RETIFICAÇÃO DO REGISTRO DO IMÓVEL - CANCELAMENTO DE AVERBAÇÃO - USUFRUTO
VITALÍCIO - EXTINÇÃO - MORTE DO USUFRUTUÁRIO - CARÁTER PERSONALÍSSIMO -
INTRANSMISSIBILIDADE
- Ainda que de comunhão universal o regime de casamento, porque de caráter
personalíssimo e intransmissível, não há comunicação do usufruto ao outro
cônjuge.
- A cessão do exercício não transmite o usufruto, mas apenas os poderes
derivados da relação jurídica do instituto, isto é, consiste na simples
transmissão de um direito de crédito, podendo o terceiro usar ou fruir da
coisa, mas nunca obter o direito real.
- Em conseqüência disso, extinto o usufruto, por qualquer de suas causas,
extingue-se o direito de exercício dele decorrente, não podendo o
cessionário do exercício opor direitos frente ao nu proprietário que
consolidou a propriedade para si.
- V.v.: - Registros públicos - Cancelamento de registro ou de averbação -
Ato do oficial registrador - Conflito decorrente do próprio ato registrário
em seus requisitos formais e ou substanciais - Questão afeta à legislação
concernente aos registros públicos - Competência do juiz de registros
públicos - Natureza absoluta - Lei de Organização e Divisão Judiciária do
Estado de Minas Gerais (LCE 59, de 2001), art. 57, itens I e II - Recurso de
apelação - Simetria - Competência de câmara cível de direito público deste
TJMG (unidade Goiás) - Regimento Interno, art. 19-A, I, d - Nulidade
absoluta do julgamento - Art. 113, § 2º, CPC - Preliminar de ofício. (Des.
Marcelo Rodrigues)
Apelação Cível nº 1.0079.07.387263-6/001 - Comarca de Contagem - Apelante:
Maria da Conceição Muniz - Apelados: Mary Ivone Noeme da Silva Fonseca,
Rosemary da Silva, Rosilene Cristiane Silva, Marlene Batista da Silva e
outros, Heleno Soares da Fonseca, José Antônio da Silva Malaquias -
Relatora: Des.ª Selma Marques
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à
unanimidade, em rejeitar preliminar do Vogal e, no mérito, negar provimento.
Belo Horizonte, 29 de junho de 2012. - Selma Marques - Relatora.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES.ª SELMA MARQUES - Cuida-se de apelação interposta contra a r. sentença
de f. 93/94 que julgou procedente o pedido inicial formulado por Marlene
Batista da Silva; Rosilene Cristiano Silva Malaquias e seu esposo; Rosemare
Silva; e outros contra Maria da Conceição Muniz e outros, para determinar o
"cancelamento da averbação "AV - 1.106265", relativo ao usufruto parcial a
favor de Maria da Conceição Muniz de Abreu e a retirada da expressão: "O
imóvel continua onerado com usufruto vitalício a favor de Maria da Conceição
Muniz de Abreu", inserida na parte final do Registro "2.106265", constantes
do registro do imóvel já mencionado, Matrícula 106.265, Livro "2", página
"1", do Cartório do Registro de Imóveis da Comarca de Contagem - MG".
Inconformada com o resultado da lide, apela a primeira requerida às f.
98/103, defendendo a manutenção do gravame do usufruto sobre o bem imóvel,
já que houve a cessão gratuita do seu exercício pelo de cujus usufrutuário à
sua cônjuge sobrevivente. Requereu o benefício da assistência judiciária e a
fixação de honorários em favor do seu patrono.
Foi oferecida contraminuta ao agravo, às f. 105/109, pelo seu não
provimento.
Conheço do recurso porque presentes seus pressupostos de admissibilidade,
ressaltando que já houve a concessão do benefício da assistência judiciária
à recorrente na sentença (f. 94-v.).
DES. MARCELO RODRIGUES - Sr.ª Presidente.
Preliminar de ofício - incompetência absoluta do juízo.
Trata-se de ação de retificação de registro deflagrada por Marlene Batista
da Silva, José Antônio da Silva Malaquias, Rosemary da Silva, Mary Ivone
Noeme da Silva Fonseca e Heleno Soares da Fonseca, todos nos autos
qualificados, mediante a qual desejam, de forma clara e insofismável, até
mais não poder, o cancelamento da Averbação de n. 01, inserida, de ofício,
pelo oficial registrador do Serviço de Registro de Imóveis da Comarca de
Contagem - MG, à margem do Registro de n. 421, do livro 04 do referido
cartório, conforme atestam as certidões de f. 38 e 39.
