sobre o cenário extrajudicial mineiro e sobre o trabalho desempenhado no Parlamento brasileiro.

Anastasia discorreu sobre a atuação da Comissão Mista da Desburocratização – que propunha medidas como a desjudicialização dos procedimentos de divórcio, separação, extinção de união estável, inventário e partilha – defendendo mais mobilização em torno do tema. Também foram abordadas a cultura do litígio que envolve a população brasileira, as iniciativas tomadas com o objetivo de desobstruir a Justiça, a regulamentação dos serviços digitais pelos cartórios e a importância da participação do setor extrajudicial no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro no Brasil.

Leia a íntegra da entrevista.

CNB/MG: Quais propostas da Comissão Mista de Desburocratização avançaram no sentido de desobstruir o Poder Judiciário no Brasil?

Senador Antonio Anastasia: A Comissão Mista da Desburocratização foi uma iniciativa importante do Congresso Nacional porque ela conseguiu encurtar alguns processos do trâmite legislativo. Ela buscou se debruçar sobre algumas propostas que melhorassem procedimentos e que, ao mesmo tempo, não gerassem custos nem para o Estado nem para o cidadão ou as empresas. São propostas que terão um impacto positivo se aprovadas e sancionadas. Quando da conclusão dos trabalhos da comissão, apresentamos 31 projetos que foram aprovados pela Comissão Mista. Metade deles foram para o Senado e metade para a Câmara dos Deputados. Das 16 que vieram para o Senado, conseguimos aprovar oito até agora. A Câmara, por sua vez, infelizmente, ainda não avançou com os projetos sob sua responsabilidade. Eu acredito que há o reconhecimento dos parlamentares de que essa é uma agenda importante. Mas é preciso haver uma maior mobilização em torno do tema. A desburocratização precisa se tornar prioridade no Brasil se quisermos avançar no nosso desenvolvimento porque ela vai representar mais simplicidade e menos custos.

CNB/MG: De acordo com o relatório Justiça em Números, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça, o Poder Judiciário finalizou o ano de 2019 com 77,1 milhões de processos em tramitação, que aguardavam alguma solução definitiva. Quais seriam os melhores caminhos para evitar a demanda de litígios que envolve a população brasileira?

Senador Antonio Anastasia: Precisamos pôr fim a essa cultura nossa – muito forte por causa do nosso histórico lusitano – de que necessitamos do Estado para resolver todos os nossos problemas. Não poucas vezes o Judiciário fica abarrotado de ações para resolver brigas de vizinhos. Ora, a pessoa se dispõe a ir diversas vezes ao advogado e ao Fórum, perde tempo e dinheiro quando poderia conversar e, de boa-fé, resolver seus problemas com alguém que mora do seu lado. É claro que há casos muito graves em que a intervenção do Poder Judiciário será imprescindível. Mas não deveríamos levar tudo para que o Estado resolva por nós. Se houver boa-fé e boa vontade de um lado e do outro não precisamos disso. Mas isso, como eu disse, é uma questão cultural e demanda um pouco mais de tempo para extirparmos por completo do nosso modelo de democracia.

CNB/MG: Nos últimos anos, diversos atos, antes exclusivos do Poder Judiciário, foram delegados a atividade de notários e registradores com o objetivo de desobstruir a Justiça. O divórcio consensual, o inventário, o apostilamento e a usucapião estão entre eles. Como avalia este movimento de desjudicialização?

Senador Antonio Anastasia: É verdade. E eu tenho orgulho de ter sido relator de algumas dessas iniciativas aqui no Senado Federal como a que possibilitou, por exemplo, o apostilamento. Veja só, a chamada ‘Convenção da apostila’ foi assinada em Haia em 1961. E até pouco tempo não havia sido apreciada pelos parlamentares brasileiros para que pudesse gerar seus efeitos positivos no Brasil. Felizmente, mudamos isso e agora ela está em pleno funcionamento. Movimentos de desjudicialização devem ser incentivados, na minha opinião. Até porque, como eu disse, o Poder Judiciário não consegue, sozinho, hoje, responder a contento a todas as demandas que a ele são apresentadas. Foi nesse sentido, de promover a desjuducialização, que apresentei projetos aqui no Congresso Nacional como o que cria Comitês de Prevenção e Solução de Disputas (PLS 206/2018), como o que permite arbitragem para desapropriações (PLS 135/2017, que se tornou a Lei 13.867) e como o que prevê, em alguns casos, processo de interdição coordenado pelo próprio Oficial de Registro Civil de Pessoais Naturais (PLS 452/2015). Tudo isso com o objetivo de desobstruir a Justiça e dar oportunidades de um processo mais célere para que as pessoas resolvam suas demandas.

CNB/MG: Qual a sua avaliação sobre o trabalho realizado pelos cartórios extrajudiciais no Brasil?

