ALMG publica relatório final da CPI dos Cartórios

RELATÓRIO FINAL DA CPI DOS CARTÓRIOS 

1 - A Comissão Parlamentar de Inquérito 
1.1 - Objetivos 
Esta Comissão Parlamentar de Inquérito foi instituída em face da aprovação de requerimento subscrito por mais de 1/3 dos membros da Assembléia Legislativa, tendo como primeiro signatário o Deputado Dilzon Melo. 
Conhecida como CPI dos Cartórios, esta Comissão teve como objetivo a apuração de possíveis irregularidades no processo de arrecadação, por parte do poder público, de custas e emolumentos devidos por serviços prestados pelas serventias do foro extrajudicial do Estado de Minas Gerais. 
Ao justificar a proposta de instalação da CPI dos Cartórios, o primeiro signatário do requerimento lembra a competência da Corregedoria-Geral de Justiça e do Juiz de Direito Diretor do Foro para a fiscalização judiciária da prática dos atos notariais e de registro, nos termos do disposto na Lei nº 13.438, de 30/12/99. Consta ainda na justificação o fato de que o Deputado Miguel Martini assegurou, em pronunciamento na Assembléia Legislativa, que 95% dos recursos a serem arrecadados, relativos a custas e emolumentos, não estavam sendo recolhidos pelos órgãos competentes, exatamente em decorrência da falta de fiscalização da prática dos referidos atos. A evasão de divisas, segundo esse parlamentar, atingiria montante próximo a R$100.000.000,00 ao ano. 
Os trabalhos da comissão foram prorrogados por 60 dias mediante aprovação de requerimento nesse sentido, em 13/8/2002. 
Apesar do esforço do SINOREG para inviabilizar a atividade desta Comissão, mediante propositura de mandado de segurança, em curso no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, esta Comissão pôde concluir satisfatoriamente os seus trabalhos, que são sintetizados neste relatório. 
1.2 - Composição da Comissão 
Após a indicação dos membros desta Comissão pelas Lideranças dos partidos com assento nesta Casa Legislativa, foram instalados os trabalhos, no dia 2/4/2002, quando se realizou a primeira reunião especial da Comissão, sob a Presidência do Deputado Dilzon Melo. Na oportunidade, foram eleitos o Presidente e o Vice-Presidente da CPI. 
Apurados os votos, foi verificada a eleição unânime do Deputado Rêmolo Aloise como Presidente e do Deputado Ivair Nogueira como Vice-Presidente, sendo indicado o Deputado Agostinho Silveira para atuar como relator, ficando a Comissão com a seguinte composição: Deputados Rêmolo Aloise, Presidente; Ivair Nogueira, Vice-Presidente; Agostinho Silveira, relator; Dilzon Melo; Durval Ângelo; Antônio Carlos Andrada e Luiz Fernando Faria. 
2 - A responsabilidade do Poder Judiciário pela fiscalização dos atos notariais e de registro 
A Constituição da República estabelece, em seu art. 236, que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, remetendo à lei ordinária o tratamento das questões relativas às responsabilidades civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, como também a definição acerca da fiscalização, por parte do Poder Judiciário, dos atos praticados pelos notários e pelos registradores. 
A matéria veio a ser disciplinada pela Lei nº 8.935, de 1994, cujo art. 37 determina que a fiscalização judiciária dos atos notariais e de registro será exercida pelo juízo competente, assim definido na órbita estadual e do Distrito Federal. 
A Assembléia Legislativa, por seu turno, ao promover alterações na Lei nº 12.727, por meio da Lei nº 13.438, estabeleceu que a fiscalização judiciária da prática dos atos notariais e de registro e da contagem, da cobrança e do pagamento de emolumentos será exercida pela Corregedoria-Geral de Justiça e pelo Juiz de Direito Diretor do Foro, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público ou do interessado, conforme se evidencia do dispostivo constante do art. 26 da referida norma. 
2.1 - A utilização do selo para controle dos atos notariais e de registro 
Ao mesmo tempo em que a lei estabeleceu as responsabilidades pela fiscalização judiciária das práticas dos atos notariais e de registro, como também da contagem, da cobrança e do pagamento de emolumentos, foi instituída a utilização do selo a ser aposto nos papéis e documentos expedidos ou submetidos a exame e nos livros utilizados, quando da prática dos referidos atos. 
