Rompimento legal e definitivo do vínculo de casamento civil, o divórcio é
matéria comum nos dias de hoje. De acordo com o estudo Síntese de
Indicadores Sociais 2010, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), a taxa de separação, entre 2004e 2008, manteve-se
estável em 0,8%. Já a taxa de divórcio passou de 1,15%, em 2004, para 1,52%,
com aumento mais significativo a partir de 2004.
Isso apenas para citar dados relativos aos casamentos dissolvidos. A
discussão abrange a separação das famílias como um todo, seja de um
casamento civil, seja de uma ruptura de uma união de fato, seja de um
relacionamento que não durou, mas deixou frutos. E são esse frutos que
levantam um outro debate:: como fica a situação financeira dos filhos?
A atenção ao assunto começa na própria Constituição Federal que, no artigo
229, ao tratar do dever de prestar pensão alimentícia, dispõe: “Os pais têm
o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores
têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade”.
A Lei do Divórcio (Lei n. 6.515/1977) também trata do tema na Seção IV, em
seu artigo 20: “para manutenção dos filhos, os cônjuges, separados
judicialmente, contribuirão na proporção de seus recursos”.
Mas... e quando os pais não conseguem arcar com a pensão imposta pela
Justiça? No resguardo deste direito, existe a figura da pensão avoenga, ou
seja, aquela que será prestada pelos avós do menor, quer em substituição,
quer em complementação à pensão paga pelo pai. Dessa forma, caso o pai não
pague, ou pague pouco, os avós serão acionados para cumprirem tal obrigação
(artigos 1.696 e 1.698, ambos do Código Civil de 2002).
Nesses casos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem decidindo que não
basta que o pai ou a mãe deixem de prestar alimentos. É necessário que se
comprove a impossibilidade da prestação, uma vez que a obrigação dos avós é
subsidiária e não solidária.
Isso porque a lei não atribuiu ao credor dos alimentos a faculdade de
escolher a quem pedir a pensão, uma vez que o devedor principal é sempre o
pai ou a mãe e somente na hipótese de ausência de condições destes é que
surge a obrigação dos demais ascendentes.
“A responsabilidade dos avós não é apenas sucessiva em relação à
responsabilidade dos progenitores, mas também é complementar para o caso em
que os pais não se encontrem em condições de arcar com a totalidade da
pensão, ostentando os avós, de seu turno, possibilidades financeiras para
tanto”, afirmou o então ministro Barros Monteiro, no julgamento do Recurso
Especial 70.740.
No caso, o menor, representado por sua mãe, propôs ação de alimentos contra
os avós paternos, visando à complementação da pensão alimentícia que vinha
sendo paga pelo pai. Em primeira instância, os avós foram condenados ao
pagamento dos alimentos fixados em dois terços do salário mínimo.
Os avós apelaram, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a sentença.
Inconformados, recorreram ao STJ sustentando que, vivo, o pai e contribuindo
mensalmente para a manutenção do menor, somente em falta dele é que o neto
poderia reclamar alimentos aos avós. Para o ministro Barros Monteiro, o fato
de o genitor já vir prestando alimentos ao filho não impede que este possa
reclamá-los dos avós paternos, desde que demonstrada a insuficiência do que
recebe.
No julgamento de um recurso especial, a Quarta Turma do Tribunal manteve
decisão que condenou os avós paternos de duas menores ao pagamento de pensão
alimentícia. O ministro relator do recurso, Ruy Rosado de Aguiar, entendeu
que, no caso, se o pai das menores é sustentado por seus pais, e não havendo
como receber dele o cumprimento da obrigação, o dever se transfere aos avós,
como reconhecido pela decisão do Tribunal de Justiça estadual.
“Se o pai deixa durante anos de cumprir adequadamente a sua obrigação
alimentar, sem emprego fixo, porque vive sustentando pelos seus pais, ora
réus, mantendo alto padrão de vida, estende-se aos avós a obrigação de
garantir aos netos o mesmo padrão de vida que proporcionam ao filho”,
assinalou o ministro.
