O testamento não pode prever causas de deserdação posteriores ao ato ou
morte do testador. O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que não apreciou recurso de sobrinhos contra o filho adotivo
da testadora. O julgamento manteve válida a decisão anterior do Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJSP).
Em testamento, a mãe havia incluído como herdeiros os sobrinhos e deserdado
o filho adotivo. Segundo os sobrinhos afirmaram na ação de deserdação, a
adoção teria sido manobra do adotado, visando desconstituir testamento
anterior. Após o ato, o filho adotivo teria passado a agredir a mãe, que
resolveu deserdá-lo. Não havia outros herdeiros necessários, como filhos,
pais ou cônjuge.
O filho apresentou reconvenção contra os autores, alegando que as
declarações de que agredira a mãe estariam viciadas, já que à época ela já
sofria de debilidade, iniciada com a morte de seu marido e culminando em sua
interdição. Pediu, por isso, a nulidade do testamento.
Como ambos os pedidos, da ação original e de reconvenção, foram negados
pelas instâncias ordinárias, as restrições do testamento foram mantidas
válidas, exceto pela deserdação. Por isso, uma das autoras recorreu ao STJ,
argumentando não importar para a deserdação o momento de ocorrência das
agressões, mas apenas sua existência, o que teria sido comprovado no caso.
Ao decidir, o ministro Luis Felipe Salomão citou doutrina para afirmar que o
TJSP acertou em fixar a necessidade da ocorrência prévia das agressões para
justificar a deserdação. Conforme obra referida pelo ministro, a deserdação
serve para o testador afastar o direito à herança – inclusive à parte
legítima – do herdeiro que se mostra ingrato. Mas nem todas as causas que
justificam a deserdação serviriam para justificar a exclusão – ocorrida por
indignidade do herdeiro e de formas previstas em lei. Além disso, as causas
de deserdação devem preexistir à morte do testador, o que não ocorre no caso
de indignidade, que pode ocorrer após ou simultaneamente à morte.
O TJSP registrou, em sua decisão, que as agressões físicas e morais, “se,
realmente, aconteceram, foram bem posteriores ao testamento”, por isso seria
inviável manter a deserdação. O voto do relator estadual menciona também
que, se a mãe adotiva magoou-se com a falta de gratidão do adotado pelo
benefício, traduzindo sua insatisfação no testamento, não houve provas
efetivas de que as agressões efetivamente ocorreram. A sentença também
afirma, expressamente, que as testemunhas teriam apenas “ouvido dizer” que
as agressões teriam ocorrido, e sempre após o testamento.
Para o ministro, alterar esse entendimento demandaria a revisão de provas e
fatos, inviabilizada ao STJ em recurso especial. O juiz convocado Carlos
Mathias divergiu, sustentando que nem a incapacidade da testadora nem a
inexistência de agressões teriam sido comprovadas. O ministro Aldir
Passarinho Junior divergiu em parte, afirmando ser possível apontar no
testamento causas de deserdação que ocorram posteriormente, mas acompanhando
o relator quanto à inexistência de provas das agressões alegadas. Os
ministros Fernando Gonçalves e João Otávio de Noronha seguiram o relator.
REsp 124313 |