Como é do conhecimento público, alguns atos notariais, como a emissão de certidões, o reconhecimento de firma e as autenticações de documentos, não impõem a necessidade do registro em livro próprio, por parte das serventias, o que dificulta sobremaneira o controle da sua prática. 
A instituição do sistema de selo adveio de proposta do Deputado Miguel Martini, exaustivamente debatida por esta Casa legislativa, e teve como objetivo a facilitação dos trabalhos de fiscalização, especialmente quanto aos atos antes mencionados. Cotejando-se o número de selos adquiridos e utilizados pela serventia pode-se chegar à conclusão do número de atos praticados, simplificando-se o trabalho de correição e controle do fluxo dos emolumentos e da arrecadação da Taxa de Fiscalização Judiciária. 
A Corte Superior do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, por meio da Resolução nº 383, de 12/12/2001, estabeleceu normas gerais para a Corregedoria-Geral de Justiça expedir provimento para disciplinar a utilização do selo de fiscalização. 
A efetiva utilização do selo nos documentos emitidos pelas serventias do foro extrajudicial, entretanto - embora a lei que o instituiu remonte ao ano de 1999 -, somente veio a ocorrer a partir de 2/4/2002, conforme determinação da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, pela Portaria nº 022/2002. 
O resultado mais imediato da adoção das medidas propostas constituiu-se, exatamente, numa maior arrecadação de tributos pelo Estado de Minas Gerais, cujo caixa encontra-se atualmente combalido diante de compromissos com o pagamento de dívidas, servidores e demais despesas comuns a qualquer ente da federação brasileira. 
2.2 - A instituição da Taxa de Fiscalização Judiciária 
A citada Lei nº 13.438, de 1999, instituiu, ainda, por força do disposto em seu art. 2º, a Taxa de Fiscalização Judiciária, para atender as despesas decorrentes das atividades correspondentes ao exercício do poder de polícia de que trata o art. 236, SS 1º, da Constituição da República. Melhor esclarecendo, o pagamento da Taxa de Fiscalização Judiciária consiste na contrapartida pelos serviços de fiscalização a serem implementados pelo Poder Judiciário. 
Os recursos arrecadados a esse título são transferidos diretamente aos cofres do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, conforme disciplinado pelo Decreto nº 40.976, de 28/3/2000, que dispõe sobre a matéria. 
Os valores a serem desembolsados a esse título pelos contribuintes que demandam serviços notariais e de registro encontram-se discriminados no Anexo II da lei e variam de R$0,51, pagos pela autenticação de cópia reprográfica, datilografada, impressa por computador ou manuscrita, por documento, a R$1.199,02, pagos quando da lavratura de escritura pública de bem de valor patrimonial superior a R$3.200.000,00. 
3 - Dos trabalhos investigativos 
Para apuração dos fatos, foram realizadas inúmeras reuniões, colhidos depoimentos e requisitados documentos para análise a diversas serventias, órgãos e entidades da administração do Estado, os quais se encontram sob a guarda da Secretaria da Comissão. 
Ao mesmo tempo, os membros da Comissão receberam as demandas de particulares, promoveram visitas a diversas serventias de registro imobiliário e de protesto de títulos, colhendo informações de toda natureza que pudessem servir de subsídio para as conclusões dos trabalhos desenvolvidos. 
3.1 - Das visitas realizadas 
A Comissão pôde constatar, "in loco", a inexistência de uma efetiva fiscalização quanto ao recolhimento dos tributos correspondentes à prática dos atos notariais e de registro, bem como a presença de problemas relativos à qualidade na prestação do serviço e ao mecanismo de controle dos atos notariais. 
Apenas como exemplo, pode-se citar a expedição de certidão dos protestos realizados a cada dia, por solicitação dos bancos de dados de restrição ao crédito, como SPC e SERASA, que permite a inclusão de diversos nomes em uma única certidão. Ao registrador, entretanto, é exigida a utilização de um selo correspondente a cada nome constante da certidão, o que dificulta sobremaneira o controle do ato, desvirtuando, desse modo, a utilização do selo. 