O pleito inicial e, diga-se de passagem, corretamente dirigido ao Juízo de
Fazenda e Registros Públicos da referida comarca foi julgado procedente pela
sentença de f. 93/94-v., não obstante produzida por juízo absolutamente
incompetente, qual seja o da 2ª Vara Cível, como se verá.
Tenho, portanto, preliminar de ofício de nulidade absoluta do processo a
partir da sentença de f. 93/94-v., bem como de incompetência igualmente
absoluta não apenas dessa Câmara, como de resto de todas as demais Câmaras
de Direito Privado deste Tribunal (Unidade Raja), para conhecer e decidir
qualquer outra matéria ou questão relativa ao presente recurso de apelação.
No tocante ao registro público propriamente dito, foi apontada pelos autores
na prefacial, à f. 04 - bastando uma rápida leitura da mesma -, no que se
refere à invalidade de assento registral, a "existência de averbações até
então inexistentes", e elas foram "inseridas de maneira ilícita à margem do
documento original" (sic).
Constata-se, assim, que a causa de pedir se refere à inexistência dos
pressupostos precípuos para o ato tabular efetivado pelo oficial registrador
de Contagem, notadamente o registro (rectius: averbação constante do
registro) de n. 421, à f. 174 do Livro 4 do mencionado Serviço de Registro
de Imóveis.
Como cediço, dispõe o art. 57, itens I e II, da Lei Complementar Estadual
59, de 2001, tal como se acha em vigor - Lei de Organização e Divisão
Judiciária -, que compete ao Juízo de Registros Públicos resolver reclamação
ou dúvida suscitadas por tabelião ou oficial do registro público e exercer
as atribuições conferidas a juízes de direito pela legislação concernente
aos registros públicos.
Por sua vez, o Regimento Interno deste Tribunal diz textualmente que compete
à Unidade Goiás deste Tribunal conhecer e julgar os feitos cíveis de causa
relativa aos registros públicos (art. 19-A, I, d).
Pois bem.
No plano da Lei 6.015, de 31.12.73, foram distinguidos os casos de nulidade
de pleno direito do assento registral daqueles referentes à nulidade ou
perda do objeto do ato jurídico ou título causal. Nesses últimos, o
cancelamento do assento não é atingido diretamente, mas sim por via oblíqua,
puramente em consequência da invalidação do título que lhe serviu de
fundamento, compreendendo todas as modalidades de vícios do ato jurídico
(vícios de vontade) que cinjam exclusivamente ao título ou às qualidades que
lhe forem próprias, tudo em ação própria perante o Juízo Cível.
Adverte o tratadista Cunha Gonçalves (Tratado de direito civil, v. IV, p.
356) que, por isso:
"quando se cogita da aplicação do art. 214 da LRP, costuma-se distinguir
entre a nulidade do ato jurídico que deu origem ao registro e a dele
próprio. Só esta última poderia ser proclamada independentemente de ação
direta. Assim, eventual declaração de nulidade de uma compra e venda haveria
de ser demandada em ação própria perante o Juízo Civil competente. Se o
vício, entretanto, for do ato registral em si, poderá a nulidade ser
reconhecida em sede administrativa".
A propósito, colhendo-se do julgamento do conflito negativo de competência
de nº 22.068/1, sendo Relator o Desembargador Hugo Bengtsson, precioso
escólio, para quem:
"Se se ataca única e exclusivamente o registro, em seus requisitos formais
ou substanciais, a competência é do Juízo da Vara de Registros Públicos
(art. 73, § 1º, II, da Res. nº 61/75, com a redação dada pela LC nº
7.655/79).
