AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA -
FUNDAMENTAÇÃO - NULIDADE DE SENTENÇA - NÃO-OCORRÊNCIA - INADIMPLÊNCIA DO
PROMITENTE COMPRADOR - RESCISÃO DEVIDA - CLÁUSULAS ABUSIVAS - ANULABILIDADE
- CDC - DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS - DESPESAS E FRUIÇÃO - USO DO IMÓVEL -
RETENÇÃO DEVIDA
- Não é nula a sentença em que o julgador fornece para a parte os motivos de
decidir. Descumprido o contrato, com a falta de pagamento do preço,
justifica-se a rescisão do mesmo por culpa do promitente comprador.
- Devem ser anuladas as cláusulas abusivas de contrato de promessa de compra
e venda, com fulcro nos arts. 51 e 53 do CDC.
- Na hipótese de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de
imóvel, por inadimplência do promissário comprador, tem este direito à
restituição do valor pago, corrigido monetariamente, autorizando-se,
entretanto, ao promitente vendedor reter percentual desse quantum para fazer
frente às despesas com administração e fruição do imóvel, pelo uso deste, em
razão do descumprimento.
Apelação Cível n° 1.0114.04.034676-8/001 (em conexão com a Apelação Cível nº
1.0114.04.038257-3/001) - Comarca de Ibirité - Apelante: Conemp - Costa
Nogueira Empreendimentos e Participações Ltda. - Apelado: Juvenal dos Santos
- Relator: Des. Valdez Leite Machado
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na
conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade
de votos, em rejeitar preliminar e dar provimento parcial.
Belo Horizonte, 9 de outubro de 2008. - Valdez Leite Machado - Relator.
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
Produziu sustentação oral, pela apelante, o Dr. Welington Luzia Teixeira.
DES. VALDEZ LEITE MACHADO - Cuida-se de recursos de apelação interpostos por
Conemp - Costa Nogueira Empreendimentos e Participações Ltda. contra
sentença proferida em ações conexas de rescisão de contrato de promessa de
compra e venda em que contende com Juvenal dos Santos.
Alegou o autor da primeira ação, Juvenal dos Santos, que, em 10.12.1996,
adquiriu um lote por meio de contrato particular de promessa de compra e
venda, em que o preço de venda foi ajustado em R$ 14.700,00, a ser pago em
70 prestações mensais reajustáveis.
Aduziu que consta do contrato que as prestações seriam reajustadas
anualmente com observância da variação do IPC mais 6% de juros ao ano, desde
a assinatura até o efetivo pagamento. E, em caso de atraso, as parcelas
ficariam sujeitas ao IPC mais juros moratórios ao mês, mais multa de 2%.
Asseverou que efetuou os pagamentos conforme o contrato, mas que, em
30.04.2003, a ré apresentou um termo aditivo ao contrato particular de
promessa de compra e venda, no qual foi encontrado um saldo devedor no valor
de R$ 23.763,65.
Ressaltou que não pode prevalecer o termo aditivo porque a ré não descontou
as prestações efetivamente pagas. Ademais, disse que consta do referido
termo que existem 48 prestações em aberto, mas foram pagas 41 prestações.
Aduziu que, nos meses de dezembro de 1993 e fevereiro de 1998, a ré cobrou
valores a título de resíduo, o que é ilegal porque é desfavorável ao
consumidor, já que o próprio contrato estabelece a forma de correção das
prestações.
Sustentou que o saldo devedor encontrado pela ré é irreal e absurdo, já que
o valor do seu débito é de R$ 2.711,14.
Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos, para que seja declarado
quitado integralmente o contrato, determinando-se à ré que entregue a
certidão de liberação do registro de loteamento para lavratura da escritura
de compra e venda.
A ré apresentou contestação às f. 56/60, argüindo, preliminarmente, a
inépcia da inicial e a ausência de autorização para construção no imóvel.
No mérito, requereu que sejam julgados improcedentes os pedidos iniciais.
Alegou a autora da segunda ação, Conemp - Costa Nogueira Empreendimentos e
Participações Ltda., que foi celebrado entre as partes, em 10.12.1996, um
contrato particular de promessa de compra e venda, que tem como objeto o
lote 14 da quadra 04, no Bairro Nossa Senhora de Lourdes.
Aduziu que o lote foi prometido à venda pelo valor de R$ 14.700,00, cujo
pagamento foi diferido em 70 prestações mensais de R$ 210,00. Além disso,
asseverou que, por força de disposição contratual, o promissário comprador
já se encontra na posse do imóvel.
