União Estável

Questões Instrumentais e Registrárias

* Mario Pazutti Mezzari

Há um ditado castelhano, bastante conhecido da gente gaúcha, dizendo que “o diabo sabe mais por velho do que por diabo”. Essa é uma pequena compensação a que se permitem os que já viram passar várias primaveras e que adentram no outono da vida. Mas que tem seu valor, isso tem!

UM POUCO DE HISTÓRIA

Lembro-me por ter vivenciado, que a União Estável encontrou regulamento legal no Direito Positivo brasileiro com a edição da Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996.

Em seus artigos 3º e 4º, o texto original dispunha:

Art. 3º - Os conviventes poderão, por meio de contrato escrito, regular seus direitos e deveres, observados os preceitos desta Lei, as normas de ordem pública atinentes ao casamento, os bons costumes e os princípios gerais de direito.

Art. 4º - Para ter eficácia contra terceiros, o contrato referido no artigo anterior deverá ser registrado no Cartório do Registro Civil de residência de qualquer dos contratantes, efetuando-se, se for o caso, comunicação ao Cartório de Registro de Imóveis, para averbação.

Estes artigos vieram a ser vetados pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, e com justificadas razões. A União Estável é fato e, como tal, seu reconhecimento não pode ficar adstrito a um ato formal - contrato escrito - nem a atos registrários - registro no Registro Civil das Pessoas Naturais e averbação no Registro de Imóveis.

Os fatos provam-se por todos os meios admitidos em direito, sejam testemunhais, sejam escritos. E aí reside a grande questão: o veto ao artigo 3º e 4º da Lei 9.278/1996 não significou vedação a que se fizesse contrato escrito; significou, isso sim, que não se pode condicionar o reconhecimento da união estável à existência de contrato escrito.

A partir da edição do Código Civil de 2002, o instituto da união estável foi inserida no Livro IV - Do Direito de Família, e chama especial atenção o disposto no artigo 1.725, “verbis”:

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Admite claramente o legislador que a união estável seja objeto de contrato escrito, a provar que o veto ao artigo 3º da Lei 9.278/1996 não consistia em veto ao contrato mas, repetindo-me “ad nauseam”, apenas veto à que a união estável tivesse seu reconhecimento condicionado à existência de contrato escrito.

CONTRATO ESCRITO - ESCRITURA PÚBLICA NOTARIAL

Artigos e notas esparsas vêm sendo publicados na imprensa especializada, e alguns chamam a atenção pelo “parti pris”: todos, sem exceção, admitem a celebração do contrato escrito.

Exemplo disso é a orientação do Ministério Público Federal do Distrito Federal, nestes termos:

União estável tem que ser comprovada por duas testemunhas, diz MPF

O MPF (Ministério Público Federal) enviou recomendação a todos os tabelionatos da jurisdição do Distrito Federal que tenham atribuição de lavrar escritura pública declaratória de união estável para que conste nas declarações o registro de, no mínimo, duas testemunhas que comprovem tal situação.

A medida visa evitar que se proliferem sucessivas declarações de uniões estáveis duvidosas que possivelmente venham a produzir efeitos no âmbito previdenciário ou que tenham repercussão patrimonial nas relações entre supostos conviventes ou concubinos, principalmente quando essas escrituras são destinadas a fazerem parte de comprovação em órgãos públicos federais.

Foi estabelecido o prazo de 15 dias para que os tabelionatos cíveis do DF cumpram a recomendação e para que informem ao MPF as providências adotadas no sentido de dar efetividade à recomendação.

Outra nota dá conta da rapidez com que estes contratos são celebrados no 1º Tabelionato de Nota de Santos-SP:

Contratos de união estável são feitos com agilidade

Aos poucos, casais que vivem juntos há algum tempo aderem aos contratos de união estável, feitos nos cartórios de notas. A falta de burocracia, aliada à rapidez, é um dos fatores considerados na hora da escolha. Contudo, há ainda quem se decida pelo casamento no civil ao tomar conhecimento do valor da escritura de união estável, quase o mesmo cobrado pelos cartórios de registro civil para celebrar casamentos.

Segundo o auxiliar cartorário do 1º Tabelião de Notas de Santos, Luiz Carlos Lopes da Silva Júnior, o fato do custo do contrato de união estável ser praticamente o mesmo que o do casamento no civil faz os casais desistirem de fazer o documento.

"Quando ficam sabendo, preferem casar no civil", explica Silva Júnior. "A não ser quando não estão separados legalmente (no caso de um deles ou os dois terem casados anteriormente)".