Os membros da CPI tiveram acesso aos relatórios das inspeções realizadas pela Corregedoria-Geral de Justiça, que também sugerem a inexistência de controle quanto ao recolhimento aos cofres públicos das taxas devidas em decorrência da prática dos atos notariais e de registro. 
Compete ao Poder Judiciário lidar com tais problemas, mas exercendo um maior controle sobre os atos e facilitando, ainda, o atendimento às partes que procuram os serviços das serventias do foro extrajudicial. 
3.2 - Da coleta de dados na Secretaria de Estado da Fazenda 
A Taxa de Fiscalização Judiciária é um tributo instituído por lei, cujo recolhimento, em princípio, deveria ser fiscalizado por técnicos da Secretaria de Estado da Fazenda. 
A legislação, entretanto, delegou ao Poder Judiciário a fiscalização dos atos de registro e notariais, como também a fiscalização das serventias, inclusive no que tange ao recolhimento da Taxa de Fiscalização Judiciária, atribuindo essa competência à Corregedoria-Geral de Justiça e ao Juiz Diretor do Foro. 
Em face da experiência dos técnicos fazendários relativamente à fiscalização e ao levantamento de dados para constatação da evasão de divisas, a CPI decidiu buscar subsídios ao seu trabalho por meio de requerimentos, solicitações pessoais e visita ao Secretário-Adjunto da Fazenda, que se prontificou a colaborar para a devida apuração dos fatos. 
Embora o Secretário-Adjunto considere que a responsabilidade pela fiscalização do recolhimento do tributo seja da alçada do Poder Judiciário, forneceu à CPI documentos de grande valor para a apuração do desvio de recursos que deveriam ser carreados aos cofres públicos. 
Entre os documentos requisitados àquele órgão podem-se citar as planilhas contendo o volume da arrecadação dos recursos relativos à Taxa de Fiscalização Judiciária, em períodos anteriores e posteriores à efetiva obrigatoriedade de utilização do selo a ser aposto nos documentos expedidos pelos notários e registradores. 
3.3 - Dos depoimentos prestados 
3.3.1 - Dr. Eugênio Klein Dutra - Titular do Cartório do 6º Ofício de Registro de Imóveis de Belo Horizonte e Presidente do Sindicato dos Notários e Registradores de Minas Gerais - SINOREG-MG 
Após fazer considerações sobre a competência constitucional para a fiscalização dos atos praticados pelos notários e registradores, o depoente adiantou as informações divulgadas na imprensa relativas à correição recentemente realizada em todas as serventias do Estado de Minas Gerais. 
Fez alusão ao pronunciamento da Juíza Corregedora Mariza de Melo Porto, que, em entrevista ao jornalista Rogério Tavares, assegurou que nenhuma irregularidade grave foi constatada e que as recomendações para o aprimoramento dos serviços já haviam sido feitas, caso a caso. 
Criticou o papel da mídia, que procura retirar a credibilidade das serventias do foro extrajudicial, o qual, segundo o depoente, presta, de forma eficiente e correta, relevantes serviços à cidadania. 
Teceu críticas aos trabalhos da CPI, à qual, segundo o depoente, não compete exercer a fiscalização dos serviços notariais e de registro. 
Buscando argumentos na legislação federal e em súmulas do Supremo Tribunal Federal, taxou de inconstitucional e ilegal a Lei nº 12.727, cujas alterações porporcionaram a instituição do Selo e da Taxa de Fiscalização Judiciária. 
Sugeriu reformulações na lei que instituiu a Taxa de Fiscalização Judiciária para que fosse retirada desta a pecha de inconstitucionalidade. 
Protestou contra o fato de os notários e registradores estarem obrigados a fiscalizar o recolhimento de tributos federais, estaduais e municipais de forma gratuita, estando eles a exercer uma função fiscalizadora muito mais eficiente do que a exercida pelos próprios fiscais. 
Demonstrou, mediante apresentação de dados numéricos, os custos para manutenção de uma serventia, sugerindo a redução do valor da taxa para melhor viabilizar a atividade dos notários e dos registradores. 
