- Não existindo prova acerca de erro do oficial do cartório, não há falar em
modificação da data de nascimento.
- Somente é possível a modificação do prenome por fundada coação ou ameaça
decorrente de apuração de crime, ou por situações em que o registro possa
impedir o bem-estar do indivíduo, como a existência de homônimo, erro de
grafia ou exposição ao ridículo.
Apelação Cível n° 1.0313.08.249844-2/001 - Comarca de Ipatinga - Apelante:
Maria Aparecida da Silva - Relator: Des. Vieira de Brito
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em negar provimento ao recurso.
Belo Horizonte, 5 de novembro de 2009. - Vieira de Brito - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. VIEIRA DE BRITO - Trata-se de recurso interposto contra a r. sentença
de f. 60/61, proferida nos autos da ação de retificação de nome e data de
nascimento ajuizada por Maria Aparecida Silva, que julgou improcedente o
pedido.
Em suas razões, sustenta a apelante (f. 64/67) que, apesar de não possuir
documentos para comprovar o erro na data de nascimento constante de seu
registro, apresentou testemunhas que comprovam o fato. No que tange ao
prenome "Aparecida", aduz que é discriminada em sua comunidade, porque as
pessoas dizem "lá vem a aparecida" insinuando que a mesma gosta de se
exibir.
Pugna, assim, pela modificação da data constante em sua certidão de
nascimento, bem como a substituição do prenome "Aparecida" por "Hadassa".
Parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça às f. 76/81, opinando pelo
desprovimento do recurso.
Eis o relatório.
Conheço do recurso, visto que presentes os pressupostos de sua
admissibilidade.
Aduz a recorrente que a cidade de Ipaba/MG, na época de seu nascimento, era
apenas distrito de Caratinga, não possuindo cartório, motivo pelo qual sua
genitora efetuou o seu registro de nascimento na cidade de São Cândido.
Esse fato foi confirmado pela genitora da recorrente, Marina Rosa da Silva
(f. 54) e pela tia, Conceição Margarida da Silva Lopes (f. 52).
Certo é que, segundo as informações prestadas pela genitora e tia da
recorrente, esta nasceu na casa dos pais, no dia 23 de maio de 1977, mas não
foi apresentado nos autos qualquer documento que comprove a existência de
erro quanto ao dia do nascimento. Tampouco há depoimentos de terceiros, uma
vez que a única testemunha ouvida, qual seja Vanderleia Lúcia dos Santos,
nada sabe sobre o assunto.
Tenho que não restou comprovado nos autos que existiu realmente erro do
oficial do cartório, já que o registro foi realizado pela própria genitora
da requerente, fazendo constar a data de 20 de julho de 1977.
O fato de não existir cartório no então distrito de Ipaba/MG justifica não
ter sido realizado o registro da recorrente logo após o seu nascimento, mas
aproximadamente dois meses depois, como se depreende do documento de f. 07.
Mas não há indícios de que tenha ocorrido erro quanto à data constante do
registro.
Isso posto, não há falar em modificação da data de nascimento constante do
registro público, já que ausentes, nos autos, provas suficientes da
ocorrência de erro.
Quanto ao prenome da recorrente, aduz a mesma existir constrangimento, pois,
em sua comunidade, as pessoas dizem "lá vem a aparecida", insinuando que a
mesma gosta de se exibir.
Dispõe o art. 57 da Lei 6.015/73:
"Qualquer alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente,
após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a
que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandato e publicando-se a
alteração pela imprensa".
No entanto, não há nenhuma testemunha nos autos que comprove o alegado
constrangimento. A sua genitora, na verdade, esclarece que a requerente
pretende mudar o prenome por razões religiosas.
Confira-se o depoimento de Marina Rosa da Silva:
"'muita gente critica o nome dela, dizendo que é o da santa e dizem assim:
que nome difícil é o da santa'. A depoente é católica. A requerente é
evangélica, sendo membro da Igreja Quadrangular. Parece que a requerente
quer mudar o prenome por motivo religioso" (f. 54).
Não há qualquer menção a situação de constrangimento, como afirma a
recorrente, atinente ao fato de seu nome lhe expor ao ridículo por ser
confundida com pessoa que gosta de aparecer e de se exibir.
Na verdade, o nome "Aparecida" é usado, segundo o depoimento de Marina Rosa
da Silva, como comparação a uma santa venerada pela Igreja Católica,
enquanto a requerente, evangélica, pretende modificar o nome por "Hadassa",
que estaria na Bíblia.
