Ementa: Embargos do devedor.
Instrumentos úteis ou necessários ao exercício da profissão. Pessoa
jurídica. Impenhorabilidade afastada.
- O corolário da norma disposta no art. 649, VI, do Código de Processo
Civil, de caráter marcadamente social, torna inviável a formalização da
penhora sobre aqueles instrumentos utilizados no exercício da profissão. Com
isso, buscou-se proteger a própria subsistência do indivíduo através da
manutenção do exercício da profissão, preservando o mínimo existencial e,
conseqüentemente, o princípio maior da dignidade da pessoa humana.
- Em princípio, tendo por objetivo essencial a preservação do sustento, o
âmbito de abrangência da norma alcança apenas as pessoas físicas, ou seja,
aqueles que vivem do trabalho pessoal próprio. Decerto que estendê-la também
às pessoas jurídicas acabaria por subverter a sua finalidade de humanidade,
consagrando verdadeira fraude contra credor.
Apelação Cível ndeg. 1.0024.05.799214-1/001 - Comarca de Belo Horizonte -
Apelante: Pampulha Eventos Ltda. - Apelada: TV Globo Ltda. - Relatora: Des.ª
Cláudia Maia
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em negar provimento.
Belo Horizonte, 7 de dezembro de 2006. - Cláudia Maia - Relatora.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
Assistiu ao julgamento, pela apelada, o Dr. Sérgio Pessoa de Paula Castro.
DES.ª CLÁUDIA MAIA - Trata-se de recurso de apelação interposto por Pampulha
Eventos Ltda. contra sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da
Comarca de Belo Horizonte que, nos autos de ação de embargos do devedor à
execução ajuizada por TV Globo Ltda., julgou improcedentes os pedidos
formulados, determinando, por conseguinte, o prosseguimento da execução.
Nas razões recursais de f. 69/77, a apelante esclarece que foi efetuada
penhora sobre 10 (dez) barracas, modelo piramidal, essenciais ao exercício
da sua atividade. Afirma que seria inegável a impossibilidade de a penhora
recair sobre bens indispensáveis e imprescindíveis à sua sobrevivência, sob
pena de violação ao art. 649, VI, do Código de Processo Civil. Assevera que
esta norma seria aplicável tanto para as pessoas físicas quanto para as
jurídicas, uma vez que a lei não faz distinção. Sustenta, por essas razões,
a nulidade da penhora efetuada nos autos e, conseqüentemente, de todos os
atos processuais praticados posteriormente.
A apelada apresenta contra-razões recursais, f. 88/92, alegando, em suma,
que a regra constante no inciso VI do art. 649 do Código de Processo Civil
não se aplicaria à apelante, por se tratar de pessoa jurídica. Colaciona
jurisprudência favorável às suas alegações.
É o relatório.
Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade,
conheço do recurso.
O inconformismo recursal não procede. Cinge-se a controvérsia instalada nos
autos em saber se a penhora efetuada nos autos da execução sobre as barracas
de propriedade da apelante incorreu em nulidade, em face do disposto no art.
649, VI, do Código de Processo Civil.
O dispositivo supracitado preceitua que:
"Art. 649 - São absolutamente impenhoráveis:
(...)
VI - os livros, as máquinas, os utensílios e os instrumentos, necessários ou
úteis, ao exercício da profissão".
Ao que se pode ver, o corolário da norma transcrita, de caráter marcadamente
social, torna inviável a formalização da penhora sobre aqueles instrumentos
utilizados no exercício da profissão. Com isso, buscou-se proteger a própria
subsistência do indivíduo através da manutenção do exercício da profissão,
preservando o mínimo existencial e, conseqüentemente, o princípio maior da
dignidade da pessoa humana.
Em princípio, tendo por objetivo essencial a preservação do sustento, o
âmbito de abrangência da norma alcança apenas as pessoas físicas, ou seja,
aqueles que vivem do trabalho pessoal próprio.
Decerto que estendê-la também às pessoas jurídicas acabaria por subverter a
sua finalidade de humanidade, consagrando verdadeira fraude contra credor.
Nesse sentido é a lição do festejado processualista Humberto Theodoro
Júnior:
"A impenhorabilidade, no caso, decorre do dever que cabe ao Estado de
assegurar condição de trabalho a todos os cidadãos. Protege-se, assim, o
'ganha-pão', em qualquer atividade profissional lícita, qualquer ocupação,
arte ou ofício, desde as mais rudimentares até as mais sofisticadas, dos
trabalhadores braçais até os profissionais liberais. O privilégio, todavia,
é apenas daqueles que vivem do trabalho pessoal próprio, de maneira que não
se inclui no dispositivo apreciado firma comercial, individual ou coletiva"
(in Curso de direito processual civil, 36. ed., Forense, 2005, v. II, p.
194).
Tal entendimento restou amplamente consagrado pelos tribunais pátrios; se
não, veja-se:
"Em princípio, a impenhorabilidade de instrumentos de trabalho somente se
aplica às pessoas físicas; não se aplica a empresas (RTJ 90/638). Assim: 'Os
bens móveis e imóveis de uma empresa são penhoráveis. A penhora de máquinas
industriais não priva a empresa de continuar suas atividades (RSTJ 73/401).'
No mesmo sentido: STJ-3ª T., Ag. 200.068-MG-Ag-Rg, Rel. Min. Nilson Naves,
j. em 04.03.99, negaram provimento, v.u., DJU de 04.03.99, p. 102; RT
669/130, 725/324, 731/282, RF 295/280, RJTJERGS 161/275, JTA 98/98, Lex-JTA
162/387, 167/309, RJTAMG 22/282, 62/308" (in NEGRÃO, Theotonio. Código de
Processo Civil e legislação processual em vigor. 31. ed., Editora Saraiva,
p. 676, nota 27 ao art. 649).
Diante do exposto, com respaldo nos princípios do livre convencimento
motivado e da fundamentação dos atos jurisdicionais, nego provimento ao
apelo, mantendo, na íntegra, a r. sentença.
DES.ª EULINA DO CARMO ALMEIDA - De acordo.
DES. FRANCISCO KUPIDLOWSKI - De acordo.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.
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