Interrogado, esclareceu que a legislação prevê a obrigatoriedade de proceder-se a uma correição, a cada ano, nas serventias, o que não tem ocorrido com regularidade. Disse ser possível que ocorra, no interior do Estado, que a serventia permaneça sem nenhuma fiscalização por períodos superiores a três anos. Lembrou a instituição de selos na administração Campos Sales, que abandonou essa prática em face do fracasso na fiscalização mediante a utilização desse método. Reportou-se à implementação da fiscalização por meio de selo no Estado de São Paulo onde já foram baixados 70 provimentos. Fez críticas às exigências da Corregedoria-Geral de Justiça, que, por meio de provimento, exige um selo para cada unidade que componha o edifício incorporado ou um selo para cada lote, no caso de loteamentos. 
3.3.2 - Wolfgang Jorge Coelho, Presidente da Associação dos Notários e Registradores de Minas Gerais - ANOREG-MG 
Em depoimento, disse parecer incorreta a declaração do Deputado Miguel Martins de que há de 90% a 95% de sonegação no recolhimento dos tributos pertencentes ao Estado, por parte das serventias de Minas Gerais. Informou que, em sua serventia, não houve alteração de arrecadação decorrente da implantação do sistema de controle por meio de selos. Confirmou ser feita a correição anual pelo Juiz Diretor do Fórum, em sua serventia, que também é objeto de fiscalização mensal. Esclareceu que o Contador do Fórum, por delegação de competência por parte do Juiz Diretor, fiscaliza a arrecadação das serventias. 
3.3.3 - Luiz Carlos Gonçalo Eloy, Diretor-Geral da Secretaria do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais O depoente entregou à CPI relatório contendo o repasse ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais nos meses de abril e maio de 2002, dos valores relativos à Taxa de Fiscalização Judiciária, conforme consta no Decreto nº 4.976, de 28/3/2000, e também dos valores repassados às serventias do registro civil pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Discorreu sobre as variações entre as arrecadações de 2001 e 2002, não podendo afirmar se as discrepâncias apontadas são decorrentes da evasão denunciada pelo Deputado Miguel Martini. Reconhece a existência de uma fiscalização esporádica, lembrando que a instituição da taxa tem o intuito de melhor aparelhar o Tribunal de Justiça para efetivar a fiscalização. Esclareceu que a verificação de eventual recolhimento da taxa compete à Secretaria de Estado da Fazenda, havendo, eventualmente, a ação dos dois órgãos em conjunto. 
3.3.4 - José Antônio Braga, Juiz da Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais 
O Juiz da Corregedoria-Geral de Justiça, por seu turno, também deixa aflorar dificuldade do Poder Judiciário para o exercício de atividades típicas do Fisco, como é o caso da fiscalização do recolhimento da Taxa Judiciária por parte dos cartórios. Reconhece a necessidade do trabalho conjunto com Agentes Fazendários, até mesmo pela falta de competência do Juiz para lavrar autuação de natureza tributária. Fez abordagens sobre a Lei nº 12.920, oriunda de projeto de autoria do Deputado Ivair Nogueira, que facultou a criação de serventias sem que elas pudessem ser implementadas, pelo fato de não terem sido efetivamente criadas pela lei. Sugeriu parceria entre a Assembléia Legislativa e o Tribunal de Justiça para promoção de estudos com o objetivo de redefinir o número de serventias extrajudiciais do Estado, com base nos critérios populacionais, e o número de atos praticados pelos titulares, dados esses que já estão sendo coletados pela Corregedoria. Manifestou o depoente concordância com o posicionamento assumido pelo Presidente da CPI quanto à necessidade de promover uma ampla informatização dos cartórios, em benefício de toda a população. Reconheceu a implantação do selo como um mecanismo para melhor acompanhamento da receita proveniente da prestação do serviço. 
3.4 - A Lei nº 12.920, de 29/6/98 
A Lei nº 12.920, de 29/6/98, oriunda de projeto de autoria do Deputado Ivair Nogueira, Vice-Presidente desta Comissão, fixa critérios populacionais, socioeconômicos e estatísticos para a criação, a fusão e o desmembramento de serviços notariais e de registro, regulamentando o dispositivo constante no art. 278 da Constituição mineira. 
