REGISTRO DE IMÓVEIS - RETIFICAÇÃO DE ÁREA - ERRO NÃO COMPROVADO -
ACRÉSCIMO DE ÁREA - ALTERAÇÃO DE DIVISAS - INADMISSIBILIDADE - SENTENÇA
CITRA PETITA - INEXISTÊNCIA - NULIDADE - INOCORRÊNCIA
- Havendo exame completo da matéria levada a julgamento, não há que se
falar em nulidade da sentença por vício citra petita, uma vez que esta
só ocorre quando o juiz deixa de examinar todas as questões propostas
pelas partes.
- A ação de retificação de área tem caráter meramente administrativo e
destina-se a retificar erro no registro de imóveis. Ausente a
demonstração do erro, a mencionada ação não se presta para aumentar
substancialmente a área do imóvel ou para alteração de divisas.
Apelação Cível nº 1.0558.03.900023-4/001
Comarca de Rio Pomba
Relator: Des. Caetano Levi Lopes
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de
fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas,
à unanimidade de votos, em dar provimento às apelações.
Belo Horizonte, 27 de abril de 2004.
- Caetano Levi Lopes - Relator.
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O Sr. Des. Caetano Levi Lopes - Conheço dos recursos porque presentes os
requisitos de admissibilidade.
Os apelados Ercy Gambêta Soares e Jessialva Martins Soares aforaram esta
ação de retificação de área em registro imobiliário. Aduziram que são
proprietários de um imóvel residencial constante das matrículas nº
4-4117 e 2-4244 do Ofício de Registro de Imóveis de Rio Pomba, onde
consta uma área total de terreno de 173,60m2. Acrescentaram que em
levantamento topográfico do imóvel foi constatado que a área real é de
431,17m2. Os segundos apelantes e alienantes Ademar Mota Moreira e
Bernadete Simonato Moreira entendem que o procedimento é inadequado
porque estaria havendo acréscimo exagerado de área e alteração de
divisas. Pela r. sentença de fls. 52/58 o pedido foi acolhido.
Preliminar da primeira apelação.
O primeiro apelante - Ministério Público - aduziu preliminar de nulidade
da sentença pelo vício citra petita. Afirmou que o Julgador monocrático
analisou apenas a impugnação dele e omitiu-se em relação à ofertada
pelos segundos apelantes.
O defeito apontado, como se sabe, ocorre quando o juiz não examina todas
as questões propostas pelas partes. É o que esclarece Humberto Theodoro
Júnior, em Curso de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro: Forense,
2002, 38 ed., vol. I, p. 464:
"A sentença, enfim, é citra petita quando não examina todas as questões
propostas pelas partes. O réu, por exemplo, se defendeu do pedido
reivindicatório alegando nulidade do título dominial do autor e
prescrição aquisitiva em seu favor. Se o juiz acolher o pedido do autor,
mediante reconhecimento apenas da eficácia do seu título, sem cogitar do
usucapião invocado pelo réu, terá proferido sentença nula, porque citra
petita, já que apenas foi solucionada uma das duas questões propostas.
Mas o exame imperfeito ou incompleto de uma questão não induz nulidade
da sentença, porque o tribunal tem o poder de, no julgamento da
apelação, completar tal exame, em face do efeito devolutivo assegurado
pelo art. 515, SS 1º".
Na espécie, o douto Julgador monocrático mencionou à fl. 54 que o
representante do Ministério Público e o curador nomeado aos confinantes
pugnaram pela remessa do feito às vias ordinárias. Portanto, inocorre o
suposto vício. A preliminar é impertinente. Rejeito-a.
Mérito.
As duas apelações, no mérito, versam acerca de idêntica matéria. Assim,
examino-as em conjunto.
Anoto que os recorridos, com a petição inicial, acostaram as certidões
imobiliárias de fls. 07/08, noticiando que o imóvel tem área de 173,60m2.
Carrearam ainda a planta e o memorial descritivo de fls. 09/10 e cópia
de documento de arrecadação de IPTU de fl. 11, apontando a área de
431,17m2. Estes os fatos.