Ressaltou que, após a efetivação do contrato, o réu pagou parcelas
componentes do preço; contudo, a partir de determinado instante deixou de
cumprir as obrigações pecuniárias assumidas no momento da realização do
negócio, encontrando-se em aberto 38 prestações mensais, referentes aos
meses de agosto de 1999 a setembro de 2002, que perfazem o montante de R$
23.833,92.
Asseverou que aos valores que se encontram em aberto deve-se aplicar
correção monetária, juros e multa na forma prevista no contrato.
Sustentou que o atraso no pagamento implica a rescisão do contrato, que
ocorre trinta dias após a notificação para purgação de mora.
Informou que o réu foi constituído em mora, mas se manteve inerte, sem tomar
qualquer providência para regular a situação. Assim, salientou que não há
outra opção além da rescisão do contrato de promessa de compra e venda.
Ao final, pugnou pela procedência do pedido, para que seja declarado
rescindido o contrato e seja determinada aplicação das cláusulas 5ª e 15ª,
para que o requerido seja condenado ao pagamento pela utilização do imóvel.
O réu apresentou contestação às f. 33/44, argüindo, preliminarmente, a
existência de conexão, na medida em que existe uma ação ordinária ajuizada
por ele, que tramita perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Ibirité.
No mérito, aduziu que nunca se manteve inerte, uma vez que sempre quitou os
boletos que lhe eram enviados. Além disso, asseverou que construiu no lote
sua casa de morada, o que trouxe valorização para o imóvel. Assim, não pode
a autora impor a rescisão do contrato e ficar com sua casa, devendo ser
indenizado pelas benfeitorias realizadas.
Por fim, pugnou pela improcedência do pedido.
Foi apresentada impugnação à contestação pelas duas partes.
Acolhida a preliminar de conexão, os autos foram remetidos à 1ª Vara da
Comarca de Ibirité.
Sobreveio aos autos sentença única quanto a ambos os processos, às f.
102/105 e 106/109, na qual o Magistrado singular julgou procedente o pedido
manejado na Ação Ordinária nº 114.04.34676-8, declarando pago o preço do
imóvel, determinando que a vendedora Conemp outorgue a escritura ao
adquirente. Ademais, julgou improcedente o pedido manejado nos Autos de nº
114.04.038257-3, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios fixados em 20% do valor da causa.
Inconformada, Conemp - Costa Nogueira Empreendimentos e Participações Ltda.
interpôs recurso de apelação às f. 107/116 e 111/120, argüindo,
preliminarmente, a nulidade da sentença por falta de fundamentação.
No mérito, alegou que a sentença não deve prosperar, pois o Magistrado
singular, em julgamento da ação conexa, considerou que foi pago pelo imóvel
o valor de R$ 20.265,00, porém tal quantia foi encontrada unilateralmente
pelo apelado.
Aduziu que, ainda que se considere correto o valor encontrado pela parte
recorrida, não é a importância já paga pelo apelado que está em discussão,
mas a falta de pagamento das parcelas, que se traduz em inadimplência
contratual e é causa bastante para a rescisão.
Afirmou que, conforme confissão do próprio apelado, aquele pagou somente 22
prestações de um total de 70, sendo a última em 03.12.2003, há mais de três
anos.
Asseverou que deve ser respeitada a cláusula quinta do contrato, que em seu
§ 2º estipula a forma de devolução das parcelas, já que a culpa pela
rescisão do contrato é do comprador.
Ressaltou que o apelado vem utilizando o imóvel desde 10.12.1996, devendo
ser condenado ao ressarcimento por tal uso, visto que existe disposição
contratual expressa para indenização pela fruição do imóvel.
Ao final, pugnou pelo provimento do recurso, para que seja modificada a
sentença, julgando-se procedente o pedido de rescisão contratual, e seja
devolvido valor referente a 80% das parcelas pagas. Além disso, requereu
indenização pela fruição do imóvel, na forma da cláusula décima quinta do
contrato.
O apelado, devidamente intimado, apresentou contra-razões às f. 128/130,
batendo-se pela manutenção da sentença.
Presentes os pressupostos de admissibilidade dos recursos, deles conheço.
Inicialmente, observo que a apelante argüiu preliminar de nulidade da
sentença em razão de ausência de fundamentação.
Contudo, razão não lhe assiste, devendo ser rejeitada tal preliminar.