Percebe-se, claramente, o cunho religioso do pedido.
No entanto, tenho que não é possível a modificação do prenome em razão de
convicção religiosa, mas apenas por fundada coação ou ameaça decorrente de
apuração de crime, ou por situações em que o registro possa impedir o
bem-estar do indivíduo, como a existência de homônimo, erro de grafia ou
exposição ao ridículo.
Dispõe o art. 58 da Lei 6.015/73:
"O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por
apelidos públicos notórios.
Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de
fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime,
por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério
Público".
Dentre as hipóteses de determinação em sentença da retificação do registro,
tem-se o prenome capaz de expor a pessoa a ridículo, tanto que previsto no
art. 55, parágrafo único, da Lei 6.015/73:
"Os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor
ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a
recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independentemente da
cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz competente".
Assim, não restando comprovada a exposição da requerente ao ridículo em
razão de seu prenome "Aparecida", deve ser mantido o registro público.
Nesse sentido esclarece Walter Ceneviva (in Lei dos registros públicos
comentada. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 115):
"Não se trata de questão de gosto ou de preferência do indivíduo a que
enseja alteração. Deve ser claramente enunciada e, embora subjetiva, há de
ser compreensível objetivamente. Disso se infere que a é a inalterabilidade
do registro civil (prenome e patrimônio), somente excepcionada em casos que
a justifiquem. Os autores pátrios trazem algumas destas hipóteses, dentre as
quais, conforme supracitado, a possibilidade de homônimo ou o fato de o
indivíduo ser conhecido no meio em que vive por outro nome, o que
autorizaria o acréscimo deste ao prenome registrado. A Lei, mesmo com a
alteração operada em seu art. 58, traz a possibilidade de alteração do
prenome quando este exponha o seu portador ao ridículo, em conformidade com
o parágrafo único do art. 55".
Confira-se a jurisprudência deste egrégio Tribunal:
"Retificação registro de nascimento. Alteração prenome. Capricho pessoal.
Impossibilidade. Recurso não provido. - A exegese dos arts. 57 e 58 da Lei
6.015/74 informa que a imutabilidade do registro de nascimento não é
absoluta, podendo ocorrer alteração do nome a título de exceção e
motivadamente e a substituição do prenome quando se tratar de apelido
público notório. Nessa linha, improcede o pedido de retificação quando a
parte não apresenta qualquer exceção à regra da imutabilidade do prenome,
fazendo transparecer, na realidade, mero capricho pessoal" (TJMG, 5ª Câmara
Cível, Rel.ª Des.ª Maria Elza, Apelação nº 1.0112.06.065682-7/001, j. em
17.07.2008).
"Registro público - Retificação de prenome - Impossibilidade da pretensão
inicial. - 1. A retificação do nome somente é possível quando presentes os
requisitos do art. 57, que, não estando presentes, levam à improcedência do
pedido. - 2. Recurso não provido" (TJMG, 8ª Câmara Cível, Rel. Des. Edgar
Pena Amorim, Apelação nº 1.0427.04.911867-7/001, p. em 21.02.2006).
O egrégio Superior Tribunal de Justiça não destoa:
"Civil. Recurso especial. Retificação de registro civil. Homonímia.
Peculiaridades do caso concreto. Inclusão de prenome. Substituição. Apelido
público e notório.
- O art. 57 da Lei nº 6.015/73 admite a alteração de nome civil, desde que
se faça por meio de exceção e motivadamente, com a devida apreciação
Judicial, sem descurar das peculiaridades do caso concreto. Precedentes.
- Por não se tratar de hipótese de substituição de prenome, e sim de adição
deste, além de não ter sido demonstrado em momento oportuno ser o recorrente
conhecido no meio social pelo prenome que pretende acrescentar, obsta o seu
pedido o art. 58 da LRP.
- Conquanto possa a homonímia vir a prejudicar a identificação do sujeito,
se o Tribunal de origem, com base no delineamento fático-probatório do
processo, entende que não há exposição a circunstâncias vexatórias e de
constrangimento decorrentes dos homônimos existentes, tal reexame é vedado
em recurso especial.
Recurso especial não conhecido" (STJ, 3ª Turma, REsp 647296/MT, Rel.ª Min.ª
Nancy Andrighi, DJ de 16.05.2005, p. 348).
Mediante tais considerações, nego provimento ao recurso, mantendo a r.
decisão singular.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Bitencourt Marcondes e
Fernando Botelho.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. |