Jurisprudência TJMG - Gratuidade no Registro Civil

REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO - CERTIDÃO DE ÓBITO - GRATUIDADE PARA OS NECESSITADOS - INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, INCISO LXXVI, C/C O ART. 236, CAPUT E §2º, DA CF - GRATUIDADE PARA OS NÃO-NECESSITADOS - LEI Nº 9.534/97 - EFICÁCIA
- Conquanto desperte profunda perplexidade a imposição de gratuidade de registro civil de nascimento e de óbito, com a emissão da primeira certidão, em favor dos não reconhecidos pobres, pela Lei Federal nº 9.534/97, ante o disposto no caput do art. 236 e do seu § 2º da CF, bem assim no inciso LXXVI, letras 'a' e 'b', do art. 5º da mesma Carta Magna, e atendo-se a que o Estado não pode obrigar o particular a prestar serviços gratuitos aos cidadãos não necessitados, sob pena de se caracterizar um regime de escravidão imposto pelo Estado, há que se concluir pela eficácia da Lei nº 9.534/97, de cumprimento obrigatório, até que o STF lhe suspenda a eficácia.
Apelação Cível nº 242.884-5/00 - Comarca de Caratinga - Relator: Des. Célio César Paduani 

ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em confirmar a sentença no reexame necessário. 
Belo Horizonte, 20 de junho de 2002. - Célio César Paduani - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O Sr. Des. Célio César Paduani (convocado) - Cuida-se de reexame necessário de sentença concessiva de segurança, ratificando a liminar concedida em caráter satisfativo e oriunda da 2ª Vara Cível da Comarca de Caratinga, impetrada contra ato da Srª. Oficiala do Cartório de Registro Civil da Comarca de Caratinga, Srª. Adriana Patrício dos Santos, consistente em negar a gratuidade do registro civil de nascimento do filho da impetrante, ora apelada, Margarida Cristina dos Santos. 
Apesar de devidamente intimadas, deixaram as partes transcorrer in albis o prazo para apresentação de recurso voluntário. 
Subiram os autos, vindo conclusos a este Relator mediante distribuição por dependência aos autos de nº 171.059-9, cujo acórdão se encontra às fls. 114/118-TJ. 
Nesta instância colheu-se o parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 145/148-TJ), no sentido de confirmação da decisão em reexame necessário. 
É a síntese do necessário. 

Decido. 
Conheço do reexame oficial do feito, ex vi do parágrafo único do art. 12 da Lei nº 1.533/51, bem como do art. 475, II, do CPC. 
A matéria objeto dos presentes autos é singela, merecendo confirmação a r. decisão submetida ao duplo grau. 
Diz o inciso LXXVI do art. 5º da Constituição da República que: 
"São gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei: 
a) o registro civil de nascimento; 
b) a certidão de óbito". 
Por outro lado, diz a regra contida no art. 236 que:
"Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público". 
"§ 2º. Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro" (grifou-se). 

Daí o entendimento já externado em casos outros idênticos a este, da mesma Comarca de Caratinga, v.g., na Apelação Cível nº 154.960/0, exarada pela eg. Primeira Câmara Cível deste Tribunal e que reitero, litteris: 
"Conquanto desperte profunda perplexidade a imposição de gratuidade do registro civil de nascimento e de óbito, com a emissão da primeira certidão, em favor dos não reconhecidos pobres, pela Lei Federal nº 9.534/97, ante o disposto no caput do art. 236 e do seu § 2º da CF, bem assim no inciso LXXVI, letras 'a' e 'b', do art. 5º da mesma Carta Magna, e atendo-se a que o Estado não pode obrigar o particular a prestar serviços gratuitos aos cidadãos não necessitados, sob pena de se caracterizar um regime de escravidão imposto pelo Estado, há que se concluir pela eficácia da Lei nº 9.534/97, de cumprimento obrigatório, até que o STF lhe suspenda a eficácia". 
É verdade que a Lei nº 9.534/97, em vigor desde março de 1998, trouxe sacrifício ao registrador que paga papel (os quais o serviço público não manda comprar em papelarias), máquinas, fitas, aluguel do prédio etc. 
Não se pode ignorar, que, às vezes, o registrador civil, "principalmente no interior do Estado, é tão pobre quanto outros cidadãos". Contudo, o legislador trouxe a solução no art. 7º da referida lei, permitindo aos Tribunais de Justiça dos Estados a instituição de serviços itinerantes, apoiados pelo Poder Público estadual e municipal, para garantia da gratuidade. 
Ora, tais "serviços itinerantes" não funcionam em socorro das necessidades diárias locais. Além disso, a Administração Federal impõe deveres aos Oficiais de Registros; então, ela é que deveria arcar com os ônus, não "delegá-los" aos Estados e Municípios. 
Tais digressões, todavia, não afetam o mérito do decisum monocrático sujeito ao reexame, absolutamente escorreito, por embasar-se na Lei nº 9.534/97, de eficácia plena, restando insolúvel a compensação aos Oficiais pelo trabalho prestado a quem dele não necessita. 
Sobre a matéria, esta mesma Câmara assim se manifestou na ocasião do julgamento das Apelações Cíveis nºs 151.348-0 e 152.244-0, sendo Relator o em. Des. Carreira Machado, esposando o entendimento de que, em consonância com o inciso LXXVI, a, do art. 5º da Constituição Federal, "são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei o registro civil de nascimento", dispondo ainda o caput do art. 30 da Lei nº 6.015/73, com a redação da Lei nº 9.534/97, que não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento de óbito, bem como pela primeira certidão respectiva. 
"Consigne-se que referido dispositivo legal encontra-se em vigor, não obstante constitua objeto de discussão na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.800-1 perante o Supremo Tribunal Federal, considerando-se que a liminar foi indeferida em 06.04.1998, não havendo o julgamento definitivo até a presente data". 
Ante o exposto, em reexame necessário, confirmo a r. sentença. 
Custas, ex lege. 
É como voto. 
O Sr. Des. Hyparco Immesi - De acordo. 
A Srª. Desª. Jurema Brasil Marins Miranda - De acordo. 
Súmula - CONFIRMARAM A SENTENÇA NO REEXAME NECESSÁRIO


Fonte: Jornal "Minas Gerais" - 21/11/2002