No 2º Tabelião de Notas da Cidade, conforme o tabelião José Henrique do Nascimento, tem sido grande a procura por esse tipo de contrato. ‘‘É raro o dia em que não fazemos’’, atesta Nascimento, lembrando que a união estável é regida pelo regime de comunhão parcial de bens. Caso o casal queira estipular outro regime, a escritura estabelece isso. ‘‘É para evitar algum litígio lá na frente’’.

Entre os dias 17 e 28 de março, de acordo com o tabelião, foram celebrados 13 contratos de união estável naquele cartório.

Já no 7º Tabelião de Notas, segundo o escrevente Kléber de Paula Oliveira, foram feitas 30 escrituras de união estável no ano passado. Em 2008, até o momento, já foram 12.

PATRIMÔNIO

‘‘É um contrato. Eles podem mencionar desde a união até o patrimônio que possuem, para que esses não se comuniquem no caso de uma eventual dissolução da sociedade conjugal’’, destaca Oliveira. ‘‘Mas a maioria faz o contrato e pronto (não fazem essa distinção)’’.

Para celebrar o contrato de união estável, basta que o casal vá ao cartório acompanhado de duas testemunhas maiores de idade e capazes, munidos, os quatro, de RG e CPF. A escritura é feita na hora.

Já para casar no civil, o casal deve levar duas testemunhas maiores de idade e apresentar certidão de nascimento atualizada, CPF e RG.

Fonte: A Tribuna-SP (07/04/2008)

Chama especial atenção o fato de que em ambas as notas é citada a escritura pública notarial e não qualquer contrato escrito. Isso se justifica devido às implicações patrimoniais que decorrem de tal contrato, fazendo com que este deva ser lavrado por escritura pública.

AVERBAÇÃO NA MATRÍCULA DO REGISTRO DE IMÓVEIS

Há tempos, graças ao gênio criativo, à coragem prussiana e ao monumental conhecimento jurídico, o então Desembargador Décio Antonio Erpen, hoje advogado de grande sucesso, lançou no meio jurídico, especialmente na área registral imobiliária, as bases do que chamou de Princípio da Concentração, preconizando que o Registro de Imóveis tem natural força de atração de todos os atos e fatos que, não sendo contrários à lei e obedecendo a forma prescrita, quando houver, devem ser acolhidos no álbum imobiliário.

Decorrem destes ensinamentos do mestre Erpen a consciência, hoje arraigada nos registradores gaúchos e de todos os rincões brasileiros, de que o Registro de Imóveis não pode fechar-se em “numerus clausus” e negar acesso à situações jurídicas que interessam à comunidade conhecer. É de justiça dizer que o primeiro registrador a reconhecer a profundidade e relevância deste princípio foi o eminente colega Dr. João Pedro Lamana Paiva, que não tardou em convencer-me e a tantos outros.

Esta é a grande virtude da aplicação do Princípio da Concentração: informar, publicizar, dar a conhecer a todos os interessados a existência de atos ou fatos que tenham repercussão no imóvel ou nas pessoas envolvidas no registro.

O Princípio da Concentração foi adotado pela Corregedoria-Geral da Justiça do RS desde a publicação da primeira Consolidação Normativa Notarial e Registral, quando foram admitidos como averbáveis várias situações jurídicas que a doutrina clássica negava acesso ao registro imobiliário, tais como o protesto contra alienação de bens, os decretos de desapropriação, o tombamento etc.

“En passant”, este princípio já está insculpido na legislação nacional, mais precisamente na Lei dos Registros Públicos, artigo 167, II, 5 “in fine”, cuja leitura se pode perfeitamente reduzir a:

“No Registro de Imóveis será feita a averbação de quaisquer circunstâncias que, de qualquer modo, tenham influência no registro ou nas pessoas nele interessadas”

Pois apesar de se encontrar a base legal na própria lei que regulamenta o registro imobiliário no Brasil, ainda se fala em “numerus clausus”, teoria que encontra maior ressonância no Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, fonte de tantos e tão bons conhecimentos mas que resiste, ferreamente, a abrir as matrículas paulistas para publicizar atos e fatos, mesmo que tenham, de qualquer modo, “... influência no registro ou nas pessoas nele interessadas”.

