Adoção. Para a sociedade, um ato de amor incondicional. Para o direito
brasileiro, um ato jurídico que cria relações de paternidade e filiação
entre duas pessoas; um ato que faz com que uma pessoa passe a gozar do
estado de filho de outra pessoa.
Independentemente do significado, o fato é que, no Brasil, cerca de 80 mil
crianças e adolescentes vivem em abrigos e cerca de oito mil delas estão
aptas para a adoção. Os dados estão no relatório do Instituto de Pesquisas
Econômicas Aplicadas (Ipea) de 2008. Naturalmente, a adoção não é concedida
a qualquer pessoa que tenha interesse. É preciso preencher algumas
formalidades e requisitos necessários para habilitar um pretendente.
Entretanto, depois do advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
em 1998, o processo de adoção, outrora muito complexo, demorado e
burocrático, ficou mais simples, mais rápido. O pleno funcionamento dos
Juizados da Infância e da Juventude igualmente colaborou com especiais
medidas de segurança para todas as partes envolvidas no processo de adoção.
Processos que discutem questões sobre adoção, como cadastro, pensão,
maioridade e até a possibilidade de realizar o ato mesmo com o falecimento
do adotante, chegam ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) frequentemente.
Até dezembro de 2008, a Corte recebeu cerca de 323 processos sobre o tema.
Cadastro
Os pretensos adotantes, depois de aprovados por um juiz, passam a integrar
um cadastro. Em 29 de abril de 2008, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
lançou o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), com a promessa de agilizar os
processos. Quando estiver totalmente implantado, o CNA fornecerá informações
sobre o número de crianças e adolescentes sob a tutela do Estado, quantidade
e localização de casais habilitados a adotar em todas as regiões, perfis
completos e dados sobre os abrigos.
Geralmente, os processos de guarda e adoção devem observar as cautelas
legais que se destinam à proteção da criança e à garantia da idoneidade do
procedimento, entre elas, o cadastro judicial. Entretanto, o STJ vem
decidindo que a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para
adotar determinada criança não é absoluta, devendo o magistrado observar,
com base no princípio do melhor interesse do menor, o estabelecimento de
vínculo afetivo com o casal adotante.
Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Tribunal em março deste ano, ao
determinar a devolução de uma criança de um ano e três meses a um casal de
Minas Gerais que havia perdido sua guarda para um outro casal inscrito na
lista. Os ministros da Turma reconheceram que o menor já havia formado
vínculo afetivo anterior, razão pela qual esse deveria ser o critério de
aferição.
No final do ano passado, a Quarta Turma, ao julgar processo semelhante,
entendeu que a ausência do casal adotante no cadastro de pretendentes à
adoção, por si só, não configura situação de risco e não afasta de maneira
definitiva a possibilidade de adoção.
Adoção póstuma
Para o STJ, a adoção póstuma pode ser concedida desde que a pessoa falecida
tenha demonstrado, em vida, inequívoca vontade de adotar e laço de
afetividade com a criança. Em um julgamento ocorrido em 2007 na Terceira
Turma, os ministros aplicaram esse entendimento e negaram o pedido das irmãs
de um militar contra a decisão da Justiça fluminense que admitira o direito
à adoção póstuma de uma criança de sete anos.
As irmãs alegavam que o militar não demonstrou em vida a intenção de adotar
a menina e que, por ser “solteiro, sistemático e agressivo”, além de ter
idade avançada (71 anos), o falecido não seria a pessoa indicada para adotar
uma criança, oferecendo-lhe um ambiente familiar adequado.
Segundo a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, o tribunal fluminense
concluiu, de maneira inequívoca, que houve a manifestação em vida da vontade
de adotar a criança, tanto que o militar chegou a iniciar o processo de
adoção. “O magistrado deve fazer prevalecer os interesses do menor sobre
qualquer outro bem ou interesse protegido juridicamente”, assinalou a
ministra.
Pensão
Considerado um Tribunal de precedentes, o STJ, em uma decisão inédita,
reconheceu a uma jovem o direito de receber alimentos do pai descoberto por
meio do exame de DNA, depois de ela ter sido adotada por uma viúva que
trabalhava no abrigo de crianças da cidade onde morava.
Baseada no entendimento da relatora, ministra Nancy Andrighi, a decisão
estabelece que, como não há vínculo anterior com o pai biológico para ser
rompido pela adoção, simplesmente porque jamais existiu tal ligação, não se
pode eliminar o direito da filha de pleitear alimentos do pai reconhecido na
ação investigatória.
Segundo a relatora, a questão deve ser vista sob a proteção dos menores
definida no ECA, em seu artigo 27, no qual “o reconhecimento do estado de
filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo
ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição,
observado o segredo de justiça”.
Maior idade
Quanto à adoção de maiores de idade, o Tribunal tem entendido que não é
necessária a aprovação dos pais biológicos. Ao julgar uma contestação em
sentença estrangeira originária de Munique, Alemanha, a Corte Especial citou
artigos do Código Civil Brasileiro (CCB) e do ECA que afirmam ser
desnecessário o consentimento nos casos em que os pais tenham sido
destituídos do poder familiar.
No caso, a Vara de Tutela do Juízo Cível de Munique pediu a homologação da
sentença que reconheceu a adoção de duas brasileiras por um cidadão alemão.
Ambas são filhas biológicas da atual esposa do alemão, que concordou com a
adoção. O pai biológico das adotadas foi citado para participar do processo.
Como não o fez, foi nomeado um curador para apresentar a resposta.
Em seu voto, o relator, ministro Teori Albino Zavascki, destacou que os
artigos 1.749, 1.767 e 1.768 do Código Civil alemão dispensariam a
autorização e que tal orientação é semelhante à do nosso ordenamento, como
indicam os artigos 1.621, 1.630 e 1.635 do CCB e o artigo 45 do ECA.
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