O Hospital e
Maternidade Pan-americano Ltda. terá de fracionar imóvel penhorado no
valor de R$ 10.688.728,00 para transferir parte a credores, os quais
ingressaram com ação de indenização e obtiveram êxito em sentença que
confirmou débito de R$ 1.074.356,00. A Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) acompanhou por unanimidade o voto do relator,
ministro Castro Filho, e manteve o acórdão da Décima Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP). O
entendimento é que, sendo esse valor muito inferior ao do imóvel
penhorado, foi necessário, em situação especial, conceder a posse de
parte da sede do hospital. A adjudicação é aceita, mas por preço não
inferior ao do valor do bem.
Determinada a execução de sentença em um processo que teve início em
1984, após a segunda praça sem licitantes, foi requerida a adjudicação
(ato de transferir ao exeqüente bens penhorados) de parte ideal do
imóvel, em proporção ao crédito de R$ 1.074.356,00, valor apurado em
ação de indenização. O pedido foi indeferido pelo juiz de primeiro grau
sob o fundamento de que o valor devido é muito inferior ao do bem,
avaliado em R$ 10.688.728,00. Entendeu que o artigo 714 do Código de
Processo é claro quanto à possibilidade da adjudicação, entretanto por
preço não inferior ao do valor do bem.
As credoras recorreram da decisão, obtendo êxito na Décima Câmara de
Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. O TJSP
admitiu a transferência parcial do imóvel, por fração ideal, na
proporção do valor devido por entender ser uma situação especial.
"Admissibilidade em situação especial, configurada quando não se
dispuser a devedora a providenciar superação de impasse decorrente de
não estar o imóvel regularmente desmembrado", diz o acórdão.
No recurso interposto contra essa decisão e julgado no STJ, o Hospital
de Maternidade sustentou, entre outros pontos, violação a artigos do
Código de Processo Civil (CPC). Diz que, anteriormente à praça, foi
pedida redução da penhora, o que lhe permitiria dispor de terreno
destacado, embora não estivesse desmembrado perante o Cartório de
Registro de Imóveis, mas lhe foi negada a solicitação, diante da
impossibilidade da divisão do imóvel perante o registro imobiliário.
Foi solicitada pela entidade o prazo de 30 dias para completar e
regularizar a situação do terreno, mas foi proferida esta decisão pela
Câmara do TJSP: "Conforme já decidido, a penhora será realizada de
imediato, podendo ser, após o desmembramento, reduzida." Feita a
penhora, o imóvel foi avaliado em R$ 10.688.728,00.
Assim, em seu recurso o Hospital argumenta, ainda, que, ao não admitir a
redução da penhora, permitiu ser levado à praça, para pagamento de uma
dívida de R$ 1 milhão, um imóvel avaliado em mais de R$ 10 milhões.
Sustenta violação ao CP quando deferida a adjudicação pelo valor do
crédito, "providência inadmitida pela lei processual."
Voto - Primeiramente, o relator afastou a ofensa ao Código de
Processo Civil ((artigos 503 e 473). Para o ministro, está correto o
acórdão ao salientar que o simples pedido, feito pelos exeqüentes, para
se localizar outros bens passíveis de penhora não significava
desistência implícita. O relator explica que essa providência se
destinava, tão-somente, a verificar a existência de outros bens
disponíveis do executado, caso se inviabilizasse o prosseguimento da
execução em relação ao imóvel penhorado.
O ministro analisa: "Portanto não configura ato incompatível com a
vontade de recorrer o fato de as credoras cogitarem da constrição de
parte da renda bruta ou do faturamento da executada, após uma demanda
longa, desgastante e coroada por uma execução pródiga em percalços".
Também considerou impertinente a argumentação em torno de artigo (473)
do código instrumental, "pois não se chegou a afirmar, em nenhum
momento, a indivisibilidade do bem penhorado (...)".
Observou, ainda, que o TJSP optou, sem desconhecer as regras do CPC, por
adequar os comandos legais ao princípio da efetividade processual em
prol da realização da justiça e da concreção do direito. O relator no
STJ citou trechos do relatório: "Não podem ficar as credoras, ora
recorridas, indefinidamente à mercê de artifícios usados pela empresa
executada, ora recorrente, com o fim de protelar a execução, como parece
estar ocorrendo – primeiro, nomeia bens à penhora que não lhe pertencem;
depois, requer que a penhora recaia apenas sobre uma parte do imóvel,
mas não providencia o desmembramento; e, agora, alega a impossibilidade
de divisão do imóvel (...)."
Segundo o ministro Castro Filho, depois de uma reflexão mais demorada e
examinada com maior profundidade a questão, convenceu-se do acerto do
Tribunal de origem ao deferir a adjudicação de parte ideal do imóvel
devedor: "Ainda que, aparentemente, destoe dos dispositivos legais
orientadores do procedimento para adjudicação por parte do credor." Para
o relator, o que se buscou foi efetividade e resultado.
Mesmo assim, lembra que a razão de ser do disposto no CPC é, sem dúvida,
não permitir o aviltamento do preço do imóvel praceado, para tanto, são
três os requisitos essenciais: a) findar a hasta pública sem lançador;
b) oferecimento de preço não inferior ao do edital; c) ostentar o
requerente legitimidade para o ato. Garante que, quanto aos pressupostos
"a" e "c", a praça terminou sem lançador e o requerente tem legitimidade
para o ato. Quanto ao item "b", afirma ser a "discrepância apenas
aparente". Isso porque o valor do bem foi respeitado e o credor ofereceu
o valor de seu crédito por uma parte ideal, respeitando,
proporcionalmente, o preço do edital.
Considera o ministro: "Claro que melhor seria se antes já se houvesse
desmembrado o imóvel, com penhora incidindo sobre a parte desmembrada,
mas isso só não ocorreu, ao que se afirma, por má vontade do devedor."
Assim, entendeu não haver reparos a serem feitos no acórdão do TJSP, mas
acrescentou: "Se à devedora pareceu possível antes desmembrar o imóvel,
para que a penhora recaísse sobre a parte desmembrada, o que não se
realizou, agora, feita a adjudicação da fração ideal, nas proporções
indicadas, nada impede que se faça o desmembramento, mantido o imóvel,
até então em condomínio." Ao finalizar seu voto, lembrou que tudo isso
poderá ser evitado se o credor saldar o débito com antecedência. |