O falecimento de um dos cônjuges durante o processo de divórcio - ainda pendente por recursos judiciais - torna o cônjuge sobrevivente "viúvo", e não "divorciado". Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou as decisões judiciais que extinguiram o processo de divórcio de um casal de São Paulo. Os ministros rejeitaram o recurso de V.L.C., segunda companheira de J.C.G., que estava se divorciando de M.C.G. para oficializar sua união estável com a segunda companheira.
O engenheiro químico J.C.G. entrou com um processo com o objetivo de se divorciar de M.C.G. com quem foi casado por 24 anos. Na ação, ajuizada em 1992, o engenheiro químico alegou que já estaria separado de M.C.G. desde 1989 e desejava, após o divórcio, oficializar sua união estável com V.L.C.. A primeira instância concedeu o divórcio determinando a averbação da separação judicial assim que a sentença transitasse em julgado (quando acaba o prazo para se recorrer à Justiça e não existe mais recurso pendente).
M.C.G. apelou discutindo os termos da partilha dos bens. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve o divórcio, mas anulou a parte da sentença que acolhia a forma de partilha como indicado pelo ex-marido. Porém, em julho de 1994 - antes que se esgotasse o prazo para recursos e, com isso, o divórcio pudesse ser averbado (registrado oficialmente) - J.C.G. faleceu, vítima de câncer.
O Juízo, por causa da morte do cônjuge, extinguiu o processo. Com isso, o advogado de J.C.G., mesmo sabendo que seu cliente estava morto, apelou da decisão tentando validar o divórcio. O apelo foi acolhido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. O TJ declarou eficaz a autorização do divórcio e determinou a expedição de uma carta-sentença para que o advogado de J.C.G. pudesse averbar a separação judicial.
Indignada, M.C.G. entrou com um mandado de segurança para suspender os efeitos da decisão do TJ/SP e declarar seu estado civil como "viúva". No processo, a recorrente afirmou que o advogado de J.C.G. teria promovido, às vésperas da morte de J.C.G., o casamento de seu cliente, que estava sedado e em estado terminal de um câncer, com a atual companheira, V.L.C., mesmo sem a decisão definitiva do divórcio. E, logo em seguida, o advogado entrou com um pedido de homologação do casamento.
O mandado de segurança foi acolhido em parte pelo TJ/SP, que confirmou a extinção do processo de divórcio. Segundo o Tribunal, a sentença estaria correta, pois o pedido de divórcio seria um direito personalíssimo. "Impossível a apresentação de qualquer recurso em nome daquele que está morto". Com a decisão, V.L.C., segunda companheira de J.C.G., recorreu ao STJ.
V.L.C. destacou em seu recurso o artigo 463 do Código de Processo Civil afirmando que "o divórcio consumou-se na data de julgamento do recurso de apelação" no TJ. Para a recorrente, "os efeitos da decisão decorrem imediatamente do ato de julgamento, a coisa julgada (quando se esgota o prazo para recursos e não existem recursos pendentes) apenas torna imutáveis estes efeitos".
A ministra Nancy Andrighi rejeitou o pedido mantendo a extinção do processo de divórcio e a declaração do estado civil de "viúva" para M.C.G.. A relatora lembrou que o advogado não poderia entrar com recurso representando J.C.G., já falecido, pois, de acordo com o artigo 24 da Lei 6.515/77, "o direito à ação de divórcio é personalíssimo e, por conseguinte, intransmissível, afastável no caso, a possibilidade de sucessão processual".
Nancy Andrighi também destacou os artigos 32 da Lei 6.515/77 e 100 da Lei de Registros Públicos, afirmando que "o trânsito em julgado da decisão que decreta o divórcio constitui requisito indispensável à sua eficácia jurídica e à necessária averbação no livro de casamento do cartório competente". A relatora lembrou ainda decisão da Terceira Turma no mesmo sentido: "O autor faleceu antes de transitada em julgado a decisão que concedeu o divórcio, em conseqüência, o estado civil do cônjuge sobrevivente é de viúva, não de divorciada".
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