Após sete anos de disputa judicial entre pai biológico e pai de criação, a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o registro
civil de uma menina deverá permanecer com o nome do pai afetivo. Os
ministros entenderam que, no caso, a filiação socioafetiva predomina sobre o
vínculo biológico, pois atende o melhor interesse do menor.
A criança nasceu da relação extraconjugal entre a mãe e o homem que, mais
tarde, entraria com ação judicial pedindo anulação de registro civil e
declaração de paternidade. A menina foi registrada pelo marido da genitora,
que acreditava ser o pai biológico. Mesmo após o resultado do exame de DNA,
ele quis manter a relação de pai com a filha.
Em primeira instância, o processo foi extinto sem julgamento de mérito por
ilegitimidade do pai biológico para propor a ação. Mas o juiz deu a ele o
direito de visita quinzenal monitorada. No julgamento da apelação, o
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou a alteração do registro
civil da menor, para inclusão do nome do pai biológico, e excluiu a
possibilidade de visitas porque isso não foi pedido pelas partes.
Seguindo o voto da ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso do pai
afetivo, os ministros reconheceram a ilegitimidade do pai biológico para
propor a ação. O Código Civil de 2002 atribui ao marido o direito de
contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher e dá ao filho a
legitimidade para ajuizar ação de prova de filiação.
A relatora destacou que o próprio código abre a possibilidade de outras
pessoas com interesse jurídico na questão discutirem autenticidade de
registro de nascimento. Segundo ela, o pai biológico pode contestar a
veracidade de registro quando fica sabendo da existência de filho registrado
em nome de outro. “Contudo, a ampliação do leque de legitimidade para
pleitear a alteração no registro civil deve ser avaliada à luz da conjunção
de circunstâncias”, afirmou a ministra.
Analisando as peculiaridades do caso, a relatora constatou que o pai afetivo
sempre manteve comportamento de pai na vida social e familiar, desde a
gestação até os dias atuais; agiu como pai atencioso, cuidadoso e com
profundo vínculo afetivo com a menor, que hoje já é adolescente. Ele ainda
manteve o desejo de garantir o vínculo paterno-filial, mesmo após saber que
não era pai biológico, sem ter havido enfraquecimento na relação com a
menina.
Por outro lado, a relatora observou que o pai biológico, ao saber da
paternidade, deixou passar mais de três anos sem manifestar interesse
afetivo pela filha, mesmo sabendo que era criada por outra pessoa. A
ministra considerou esse tempo mais do que suficiente para consolidar a
paternidade socioafetiva com a criança. “Esse período de inércia afetiva
demonstra evidente menoscabo do genitor em relação à paternidade”, concluiu
Nancy Andrighi.
Em decisão unânime, a Terceira Turma deu provimento ao recurso para
restabelecer a sentença na parte que reconheceu a ilegitimidade do pai
biológico para ajuizar ação de alteração do registro de nascimento. No
futuro, ao atingir a maioridade civil, a menina poderá pedir a retificação
de seu registro, se quiser.
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