Conselheiro Lafaiete/MG consegue liminar contra cobrança do ISS

Ref. Mandado de Segurança
Autos nº 18304064378-9
Impetrante: Associação dos Notários e Registradores de Minas Gerais
Impetrado: Município de Conselheiro Lafaiete

Vistos, etc.

A Associação dos Notários e Registradores de Minas Gerais, na qualidade de representante legal dos associados do 1º Ofício de Notas, 2º Ofício de Notas, 3º Ofício de Notas, 1º Ofício de Registro de Imóveis, 2º Ofício de Registro de Imóveis, Registro de Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas, bem como, Tabelionato de Protestos, cujas titularidades pertencem, respectivamente, a Paulo Sérgio Marcenes Castelhões de Menezes, Maria Patrícia Vianna Cruz, Márcio Alexandre Mota Dutra, Eulália Maria Albino P. Furtado de Mendonça Souza, Maria Emília Marcenes Castelhões Menezes, Ana Paula Fonseca de Souza e Mário Marcenes Castelhões Menezes, aforou o presente mandamus, com pedido de liminar, com fulcro nos incisos LXIX, LXX, alínea "b", do artigo 5º da Constituição Federal, nos artigos 145, II, 2ª parte, 150, inciso VI, alínea "a", 150, § 2º e § 3º e 236, "caput", todos da Constituição Federal de 1988, § 3º do artigo 1º da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, e seus itens 21 e 21.1, constantes da Lista Anexa à mesma, publicada no Diário Oficial em 01 de agosto de 2003, contra ato que, no entender da impetrante, fora abusivo e ilegal, praticado pela Câmara Municipal de Conselheiro Lafaiete, que decretou a Lei Complementar nº 0010/2003 e pelo Chefe do Executivo Municipal que a sancionou, embora, "permissa vênia", tenha a digna Causídica subscritora do presente writ, erroneamente, utilizado "Prefeitura Municipal", sendo que a retro-referida lei dispõe sobre a alteração do Código Tributário Municipal e dá outras providências.

Com a peça vestibular, vieram os documentos de fls. 19 usque 108 e o respetivo preparo de diligência, atribuindo à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais).

Instado a manifestar no presente feito, a Digna Representante do Ministério Público, em judicioso parecer de fls. 110/111, postou-se contrariamente à antecipação da tutela pretendida.

Sucintamente, é o relatório, do que, tudo visto, e analisado, passo a apreciar a pretensão liminar.

Cuida-se o presente procedimento, de medida judicial intitulada como Mandado de Segurança, no qual a impetrante pugna pela concessão da liminar com o fito único e exclusivo de suspender a aplicação da Lei Complementar de nº 0010/2003, de 01 de janeiro de 2004.

Segundo preleciona o saudoso Mestre Hely Lopes Meirelles, em sua obra Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, Habeas Data, 14ª edição, atualizada por Arnoldo Wald, "A medida liminar é provimento cautelar admitido pela própria lei de mandado de segurança quando sejam relevantes os fundamentos da impetração e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da ordem judicial, se concedida a final (art. 7º, II). Para a concessão da liminar devem concorrer os dois requisitos legais, ou seja, a relevância dos motivos em que se assenta o pedido na inicial e a possibilidade da ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito - fumus boni iuris e periculum in mora. A medida liminar não é concedida como antecipação dos efeitos da sentença final, é procedimento acautelador do possível direito do impetrante, justificado pela iminência de dano irreversível de ordem patrimonial, funcional ou moral se mantido o ato coator até a apreciação definitiva da causa. Por isso mesmo, não importa prejulgamento; não afirma direitos; nem nega poderes à Administração. Preserva, apenas, o impetrante de lesão irreparável, sustando provisoriamente os efeitos do ato impugnado."

In casu
, sem embargos de outros entendimentos, a meu sentir, estão presentes o fumus boni juris e o periculum in mora, vez que as alegações esposadas na peça exordial, acompanhadas de farta documentação, inclusive de decisões e pareceres proferidos em outros feitos, apontam relevantes indícios de aparente ilegalidade da aplicação da lei no que se concerne à cobrança de tributos.

Por oportuno, impõe-se ressaltar que a pretensão da impetrante, representando seus associados, por ora analisada, não tem caráter definitivo, advém de tese, pacificada por nossos tribunais, sob o prisma de que as atividades desenvolvidas pelos titulares do direito invocado têm natureza de serviço público estatal exercido através de delegação, de maneira que resta inviável a cobrança de impostos sobre serviços, como previsto na legislação ora impugnada, especialmente por ferir dispositivo constante da Carta Magna de 1988, que consagra a imunidade recíproca entre os entes políticos na cobrança de impostos sobre patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros.

Prescreve o art. 150, inciso VI, alínea "a", da Lei Maior (Constituição Federal), verbis:

"Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

omissis...

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;"


Assim, nos termos da norma constitucional retro-mencionada, é de se observar o princípio da imunidade recíproca entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, vez que o serviço dos registradores e dos notários, sendo de natureza pública estatal, não são passíveis, "data vênia", em tese, de serem tributados por impostos, remunerados por meio de taxa, em razão da natureza singular do serviço público delegado, estando caracterizado, indubitavelmente, o fumus boni juris.

No que concerne ao periculum in mora, com a aplicação da lei ora objurgada, os titulares do direito invocado se submeterão à tributação, em tese, indevida, causando-lhes dano irreparável ou de difícil reparação, na hipótese de não ser atendida a pretensão liminar.

Importante ressaltar que, a concessão da liminar pleiteada não impõe ao município ônus irreversíveis, uma vez que este possui instrumentos legais capazes de promover, de maneira plena, a cobrança dos valores supostamente devidos caso a ação seja denegada ao final.

Ao contrário, caso seja concretizada a cobrança, o ressarcimento só será possível, em ação própria, através de precatório, via tormentosa e sabidamente demorada.

Isto posto, à esteira do ora consignado, defiro o pedido de liminar pleiteado na peça preambular, e o faço a fim de determinar a suspensão da aplicabilidade da Lei Complementar Municipal nº 0010/2003, de 1º de janeiro de 2004, tão somente quanto aos titulares do direito, representados pela impetrante, no que se pertine à cobrança do imposto sobre serviço de qualquer natureza (ISSQN), instituído pela retro-referida lei.

Notifiquem-se os impetrados, dando ciência da presente decisão, solicitando a prestarem as informações que entenderem necessárias, caso queiram, no decêndio legal.

Prestadas ou não as informações, ouça-se o Ministério Público.

Intimem-se e cumpra-se.

Conselheiro Lafaiete, 13 de fevereiro de 2004.

Márcia Ribeiro Montandon
Juíza de Direito