Conforme consta no art. 1º da lei aprovada por esta Casa Legislativa, poderão ser criadas tantas serventias quantas resultarem da redivisão de zona ou comarca, com as respectivas jurisdições, que tenha mais de 150 mil habitantes e na qual os serviços notaraiais e os de registro tenham ultrapassado, no triênio, a média mensal de 400 atos remunerados, não se incluindo nesse número as certidões, os atos cujos emolumentos sejam reduzidos ou dispensados por disposição de lei federal, os protocolos de documentos de dívida que não resultem na lavratura de protesto, o reconhecimento de firmas e as autenticações de cópias. 
Segundo a orientação constante no art. 278 da Constituição do Estado e também na Lei nº 8.935, de 18/11/94, o legislador considerou parâmetros populacionais, socioeconômicos e estatísticos para a formulação da proposta, facultando a criação de numerosas serventias em diversas comarcas do Estado. A efetiva implantação das serventias, entretanto, ainda não veio a ocorrer, por razões que conflitam com os interesses de toda a sociedade. Segundo o Juiz José Antônio Braga, da Corregedoria-Geral de Justiça, a Lei nº 12.920 não contém comando de ordem impositiva, pois apenas faculta a criação das serventias, tornando-se necessária a reformulação do dispositivo constante em seu art. 1º, para que seja entendida como regra geral, absoluta e imperativa. 
A imediata implantação das serventias cogitadas pela lei amenizaria sobremaneira o problema enfrentado pela população, no tocante à qualidade dos serviços, uma vez que a redistribuição das competências entre diversas titularidades por certo diminuirá em muito o volume de trabalho dos cartórios já existentes, o que possibilitará um atendimento mais eficaz da população. 
4 - Conclusão 
4.1 - Atualmente, não há nenhuma controvérsia quanto à natureza pública dos serviços prestados pelas serventias extrajudiciais, haja vista o reconhecimento desse fato pela própria legislação correlata à matéria, pela doutrina e, notadamente, pela jurisprudência oriunda das mais diversas instâncias judiciárias do País. 
Tratando-se de serviço público, deve este ser prestado à luz dos princípios norteadores da atividade pública, levando-se em conta o atendimento das necessidades dos destinatários, a eficiência, a segurança e, especialmente, a modicidade das custas e emolumentos, os quais, lamentavelmente, oneram sobremaneira todos aqueles que dependem da atividade das serventias extrajudiciais. Os custos desses serviços, a propósito, repercutem até mesmo no preço das unidades imobiliárias disponibilizadas ao mercado pelos empresários da construção civil, haja vista os excessivos valores cobrados pelo registro de incorporações imobiliárias e desmembramentos, entre outros. 
A verdade é que tais princípios têm sido ignorados na efetiva prestação do serviço. Têm chegado a esta Comissão reclamações acerca da descortesia dos empregados das serventias, da imposição de dificuldades de toda ordem para a prática dos atos e, até mesmo, do desdobramento de atos em vários outros, para que possa ser conferida uma maior arrecadação por parte da serventia. 
Em Belo Horizonte, particularmente, a Comissão constatou a existência de filas intermináveis, que geram fadiga em todos aqueles que dependem dos serviços notariais. De maneira geral os cartórios ocupam instalações precárias que obrigam os usuários a aguardar em pé a hora do atendimento, sem que lhes seja disponibilizado um assento, a oportunidade de matar a sede ou a possibilidade de satisfazer suas necessidades fisiológicas. 
O mais interessante é que os cartórios que mais arrecadam a título de emolumentos são os que apresentam instalações mais precárias, deixando de repassar para a sociedade um pouco do vultoso ganho que representa a cobrança pela prática dos atos notariais. 
Essa situação torna-se patente na medida em que se constata que há anos não se procede à criação de novas serventias, de modo a acompanhar o crescimento demográfico e econômico das mais diversas regiões do Estado. 
É oportuno lembrar que a Constituição do Estado, por força do disposto em seu art. 278, confere a esta Casa Legislativa a prerrogativa de fixar, por meio de lei ordinária, os critérios populacionais, socioeconômicos e estatísticos, para criação, fusão e desmembramento dos serviços notariais e de registro. 
