O particular que ocupa área pública não tem direito à indenização por
benfeitorias que tenha construído, mesmo que a ocupação tenha ocorrido de
boa-fé. Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as
regras do direito civil não são aplicáveis aos imóveis públicos, já que as
benfeitorias não só não beneficiam a Administração Pública como geram custos
ao erário em razão da demolição e recuperação das áreas.
O caso trata de três “chácaras” da Colônia Agrícola IAPI na região
administrativa do Guará (DF). Os ocupantes afirmavam manter há mais de 20
anos a posse pacífica do local, tendo desenvolvido plantações diversas,
casas, barracos, criadouros e outras obras. Possuíam também documento
fornecido pelo poder público, chamado de “certificado para regularização
fundiária”. A Terracap argumentou que, o certificado além de não poder
legitimar a ocupação ou provar propriedade, foi emitido por quem não detinha
competência para o tema.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) entendeu
que, apesar de a área ser pública e não ser passível de usucapião ou posse,
os ocupantes deveriam ser equiparados a possuidores de boa-fé para fins de
indenização por benfeitorias. Mas, para o ministro Herman Benjamin, o
possuidor é aquele que tem, de fato, o exercício de algum dos direitos de
propriedade, o que jamais ocorre em relação a áreas públicas. “O particular
jamais exerce poderes de propriedade, já que o imóvel público não pode ser
usucapido O particular, portanto, nunca poderá ser considerado possuidor de
área pública, senão mero detentor”, explicou.
O ministro ressaltou que, apesar de esse ponto já bastar para afastar o
direito à compensação pelo poder público em razão de melhorias, o instituto
da indenização pressupõe a existência de vantagem oriunda dessas obras para
o real proprietário. E, no caso da Administração, como esses imóveis são
geralmente construídos com ilegalidades ambientais e urbanísticas, o Poder
Público precisa demoli-los ou regularizá-los.
“Seria incoerente impor à Administração a obrigação de indenizar por imóveis
irregularmente construídos que, além de não terem utilidade para o Poder
Público, ensejarão dispêndio de recursos do erário para sua demolição”,
afirmou o relator. “Entender de modo diverso é atribuir à detenção efeitos
próprios da posse, o que enfraquece a dominialidade pública, destrói as
premissas básicas do princípio da boa-fé objetiva, estimula invasões e
construções ilegais e legitima, com a garantia de indenização, a apropriação
privada do espaço público”, completou.
Segundo o ministro, a tolerância da Administração não pode servir para
afastar ou distorcer a aplicação da lei: “Não fosse assim, os agentes
públicos teriam, sob sua exclusiva vontade, o poder de afastar normas legais
cogentes, instituídas em observância e como garantia do interesse da
coletividade.”
Ainda segundo o relator, o entendimento da Turma não afasta o dever de o
Estado amparar os que não possuem casa própria. Mas não seria razoável
torcer as normas de posse e propriedade para atingir tais objetivos sociais
e dar tratamento idêntico a ricos e pobres que ocupam ilegalmente bens que
pertencem à comunidade e às gerações futuras.
“Sim, porque, como é de conhecimento público, no Brasil, invasão de espaço
público é prática corriqueira em todas as classes sociais: estão aí as
praças e vias públicas ocupadas por construções ilegais de shopping centers,
as áreas de preservação permanente, inclusive no Pantanal e em dunas,
tomadas por residências de lazer, as margens de rios e lagos abocanhadas por
clubes, para citar alguns exemplos”, concluiu.
REsp 945055
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