O objetivo inicial da Lei n. 8.009, de 1990 (Lei do Bem de Família), a qual
impede a penhora do imóvel que serve de residência é proteger a unidade
familiar e, se for estendida para o caso de imóveis de pessoas separadas de
fato, mas sem ter havido homologação judicial, pode facilitar fraudes. Esse
foi o entendimento da maioria da Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) em processo originário de Rondônia. A relatora do acórdão é a
ministra Nancy Andrighi.
M.A.O. e C.S.U. eram casados e sócios em um posto de combustíveis. Em 20 de
julho de 1998, eles entregaram o ponto e dissolveram irregularmente a
sociedade. Os réus continuaram casados, mas se separaram de fato, não
judicialmente, vindo a residir em imóveis diferentes. A Petrobras
Distribuidora entrou com ação de cobrança contra eles e foi determinada a
penhora dos imóveis de propriedade de ambos. A casa onde a mulher residia
com os filhos não foi incluída na penhora por ser considerada como bem de
família, contudo decidiu-se que o imóvel em que o marido residia deveria ser
penhorado.
No recurso ao STJ, foi pedido que ambos os imóveis fossem considerados
impenhoráveis. A defesa do casal afirmou que a personalidade jurídica do
posto, de acordo com o artigo 10 do Decreto 3.708 de 1919, não poderia ser
desconsiderada para fins de penhora. Afirmou-se que a insolvência do posto
foi uma questão de mercado, não tendo havido má-fé. Para a defesa, isso
poria a salvo de penhora os bens particulares dos sócios.
Ao examinar o recurso, a ministra Nancy Andrighi considerou que a
personalidade jurídica do posto deveria ser desconsiderada no caso. A
ministra apontou diversas irregularidades na dissolução da sociedade. Um
exemplo foi que, dois dias após o ponto ser repassado, foi feita uma última
compra de combustível, indicando não haver intenção de pagar pelo produto
adquirido.
Já no caso do bem de família, a ministra considerou que a Lei n. 8.009 pode
ser estendida para solteiros, viúvos, divorciados e separados judicialmente.
Entretanto, no caso específico, a situação é diferente, já que a separação é
apenas de fato, isto é, sem ter havido homologação judicial. Segundo a
ministra, a separação de fato não acaba com a sociedade conjugal. “Nos
termos dos incisos I a IV do artigo 2º da Lei n. 6.515/1977, a sociedade
conjugal somente se dissolve com a morte, com a decretação da nulidade, com
o divórcio ou com a separação judicial”, explicou. Para ministra, do ponto
de vista jurídico, o que ocorre no caso é uma família ocupar dois imóveis.
Por fim, a ministra considerou que estender para essa situação a proteção ao
bem de família seria criar um grande risco de fraude, pois bastaria que o
casal que estivesse sofrendo uma execução declarasse uma separação de fato e
protegeria dois imóveis. Com essa fundamentação, a ministra entendeu que
apenas o imóvel ocupado pela mulher e filhos é impenhorável.
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