Insurgindo-me contra a teoria de “numerus clausus”, escrevi um artigo de pouco valor jurídico mas de intenso desabafo, perguntando o que se faria com as Cartas de Remição, ou como se admitiriam inscrições aquisitivas de propriedade decorrentes de aluviões, avulsões, álveos abandonados, formação de ilhas? Desafiava mais: como registrar a transmissão da propriedade imóvel no pagamento de haveres dos sócios, quando da extinção ou alteração das sociedades? Ou as transmissões decorrentes de cisão, fusão ou incorporação de empresas? E que dizer da renúncia de propriedade, prevista no artigo 1.275, inciso II, do Código Civil, cujo registro está expressamente previsto no parágrafo único do mesmo artigo? Ou como efetuar o registro das cédulas de crédito comercial e de crédito à exportação ou da cédula do produto rural, criadas por leis posteriores à Lei dos Registros Públicos mas não incluídas expressamente no rol do art. 167?

Nenhum destes atos ou títulos encontra-se no rol do artigo 167 da Lei dos Registros Públicos.

A toda evidência, perdoem-me os que pensam em contrário, o elenco do artigo 167, I e II, da Lei dos Registros Públicos, não contém “numerus clausus”.

Assim também o rol dos títulos registráveis, contidos no artigo 221 da mesma lei, que inicia dizendo “somente são admitidos a registro ...” e esquece dos títulos emitidos pela Administração Pública, dentre os quais destacam-se as escrituras do Serviço de Patrimônio da União e as certidões das Juntas Comerciais.

A teoria de “numerus apertus” é a essência mesma do Princípio da Concentração: tudo o que interessa à coletividade conhecer a respeito dos imóveis e das pessoas envolvidas em seus registros, deve ser dado a conhecer mediante registro ou averbação, segundo a natureza e os efeitos de cada ato.

Para meu indizível contentamento, descobri que minha tese esposa o pensamento de um dos mais brilhantes magistrados brasileiros, outro gênio com justiça sempre festejado e reconhecido, o Desembargador Ricardo Henry Marques Dip, em seu artigo ¿São taxativos os atos registráveis? no qual, a folhas tantas, assim conclui:

Nem sempre se adverte com clareza que o direito real é uma atualização que depende de uma potência, scl., de um título, e que esse título é de direito obrigacional. Ora,
- se o registro imobiliário atualiza o título para, freqüentemente, constituir um direito real.
- se esse título, no sistema obrigacional vigente, é resultado possível de uma autonomia de vontades contratantes,
- se esse título, não menos, é alheio de exigências tipológicas e restritivas,
tem-se de admitir que, longe de afirmar-se a taxatividade dos atos suscetíveis de registro imobiliário, deve antes e ao revés dizer-se que todos os atos aos quais, sem vícios, se possa atribuir potencialidade para constituir (ou modificar) direitos reais imobiliários são suscetíveis de registração predial.

Encorajado por esta lição, começo por concluir (com permissão do contra-senso) que o Registro de Imóveis é um instrumento de paz social, de segurança jurídica e que só conseguirá atingir estes objetivos atraindo para si o maior número possível de informações que tenham o poder de acautelar a todos quantos queiram negociar ou simplesmente saber da situação jurídica de determinado imóvel e das pessoas que constam eu seus registros.

A união estável gera direitos patrimoniais, já se disse e apenas se repete para retomar o curso do pensamento que tende a divagar. Negar acesso à matrícula do imóvel, de uma escritura pública declaratória de união estável, é negar à comunidade em geral o conhecimento de que aquele(a) em cujo nome encontra-se registrado o imóvel não pode livremente dele dispor, sem anuência de seu companheiro(a).

Negar averbação da escritura declaratória de união estável é gerar insegurança jurídica, é submeter eventuais interessados ao dissabor de ver seu negócio jurídico anulado por ofensivo aos direitos patrimoniais de outrem, o companheiro, que bem tentou avisar ao público que havia uma relação de união estável e, por capricho do registrador imobiliário, não conseguiu acautelar a comunidade.

A segurança jurídica está no registro; a insegurança está na clandestinidade!

REGISTRO DO PACTO PATRIMONIAL NO LIVRO 3 DO REGISTRO DE IMÓVEIS

Adentro agora em espinhoso caminho, mas que aos meus pés já calejados parece coberto de rosas. Trata-se de analisar a possibilidade de que os conviventes, em regime de união estável, estabeleçam por escrito o destino dos bens, presentes e futuros, sua comunicação ou não com o patrimônio do outro convivente e que tal pacto seja registrado no Registro de Imóveis.

Em princípio, penso que a celebração de um Pacto Patrimonial (chamemos assim) entre conviventes está perfeitamente admitida em lei, quando no já citado artigo artigo 1.725 do Código Civil, assim se dispôs:

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

A leitura deste artigo não carece de interpretação outra que não a gramatical, e verte-se no seguinte princípio: na união estável vigora, quanto aos bens, o regime da comunhão parcial, salvo se de outro modo vier a ser estipulado em contrato escrito.