É bem verdade que muitos notários e registradores ocupam serventias que pouco arrecadam e inviabilizam até mesmo a manutenção de servidores que possam prestar serviços condizentes com os anseios da sociedade. 
Por outro lado, outras serventias de registro imobiliário, protesto de títulos e notas das grandes cidades do Estado têm-se prestado a constituir uma casta de notários e registradores que, muitas vezes, oferecem serviços de qualidade questionável e acabam por obter ganhos incompatíveis com a qualidade do atendimento. 
Torna-se importante, diante do quadro delineado, acolher a sugestão do Juiz Corregedor José Antônio Braga, que prestou depoimento a esta CPI, de que se constitua comissão formada por membros do Poder Judiciário, da Corregedoria-Geral de Justiça, do Poder Legislativo, da Secretaria de Estado da Fazenda, por empresários da construção civil e por entidades representativas da sociedade, para minucioso estudo sobre a matéria. 
Essa comissão teria como principal objetivo o levantamento de dados e a realização de estudos, com o propósito de aprimorar a prestação dos serviços notariais mediante redivisão das serventias, adoção de exigências mínimas quanto às instalações das dependências físicas da serventia, instituição de mecanismos de controle dos atos notariais e do recolhimento dos tributos a eles correspondentes. 
Para a consecução desses objetivos, a comissão não pode deixar de levar em conta os dados que serão disponibilizados pela Corregedoria relativos ao número de atos praticados pelas serventias e à arrecadação, a título de emolumentos, nem os dados colhidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE - quanto à população correspondente às comarcas, em estrita consonância com o disposto na Constituição do Estado. 
Mediante a conjunção desses elementos e dos esforços de todos os colaboradores, esta Casa terá a condição mínima para formular proposta de lei a fim de definir, em todo o Estado de Minas Gerais, um novo quadro para as serventias extrajudiciais, em nome do interesse maior de toda a população mineira. 
Essa proposta não poderá deixar de atender um pleito de toda a sociedade, ratificado pelos parlamentares desta CPI, para que se implemente, o mais rápido possível, a completa informatização dos serviços notariais. Tal medida, conjugada com a alteração da legislação, permitirá ao adquirente de um imóvel registrá-lo no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca que melhor atender os seus interesses, seja quanto à qualidade na prestação do serviço, seja quanto ao preço cobrado a título de emolumentos. 
Com a adoção dessas providências, estar-se-ia, também, a formular uma verdadeira redistribuição de renda no Estado, pois é público e notório que muitas serventias de cidades que experimentaram grande crescimento econômico e demográfico arrecadam vultosas somas a título de emolumentos sem, contudo, prestar um serviço de qualidade. Por outro lado, inúmeras outras serventias se vêem obrigadas a prestar serviços adequados sem arrecadar o mínimo suficiente para a manutenção dos serviços básicos. 
O resultado dessas ações seria a melhor qualidade dos serviços notariais disponibilizados ao público, mediante diminuição de filas, instalações mais cômodas e rapidez na prestação dos serviços. 
A imediata implementação das medidas preconizadas pela Lei nº 12.920, de 29/6/98, que fixa critérios populacionais, socioeconômicos e estatísticos para criação, fusão e desmembramento de serviços notariais e de registro, poderia amenizar o problema relativo ao volume de serviços das serventias das comarcas ali enumeradas. Entre elas, podem-se citar as cidades de Belo Horizonte, Betim, Contagem, Uberaba, Uberlândia, entre outras que sofreram verdadeira explosão demográfica, nos últimos anos, sem, contudo, ter alterado o seu quadro de serventias. 
A propósito, o relator desta CPI acolhe a iniciativa do Deputado Rêmolo Aloise, que, antecipando a conclusão dos trabalhos desta CPI, entendeu por bem sugerir emenda ao Projeto de Lei nº 2.463/2002, quando do seu trâmite na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária, a qual corrige a distorção existente no comando legal e visa à efetiva criação das serventias previstas nos demais dispositivos daquela norma. 
A aprovação do projeto, com a emenda sugerida, representa uma imediata adequação do número de serventias às necessidades da população das comarcas de grandes cidades mineiras, conforme se encontra ali enumerado. 