Na mesma linha de raciocínio:
1) 140.908/5 (4ª Câm. Cív., Rel. Des. Bady Curi)
2) 130.694/3 (1ª Câm. Cív., Rel. Des. Páris Peixoto Pena)
3) 129.840/5 (5ª Câm. Cív., Rel. Des. Schalcher Ventura)
4) 123.535/7 (5ª Câm. Cív., Rel. Des. Cláudio Costa)
5) 125.895/3 (5ª Câm. Cív., Rel. Des. Cláudio Costa)
6) 121.794/2 (5ª Câm. Cív, Rel. Des. Hugo Bengtsson)
7) 099.145/5 (3ª Câm. Cív, Rel. Des. Murilo Pereira)
8) 126.159/3 (3ª Câm. Cív., Rel. Des. Monteiro de Barros)
9) 122.611/7 (4ª Câm. Cív., Rel. Des. Corrêa de Marins)
10) 140.908-5 (4ª Câm. Cív., Rel. Des. Bady Curi)
11) 141.657-7 (3ª Câm. Cív., Rel. Des. Baia Borges)
12) 153.272-0 (4ª Câm. Cív., Rel. Des. Carreira Machado)
Etc.
Veja-se ainda decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, muito bem situada
na hipótese em apreço, cuja ementa se transcreve abaixo:
"Somente é competente a Vara de Registros Públicos para conhecer das
demandas que versem sobre conflitos de interesses decorrentes do próprio ato
registrário" (TJSP - CComp. 34.201-0/1 - Câm. Especial - RT 741/246-7).
Em seu lapidar voto, ponderou o Relator, Desembargador Dirceu de Mello:
"Dada a especialidade das Varas de Registros Públicos, as demandas a serem
por elas conhecidas devem versar a respeito de conflitos de interesses
decorrentes do próprio ato registrário e não da causa determinadora do
registro. Isto é, compete a este Juízo Especializado dirimir os conflitos,
quer na esfera administrativa e então exercendo o Magistrado a função de
corregedor permanente das serventias extrajudiciais, quer na jurisdicional,
em processos de jurisdição contenciosa ou voluntária, quando o ponto
controvertido residir na regularidade formal do ato notarial atacado [...].
Pensar-se de modo diverso [...] por óbvio, desvirtuaria a intenção do
legislador em proporcionar uma melhor distribuição da justiça".
Impõe-se reconhecer que, no caso em concreto, o pedido de cancelamento
formulado na inicial ataca direta e objetivamente ato de ofício praticado
pelo oficial registrador, vale dizer, reclama a nulidade de pleno direito do
registro (vocábulo aqui empregado em sua acepção ampla), em si mesmo
considerado. Lado outro, na causa de pedir, assim como no próprio pedido,
nada é direcionado contra o título causal que ao mencionado registro deu
origem, por isso que a presente questão se mostra afeta à legislação de
registros públicos, atraindo a competência, firmada em razão da matéria, do
Juiz de Registros Públicos, e não do Juiz do Cível, órgão jurisdicional que,
na presente hipótese, se mostra absolutamente incompetente para decidir a
matéria.
A linha divisória traçada na Lei 6.015, de 1973, é bem clara a respeito.
Quando se ataca o título causal, a competência para decidir sobre sua
invalidade é do Juiz do Cível, sucedendo o cancelamento do registro como
mero, lógico e natural desdobramento da decisão. Diferentemente, quando se
ataca diretamente o registro em seus requisitos formais e ou substanciais,
independentemente do título que lhe deu origem, a competência é firmada em
razão da matéria - especial e de ordem pública - que lhe corresponde, isto
é, do Juiz de Registros Públicos, podendo ser decidida, conforme o caso,
seja em jurisdição voluntária ou administrativa, seja em sede contenciosa.
Daí resulta, ademais, que o correspondente recurso de apelação interposto
dessa sentença será, por simetria, necessariamente apreciado por uma das
Câmaras Cíveis de Direito Público deste Tribunal (Unidade Goiás), tal como
reclamado expressamente pelo seu Regimento Interno, tal como se acha em
vigor (art. 19-A, I, d), sob pena, igualmente, de se incorrer na sanção de
nulidade absoluta de todo e qualquer ato decisório referida no art. 113, §
2º, do Código de Processo Civil.
Lamentavelmente, de tudo principiou o equívoco da determinação judicial de
f. 49 e 54 dos autos, na medida em que o ilustre Juiz titular da Vara de
Fazenda e Registros Públicos, na época, demonstrou desconhecer a dupla
acepção jurídica da expressão "retificação do registro", a qual, em verdade,
pode ser empregada seja na vertente contenciosa (art. 214 LRP), seja no
campo administrativo (art. 212 e 213 LRP), sem maiores entraves. Mais,
ignorou que, em matéria de legislação, concernente aos registros públicos
não se impõem absolutamente que "ente público" figure como parte, neste
aspecto parecendo prevalecer no inconsciente do juiz a quo apenas a
competência da Fazenda Pública.