Parece redundância, mas é para que fique patente que a instrumentalização de um acordo sobre a forma de repartir os bens entre os conviventes é perfeitamente aceita pelo legislador.

A vontade dos conviventes em relação aos seus bens presentes e futuros é de livre disposição, a exemplo do que ocorre entre aqueles que contraem matrimônio, como está no Código Civil:

Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

E não parece haver discussão em se dizer que que, face aos efeitos patrimoniais gerados por tal Pacto Patrimonial, este deve ser celebrado por escritura pública, também a exemplo do que ocorre no casamento, conforme dispõe o Código Civil:

Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento.

Ao tratar desta questão, a Dra. Daniella Gomes Pierotti, Advogada do escritório Miguel Neto Advogados Associados, brindou-nos com o artigo intitulado “As implicações relativas à caracterização da união estável”. Ao comentar as dificuldades inerentes ao relacionamento dos conviventes, igual ao que acontece entre os casados, discutia as questões patrimoniais e a soberania da vontade das partes, concluindo:

“Para a solução desta questão, a saída é a elaboração de um contrato escrito entre as partes, em que poderá ser estipulado o regime de comunhão de bens que regerá a união estável, como por exemplo, o de separação de bens, previsto nos artigos 1.687 e 1.688 do Código Civil de 2002, dentre outras disposições, como por exemplo a não comunicação de certos bens.

Tal documento tem o mesmo objetivo e finalidade do Pacto Antenupcial firmado entre os cônjuges casados sob o regime de separação de bens e tem o condão de resguardar os companheiros no que tange ao aspecto patrimonial.”

Ainda que de modo precário pela falta de análise jurídica aprofundada, a qual não me atrevo a fazer por absoluta e inarredável ignorância da Filosofia do Direito, encorajo-me a concluir que não há óbice à celebração de contrato escrito dispondo sobre os bens dos conviventes e, mais, que tal contrato deve ser instrumentalizado em escritura pública notarial para que possa gerar efeitos imediatos.

Superada esta questão - assim o espero - resta saber se este Pacto Patrimonial pode ser levado ao Registro de Imóveis?

Parece-me que a possibilidade de averbar as regras do pacto junto à matrícula do imóvel merece o mesmo tratamento relativo à possibilidade de averbar a declaração de união estável. Em ambos os casos, está presente o interesse público em conhecer tais regras, porque elas poderão ser invocadas para desfazer negócios imobiliários. O conhecimento, a publicização decorrente da averbação do Pacto Patrimonial na matrícula do imóvel, é inegavelmente fator de segurança jurídica, interessa à comunidade em geral e atende ao Princípio da Concentração.

No entanto, arrisco-me a ir mais longe, uma vez que o Pacto Patrimonial pode conter regras que variem de imóvel a imóvel, regras que se alternem no tempo e no espaço, regras enfim que são de interesse da comunidade conhecer para não ser induzida a erro ou ignorância ao contratar.

Destarte, à semelhança do que acontece com o Pacto Antenupcial, cujo registro foi previsto para o Livro 3 - Registro Auxiliar, pela idêntica importância jurídica de ambos, o Pacto Patrimonial decorrente de união estável pode e deve ser registrado no mesmo livro, por analogia e com base no disposto no artigo 178, V, da Lei dos Registros Públicos.

ESCRITURA DECLARATÓRIA DE EXTINÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL

“O distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato”, assim estabelece o artigo 472 do Código Civil.

Admitindo-se como válida e eficaz a escritura pública declaratória de união estável, igualmente válida e eficaz a escritura pública declaratória de extinção de união estável. Evidentemente em ambos os casos não fica afastada a via judicial, apenas oferta-se aos interessados outra via, mais rápida e igualmente eficaz.

A escritura declaratória de extinção de união estável não fica adstrita somente aos casos em que existam bens a serem partilhados, eis que seus reflexos vão muito além e atingem principalmente a esfera previdenciária.

Parece-me, “concessa venia” já adentrando na esfera notarial, que se a escritura declaratória de extinção de união estável não foi precedida de escritura de existência dessa união, aquela deverá iniciar por esta, ou seja, deixar evidente e comprovado com duas testemunhas, que houve efetivamente a união estável, antes de adentrar na declaração de sua extinção.

PARTILHA DE BENS NA EXTINÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL

Quando ocorrer a extinção da união estável, dois procedimentos facultam-se aos ex-companheiros para ratificar o fato extintivo e para partilhar eventuais bens havidos em comum.

