JURISPRUDÊNCIA CÍVEL
MANDADO DE SEGURANÇA - ILEGITIMIDADE DE PARTE - EXTINÇÃO DO PROCESSO -
USUFRUTO VITALÍCIO - BENS DOADOS COM RESERVA AOS DOADORES - MORTE DE UM
DOADOR - USUFRUTUÁRIO SOBREVIVENTE - TITULARIDADE PARA A DEFESA DOS BENS -
PLENO EXERCÍCIO DO USUFRUTO - CARÁTER INDIVISÍVEL DO GRAVAME - ESPÓLIO DO
USUFRUTUÁRIO FALECIDO - IMPETRAÇÃO DA AÇÃO - IMPOSSIBILIDADE
Ementa: Recurso de apelação. Mandado de segurança. Processo extinto sem
julgamento do mérito, por ilegitimidade de parte. Ação visando à defesa de
imóveis localizados em edifício. Bens doados com reserva de usufruto
vitalício aos doadores. Morte de um doador. Pleno exercício do usufruto na
pessoa do usufrutuário sobrevivente. Caráter indivisível do gravame.
Titularidade para a defesa de tais bens do usufrutuário sobrevivente. Ação
impetrada pelo espólio do usufrutuário falecido. Impossibilidade. Parte
ilegítima. Recurso desprovido.
- No usufruto simultâneo, como na hipótese de cônjuges que reservam o
proveito econômico dos bens doados aos filhos, subsistirá o pleno exercício
do gravame pelo usufrutuário sobrevivente, caso instituído em caráter
indivisível, cabendo, unicamente, a este a defesa dos direitos que lhe
pertencem. Mantida a sentença de primeiro grau, que, reconhecendo a
ilegitimidade ativa do apelante, extinguiu o processo sem julgamento do
mérito. Recurso desprovido.
Apelação Cível ndeg. 1.0024.03.132795-0/003 - Comarca de Belo Horizonte -
Apelante: Epólio de Osvaldo Dantés dos Reis - Apelados: Município de Belo
Horizonte e outro - Relator: Des. Ernane Fidélis
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em negar provimento.
Belo Horizonte, 5 de setembro de 2006. - Ernane Fidélis - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C AS
DES. ERNANE FIDÉLIS - Cuida-se de recurso de apelação, interposto em face de
sentença que, reconhecendo a ilegitimidade ativa do espólio de Osvaldo
Dantés dos Reis, bem como a ausência de interesse de agir, julgou extinto o
presente mandado de segurança, sem julgamento do mérito, nos termos do art.
267, inciso VI, do CPC.
Inconformado, recorre o impetrante, pleiteando a reforma do decisum,
ao defender que, com a morte de Osvaldo Dantés dos Reis, restou o seu
cônjuge, a Sr.ª Flora Sabino dos Reis, a qual, como usufrutuária vitalícia
dos imóveis em questão e também como representante legal do espólio locador,
possui legitimidade para ajuizar o presente mandamus.
No caso dos autos, o espólio de Osvaldo Dantés dos Reis impetrou mandado de
segurança, pretendendo obstar ato do Chefe de Fiscalização da Secretaria
Municipal Regional de Serviços Urbanos Centro-Sul, consistente na interdição
dos imóveis situados nos andares 11deg. ao 15deg. do Edifício Dantés.
O digno Juiz Sentenciante concluiu pela ilegitimidade ativa, uma vez que,
após a morte de Osvaldo Dantés dos Reis, o usufruto a seu favor
extinguiu-se, não se transmitindo este direito real ao seu espólio. Lado
outro, entendeu também que, relativamente aos imóveis situados nos andares
11deg. e 12deg. do Edifício Dantés, inexiste interesse de agir, pois não há
prova nos autos da propriedade desses bens.
Sabe-se que o titular do direito lesado ou ameaçado, por ato ilegal ou
abusivo de autoridade, é quem possui legitimidade para impetrar mandado de
segurança.
Com efeito, in casu, tratando-se de mandado de segurança visando a
impedir interdição dos imóveis situados nos andares 11deg. ao 15deg. do
Edifício Dantés, possui legitimidade ativa o titular do direito real sobre
os esses bens.
Pela observância dos documentos de f. 17/19, constata-se que os referidos
imóveis foram doados por Osvaldo Dantés dos Reis e sua esposa Flora Sabino
Reis a Márcio Lincoln Dantés e Joyce Carneiro Dantés, mas com reserva de
usufruto vitalício e sucessivo aos doadores.
Assim, a princípio, na hipótese, esses doadores, na condição de
usufrutuários, titulares do direito de uso e gozo dos bens, é quem possuiria
legitimidade para a presente impetração.
Todavia, com o falecimento de Osvaldo Dantés dos Reis, restou apenas a Sr.ª
Flora Sabino dos Reis como usufrutuária, em virtude da instituição do
usufruto também a seu favor, cumprindo-nos, neste momento, perquirir se o
gravame subsistirá integralmente com o cônjuge sobrevivente ou se extinguirá
parte a parte. Vejamos o que dispõe o art. 1.411 do Código Civil:
"Art. 1.411. Constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas,
extinguir-se-á a parte em relação a cada uma das que falecerem, salvo se,
por estipulação expressa, o quinhão couber ao sobrevivente".
Acontece que, no caso dos autos, a única disposição a respeito encontra-se
assim transcrita: "Que os bens aqui descritos e doados, eles doadores se
reservam o direito comum e sucessivo de sua administração" (f. 19).
A meu ver, apesar de ter sido utilizado o termo "sucessivo", o que, a
princípio, choca-se com o instituto do usufruto, é manifesta, expressamente,
a intenção dos doadores de convencionar o direito de acrescer entre os
sobreviventes, ao instituírem o gravame em caráter indivisível. Nesse
sentido, confira-se o seguinte ensinamento:
"Sendo dois ou mais usufrutuários, extingue-se em relação aos que falecerem,
subsistindo pro parte em proporção aos sobreviventes (art. 1.411). Mas, se o
título estabelece a sua indivisibilidade, ou expressamente estipula o
direito de acrescer entre os usufrutuários, subsiste íntegro irredutível até
que todos venham a falecer" (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de
Direito Civil, v. IV, p. 303).
Dessa forma, estabelecida a indivisibilidade do usufruto, com a morte de
Osvaldo Dantés dos Reis, a sua viúva, a Sr.ª Flora Sabino dos Reis, torna-se
a única usufrutuária, em pleno exercício dos direitos que lhes são
inerentes, e, por conseqüência, a única a quem competia a defesa dos bens em
juízo, em virtude de seu direito de uso, gozo e administração dos bens
gravados.
Concluído isso, tenho que é de ser mantido o decisum de 1deg. grau,
que reconheceu a ilegitimidade ativa na espécie, já que, mesmo sendo a Sr.ª
Flora Sabino dos Reis inventariante do espólio de Osvaldo Dantés dos Reis,
tais figuras não se confundem, nem se substituem, não possuindo o apelante,
pois, de fato, legitimidade para ser parte neste mandamus.
Feitas essas considerações, vejo por bem negar provimento ao recurso.
Custas, pelo apelante.
É o meu voto.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Edilson Fernandes e
Maurício Barros.
Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.
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