As tabelas que constam dos anexos da Lei nº 13.438, de 1999, estão a indicar a onerosidade dos serviços cartoriais. Cobram-se, por uma simples autenticação de documento, R$2,01, dificultando a vida daqueles que a todo instante necessitam dessa providência, seja para validar documentos tendo em vista a propositura de ações judiciais, seja para participar de concorrências públicas. Essas são apenas algumas das muitas situações que exigem sacrifício dos cidadãos para o pagamento dos emolumentos. 
Num país que possui mais de 50 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da miséria, os preços estipulados para os emolumentos e para a Taxa de Fiscalização Judiciária estão a contribuir para a inviabilização do exercício da cidadania, inflacionando o mercado em prejuízo de todos, haja vista o ônus que representam para os cidadãos comuns e empreendedores o pagamento de altos preços pelos serviços mais singelos e o enfrentamento dessa burocracia. 
O Estado não pode permitir que se vislumbre nessa atividade uma perspectiva de ganhos astronômicos para os registradores e notários. Muito menos pode procurar, por vias transversas, o aumento de receita, penalizando sobremaneira os contribuintes já sacrificados pelo grande volume de tributos que são obrigados a recolher. 
As tabelas correspondentes às custas e aos emolumentos devem, portanto, ser objeto de estudos e revisão por parte da comissão proposta, o que também se encontra na órbita de competência desta Casa Legislativa. 
A Secretaria de Estado da Fazenda apresentou a esta Comissão planilhas contendo a arrecadação da Taxa de Fiscalização Judiciária nos três meses anteriores e posteriores à instituição da obrigatoriedade do selo nos documentos cartorários, as quais passam a fazer parte deste relatório. Os dados colacionados demonstram, de forma inconteste, aumento significativo da receita tributária oriunda dos atos praticados pelas serventias após a implantação da obrigatoriedade da utilização do selo. 
Essa grave situação, por certo, decorre da falta de efetiva fiscalização e, quem sabe, da inexperiência dos membros do Poder Judiciário para, atendendo o comando da legislação, praticar atos fiscalizatórios da arrecadação dos tributos, atividade típica do órgão fazendário. 
Não se pode exigir de Juízes e servidores do Poder Judiciário, afeitos a atos meramente judiciais, a formação técnica para trabalhos de auditagem e de apuração de dados necessários à fiscalização dos recolhimentos tributários. 
Torna-se importante, sob esse aspecto, sugerir ao Corregedor-Geral de Justiça a formação de comissão mista para atuar de forma permanente na fiscalização da arrecadação tributária por parte das serventias. 
Essa comissão, composta por técnicos do Poder Judiciário e da Secretaria de Estado da Fazenda, receberia treinamento específico para que o trabalho de inspeção e de auditagem extrapolasse a superficialidade e passasse a verificar, ato por ato, documento por documento, guia por guia, o recolhimento do tributo, para que o Estado não seja lesado por escrivães pouco afeitos ao zelo com o bem público. 
Muitas serventias tiveram variações bruscas na totalidade da arrecadação mensal, o que deve ser motivo de prioridade para uma rigorosa inspeção e para apuração detalhada dos motivos da distorção existente entre os dados. Apurada a fraude, responde o seu autor pelo delito na esfera administrativa e judicial, sendo importante a remessa de cópia deste relatório, de imediato, ao Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. 
Outro ponto que deve ser considerado e que pode reverter em significativo benefício para os cidadãos diz respeito à possibilidade de facultar aos titulares das serventias de notas das comarcas do interior do Estado o exercício de suas atividades em toda e qualquer cidade mineira, mediante o deslocamento do oficial e do livro de notas. 
Essa medida, caso venha a ser adotada, institucionalizaria, entre as serventias, a concorrência "de fato", comum nos dias atuais, ainda que dissimulada. 
O oficial dos cartórios de menor movimento, no interior do Estado, teria liberdade para trabalhar nos grandes centros, oferecendo serviços a preços inferiores à tabela de custas e emolumentos, obrigado a manter, apenas e tão-somente, ao preço de tabela, a cobrança do tributo correspondente ao ato praticado. 
