CORREGEDORIA GERAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Proc. CG nº 421/2000
Registro de Imóveis.
Reserva Florestal Legal. Indeferimento de requerimento formulado pelo
Ministério Público visando a edição de portaria condicionando o
ingresso de ato translativo da propriedade imobiliária rural e de
desmembramento de tais imóveis no registro imobiliário à averbação
da reserva florestal legal. Indeferimento. Recurso não provido.
Excelentíssimo Senhor
Corregedor Geral da Justiça:
Trata-se de recurso
administrativo (f. 30/37) interposto pelo Ministério Público da
decisão (f. 24/28) do MM. Juiz Corregedor Permanente do Serviço de
Registro de Imóveis da Comarca de Jaboticabal que desacolheu
requerimento que objetiva condicionar, por portaria, o ingresso de
escrituras e outros documentos relativos a transmissão ou
desmembramento de imóveis rurais no registro imobiliário à
averbação da área de reserva legal.
O E. Conselho Superior da Magistratura não conheceu do recurso
determinando a remessa dos autos a esta Corregedoria Geral (f. 86/89).
É o relatório. OPINO.
Almeja o recorrente condicionar o ingresso no registro imobiliário dos
títulos translativos da propriedade imobiliária rural e de
fracionamento do imóvel rural à efetivação da averbação relativa
à área de reserva legal, sustentando que tal condicionamento decorre
da norma do § 2º do art. 16 do Código Florestal (Lei nº 4.771/65)
acrescido pela Lei nº 7.803/89, que determinou a averbação da área
destinada à reserva legal na matrícula imobiliária, coibindo a
alteração de sua destinação nos casos de transmissão, a qualquer
título, ou de desmembramento da área.
Sem razão, contudo, em que pesem as doutas opiniões em sentido
contrário.
É certo que o Código Florestal, no § 2º do art. 16, determina
imperativamente a averbação da reserva florestal legal na matrícula
imobiliária: "A reserva legal... deverá ser averbada à margem da
inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis
competente...".
Não há, porém, na lei, proibição de ingresso no registro
imobiliário de atos translativos da propriedade imobiliária rural ou
de fracionamento de tal imóvel se não for observada a determinação
relativa à averbação da reserva legal.
E o inolvidável Pontes de Miranda, ao comentar a Constituição Federal
de 1967 com a emenda nº 1, de 1969, já observava, quanto à garantia
constitucional da propriedade, que:
"O conteúdo e os limites do direito de propriedade
são definidos nas leis, de modo que só se garante, no art. 153, § 22,
a instituição da propriedade: são suscetíveis de mudança, em
virtude da legislação, o conteúdo e os limites mesmos da propriedade
e do direito de propriedade. Isso estava expresso na Constituição de
1937, mas subentendia-se antes (Comentários à Constituição de
1934, II, 184-185)." (in "Comentários à
Constituição de 1967 com a emenda nº 1 de 1969", Forense, 3ª
ed., 1987, Tomo V, pg. 397).
Ora, se é a lei que define o conteúdo e os limites do direito de
propriedade, a exigência da prévia averbação da reserva legal ao
ingresso na tábua registral dos atos translativos da propriedade
imobiliária rural e do desmembramento de tais imóveis deve ser imposta
por lei, não por ato administrativo.
E, nesse particular, calha colacionar a seguinte lição do ilustre Des.
Narciso Orlandi Neto, um dos estudiosos da matéria, em seu trabalho
intitulado "As Reservas Particulares e Legais do Código Florestal
e sua Averbação no Registro de Imóveis" inserto na obra
"Direito Ambiental em Evolução", organizada por Vladimir
Passos Freitas:
"A Lei 4.771 não estabelece nenhuma penalidade para a falta de
averbação da reserva legal. Prova disso é o art. 99 da Lei 8.171/91,
que, igualmente, sem estabelecer penalidade determinou:
'A partir do ano seguinte ao da promulgação desta Lei, obriga-se o
proprietário rural, quando for o caso, a recompor em sua propriedade a
Reserva Florestal Legal, prevista na Lei 4.771/65, com a nova redação
dada pela Lei 7.803/89, mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos
um trinta avos da área total para complementar a referida Reserva
Florestal (RFL).'"
"Não está o oficial do Registro de Imóveis impedido de praticar
atos de registro sem que conste da matrícula a averbação da reserva
legal. A lei não o proíbe. E observe-se que o legislador foi preciso
quando quis limitar a atividade do oficial, subordinando-o ao
cumprimento da exigência legal pelo proprietário. De fato, dispõe o
art. 37 do Código Florestal:
'Não serão transcritos ou averbados no Registro Geral de Imóveis os
atos de transmissão inter vivos ou causa mortis, bem como
a constituição de ônus reais sobre imóveis da zona rural, sem a
apresentação de certidão negativa de dívidas referentes a multas
previstas nesta Lei ou nas Leis estaduais supletivas, por decisão
transitada em julgado'".
"É evidente que se houvesse limitação à alienação ou à
oneração de bens imóveis pelo proprietário que não tivesse averbado
a reserva legal, ela estaria expressa na lei." (pg. 210).
E, em seguida, examinando diversos atos normativos expedidos pelo IBAMA,
conclui que:
"... a averbação da reserva legal é exigida para algumas formas
de exploração dos imóveis rurais, mormente para preservação da Mata
Atlântica. Não há, todavia, fora essas exigências constantes de atos
administrativos, nenhuma obrigatoriedade da averbação, nem ela
constitui requisito para o exercício da disponibilidade pelo
proprietário." (pg. 214).
E não se vislumbra afronta ao princípio registrário da continuidade
na transmissão da propriedade imobiliária ou no fracionamento do
imóvel sem a prévia averbação da reserva florestal legal.
Correta, portanto, no meu entender, a r. decisão ora atacada,
manifesto-me pelo não provimentos do recurso.
É o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada consideração de
Vossa Excelência, sub censura.
São Paulo, 16 de junho
de 2000. ANTÔNIO
CARLOS MORAIS PUCCI
Juiz Auxiliar da Corregedoria
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