Assim, considerando que se trata aqui de competência firmada em razão da
matéria, sua natureza é absoluta, caráter que atrai a incidência da regra
contida no art. 113, § 2º, do Código de Processo Civil, do que se espera não
ignore este Colegiado.
Isso porque "a competência absoluta é inderrogável, não admite a vontade das
partes, e indisponível. Já na competência relativa admite-se a disposição
das partes, que podem alterá-la ou aceitá-la. Logo, se a parte aceita a
competência (relativa) diversa daquela ditada pela lei, não cabe ao juiz
dispor diversamente, dando-se por incompetente sem provocação da parte (de
ofício), que é quem deve arguir a incompetência, pela exceção de
incompetência (CPC, 112) (v. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito
processual. São Paulo: Saraiva, 5ª Série, p. 63)". (ROSAS, Roberto. Direito
sumular. 7. ed. São Paulo: Malheiros, p. 305).
Posto isso, de ofício, anulo o processo a partir de f. 93/94-v.,
determinando o seu retorno à Vara de Registros Públicos de Contagem - MG
para que nova sentença seja ali proferida, e desde logo esclareço que novo e
eventual recurso de apelação interposto deverá ser conhecido e julgado por
uma das Câmaras Cíveis de Direito Público deste Tribunal (Unidade Goiás),
sob pena de nulidade absoluta de todos os atos decisórios.
É como voto.
DES.ª SELMA MARQUES - Da preliminar, de ofício, do Segundo Vogal.
Em resposta à preliminar, suscitada de ofício pelo e. Vogal, relativa à
incompetência absoluta desta Câmara Cível para prosseguir no julgar o
presente feito, esclareço que versam os autos fundamentalmente sobre o
instituto do usufruto e a possibilidade da cessão do seu exercício pelo
usufrutuário, a título gratuito ou oneroso, a qual não se confunde com o
direito real, que se mantém intacto, sendo certo que, conforme veremos na
explanação abaixo, constituído o usufruto vitalício em favor do Sr. Nilton
Martins de Abreu, conforme se retira da escritura do imóvel e demais
documentos de f. 31/37, extinto pela sua morte (f. 40), não subsiste a
cessão de exercício supostamente concedida à Sra. Maria da Conceição Muniz e
indevidamente averbada na certidão do Registro do Imóvel (f. 39)
Assim, o cancelamento da referida averbação no assento registral, ao meu
aviso, não retira do registro do imóvel a sua autenticidade e decorre sim
indiretamente da discussão do negócio jurídico que lhe deu causa, tanto isso
é verdade que, em sede de apelo, a discussão paira exclusivamente, repito,
pela instituição do usufruto e a possibilidade de cessão do seu exercício.
Para confirmar esta assertiva, houve na tramitação do processo, em sede de
primeiro grau de jurisdição, a determinação da emenda da inicial pelo Juízo
da Vara de Fazenda Pública, à f. 49, justamente porque não se tratava de
"retificação nos moldes da Lei 6.015/73, mas de questionamento acerca da
existência e alcance de direito real (usufruto)", devidamente efetivada à f.
50, com a alteração do pedido para "extinção do direito real (usufruto) em
nome da Sra. Maria da Conceição Muniz de Abreu" e, em consequência disso, a
declinação da competência para uma das Varas Cíveis de Contagem, onde foi
proferido o julgamento.
Rejeito, portanto, a preliminar.
DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT - Senhora Presidente,
Pedi vista destes autos após o eminente 1º Vogal levantar preliminar de
incompetência do Juízo de origem e, por via de consequência, até mesmo desta
11ª Câmara para dirimir a lide posta.
V.Exa. rejeitou tal preliminar a entender que a questão não conduz a
apreciar matéria atinente ao que reza a nossa Lei de Organização Judiciária
sobre a competência das Varas de Registros Públicos.
Peco vênia ao eminente Vogal para dele discordar, respeitando a posição por
sua V.Exa. defendida.
Ao exame dos autos, chego à mesma conclusão e não menos da eminente
Relatora, para também rejeitar tal preliminar.
Observa-se nos autos do processo que, embora na inicial de f. 02 a questão
foi posta como eventual retificação de registro imobiliário e contra o
Cartório de Registro, na sequência do procedimento foi feita ementa da
inicial, ensejando a mudança das pessoas do polo passivo.