Em relação ao direito, sabe-se que o registro público deve conter dados
que estejam de acordo com a realidade. Ocorrendo erro, é possível a
retificação. Eis, a propósito, o ensinamento de Wilson de Souza Campos
Batalha em Comentários à Lei de Registros Públicos, 4. ed., Rio de
Janeiro: Forense, 1997, vol. II, p. 695:
"Se o registro não exprimir a verdade, poderá o prejudicado reclamar sua
retificação, por meio de processo próprio, consoante o art. 212. Como
bem observa o Prof. Afrânio de Carvalho (Rev. dos Tribunais, vol. 459,
p. 27), não é esta a única via para a retificação, posto que, anuindo os
interessados, pode ocorrer a retificação (...).
(...) Estabelece o art. 213 que, na hipótese de erro evidente, o Oficial
o corrigirá, a requerimento, com a devida cautela. A retificação que não
acarrete prejuízo a terceiro (ou, obviamente, à outra parte) poderá
efetuar- se, a requerimento, mediante despacho judicial. Se, porém, da
retificação resultar alteração da descrição das divisas ou da área do
imóvel, serão citados, para se manifestarem sobre o requerimento, em dez
dias, todos os confrontantes e o alienante ou seus sucessores.
Será sempre ouvido o Ministério Público, em processos de retificação.
O processo de retificação de registro tem efeitos meramente
administrativos; não obstante, comporta recurso de apelação com efeito
devolutivo e suspensivo".
Sem dúvida, a ação de retificação de registro, em princípio, é
procedimento adequado para correção de erro. Todavia, em se tratando de
registro imobiliário, a actio mencionada não se presta para aumentar a
área quando deixar de ser demonstrada a existência de erro. Neste
sentido, o posicionamento deste Tribunal:
"Registro público. Retificação. Aumento de área de imóvel. Ausência de
erro no registro. Impossibilidade. - A ação de retificação de registro
público não se presta para aumentar, substancialmente, a área do imóvel
registrado, principalmente se não existir qualquer erro ou omissão no
referido registro". (Ac. na Ap. nº 189.739-6/00, 2ª Câmara Cível, Rel.
Des. Abreu Leite, j. em 08.05.2001, in "Jurisprudência Mineira", v. 157,
p. 193.)
Acrescento por oportuno que, comprovado o erro e dado o interesse
público que envolve a segurança registral, impõe-se o levantamento
pericial para verificar a exatidão das medidas, em casos que impliquem
alterações significativas de descrição perimétrica. Neste sentido,
decidiu o egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo:
"Registro de imóveis. Retificação de área. Pedido que insere metragens e
descrição perimétrica bastante diferentes das contidas na escritura
pública. Levantamento pericial necessário para a exata descrição do
imóvel ainda que não haja impugnação do interessado. Providência que se
justifica pelo interesse público que envolve o assunto relacionado com
os registros públicos. Inteligência do art. 213 da Lei 6.015/73.
Nos pedidos de retificação de área, quando desta resultar inserção de
vários dados registrários, com metragens e descrição perimétrica
bastante diferentes das contidas na escritura pública, impõe-se o
levantamento pericial para a exata descrição do imóvel, ainda que não
haja impugnação do interessado. A providência justifica-se pelo
interesse público que envolve o assunto relacionado com os registros
públicos". (Ac. na Ap. 126.473-1, SP, 3ª Câmara Cível, Rel. Des.
Silvério Ribeiro, j. em 11.09.1990, in RT, 664/62).
Aqui, os interessados não provaram a existência de erro. Presume-se que
ao adquirir o imóvel conheciam a sua real dimensão, divisas e
confrontações. Ademais, o memorial descritivo e a planta carreados pelos
interessados alteram a divisa descrita no registro imobiliário, onde
consta que por um dos lados divide com um córrego (fls. 7 e 8),
inserindo outra com a Rua Prefeito Antônio da Mota Filho (fls. 9 e 10) e
as metragens das divisas não coincidem. Sem dúvida, a pretensão dos
recorridos deve ser deduzida em ação ordinária pertinente. O
inconformismo tem pertinência.
Com esses fundamentos, dou provimento às duas apelações para reformar a
sentença e julgar improcedente o pedido inaugural.
Condeno os apelados no pagamento das custas processuais, inclusive as
deste recurso, observado o disposto na Lei nº 1.060, de 1950.
O Sr. Des. Francisco Figueiredo - De acordo.
O Sr. Des. Nilson Reis - De acordo.
Súmula - DERAM PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES.
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