A procuradora-geral da República, Deborah Duprat, ajuizou nesta quinta-feira
(02), no Supremo Tribunal Federal (STF), Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF 178) com o propósito de levar a Suprema Corte
brasileira a declarar que é obrigatório o reconhecimento, no Brasil, da
união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, desde que
atendidos os requisitos exigidos para a constituição da união estável entre
homem e mulher. Pede, também, que os mesmos direitos e deveres dos
companheiros nas uniões estáveis sejam estendidos aos companheiros nas
uniões entre pessoas do mesmo sexo.
A petição da procuradora-geral está instruída com cópia da representação
formulada pelo Grupo de Trabalho de Direitos Sexuais e Reprodutivos da
Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e pareceres dos professores
titulares de Direito Civil e de Direito Constitucional da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Gustavo Tepedino e Luís Roberto Barroso. A
ela estão também anexadas cópias de decisões judiciais violadoras de
preceitos fundamentais na questão em debate.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) pede que a ação seja distribuída por
dependência à ADPF nº 132, ajuizada pelo Governador do estado do Rio de
Janeiro versando questão conexa. Essa ação foi distribuída ao ministro
Carlos Ayres Britto.
Igualdade
Na ação, a PGR sustenta que a união entre pessoas do mesmo sexo “é, hoje,
uma realidade fática inegável, no mundo e no Brasil”. E lembra que, em
sintonia com essa realidade, muitos países vêm estabelecendo formas diversas
de reconhecimento e proteção dessas relações.
“A premissa destas iniciativas é a idéia de que os homossexuais devem ser
tratados com o mesmo respeito e consideração que os demais cidadãos e que a
recusa estatal ao reconhecimento das suas uniões implica não só privá-los de
uma série de direitos importantíssimos de conteúdo patrimonial e
extrapatrimonial, como também importa em menosprezo a sua própria identidade
e dignidade”, sustenta a procuradora-geral.
Ela defende a tese de que “se deve extrair diretamente da Constituição de
88, notadamente dos princípios da dignidade da pessoa humana (artigo 1º,
inciso III), da igualdade (artigo 5º, caput), da vedação de discriminações
odiosas (artigo 3º, inciso IV), da liberdade (artigo 5º, caput) e da
proteção à segurança jurídica, a obrigatoriedade do reconhecimento da união
entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar”.
Sustenta ainda que, diante da inexistência de legislação infraconstitucional
regulamentadora, devem ser aplicadas analogicamente ao caso as normas que
tratam da união estável entre homem e mulher”
E pede que a equiparação pleiteada seja atendida logo, “independentemente de
qualquer mediação legislativa”, para aplicação imediata dos princípios
constitucionais por ela mencionados.
Ausência comprometedora
“A ausência desta regulamentação legal vem comprometendo, na prática, a
possibilidade de exercício de direitos fundamentais por pessoas
homossexuais, que se veem impedidas de obter o reconhecimento oficial das
suas uniões afetivas e de ter acesso a uma miríade de direitos que decorrem
de tal reconhecimento, que são concedidos sem maiores dificuldades aos
casais heterossexuais que vivem em união estável”
Isso ocorre, segundo ela, porque, “embora já existem no país algumas normas
tutelando, para finalidades específicas, a união entre pessoas do mesmo
sexo, ainda não há, em nossa ordem infraconstitucional, qualquer regra geral
conferindo a estas relações o tratamento de entidade familiar”.
Até pelo contrário, o Código Civil, em seu artigo 1723, circunscreve a união
estável às relações existentes entre homem e mulher, em sintonia com o
artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal (CF) de 1988. Dispõe esse
artigo que, “para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei
facilitar a sua conversão em casamento”.
Evolução
A procuradora-geral observa que tem havido evolução no reconhecimento
jurídico da união homossexual estável, tendo sido pioneiro o Tribunal de
Justiça do estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), no processo envolvendo os bens
deixados pelo artista plástico Jorge Guinle Filho, que faleceu depois de ter
convivido por 17 anos com parceiro do mesmo sexo. E, hoje, segundo ela, o
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já avançou em diversos pontos sobre
o assunto, declarando a competência das varas de família para julgamento das
ações de dissolução de união entre pessoas do mesmo sexo, viabilidade de
adoção conjunta de criança por casal homossexual e, também, da possibilidade
de reconhecimento dessas entidades familiares.
Também no campo previdenciário, há decisões de quatro Tribunais Regionais
Federais (TRFs) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), reconhecendo o
direito do homossexual ao recebimento de pensão do INSS ou estatutária, em
caso de óbito do seu companheiro ou companheira.
Processos relacionados
ADPF 178
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