Senador Antonio Anastasia: É um trabalho que merece aplausos e reconhecimento de todos nós. Os cartórios extrajudiciais cumprem uma missão em todo o território brasileiro. Sua pergunta me fez lembrar um outro projeto muito relevante que aprovamos aqui no Congresso, em 2017, com meu apoio vigoroso, que criou os ofícios da cidadania nos Cartórios de Registro Civil, projeto que se transformou na Lei 13.484. Esses ofícios de cidadania são importantíssimos especialmente para o interior do nosso Brasil e para os municípios menores, porque nós permitimos que esses cartórios possam emitir ali, por exemplo, a carteira de identidade ou a carteira de trabalho, na forma prevista em convênio. Significa menos burocracia, mais facilidade e, principalmente, o que é mais importante, mais cidadania. Em um País continental como o nosso, nós precisamos incentivar e facilitar para que as pessoas obtenham seus documentos para que tenham acesso real aos seus direitos e à sua cidadania plena. Essa lei foi pensada e concebida justamente nesse sentido e mostra bem como os cartórios são importantes no dia a dia das pessoas.

CNB/MG: Como avalia este modelo de delegação privada da atividade de notários e registradores, com delegação mediante aprovação em concurso público?

Senador Antonio Anastasia: Estamos evoluindo no nosso modelo brasileiro que ainda é muito sui generis. Mas estamos avançando. Os notários e registradores tem aumentado sua área de atuação com a preocupação que temos tido, da qual falamos anteriormente, de desafogar um pouco o Poder Judiciário. Ao mesmo tempo, os serviços prestados por esses órgãos geralmente são bem vistos pela sociedade, são muito mais céleres e eficientes do que os prestados pelo próprio Estado diretamente. Claro que podemos melhorar e avançar ainda mais. E não tenho dúvida de que faremos isso, dia após dia.

CNB/MG: Embora presentes em 89 países do mundo, ainda impera o desconhecimento sobre esta atividade no Brasil. O fato desta atividade ter pouco aprofundamento nos cursos de direito contribui para o seu desconhecimento?

Senador Antonio Anastasia: Essa sua observação é correta. Há ainda um grande desconhecimento em relação a essa atividade e certamente isso é pouco aprofundado na própria Academia. Os cursos de Direito – e falo isso como professor licenciado de uma Universidade pública, uma das maiores do Brasil, a nossa respeitada UFMG – ainda não promovem uma formação vigorosa nesse sentido. Ainda se mostram, muitas vezes, até por nosso histórico, muito arraigados ao modelo de judicialização de tudo.

CNB/MG: O ministro Barroso, visando diminuir a sobrecarga do Judiciário, defende uma proposta em que a oitiva de testemunhas e a elaboração de provas seja feita pelas partes, com a participação de notário, que confira fé pública a um depoimento, uma gravação ou a documentos, cabendo ao juiz ditar a sentença mediante a apresentação das provas. Como vê esta proposta?

Senador Antonio Anastasia: É uma proposta que merece ser debatida. Digo sempre que não podemos ter preconceito de ideias. Qualquer ideia que seja colocada de boa-fé, com boas intenções, no intuito de melhorar nosso atual sistema, merece ser discutida.

CNB/MG: A sociedade tem exigido cada vez mais a prestação de serviços extrajudiciais em meio eletrônico. Como o Poder Judiciário poderia avançar na regulamentação dos serviços digitais pelos cartórios?

Senador Antonio Anastasia: Isso é essencial. Vivemos na era digital, ainda mais agora com a pandemia e os desafios que ela nos impôs. Tudo hoje é muito mais rápido que antigamente, precisamos de agilidade e é natural que haja essa cobrança pela prestação de serviços por meio eletrônico. Mas também não podemos deixar de ter a preocupação com a segurança, que é essencial tanto para o Estado, quanto para os cartórios e para o próprio cidadão. O desafio está aí. E não podemos ignorá-lo. Tenho certeza de que essas também são preocupação de órgãos como o CNJ, que podem colaborar muito para que essa regulamentação possa avançar.

CNB/MG: O Provimento nº 88/2019 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) incluiu os cartórios no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro no Brasil. Qual a importância da participação do setor extrajudicial na PLD-FT?

Senador Antonio Anastasia: Temos que incentivar todas as formas de combate à corrupção que respeitem, naturalmente, nosso modelo democrático. É fundamental que todos os órgãos que direta ou indiretamente estão sob influência do Poder Público colaborem nesse esforço, que deve ser de todos. A corrupção é nociva para o Estado em todos os aspectos, até quando não envolve necessariamente recursos públicos. Porque tem a ver com a formação moral e ética do cidadão. E queremos, naturalmente, conviver em uma sociedade com pessoas íntegras, probas, que colaborem para o crescimento econômico, social e cultural brasileiro e não o contrário. A participação do setor extrajudicial também nessa área, portanto, é muito importante.

Fonte: Assessoria de Imprensa CNB/MG


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