REGISTRO PÚBLICO - PROCEDIMENTO DE DÚVIDA - INICIATIVA DO 5º OFÍCIO DE
REGISTRO DE IMÓVEIS - MANDADO JUDICIAL DE REGISTRO PROVENIENTE DE AÇÃO DE
USUCAPIÃO - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO
Apelação Cível n° 1.0024.10.012559-0/001 - Comarca de Belo Horizonte -
Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Apelado: Benedito
Cândido - Relator: Des. Audebert Delage
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador Almeida Melo,
incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos
julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar
provimento.
Belo Horizonte, 12 de agosto de 2010. - Audebert Delage - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
DES. AUDEBERT DELAGE - Trata-se de apelação interposta pelo Ministério
Público do Estado de Minas Gerais contra sentença de f. 97/98 que, em
procedimento de dúvida suscitado pela Oficiala Substituta do 5º Ofício de
Registro de Imóveis de Belo Horizonte, o julgou improcedente.
Nas razões recursais de f. 100/103, o Ministério Público bate-se pela
reforma da sentença, alegando, em síntese, que a recusa do registro se deu
em razão da existência de disparidade manifesta entre a ordem judicial e a
conexão dos seus dados com o título. Afirma que a ação de usucapião, que
originou o mandado de averbação, foi ajuizada em desfavor de Abílio de Assis
Pereira, que não é proprietário do imóvel usucapiendo. Afirma que a
propriedade é de Geralda Pereira, que não participou da referida ação e cujo
nome não consta do mandado de averbação judicial. Pugna pela observância do
princípio da especialidade e da continuidade, aplicáveis aos registros
públicos. Aduz também que se mostra cabível a exigência de retificação do
mandado para fazer constarem os barracões que compõem o imóvel, ou, caso
esses barracões não mais existam, que seja apresentada a certidão de
demolição a ser diligenciada na prefeitura.
Contrarrazões às f. 105/111.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, com vista dos autos, à f. 120,
absteve-se de opinar sobre o recurso interposto.
Conheço do apelo, visto que preenchidos seus pressupostos de
admissibilidade.
Cuidam os autos de procedimento para a instalação de dúvida sobre registro a
ser feito por oficial do cartório competente, medida que se encontra
prevista no art. 198 da Lei nº 6.015/73, in verbis:
"Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não
se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo
satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida,
remetido ao juízo competente para dirimi-la, obedecendo-se ao seguinte:
[...]".
Dessa forma, trata-se de procedimento de caráter administrativo que tem por
objeto material a recusa do registro de um título no registro de imóveis,
consubstanciado no "Mandado para Registro da Sentença" de f. 37-TJ, em que o
Juiz da 22ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte efetuou a seguinte
determinação ao Oficial do Cartório do 5º Ofício de Registro de Imóveis:
"que, em cumprimento ao presente mandado, extraído dos autos do usucapião do
imóvel constituído pelo lote 11 do quarteirão 03 da Vila Humaitá, atual lote
11 da quadra 127, Bairro Santa Cruz, situado na Rua Paulo Timóteo
Nascimento, nº 39, confrontando pela direita com o lote 09 de Leopoldo
Arcanjo Evangelista, pela esquerda com o lote 13 de propriedade de Marieta
Vilela, pelos fundos com o lote 12 de Geraldo Rosa de Miranda e pela frente
com a Rua Paulo Timóteo Nascimento, a requerimento de Benedito Cândido,
brasileiro, casado, industriário, contra Abílio de Assis Pereira, Processo
nº 024.95.058903-6, sendo à causa atribuído o valor de R$ 10.000,00,
proceda-se com observância das formalidades legais, a transcrição da
sentença que decretou o usucapião a favor dos requerentes, do imóvel acima
descrito [...]".
Observa-se que o referido mandado se origina de ação de usucapião em que o
autor, Benedito Cândido, obteve a procedência do pedido inicial, declarando
o domínio da parte autora sobre o imóvel constituído pelo lote 11 do
quarteirão 03 da Vila Humaitá, Belo Horizonte - MG (f. 38-TJ).
O oficial suscitante fundamenta a presente dúvida na divergência de
informações contidas no mandado judicial de averbação e na matrícula do
imóvel.
Por sua vez, o Juízo a quo julgou improcedente o pedido por entender que
"não pode o oficial proceder ao exame intrínseco do documento judicial" (f.
98).
O Ministério Público, ora apelante, argumenta que seria indevida a
pretendida averbação, na medida em que consta no mandado nome diverso da
real proprietária, de forma que a ação de usucapião não foi ajuizada em face
da verdadeira proprietária. Além disso, o mandado faz referência apenas ao
lote, de forma que deveria ser retificado para especificar acerca das
benfeitorias constantes no registro do imóvel.