Em outras palavras, poderiam os oficiais dessas serventias oferecer o serviço a preços menores, abrindo mão de parte do que haveriam de arrecadar a título de emolumentos, numa concorrência saudável que, por certo, baixaria o custo dos serviços de emissão de escritura, reconhecimento de firma e autenticação de documentos, entre outros. 
Esta Comissão sugere medidas para o aprimoramento do sistema de controle mediante a aposição de selos nos documentos cartorários. 
Ouvindo-se depoimentos de titulares das serventias, de representantes de construtoras ou mesmo dos servidores dos cartórios, nota-se uma certa confusão inicial no processo de adoção do sistema de selos. 
Tome-se, a título de exemplo, o registro de uma incorporação imobiliária ou loteamento com dezenas de unidades, quando são exigidos selos correspondentes a cada apartamento ou lote, ao passo que o ato notarial de incorporação é único. 
Os membros da Comissão puderam constatar, em tais processos, a inclusão de inúmeras folhas apenas para que nelas fossem apostos os selos correspondentes às unidades, o que cria um processo de arrecadação tributária inusitado e custos excessivos para o empreendedor da construção civil. 
A mesma situação vem ocorrendo quando da emissão de certidões de protesto, por solicitação dos bancos de dados de restrição ao crédito. Em uma única certidão, com diversos nomes de pessoas e empresas protestadas, são apostos selos correspondentes a cada nome. 
A adoção dessa prática dificulta a fiscalização, que seria sobremaneira desburocratizada e mais prática quanto aos atos fiscalizatórios caso fosse utilizado um único selo para cada documento emitido. 
Por último, este relator acolhe as brilhantes sugestões apresentadas na fase de discussão deste relatório pelo Deputado Durval Ângelo, aprimoradas pelos Deputados Ivair Nogueira e Luiz Fernando Faria, no sentido de que sejam adotadas, ainda, as seguintes diligências: 
- anexação ao relatório do texto da emenda formulada pelo Deputado Rêmolo Aloise ao Projeto de Lei nº 2.463/2002, com o objetivo de alterar a redação da Lei nº 12.920, de 29/6/98, que fixa critérios populacionais, socioeconômicos e estatísticos para criação, fusão e desmembramento de serviços notariais e de registro; 
- imediata instalação de auditoria nos 100 maiores cartórios, tomando-se como parâmetro a arrecadação tributária, para levantamento dos atos notariais e de registro praticados nos últimos cinco anos e verificação da correspondente arrecadação tributária; 
- determinação no sentido de que o trabalho de auditoria seja acompanhado por membros do Ministério Público do Estado; 
- encaminhamento de recomendação aos membros das bancadas de Deputados e de Senadores do Estado de Minas Gerais no Congresso Nacional, para que venham a adotar providências com o escopo de alterar a Constituição da República e a legislação federal, a fim de que a competência para a prática dos atos notariais e de registro seja repassada aos municípios, preservando, outrossim, o direito adquirido pelos atuais titulares das serventias. 
Quanto às propostas de alteração sugeridas pelo Deputado Irani Barbosa, entendo estarem abrangidas pelo relatório, sendo que muitas das diligências sugeridas refogem à esfera de competência desta Comissão, uma vez inerentes às responsabilidades do Ministério Público e do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, podendo ser adotadas após o trabalho de auditoria a ser realizado em complemento das investigações levadas a efeito por esta CPI. 
Para a consecução dos objetivos almejados por esta Comissão torna-se importante o encaminhamento de cópia deste relatório para as seguintes autoridades: Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais; Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais; Corregedor-Geral do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais; Secretário de Estado da Fazenda; Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público do Estado de Minas Gerais; Deputados Federais e Senadores que compõem a bancada do Estado de Minas Gerais no Congresso Nacional. 
Esperam os membros desta CPI ter atendido, com o seu trabalho, os anseios da comunidade mineira, que sempre espera do administrador público conduta compatível com os interesses de toda a sociedade. 

Belo Horizonte, 17 de dezembro de 2002. 

Rêmolo Aloise, Presidente - Agostinho Silveira, relator - Durval Ângelo - Luiz Fernando Faria


Fonte: Jornal "Minas Gerais" - 19/12/2002