A via judicial é a mais comum e amplamente aceita. Faz-se, perante o Magistrado, a prova da existência da união estável, sua extinção é declarada e é pedida a homologação da partilha dos bens comuns. Se os unidos tiverem filhos menores ou incapazes, ou se a extinção for não-consensual, a via judicial será sempre obrigatória.

No entanto, àquelas pessoas que, tendo convivido em união estável, não tiverem filhos menores ou incapazes e não tiverem litígio algum sobre a dissolução da união e sobre partilha dos bens comuns, abre-se uma segunda via para formalizar tais atos de maneira válida e eficaz: a escritura pública notarial.

Detenho-me mais nesta segunda hipótese, vez que a primeira não apresenta ensejo a maiores debates nem discussões.

Caso os conviventes já tenham adredemente celebrado escritura pública declaratória de união estável, de posse do traslado ou de certidão desta, poderão procurar o mesmo ou outro notário, e perante ele firmarem sua vontade de não mais conviver ou, o mais comum, declarar que já não mais convivem há determinado tempo.

No entanto, se não existe instrumento formal de reconhecimento da união estável, a escritura pública em que for declarada sua extinção precisa começar pelo reconhecimento do fato, ou seja, deverá declarar por quanto tempo os agora ex-conviventes mantiveram união estável, indicando sempre datas ou tempos o mais precisos possível; deverão declarar, também, que não tinham qualquer impedimento legal para manter tal união; e a tudo deverão servir de testemunhas duas pessoas maiores e capazes, que se identificarão perante o notário.

Em sequência, deverão declarar que não têm filhos menores ou incapazes (ou que a união não gerou filhos).

Ato contínuo, declararão se tinham ou não Pacto Patrimonial. Se tinham, deverão apresentá-lo ao notário, que examinará se a vontade nele expressa estará sendo mantida quando da dissolução, mormente se tal Pacto Patrimonial já tiver sido utilizado ou por qualquer forma publicizado, mais ainda se tal publicização deu-se por averbação em matrículas de imóveis ou, até mesmo, no propugnado registro no Livro 3 - Registro Auxiliar, do Registro de Imóveis.

Deverão os declarantes apresentar rol de bens, iniciando pelos particulares, circunstância esta que será consignada na escritura pública, para os efeitos legais e, muito especialmente, para as averbações a serem feitas no álbum imobiliário.

Depois, partirão para a indicação dos bens comuns e a forma pela qual pretendem partilhá-los. Relembro que, neste momento, há que ver se existe Pacto Patrimonial, eis que suas regras deverão ser obedecidas na partilha.

Havendo, dentre os bens comuns, excesso de meação ou transmissões de um para outro, o imposto de transmissão deverá ser recolhido previamente. Caso a partilha contemple equilíbrio entre os quinhões de meação, ainda assim a autoridade fazendária deverá ser chamada a se pronunciar, uma vez que não é dado a notários e registradores reconhecerem exonerações tributárias.

Por último mas não menos importante, quer me parecer que é obrigatória a presença de advogado nesta partilha, o qual poderá assistir a ambos, por analogia do que a lei preceitua para a partilha de bens na separação ou divórcio.

* Mario Pazutti Mezzari
Registrador de Imóveis
Pelotas, março de 2009

OFÍCIO-CIRCULAR Nº 309/09-CGJ

EXPEDIENTE Nº 10-08/004353-1

PORTO ALEGRE, 15 DE ABRIL DE 2009.

SENHOR TABELIÃO/REGISTRADOR:

CONSIDERANDO OS TERMOS DA LEI Nº 11.441/07 E A AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL ESPECÍFICA PARA A ESCRITURAÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL COM PARTILHA; RESSALVANDO, ADEMAIS, A OPORTUNIDADE DE SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA NOS CASOS CONCRETOS QUE RESULTEM EM AVERBAÇÃO E/OU REGISTRO NOS OFÍCIOS REGISTRAIS, ESCLAREÇO A VOSSA SENHORIA QUE INEXISTE ÓBICE À REALIZAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA DE DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL COM PARTILHA DE BENS, OBSERVADOS OS REQUISITOS PREVISTOS NA LEI Nº 11.441/07, NO QUE COUBER.

ATENCIOSAMENTE,
DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS
CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA
ILUSTRÍSSIMO SENHOR
TABELIÃO/REGISTRADOR
REGISTRE-SE E PUBLIQUE-SE.
BELA. THAIS SILVEIRA STEIN
SECRETÁRIA DA CGJ


Fonte: Boletim Eletrônico do IRIB nº 3642 - 27/05/2009.

Nota de responsabilidade

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