Ora, saliento que não é necessário que o magistrado, ao proferir sua
decisão, tente convencer as partes do seu entendimento, sustentando teses
jurídicas, bastando que apresente, fundamentadamente, ainda que de forma
sucinta e objetiva, como no caso, os motivos que o levaram a decidir.
Nesse sentido, aliás, oportuno reproduzir trecho de voto proferido pelo Des.
Alzir Fellipe Schmitz, componente da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul, no julgamento da Apelação Cível nº 70016355950:
``[...] De plano, cumpre estabelecer a diferença entre fundamentação sucinta
e ausência ou fundamentação deficiente. No caso em análise, o juízo lançou
os alicerces de seu convencimento. É verdade que tal se deu de forma
resumida, mas a questão é singela. Em verdade a sentença seguiu o estilo de
sua prolatora, não podendo a parte exigir prolixidade, quiçá em dias de
Judiciário abarrotado. A evolução da informática, que propicia recursos de
colagem alongadores das peças processuais, inviabiliza que o sentenciante
gaste horas para rebater argumentos, procurando adjetivos no dicionário...
Ademais, o juízo não está compelido à interpretação de um a um dos
argumentos lançados pelas partes, a adoção de determinada linha de
raciocínio conduz logicamente à rejeição das outras. É questão de lógica e
bom senso. Enfim, é a falta de fundamentação que enseja a nulidade do ato,
não a fundamentação econômica e adequada ao caso concreto [...]''.
Dessa forma, não vislumbrando qualquer ofensa ao art. 93, IX, do Texto
Constitucional, conforme faz crer a apelante em suas razões recursais,
rejeito a preliminar de nulidade da sentença por falta de fundamentação.
Adentrando o mérito do recurso, verifico que a apelante pretende ver
modificada a sentença proferida em ações conexas que julgou procedente
pedido para rescisão de contrato de promessa de compra e venda, declarando
pago o preço do imóvel, determinando a outorga da escritura ao adquirente, e
julgou improcedente o pedido para que a rescisão se desse por inadimplemento
do promitente comprador.
A meu ver, assiste razão em parte à recorrente.
Conforme se observa dos autos, foi celebrado entre as partes um contrato de
promessa de compra e venda, que tem como objeto um imóvel no valor de R$
14.700,00 (quatorze mil e setecentos reais), que seria pago em 70 prestações
de R$ 210,00 (duzentos e dez reais).
É fato incontroverso, no caso, que o apelado se tornou inadimplente, na
medida em que não cumpriu a obrigação de quitar as parcelas. Assim, tal fato
já é considerado suficiente para que ocorra a rescisão do pacto avençado,
existindo, inclusive disposição contratual nesse sentido:
``Cláusula Quinta - Vencida e não paga a prestação, o contrato será
considerado rescindido 30 (trinta) dias depois de constituído em mora o
devedor, através de notificação feita pelo Cartório de Títulos e
Documentos'' (f. 09).
Ressalte-se que a notificação foi devidamente comprovada pela certidão de f.
24, sendo o apelante constituído em mora em 07.04.2003, sem que efetuasse o
pagamento dos valores devidos no prazo de 30 dias.
Ademais, além da existência de cláusula expressa prevendo a rescisão no caso
de inadimplemento, verifica-se que o recorrido permaneceu inerte por mais de
um ano, vindo buscar a revisão do contrato somente em 12.03.2004, quando
ajuizou ação visando à declaração de quitação da dívida, restando claro que
há motivos mais do que suficientes para que se dê a rescisão na forma
requerida pela apelante, ressaltando-se, ainda, que não restara comprovado
nos autos que foram cobrados valores a maior ilegalmente pela mesma.
Entretanto, a meu ver, o parágrafo segundo da cláusula quinta do contrato,
que cuida da forma de devolução da quantia paga pelo promissário comprador,
mostra-se extremamente abusivo.
Dispõe a referida cláusula:
``Cláusula Quinta - Vencida e não paga a prestação, o contrato será
considerado rescindido 30 (trinta) dias depois de constituído em mora o
devedor, através de notificação feita pelo Cartório de Títulos e Documentos.
[...]
