É possível que terceiros que adquiriram
imóvel dos mutuários originários – réus em ação de execução hipotecaria
– paguem as prestações atrasadas do financiamento habitacional, a fim de
evitar que o imóvel seja levado a leilão. O entendimento é da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Companhia Real de Crédito Imobiliário recorreu ao STJ tentando
reverter decisão do Judiciário do Rio Grande do Sul que, em ação de
execução hipotecária movida pelos adquirentes originais do imóvel,
admitiu o pagamento do débito pelo terceiro que adquiriu os direitos do
bem.
Para a Companhia, o terceiro só pode pagar se quitar a totalidade da
dívida, e não apenas as parcelas em atraso, que foram o motivo da ação
de execução. O entendimento da empresa é o de que, se a dívida não for
paga por inteiro, permanece a relação jurídica com os devedores
originários de forma que não pode ser aceito o pagamento em nome de
terceiros, os quais, alega, não têm qualquer vínculo com a instituição
credora.
No STJ, o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, destacou parte do
voto do relator no Tribunal gaúcho, o qual afirmou que o terceiro é
diretamente interessado na regularização da dívida que pende sobre o bem
financiado, uma vez que celebrou com os mutuários originários contrato
de promessa de compra e venda, ocasião em que lhe foram cedidos os
direitos sobre o bem. "Não se perquire, aqui, da concordância ou não do
agente financeiro com a transação e sim de sua objeção em receber o
valor executado e efetivamente devido, sob a alegação de que o pagamento
deve abranger o total do financiamento contratado, ou seja, inclusive
prestações não vencidas", ressaltou o desembargador. Para aquele
magistrado, o objetivo, ao propor a ação de execução, é ver pago o
débito vencido. "O fato de terceiro honrar o débito em nome do devedor
não modifica essa situação. O importante é que a dívida, objeto da ação,
seja paga e não a pessoa que a pagou."
Entende o ministro Aldir Passarinho Junior que está correta a decisão
anterior. "De efeito, como corretamente observado pelo Tribunal a quo,
não há que se confundir, por ora, a situação do terceiro que paga a
dívida do mutuário, para evitar a praça do imóvel que adquiriu pelo
chamado ‘contrato de gaveta’, com a validade, em si, desta espécie de
avença, marginal à relação originária havida entre o credor hipotecário
e o mutuário financiado", ressalta.
O ministro afirma que, embora, em julgamentos anteriores, já tenha se
manifestado contrário à admissibilidade de tal "contrato de gaveta" – em
razão de ele não obrigar o credor, além do que os contratos regidos pelo
Sistema Financeiro de Habitação (SFH) devem atender a condições
específicas de cada mutuário, o qual não pode, sem o consentimento
expresso do financiador, transferir o imóvel sem a sua anuência e sem
renegociar a dívida, consoante a situação pessoal do novo comprador,
inclusive se reúne ou não a condição legal para obter financiamento
dessa espécie – no caso do recurso em julgamento, essa discussão não é
empecilho a que a quitação do débito em aberto se faça pelo terceiro.
"Apenas desaparece a dívida existente, porém sem que haja, com isso,
qualquer reconhecimento ou legitimação dos adquirentes ao financiamento.
Eles são apenas detentores do ‘contrato de gaveta’ e, como tal,
submetem-se a restrições próprias, na interpretação que se lhes vier a
ser dada pelo Judiciário, se houver litígio. Mas outro litígio,
específico, não este", conclui.
O próprio STJ, destaca o relator, tem decisões no sentido de que é
possível ao terceiro adquirente de casa própria financiada pelo Sistema
Financeiro de Habitação efetuar o pagamento das prestações mensais do
mútuo hipotecário, via ação consignatória. Assim como reconhece que
aquele que adquire o imóvel hipotecário é interessado, para os efeitos
do artigo 930 do Código Civil, no pagamento das prestações de resgate do
mútuo, porque a respectiva falta implica a execução da hipoteca.
|