CÓDIGO FLORESTAL - RESERVA LEGAL -
INCABÍVEL A EXIGÊNCIA DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE FLORESTA E MATA NATIVA
Número do processo: 1.0012.03.900005-9/001(1)
Relator: Nilson Reis
Data do acórdão: 30/03/2004
Data da publicação: 16/04/2004
Propriedade Rural - Reserva legal - Averbação - Lei 4.771/65, art.
16, § 8º. A reserva legal instituída pela Lei n. 4.771/65, a ser
averbada na matrícula da propriedade rural, objetiva preservar florestas
e matas nativas existentes, não se justificando exigi-la onde já não
existem, ou nunca existiram. Em reexame necessário sentença confirmada.
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de
fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas,
à unanimidade de votos, em reexame necessário, confirmar a sentença.
Belo Horizonte, 30 de março de 2004.
Des. Nilson Reis - Relator.
VOTO
Tratam os autos de mandado de segurança, impetrado por Renato Alexandre
Freire, em face de ato do Sr. Oficial do Cartório de Registro de Imóveis
da Comarca de Aiuruoca, que, com base no Provimento 50/2000 da Corregedoria de
Justiça de Minas Gerais e no art. 16, § 8º, da Lei n. 4.771/65 (Código
Florestal), se recusou proceder ao registro de escritura pública de compra
e venda de imóvel rural, exigindo, como condição para aviá-lo, a prévia
averbação, na respectiva matrícula, da área de reserva legal.
Alegou que referida exigência contraria o verdadeiro sentido e ao exato
alcance do disposto no art. 16, § 8º, do Código Florestal, pois a
reserva legal, ali prevista, pressupõe a existência de floresta ou outra
forma de vegetação nativa, a ser explorada, o que não é o caso.
E argumentou: "...a instituição da reserva legal está intimamente ligada
à efetiva exploração de floresta ou forma de vegetação nativa existente
no imóvel. Sá assim, justificaria a restrição ao direito de
propriedade", complementando: "...proprietário rural, que não pretende
desmatar, explorar a floresta ou, de qualquer modo, suprimir vegetação
nativa, não está obrigado a instituí-la, mesmo porque toda propriedade
continuará intacta e preservada".
Indeferido o pedido de liminar (fls. 40-TJ), prestou a autoridade
indigitada coatora as informações de fls. 42/46-TJ, concordando com o
impetrante.
Pelo deferimento da ordem impetrada opinou o RMP (fls. 51/55-TJ).
Sentenciando, concedeu a MMª Juíza a quo o mandamus (fls.
57/60-TJ), subindo os autos para o necessário duplo degrau.
A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela confirmação do
decisum (fls. 67/70-TJ).
Assim relatados, passo à decisão.
Conheço da remessa necessária.
Instituindo o Código Florestal, dispõe o art. 1º da Lei n. 4.771, de
15.09.65, até hoje inalterado, verbis:
"Art. 1º - As florestas existentes no território nacional e as demais
formas de vegetação, reconhecidas de utilidade à terras que revestem,
são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se
os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral
e especialmente esta Lei estabelecem".
E cuidou o legislador de definir, desde logo, ainda nesse art. 1º, no §
2º:
"§ 2º - Para os efeitos deste Código, entende-se por:
I - omissis ...
II - Área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts.
2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função
ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade
geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o
solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;
III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou
posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso
sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos
processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e
proteção de fauna e flora nativas".
Cuida a Lei de "florestas existentes", como se vê.
E no art. 16 declara expressamente que elas "suscetíveis de supressão"
ressalvada aquelas situadas em áreas de preservação permanente, assim
como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de
legislação específica, desde que mantidas, a título de reserva legal,
parte delas, como especificou nos incisos I a IV.
Objetivando resguardar esses limites, determinou o legislador, no § 8º,
desse art. 16, que "a área de reserva legal deve ser averbada à margem
da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente,
sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a
qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as
exceções previstas neste Código".
Essa "reserva legal" é uma forma de preservar as florestas e matas
nativas existentes, evitando-se o desmatamento.
Preserva-se o que ainda existe.
Entender que o legislador deu à expressão sentido mais amplo, abrangendo
áreas já sem cobertura florestal, revela-se ofensivo ao direito de
propriedade constitucionalmente garantido.
O Provimento n. 50 da Corregedoria de Justiça, ao dispor, ipsis
verbis:
"Art. 1º - A averbação da área de reserva legal no registro de imóveis
obedecerá às disposições da Lei Federal n. 4.771/65, de 15/09/65, com as
alterações da Medida Provisória n. 1.956-50, de 26/05/2000, e das
publicações subseqüentes, e da Lei Federal n. 6.015, de 31/12/73, com as modificações
da legislação posterior.
Art. 2º - A área de reserva legal deve ser averbada à margem da
inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente,
sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a
qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as
exceções previstas neste Código (art. 16, § 8º, do Código Florestal).
Art. 3º - Os emolumentos pela averbação da reserva legal no registro de
imóveis devem ser cobrados em consonância com o disposto na Lei Estadual
n. 12.727, de 30/12/97, com as alterações e acréscimos da Lei n. 13.438,
de 30/12/99, Anexo I, Tabela 4, n. 1, alínea e, e nota V.
§ 1º - A averbação da reserva legal de pequena propriedade ou posse
rural familiar é gratuita, nos termos do art. 16, § 9º, da Lei Federal n.
4.771, de 15/09/65.
Art. 4º - Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação,
ficando revogados o Provimento n. 23, de 24/10/97, e o Provimento n. 30,
de 02/03/98".
Destarte, com inteira razão observou o eminente Des. Carreira Machado,
ao relatar a Apelação Cível n. 297.454-1/00, da Comarca de Ibiraci, tal
provimento regulamenta a averbação da área de reserva legal de forma
genérica.
Não tem aplicação no caso concreto.
Assim sendo, em reexame necessário, confirmo a sentença por seus próprios
e jurídicos fundamentos.
Custas recursais, ex lege.
VOTOS
O Sr. Des. Jarbas Ladeira: De acordo.
O Sr. Des. Brandão Teixeira: De acordo.
Súmula: Em reexame necessário, confirmaram a sentença. |