Amante, companheira, concubina. São muitos os conceitos sobre a mulher que
mantém relacionamento com um homem casado, que sustenta uma vida dupla. O
chamado concubinato impuro traz em si questões jurídicas que exigem decisões
do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Uma mulher que convive por vários
anos com um homem casado pode ter reconhecido os mesmos direitos da esposa,
quando o homem falece?
A Sexta Turma do STJ está apreciando um recurso especial (REsp 674176) que
decidirá sobre a possibilidade de divisão de pensão entre a viúva e a
concubina do falecido. A relação extraconjugal teria durado mais de 30 anos
e gerado dois filhos. O homem teria, inclusive, providenciado ida da
concubina de São Paulo para Recife quando precisou mudar-se a trabalho, com
a família.
No STJ, o recurso é da viúva. O relator, ministro Nilson Naves, votou no
sentido de reconhecer o direito da concubina ao benefício previdenciário. Já
o ministro Hamilton Carvalhido, votou para se atender ao pedido da esposa,
dando provimento ao recurso. A ministra Maria Thereza de Assis Moura está
com vista do processo, para melhor análise. Ainda falta votar o juiz
convocado Carlos Mathias.
O caso julgado mais recentemente acerca do assunto (REsp 813175) reformou
decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro), que
havia concedido à concubina de um capitão do Exército 50% da pensão da
esposa do falecido. A concubina provou, por documentos e testemunhos, ter
convivido com o homem de 1960 a 1991. Demonstrou, ainda, que dele dependia
economicamente. O TRF interpretou que o relacionamento, em tudo, se
assemelharia a uma união estável, e, por isso, ela concorreria com outros
dependentes à pensão militar.
O recurso especial contra o rateio foi apresentado pela União, e julgado na
Quinta Turma do STJ. O relator, ministro Felix Fischer, destacou que a
Constituição Federal não contempla como união estável o concubinato,
resultante de união entre homem e mulher impedidos legalmente de se casar.
Como, no caso em análise, o militar convivia com a sua esposa legítima
durante o relacionamento com a concubina, o direito à pensão, previsto na
Lei 5.774/71, só é da esposa, não de concubina.
Acompanharam este pensamento a ministra Laurita Vaz e a desembargadora
convocada Jane Ribeiro Silva. Já os ministros Arnaldo Esteves Lima e
Napoleão Nunes Maia Filho entenderam que não haveria interesse jurídico da
União na causa e, por isso, votaram pelo não-conhecimento do recurso.
Entendimento divergente
A avaliação sobre os direitos da concubina é feita caso a caso. Em
julgamento na Quinta Turma, ocorrido em 2005, os ministros entenderam, por
unanimidade, que é possível a geração de direitos da concubina,
especialmente no plano da assistência social.
O recurso analisado (REsp 742685) foi apresentado pela esposa, que
contestava a divisão de pensão previdenciária com a concubina do marido
falecido. Esta havia conseguido a divisão diretamente junto ao Instituto
Nacional de Seguro Social. O TRF-2 manteve a partilha, considerando o
relatório emitido pelo órgão. O laudo ateve-se ao fato da relação íntima
duradoura.
O relator, ministro José Arnaldo da Fonseca, atualmente aposentado, entendeu
que não havia omissão na decisão do TRF-2, já que a divisão da pensão
baseou-se na comprovação da condição de concubina, por três décadas, nas
circunstâncias registradas no INSS, nos documentos juntados e depoimentos
tomados. O falecido instituiu a concubina beneficiária da previdência
social, abriu com ela conta conjunta em banco e forneceu, para diversas
lojas, o endereço em que morava a concubina.
Para o ministro relator, frente ao quadro que se desenhou, o juiz não
poderia se manter inerte “apegado ao hermetismo dos textos legais”. Mas ele
destacou que o caso não envolvia direito de herança. A decisão foi unânime.
Direito sobre herança
Na Terceira Turma, decisão do ano de 2004 (REsp 631465) criou precedente no
sentido de que não há como ser conferido status de união estável à relação
concubinária concomitante a um casamento válido. A relatora, ministra Nancy
Andrighi, afirma, no acórdão, que se a pessoa casada tiver rompido a
sociedade conjugal, de fato, ou judicialmente, não se obsta a constituição
da união estável.
No entanto, a ministra Nancy segue refletindo que, se a prova atesta a
simultaneidade das relações conjugal e de concubinato, devem prevalecer os
interesses da mulher casada, cujo patrimônio não foi dissolvido, aos
alegados direitos subjetivos pretendidos pela concubina, pois não há, sob a
ótica do Direito de Família, prerrogativa desta à partilha dos bens deixados
pelo homem falecido. No caso em análise, a relação de concubinato teria
durando 16 anos e gerado dois filhos. Ele nunca teria se separado de fato da
esposa, com quem também tinha dois filhos.
Indenização
Em decisão da Quarta Turma, do ano de 2003, o ministro Aldir Passarinho
Júnior, relator de um recurso (REsp 303604), destacou que é pacífica é a
orientação das Turmas da 2ª Seção do STJ no sentido de indenizar os serviços
domésticos prestados pela concubina ao companheiro durante o período da
relação, direito que não é esvaziado pela circunstância de o falecido ser
casado.
No caso em análise, foi identificada a existência de dupla vida em comum,
com a esposa e a concubina, por 36 anos. O relacionamento constituiria uma
sociedade de fato. O Tribunal de Justiça de São Paulo considerou incabível
indenização à concubina. Mas para o ministro relator, é coerente o pagamento
de pensão, que foi estabelecida em meio salário mínimo mensal, no período de
duração do relacionamento.
Processos:
REsp 674176;
REsp 813175;
REsp 742685;
REsp 631465;
REsp 303604
|