Procuradoria Geral da República enviou ao Supremo Tribunal Federal parecer
pela improcedência da ação direta de inconstitucionalidade (ADI 4245)
ajuizada pelo partido Democratas (DEM) contra artigos da Convenção de Haia
sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças. Em caso de
entendimento contrário, o parecer sugere a modulação temporal dos efeitos da
declaração de inconstitucionalidade, para que tenha eficácia somente a
partir da denúncia da Convenção pelo Brasil.
A convenção tem por objetivo assegurar o retorno imediato de crianças
ilicitamente transferidas para qualquer Estado Contratante ou nele retidas
indevidamente. Segundo o parecer, o acolhimento da ação pode significar um
perigoso retrocesso na busca da difícil implementação do direito à
convivência familiar nos casos de retenção ilícita de crianças de cunho
internacional. "Esses casos eram de solução quase impossível, pois as
barreiras de acesso à Justiça nos litígios que envolvem mais de uma
jurisdição nacional são evidentes", diz.
A ação alega que dispositivos da Convenção de Haia amesquinharam a proteção
constitucional da criança e do adolescente e pede que seja atribuída aos
seus artigos 1º, 7º, caput, 11 e 18 interpretação conforme a Constituição,
no sentido de que o retorno imediato do menor e a adoção de medidas de
urgência só possam ser determinados após avaliadas as peculiaridades do
caso.
Mas o parecer junta dados da Nota Técnica da Secretaria Especial de Direitos
Humanos (SEDH) para mostrar que a experiência brasileira é extremamente
proveitosa, tanto na devolução criteriosa de crianças retidas ilicitamente
no Brasil quanto na obtenção da devolução de crianças retiradas do Brasil e
enviadas ao exterior. "Nesse último caso, obteve-se um excepcional alento às
famílias brasileiras na busca do retorno de suas crianças", diz.
Interesse da criança - Em relação aos artigos 12 e 13, b, da Convenção, o
parecer afirma que a ADI quer que o STF imponha aos juízes um direcionamento
forçado, ou seja, que analisem a situação não só da criança ou do
adolescente, mas do responsável pela subtração, que pode não querer voltar
ao Estado que ordenou a guarda ou direito de visita por diversos motivos,
inclusive profissionais. "Tal pretensão, no entanto, rotulada como
interpretação ampliativa, contraria a essência da proteção dos interesses da
criança e do adolescente nesse hipótese específica", afirma.
Ações - Sobre a declaração parcial de inconstitucionalidade, sem redução de
texto, dos artigos 7º, alínea f, e 21, para que se reconheça que o
ajuizamento de ações de busca e apreensão ou de regulamentação de visitas,
de forma direta, pela União, o PGR esclarece que há dois elementos que
autorizam, com suficiência, a intervenção da União. O primeiro é o interesse
jurídico em ver cumprido tratado internacional e as obrigações dele
decorrentes e o segundo é a tarefa administrativa de implementar a
Convenção, a cargo da Autoridade Central que é a SEDH.
Sentença estrangeira - O parecer analisa ainda a pretensão de interpretação
conforme a Constituição aos artigos 3º e 15 da convenção, no sentido de que
a produção de quaisquer efeitos envolvendo sentenças e decisões judiciais
não definitivas estrangeiras fique condicionada à prévia homologação do
Superior Tribunal de Justiça. Mas a Procuradoria Geral da República explica
que o autor parte de um equívoco ao considerar que a homologação de sentença
estrangeira é um veículo indispensável para a cooperação com outros Estados.
Segundo o parecer, na homologação da sentença estrangeira, cabe apenas um
juízo de delibação que, por definição, impede a rediscussão de fatos que
ensejaram a prolação da sentença estrangeira. "Caso a pretensão do autor
fosse atendida, a situação para aquele que quisesse resistir à devolução da
criança seria ainda pior: o juízo de delibação não permite espaço probatório
e restringe a defesa a aspectos formais ou à alegação de violação da ordem
pública", esclarece.
Rediscussão da guarda - A Procuradoria Geral da República considera que não
convencem o pedido de interpretação conforme ao artigo 16 para que seja
analisado, no Brasil, o mérito do direito de guarda, e de que seja declarada
a inconstitucionalidade do artigo 17, por suposta ofensa à proteção
constitucional da criança e do adolescente ao acesso à justiça, à separação
dos poderes e à garantia da coisa julgada. Para ele, esses artigos
representam um limite à jurisdição brasileira, imposto pelo Direito
Internacional e em consonância com o direito da criança e do adolescente à
convivência familiar.
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