Pai falecido
Em caso de falecimento do genitor do menor, o STJ aplica o mesmo
entendimento. O ministro Fernando Gonçalves, hoje aposentado, ao julgar um
recurso especial, manteve decisão que condenou avô paterno à prestação de
alimentos à sua neta, em virtude do falecimento do pai da menor, que não
deixou recursos para a família, nem mesmo benefício previdenciário. O
ministro somente reduziu o valor estabelecido inicialmente.
No caso, a menor, representada por sua mãe, ajuizou ação de alimentos contra
o avô paterno, devido ao falecimento do pai em acidente automobilístico. A
ação foi julgada procedente com fixação, em definitivo, dos alimentos em
valor equivalente a três salários mínimos.
Houve apelação, mas o Tribunal de Justiça da Paraíba manteve a decisão de
primeiro grau. No STJ, o avô paterno alegou a ausência de necessidade da
neta, que conta com o apoio dos parentes de sua mãe, mas, também, sustentou
a sua incapacidade econômica.
Em seu voto, o ministro Gonçalves destacou que o entendimento é de que o
dever de prestar alimentos é deferido legalmente aos pais e, apenas
subsidiariamente, aos avós. “Ao avô foi imposta a prestação de alimentos à
sua neta, em virtude do falecimento do vero responsável, pai da menor que,
por sinal, conforme noticiam as razões do recurso especial, por vários anos,
esteve sob a responsabilidade e o sustento de seus ascendentes pelo lado
materno”, assinalou o ministro.
Citação dos avós maternos
De acordo com o artigo 1.698 do novo Código Civil, demandada uma das pessoas
obrigadas a prestar alimentos, poderão as demais ser chamadas a integrar o
feito. Com esse entendimento, a Quarta Turma do STJ atendeu o pedido de um
casal de avós, obrigados ao pagamento de pensão alimentícia complementar,
para que os demais obrigados ao pagamento das prestações alimentícias fossem
chamados ao processo.
No caso, os três menores, representados pela mãe, propuseram ação de
alimentos contra seus avós paternos, alegando que o pai (filho dos réus) não
estaria cumprindo a obrigação que lhe fora imposta, qual seja, o pagamento
de pensão alimentícia mensal, no equivalente a 15 salários mínimos. Em razão
desse fato, os netos pediram que seus avós complementassem a prestação
alimentícia.
A juíza de primeiro grau, ao não acolher o pedido, esclareceu que a mera
inadimplência ou atraso no cumprimento da obrigação por parte do alimentante
não poderia, por si só, ocasionar a convocação dos avós para a satisfação do
dever de alimentar.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao acolher o apelo dos netos, concluiu
que aos avós paternos cabe complementar a pensão alimentícia paga pelo seu
filho diante da ausência de cumprimento da obrigação alimentar assumida
pelos pais das crianças. Inconformados, os avós paternos recorreram ao STJ.
Em seu voto, o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, já aposentado,
lembrou que não desconhece que a jurisprudência anterior do STJ orientava-se
no sentido da não obrigatoriedade de figurarem em conjunto na ação de
alimentos complementares os avós paternos e maternos. “No entanto”, afirmou
o ministro, “com o advento do novo Código Civil, este entendimento restou
superado, diante do que estabelece a redação do artigo 1.698 do referido
diploma, no sentido de que, demandada uma das pessoas obrigadas a prestar
alimento, poderão as demais ser chamadas a integrar o feito”.
No julgamento de outro recurso especial, a Quarta Turma também determinou a
citação dos avós maternos, por se tratar de hipótese de litisconsórcio
obrigatório simples. No caso, tratava-se de uma ação revisional de alimentos
proposta por menor, representada por sua mãe, contra o pai e o avô paterno.
Na contestação, em preliminar, os réus levantaram a necessidade de citação
também dos avós maternos, sob o entendimento de que devem participar como
litisconsórcio necessário. Mas ela foi rejeitada. O Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul manteve o entendimento.
No STJ, os ministros consideraram mais acertado que a obrigação subsidiária
– em caso de inadimplemento da principal – deve ser diluída entre os avós
paternos e maternos na medida de seus recursos, diante da divisibilidade e
possibilidade de fracionamento.
“Isso se justifica, pois a necessidade alimentar não deve ser pautada por
quem paga, mas sim por quem recebe, representando para o alimentado, maior
provisionamento tantos quantos réus houver no polo passivo da demanda”,
afirmaram.
REsp 70740
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