Parágrafo Segundo - Não purgando a mora, fica este contrato rescindido de
pleno direito, conforme dispõe o artigo 32 da Lei 6.766/79, perdendo o
COMPRADOR em favor da VENDEDORA, por preço atualizado do contrato até o
último dia do pagamento, parte das parcelas pagas até a data do
inadimplemento, como multa compensatória, calculada da seguinte forma:
a) Se tiver pago até 10% (dez por cento) do preço atualizado do contrato,
receberá o COMPRADOR em devolução 20% (vinte por cento) da quantia paga.
b) Do que exceder a 10% (dez por cento) e até 30% (trinta por cento) do
preço atualizado do contrato receberá o COMPRADOR em devolução 50%
(cinqüenta por cento) da quantia paga.
c) Do que exceder a 30% (trinta por cento) receberá o COMPRADOR a totalidade
da quantia paga deduzidas as despesas efetuadas e comprovadas pela
VENDEDORA'' (f. 09).
Trata-se de cláusula nula de pleno direito, a teor do que dispõem o art. 51,
II, IV e § 1º, inc. III, e o art. 53, ambos da Lei nº 8.078/90 (Código de
Defesa do Consumidor).
A respeito das cláusulas abusivas, leciona o festejado Nelson Nery Júnior:
``Nesse sentido, a cláusula abusiva é aquela que é notoriamente desfavorável
à parte mais fraca na relação contratual, que, no caso de nossa análise, é o
consumidor, aliás, por expressa definição do art. 4º, nº I, do CDC. A
existência de cláusula abusiva no contrato de consumo torna inválida a
relação contratual pela quebra do equilíbrio entre as partes, pois
normalmente se verificam nos contratos de adesão, nos quais o estipulante se
outorga todas as vantagens em detrimento do aderente, de quem são retiradas
as vantagens e a quem são carreados todos os ônus derivados do contrato.
As cláusulas abusivas não se restringem aos contratos de adesão, mas a todo
e qualquer contrato de consumo, escrito ou verbal, pois o desequilíbrio
contratual, com a supremacia do fornecedor sobre o consumidor, pode ocorrer
em qualquer contrato, concluído mediante qualquer técnica contratual''
(Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, p. 339).
Ressalta-se que tal matéria se insere entre aquelas disciplinadas pelo
Código do Consumidor, ante expressa disposição da legislação consumerista
(Lei 8.078/90), em seu art. 3º, § 2º, mostrando-se, pois, pertinente a
possibilidade de controle judicial de tais ajustes, mormente quando
resultantes de avenças por adesão, que coloquem o consumidor em desvantagem
exagerada ou que sejam incompatíveis com a boa-fé (inc. IV, art. 51).
Assim, entendo deve ser retido 10% com relação às despesas efetuadas e
comprovadas pela promitente vendedora.
Em relação à fruição, salienta-se que a jurisprudência vem firmando
entendimento no sentido de que o percentual de retenção em caso de
arrependimento do promissário comprador, tendo em vista o eventual prejuízo
causado ao promitente vendedor e também pela utilização do imóvel, pode ser
reduzido eqüitativamente pelo juízo, de modo a restaurar o equilíbrio
contratual e evitar o enriquecimento sem causa.
Na hipótese, mostra-se razoável, em face da devolução do imóvel ao
promitente vendedor, a retenção de 10% do valor total das parcelas quitadas,
a título de fruição, levando-se em conta o período em que o apelado ficou na
posse do imóvel, considerando-se a depreciação do bem.
A propósito:
``Ação de rescisão contratual. Compra e venda de imóvel. Inadimplência do
promissário comprador. Devolução das parcelas pagas. Direito de retenção de
percentual a título de penalidade pelo inadimplemento. - Nos contratos de
promessa de compra e venda de imóveis, ainda que haja a rescisão do contrato
por inadimplemento do promissário comprador, tem este o direito à
restituição das parcelas pagas, acrescidas de correção monetária e de juros
de mora, sob pena de enriquecimento ilícito da empresa construtora, que
permanecerá com a propriedade do imóvel e terá direito a reter 10% (dez por
cento) do valor a ser devolvido, a título de pena contratual'' (extinto TAMG,
Apelação Cível nº 2.0000.00.452731-1/000, 4ª Câmara Cível, Rel. Des.
Domingos Coelho, j. em 10.11.2004).
``Contrato de compra e venda de imóvel. Irretratabilidade. Irrevogabilidade.
