É nula a alienação de
bem imóvel parte da sociedade conjugal sem a aprovação da mulher. Essa
foi a conclusão do relator, ministro Humberto Gomes de Barros, da
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), depois de analisar
recurso pedindo a anulação de hipoteca efetuada com assinatura falsa. O
relator concedeu a solicitação em desfavor do Banco do Brasil S.A. e
enfatizou: "Não há meia hipoteca."
Cynthia Costa Goulart de Freitas Mazoque ajuizou, contra o Banco do
Brasil, ação para invalidar contrato bancário e hipoteca. Seu principal
argumento foi o da falsificação de sua assinatura por parte do marido,
sócio da empresa Agropecuária Santa Inês Ltda, ao oferecer o imóvel do
casal ao banco em garantia de financiamento de crédito comercial,
mediante hipoteca.
Informada da penhora, a proprietária da casa tentou resguardar seu
direito real sobre o bem, mas não conseguiu o resultado desejado.
Novamente tentou reverter o processo, mas o juízo de primeiro grau teve
entendimento contrário à pretensão da recorrente. O imóvel, então, foi
leiloado, mesmo sob a alegação de Cynthia Mazoque de não ter assinado o
contrato de hipoteca. A falsificação somente foi comprovada em processo
criminal.
O Banco do Brasil contestou essa comprovação, por entender já ser a
sentença imutável, por não mais lhe caber recursos (coisa julgada
material), assim, não se poderia falar em nulidade do título. Sustentou
não ter a eventual falta de assinatura na cédula a faculdade de gerar a
nulidade da hipoteca, mas, tão-somente, levar à exclusão do direito de
co-propriedade (meação), no caso, da esposa – mas se comprovado que o
débito contraído pelo marido não gerou benefício à família.
O juízo de primeiro grau, ao decidir sobre a ação criminal, entendeu não
existir o efeito da coisa julgada material, por não ter sido apreciado o
pedido de nulidade do título nos recursos interpostos pela
co-proprietária do bem. Por fim, decidiu ser inválido o contrato por
falta de consentimento de uma das partes.
A sentença, portanto, declarou inexistente o contrato de cédula de
crédito comercial apenas em relação à Cynthia Mazoque, determinando o
cancelamento da hipoteca e sua reintegração de posse no referido imóvel.
Também foi determinada indenização por danos morais.
Em apelação ao Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, o Banco do
Brasil mostrou insatisfação com a sentença, reformada pelo Tribunal
apenas para condenar o banco a pagar a importância correspondente à
metade do valor do imóvel, acrescido de juros legais, mas afastando a
anulação da hipoteca e a reintegração de posse.
Diante da decisão, a co-proprietária recorreu ao STJ alegando ter o
Tribunal de Alçada ofendido artigos do Código Civil, como o 235, que
diz: "Marido não pode, sem o consentimento da mulher, qualquer que seja
o regime de bens, hipotecar ou gravar de ônus real os bens imóveis."
Para o relator no STJ, ministro Humberto Gomes de Barros, o legislador,
ao elaborar o artigo 235 do Código Civil, objetivou dar segurança e
proteção à família, pois os imóveis podem assegurar uma renda para seu
sustento, garantir o futuro ou proporcionar abrigo aos filhos. Segundo o
relator, a jurisprudência do STJ diz ser nula a alienação de bem imóvel
parte da sociedade conjugal sem a aprovação da mulher. Depois citou o
artigo 145 do Código Civil, o qual assegura ser nulo ato jurídico quando
for desprezada alguma formalidade considerada essencial pela lei.
Esclarece o ministro ser a hipoteca uma modalidade de garantia real de
dívida, mas, para sua eficácia, a lei exige, entre outros fatores, a
anuência dos co-proprietários dos bens do casamento. Portanto o imóvel
em questão não poderia ser dado em garantia, porque o devedor (marido)
não tinha sua livre disposição, pois necessitava da autorização da
mulher, o que não obteve.
Em sua compreensão, o relator enfatizou não fazer sentido dizer que a
hipoteca é ineficaz em relação a determinada pessoa, porque "não há meia
hipoteca", ou ela existe ou não existe, pois a hipoteca traz em si o
potencial da alienação – alienação essa que deverá incidir sobre o
imóvel inteiro. "Por isso, ou é eficaz ou não o é", considerou. Dessa
forma, foi declarada nula a hipoteca. O voto do relator foi acompanhado
por unanimidade na Terceira Turma. |