O único imóvel (bem de família) de uma pessoa que assume a condição
de fiador em contrato de aluguel pode ser penhorado, em caso de
inadimplência do locatário. A decisão foi tomada por maioria pelo
plenário do Supremo Tribunal Federal que rejeitou um Recurso
Extraordinário (RE 407688), no qual a questão era discutida.
No recurso, o fiador M.J.P. contestou decisão do Segundo Tribunal de
Alçada Civil de São Paulo, que havia determinado a penhora de seu único
imóvel para o pagamento de dívidas decorrentes de contrato de locação. O
tribunal paulista entendeu que a Lei 8.009/90 protege o bem de família,
mas faz uma ressalva, no entanto, para os casos em que o imóvel é dado
como garantia pelo fiador, em contrato de aluguel (artigo 3º, inciso
VII).
A questão chegou ao Supremo porque o fiador, inconformado com a decisão
do tribunal paulista, recorreu alegando que o dispositivo da Lei
8.009/90 ofende o artigo 6º da Constituição Federal, alterado pela
Emenda Constitucional 26/2000, que incluiu a moradia no rol dos direitos
sociais amparados pelo texto constitucional.
O julgamento
Durante o julgamento pelo plenário do STF, os ministros debateram duas
questões: se deve prevalecer a liberdade individual e constitucional de
alguém ser ou não fiador, e arcar com essa respectiva responsabilidade,
ou se o direito social à moradia, previsto na Constituição, deve ter
prevalência.
Isso implicaria dizer se o artigo 3º, inciso VII da Lei 8.009/90 estaria
ou não em confronto com o texto constitucional, ao permitir a penhora do
bem de família do fiador, para o pagamento de dívidas decorrentes de
aluguel.
O relator da matéria, ministro Cezar Peluso, entendeu que a Lei 8.009/90
é clara ao tratar como exceção à impenhorabilidade o bem de família de
fiador. Segundo o ministro Peluso, o cidadão tem a liberdade de escolher
se deve ou não avalizar um contrato de aluguel e, nessa situação, o de
arcar com os riscos que a condição de fiador implica.
O ministro Peluso não vê incompatibilidade entre o dispositivo da lei e
a Emenda Constitucional 26/2000 que trata do direito social à moradia,
ao alterar o artigo 6º da Constituição Federal. O voto do ministro
Peluso foi acompanhado pelos ministros Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes,
Ellen Gracie, Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Nelson Jobim.
A divergência
O ministro Eros Grau divergiu do relator, no sentido de afastar a
possibilidade de penhora do bem de família do fiador. O ministro citou
como precedentes dois Recursos Extraordinários (RE 352940 e 449657)
relatados pelo ministro Carlos Velloso (aposentado) e decididos no
sentido de impedir a penhora do único imóvel do fiador. Nesses dois
recursos entendeu que o dispositivo da lei ao excluir o fiador da
proteção contra a penhora de seu imóvel feriu o princípio constitucional
da isonomia.
Esse entendimento também foi citado pelos ministros Carlos Ayres Britto
e Celso de Mello, que acompanharam a divergência aberta pelo ministro
Eros Grau. Os três votos divergentes no julgamento foram no sentido de
que a Constituição ampara a família e a sua moradia e que essa proteção
consta do artigo 6º da Carta Magna, de forma que o direito à moradia
seria um direito fundamental de 2ª geração, que tornaria indisponível o
bem de família para a penhora.
Mas prevaleceu o entendimento do relator. Por 7 votos a 3, o plenário
acompanhou o voto do ministro Cezar Peluso e negou provimento ao Recurso
Extraordinário, mantendo, desta forma, a decisão proferida pelo Tribunal
de Alçada de São Paulo, que determinou a penhora do bem de família do
fiador.
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