A meu juízo, não merece acolhida a tese recursal, devendo ser mantida
decisão que julgou improcedente o pedido inicial.
De fato, a dúvida é procedimento de natureza administrativa que não comporta
discussão acerca do mérito da decisão judicial proferida nos autos da ação
declaratória que gerou o mandado judicial a ser registrado. No caso em tela,
verifica-se que a dúvida suscitada interfere diretamente no mérito da ação
de usucapião, ao discutir acerca da não participação do proprietário contido
no registro.
Aplica-se ao caso em tela o disposto no art. 945 do CPC: "A sentença que
julgar procedente a ação será transcrita, mediante mandado, no registro de
imóveis, satisfeitas as obrigações fiscais".
Também não há falar que não esteja devidamente especificado o imóvel
usucapido, de forma que a decisão deve ser cumprida integralmente, uma vez
satisfeitos os requisitos legais e atendidos os limites do procedimento de
dúvida.
Assim já decidiu este Tribunal:
"Com efeito, na suscitação de dúvida não cabe discussão a respeito do mérito
da questão retratada pelo título. Nem pelo oficial cartorário, nem pelo
julgador. A dúvida registrária é um procedimento administrativo de rito
sumaríssimo, determinado, em princípio, pela Lei de Registros Públicos e em
outras normas extravagantes, em que se discute simplesmente a possibilidade
do registro.
Nesse diapasão, o magistrado não julgará, de forma direta, eventual conflito
de interesse entre o apresentante do título e aquele que se julga titular do
direito controvertido. Ele estará latente no processo de dúvida, mas não
será apreciado pelo juiz. O juiz deve atuar no processo como uma autoridade
da Administração Pública, como um corregedor administrativo, tal como em
qualquer processo em curso numa repartição do Executivo ou do Legislativo.
Em tais circunstâncias, o juiz corregedor voltará para a regularidade formal
dos registros. Da mesma forma, a atuação do tabelião está limitada a
verificar se o documento apresentado para registro preenche os requisitos
previstos em lei.
E a lei determina que a sentença que julgar procedente o pedido de
usucapião, com a conseqüente expedição do título definitivo de domínio, será
transcrita no registro de imóveis mediante mandado judicial.
É o que reza o art. 945 do Código de Processo Civil, expressis verbis:
'A sentença que julgar procedente a ação será transcrita, mediante mandado,
no registro de imóveis, satisfeitas as obrigações fiscais'.
[...]
Portanto, na espécie, em se tratando de mandado judicial determinando o
registro da sentença que julgou procedente o pedido formulado em ação de
usucapião, não competia ao oficial cartorário indagar se o imóvel em questão
poderia ou não ter sido usucapido, ou seja, discutir o teor do título
judicial levado a registro. Não consta na esfera de atribuições a ele
conferidas proceder a questionamentos acerca da possibilidade de ser o
aludido imóvel terra devoluta e, por conseguinte, insusceptível de ser
adquirido pela usucapião. Caberia a ele, simplesmente, cumprir o mandado
judicial, após observados os procedimentos de estilo" (Apelação
Cível/Reexame Necessário nº 1.0556.02.002742-2/001, TJMG, Rel. Des. Brandão
Teixeira, j. em 19.04.2005).
Ante tais considerações, nego provimento ao recurso.
Custas, ex lege.
DES. MOREIRA DINIZ - De acordo.
DES.ª HELOÍSA COMBAT - Sr. Presidente. Trata-se de uma suscitação de dúvida
e verifiquei, cuidadosamente, nos autos, que houve uma falha dos
tabelionatos de Registro de Imóveis de Belo Horizonte, bastando ver que a
certidão do 3º cartório, f. 69, consta que esse lote, nº 11, estava, até
2004, em nome de Abílio de Assis Pereira contra quem foi ajuizada ação de
usucapião. Por sua vez, esse mesmo lote consta em nome de Geralda Pereira no
1º Ofício de Registro de Imóveis. São registros díspares e isso não pode
originar prejuízo ao autor da ação.
A dúvida foi proposta, suscitada pelo Tabelião do 5º Ofício de Registro de
Imóveis, alegando que não haverá a continuidade registral necessária, mas,
se for tido em conta o registro do 3º Cartório, estará, perfeitamente,
adequado o registro, porque lá consta o nome de Abílio de Assis Pereira. De
resto, como bem salientou o Relator, compete ao tabelião cumprir o mandado
de averbação tal qual disposto pelo Magistrado das Varas de Registros
Públicos. Portanto, nego provimento ao recurso.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.
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