Possibilidade de rescisão pelo promitente comprador inadimplente. Cláusula
penal. Percentual de 10%. Multa compensatória. Fruição. Redução. Devolução
das parcelas. Acerto final. - O compromisso de compra e venda de imóvel a
prestação como ato jurídico decorrente da vontade dos contratantes tem como
norma primária sua revogabilidade e retratabilidade, principalmente quando
dele consta cláusula resolutiva expressa de pleno direito por inadimplência
do promitente comprador. Deve ser reduzida a multa compensatória e a
percentagem da fruição contratada pelas partes nas ações de rescisão
contratual, quando restar claro, nos autos, que o valor contratado se mostra
excessivo, em razão das provas produzidas. Na ação de rescisão de contrato
de promessa de compra e venda proposta pelo comprador inadimplente contra o
vendedor, devem as parcelas ser devolvidas em uma única parcela, quando do
acerto final entre as partes'' (TJMG, Apelação Cível nº
2.0000.00.508176-1/000, 15ª Câmara Cível, Rel. Des. José Affonso da Costa
Côrtes, j. em 09.08.2007).
Por fim, analisarei a indenização pelas benfeitorias construídas no imóvel,
as quais foram pleiteadas na inicial da ação ajuizada pelo autor e não foram
posteriormente discutidas, devido ao fato de a r. sentença recorrida ter
julgado procedente o pedido do mesmo, declarando pago o preço do imóvel,
determinando que a construtora outorgasse a escritura ao autor. Assim, como
através desta decisão a sentença primeva será modificada, conforme acima
esposado, devendo a referida indenização ser analisada.
A meu ver, possui o autor direito à indenização pelas benfeitorias
comprovadamente efetuadas no lote adquirido pelo mesmo junto à apelante, não
restando dúvida, também, de que a posse do apelado tenha sido exercida de
boa-fé.
Ressalte-se que incontroversa a realização de benfeitorias no lote em
questão, sendo que fora construída uma casa no lote adquirido, em que o
apelado constitui sua residência.
Observa-se dos autos, ainda, que o apelado agiu de boa-fé ao adquirir
legitimamente um imóvel para nele edificar morada, só não tendo quitado
todas as parcelas devido ao fato de não ter tido condições econômicas de
fazê-lo conforme alegado.
Portanto, sendo lícita a posse, já que amparada em contrato de compra e
venda, e comprovadas as benfeitorias, tenho como justo que o apelado receba
pelas mesmas.
A respeito do thema, dispõe o art. 1.219 do Código Civil:
``Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das
benfeitorias necessárias e úteis, bem como quanto às voluptuárias, se não
lhes forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e
poderá exercer direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e
úteis''.
A esse respeito:
``Ementa: Ação de rescisão de contrato de compromisso de compra e venda.
Indenização deferida a título de ressarcimento por benfeitorias realizadas
no imóvel. Sentença de parcial procedência da demanda confirmada por seus
próprios fundamentos. - Rescindida promessa de compra e venda, sem que se
conclua pela culpa da parte autora, cabível a restituição ao estado
anterior, aí considerado o direito à indenização pelo promitente comprador
de benfeitoria que realizou no imóvel'' (Recurso Cível nº 71001433481,
Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Clovis Moacyr
Mattana Ramos, j. em 31.10.2007).
Diante do exposto, rejeito a preliminar e dou parcial provimento ao primeiro
e segundo apelos, para anular a cláusula quinta do contrato, declarando
rescindido o contrato de promessa de compra e venda celebrado entre as
partes, determinado que a apelante proceda à devolução do que pagou o
promissário comprador, deduzindo-se as despesas efetuadas e comprovadas pela
promitente vendedora, no valor de 10% do valor total das parcelas quitadas,
e também o percentual de 10% com referência à fruição do imóvel, tudo
devidamente corrigido desde a data do pagamento e com juros legais de 1% ao
mês, a partir da citação. Condeno a apelante, ainda, ao pagamento de
indenização pelas benfeitorias realizadas no imóvel, a serem apuradas em
liquidação.
Condeno o apelado ao pagamento de 60% das custas processuais e honorários
advocatícios referentes a ambos os processos, que fixo em R$ 1.500,00, e a
apelante, ao pagamento dos 40% restantes, considerando-se o mesmo valor
relativamente aos honorários advocatícios; no entanto, suspendo a
exigibilidade do pagamento em relação ao apelado, nos termos do art. 12 da
Lei 1.060/50, uma vez que o mesmo litiga sob o pálio da justiça gratuita.
Custas recursais, 40% pela apelante e 60% pelo apelado, ressalvando-se o
disposto no art. 12 da Lei 1.060/50 quanto ao apelado.
Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Evangelina Castilho
Duarte e Antônio de Pádua.
Súmula - REJEITARAM PRELIMINAR E DERAM PROVIMENTO PARCIAL.
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