Com a nova citação, outra a lide posta nos autos, que se traduziu em
declarar se o instituto do usufruto vitalício a favor do falecido teria
persistido, como pretendia fazer valer a certidão do Cartório respectivo,
pois houve a baixa apenas parcial do usufruto - apesar disto agora a ré, e
em face desta circunstância se coloca como titular deste usufruto, contesta
a declaratória extintiva do direito.
Diante disso somente ao dirimir-se esta querela de natureza privada e que
resultara em consequente e eventual alteração do campo do registro, e
diga-se por consequência, não sendo assim, por evidente matéria da
competência privativa daquelas varas.
Aliás, disso já bem se apercebera o MM. Juiz daquela vara original e
declinara de sua competência, como está às f. 49 e 54.
Assim, com a devida vênia do em. Vogal, estou também rejeitando tal
preliminar.
DES.ª SELMA MARQUES - Pois bem. Versam os autos fundamentalmente sobre o
usufruto, conceituado, nas lições de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald,
"como direito real temporário concedido a uma pessoa para desfrutar de um
objeto alheio como se fosse próprio, retirando suas utilidades e frutos,
contudo sem alterar-lhe a substância" (Direitos reais. 4. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007).
Caracteriza-se como direito real em coisa alheia de caráter temporário,
porquanto não se prolonga além da vida do usufrutuário. Isso decorre do seu
conteúdo personalíssimo, pois a única finalidade do usufruto é beneficiar
pessoas determinadas, não se justificando, assim, o prolongamento da
existência do direito a gerações seguintes.
Também decorre do seu caráter intuitu personae ser o usufruto um direito
real intransmissível. Ele é sempre instituído sobre a cabeça de um titular
determinado.
Assim, o fato de ser possível a cessão do seu exercício pelo usufrutuário, a
título gratuito ou oneroso, não se confunde com o direito real, que se
mantém intacto.
A cessão do exercício não transmite o usufruto, mas apenas os poderes
derivados da relação jurídica do instituto, isto é, consiste na simples
transmissão de um direito de crédito, podendo o terceiro usar ou fruir a
coisa, mas nunca obter o direito real.
Em consequência disso, extinto o usufruto, por qualquer de suas causas,
extingue-se o direito de exercício dele decorrente, não podendo o
cessionário do exercício opor seus direitos frente ao nu proprietário que
consolidou a propriedade em suas mãos.
Feitas essas considerações, constituído o usufruto vitalício em favor do Sr.
Nilton Martins de Abreu, conforme se retira da escritura do imóvel e demais
documentos de f. 31/37, extinto pela sua morte (f. 40), não subsiste a
cessão de exercício supostamente concedida à Sra. Maria da Conceição Muniz e
indevidamente averbada na certidão do Registro do Imóvel (f. 39).
Pelo exposto, nego provimento ao recurso.
Custas, pela apelante, suspenso o pagamento, no entanto, porque amparada
pelo benefício da assistência judiciária.
É como voto.
DES. FERNANDO CALDEIRA BRANT - Senhora Presidente, quanto ao mérito também a
acompanho, para negar provimento ao recurso.
DES. MARCELO RODRIGUES - Mérito.
Restei vencido na preliminar de incompetência absoluta do Juízo.
Esse resultado, a despeito de respeitá-lo, é lamentado, dado que poderá,
inclusive, trazer reflexos negativos à racionalidade, por mínima que seja,
imprimida pela Lei de Organização e Divisão Judiciária, notadamente nas
comarcas que possuem Varas de Registros Públicos no Estado de Minas Gerais e
gerar clara distorção nos critérios adotados na distribuição de feitos
concernentes à legislação de registros públicos, tomados por base de
comparação, por exemplo, os feitos distribuídos à Vara Registros Públicos de
Belo Horizonte, a gerar, além disso, insegurança jurídica.
Quanto ao mérito, resta patente que o Registro 421 do Serviço de Registro de
Imóveis de Contagem - MG, por não encontrar respaldo na lei civil, tampouco
na pública forma de instituição do usufruto, deverá ser cancelado, não
havendo falar em usufruto de metade do bem ao cônjuge supérstite.
Assim, determino que seja expedido mandado de averbação para cancelamento do
Registro 421, acima referido.
É como voto.
Súmula - REJEITAR PRELIMINAR DO VOGAL E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO.
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