- Em pedido de sobrepartilha decorrente de separação judicial consensual, a
alegada ocultação fraudulenta de bens pelo réu não se presume, devendo ser
comprovada pela parte autora.
- A natureza consensual da partilha realizada em juízo determina a presunção
juris tantum de que a não inclusão de determinados bens ocorreu por opção e
conveniência das partes em divisão extrajudicial.
Recurso não provido.
Apelação Cível n° 1.0459.07.030270-6/001 - Comarca de Ouro Branco -
Apelante: M.L.F. - Apelado: C.N.G. - Relator: Des. Almeida Melo
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em negar provimento.
Belo Horizonte, 8 de outubro de 2009. - Almeida Melo - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. ALMEIDA MELO - Conheço do recurso, porque atendidos os pressupostos de
admissibilidade.
A sentença de f. 78/80-TJ julgou improcedente o pedido da autora de partilha
das ações do CEA - Clube de Participação Acionária dos Empregados da
Açominas, de titularidade do réu, e condenou a requerente no pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em R$ 3.000,00
(três mil reais).
A apelante, nas razões de f. 111/131-TJ, sustenta que, na época em que foi
firmado o acordo de separação judicial consensual, não sabia da existência
das ações e que tal fato foi sonegado pelo apelado. Aduz que seu interesse
na partilha não decorre da valorização recente dos bens, fruto da promessa
de compra pelo grupo Gerdau.
Extrai-se dos autos que se trata de ação denominada "sobrepartilha de bens",
que foi promovida por M.L.F. contra C.N.G., sob o fundamento de que as ações
do CEA - Clube de Participação Acionária dos Empregados da Açominas, de
titularidade do apelado, devem ser objeto de divisão, em virtude de não
terem sido incluídas no acordo celebrado na separação judicial consensual.
A partilha dos bens na separação judicial consensual realizada nos autos em
apenso ocorreu mediante ajuste prévio entre as partes.
É certo que podem os cônjuges transigir a respeito dos seus pertences, não
sendo obrigatória a igualdade absoluta na partilha.
A não inclusão das ações no acordo celebrado anteriormente determina a
presunção juris tantum de que tal fato se deu por opção dos litigantes,
assim como ocorreu com o estabelecimento comercial denominado Loja
Primavera, que permaneceu na propriedade da apelante e não foi objeto de
divisão em juízo.
Relativamente à exclusão do mencionado comércio da partilha na separação
judicial, a própria recorrente confirmou o acerto extrajudicial com o
apelado (f. 65-TJ).
A apelante não demonstrou, por meio de elementos críveis, que desconhecia a
existência das ações ao tempo da separação judicial, como também não provou
que o recorrido agiu de má-fé, ou seja, que deliberadamente sonegou aqueles
bens.
O depoimento pessoal da recorrente, de que não lhe foi informada a aquisição
das ações pelo apelado (f. 65-TJ), e a mensagem eletrônica de f. 14-TJ não
constituem prova do desconhecimento nem da ocultação fraudulenta sustentadas
na inicial.
Segundo o documento de f. 60-TJ, as ações foram adquiridas pelo recorrido em
1º.10.1993 e não se pode assimilar, sem prova válida, que, em março de 2004,
quando foi requerida a separação judicial consensual pelas partes (apenso),
com prévio ajuste quanto à divisão dos bens, a recorrente ignorava a
referida aquisição.
A doutrina de Clovis Beviláqua orienta que, sendo o dolo artifício ou
expediente astucioso, empregado para induzir alguém à pratica de um ato que
o prejudica e aproveita ao autor ou terceiro, para sua caracterização há de
existir a manifestação de má-fé, a qual não se presume. (Código Civil dos
Estados Unidos do Brasil - edição histórica. Editora Rio, 1975, v. 1, p.
341).
Martinho Garcez (in Das nulidades dos atos jurídicos) adverte que "o dolo
não se presume, deve ser provado por quem alega". Ao citar Larombière,
ressalta que "não se devem considerar indícios suficientes conjecturas vagas
e arbitrárias, aparências incertas, relações obscuras e remotas, que só o
espírito de sistema pode aceitar, acomodando-as a interpretações violentas
ou sutis" (3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 163).
Como salientado inicialmente, a validade do ato ou do negócio jurídico
realizado na forma legal constitui a regra e, por isso, é presumida em
obséquio do princípio da segurança das relações jurídicas.
Logo, a invalidade de relações consensuais da espécie discutida, inclusive
para ensejar sobrepartilha baseada em ocultação dolosa de bem, constitui
exceção aos princípios da presunção de regularidade e da conservação dos
negócios jurídicos e, como tal, deve ser provada.
Ao autor incumbe o ônus da prova dos fatos constitutivos do direito alegado,
conforme o art. 333, I, do Código de Processo Civil.
Ovídio A. Baptista da Silva (Curso de processo civil. 6. ed. São Paulo, RT,
2002, v. 1, p. 342) esclarece que:
"Como todo direito se sustenta em fatos, aquele que alega possuir um direito
deve, antes de mais nada, demonstrar a existência dos fatos em que tal
direito se alicerça".
Portanto, à falta de elementos aptos à configuração de erro essencial da
apelante, que tenha decorrido de má-fé do apelado na celebração do acordo de
partilha de bens apresentado com o pedido de separação judicial consensual,
subsistem os fundamentos e a conclusão da decisão de primeiro grau.
Nego provimento ao recurso.
Custas, ex lege.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Audebert Delage e Moreira
Diniz.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO. |