Cessão de herança e meação. Desnecessidade de escritura pública

ARROLAMENTO DE BENS - CESSÃO DE QUINHÃO HEREDITÁRIO E DO DIREITO DE MEAÇÃO - INSTITUIÇÃO DE USUFRUTO - HIPÓTESE DE DESNECESSIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA (TJSP)

ACÓRDÃO

Arrolamento de bens - Juízo "a quo" que inadmitiu a formalização da cessão de quinhão hereditário e do direito de meação, com instituição de usufruto, por termo judicial, apontada a necessidade de ser lavrada escritura pública para tanto - Decisório que não merece subsistir - Hipótese em que é prescindível a escritura pública, podendo a cessão em tela ser formalizada por termo nos autos do inventário ou arrolamento, tal como dispõe o art. 2.015 do CC vigente - De outra banda, a manifestação de vontade translativa do direito à meação, a título gratuito e em proveito dos herdeiros do finado, pode igualmente ser documentada por termo judicial, aplicando-se, por extensão, a regra do art. 1.806 do novo Código Civil, que trata da forma de procedimento para a renúncia da herança - Agravo provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 344.999-4/1-00, da Comarca de São Paulo, (...)

Acordam em Décima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "deram provimento ao recurso, v.u.", de conformidade com o relatório e voto do Relator, que integram este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores Roberto Stucchi (Presidente, sem voto), Marcondes Machado e Maurício Vidigal.

São Paulo, 25 de maio de 2004.

Paulo Dimas Mascaretti, Relator.

VOTO

Cuida-se de agravo de instrumento tirado por Mercedes Batista Campos dos autos do arrolamento dos bens deixados pelo falecimento de José de Campos, contra decisão do MM. Juiz de Direito da 2ª Vara da Família e das Sucessões do Foro Regional de São Miguel Paulista da Comarca da Capital que inadmitiu a formalização da cessão de quinhão hereditário e do direito de meação, com instituição de usufruto, por termo judicial, apontada a necessidade de ser lavrada escritura pública para tanto.

Segundo a peça recursal, é dispensável, nas circunstâncias, a escritura pública para documentar a cessão de direitos, a título gratuito, na forma alvitrada pela viúva-meeira e herdeiros-filhos, haja vista que são plenamente capazes.

Informações do juízo a quo a fls. 56/57.

É o relatório.

Infere-se do plano de partilho apresentado em primeiro grau que a agravante, viúva-meeira, cedeu, a título gratuito, seu direito de meação sobre bens imóveis aos herdeiros-filhos, Magali Aparecida Campos Lima e Eugênio Aparecido de Campos, reservando para si o usufruto; esses herdeiros, a seu turno, cederam, um ao outro, também a título gratuito, direitos hereditários relativos ao patrimônio imobiliário deixado pelos de cujus.

Ora, como é sabido, os herdeiros podem dispor dos direitos hereditários, cedendo-os a outros herdeiros, de modo a ajustar, da melhor maneira e conforme a sua conveniência, a quem tocará certos bens do acervo.

E a cessão, nesses moldes, consubstanciando uma espécie de partilha amigável, prescinde de escritura pública, podendo ser formalizada por termo nos autos do inventário ou arrolamento, tal como dispõe o artigo 2.015 do Código Civil vigente.

De outra banda, a manifestação de vontade translativa do direito à meação, a título gratuito e em proveito dos herdeiros do finado, pode igualmente ser documentada por termo judicial, aplicando-se, por extensão, a regra do artigo 1.806 do novo Código Civil, que trata de procedimento para a renúncia da herança.

A propósito do tema, lecionam  Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim que a renúncia à meação, "embora inconfundível com a renúncia à herança, dela se aproxima ao ponto em que se implica efetiva cessão de direitos, de modo que utilizáveis os mesmos instrumentos para sua formalização. Com efeito, o direito de cada herdeiro, a título de posse ou propriedade, sobre sua parte ideal na herança, antes da partilha, é juridicamente equivalente ao do cônjuge sobrevivo sobre a metade ideal do patrimônio a partilhar. Um e outro são titulares de direitos hereditários, nada lhes obstando a cessão de tais direitos, antes de partilhado o monte. Assim decidiu a 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo (rel. Carlos A. Ortiz, in RJTJSP XIV/57),  embora entendendo como imprescindível a formalização da cessão por escritura pública, com invocação de precedente julgado nesse sentido (RT 268/284). Essa restrição, no entanto, não se coaduna com a equivalência do termo judicial, como sucedâneo da escritura, para fins de cessão de direitos hereditários, nos termos do artigo 1.581 do Código Civil de 1916 e artigo 1.805 do novo Código Civil" (v. "Inventários e Partilhas - Direito das Sucessões", 16ª edição, Leud: São Paulo, 2003,p. 64/65).

Bem de ver que, na esteira de precedente desta Corte, invocado pelos doutrinadores supra-aludidos, "a mesma fé pública de que se revestem as declarações de ofício do tabelião de notas, têm-na igualmente as declarações dos escrivães e, anteriormente, dos denominados tabeliães do judicial. Uns e outros lavram 'escrituras públicas'. Diferentes eram os atos que se compreendiam na competência de cada serventuário. Igual, porém, a fé pública que lhes dava autenticidade. Compreende-se, pois, a afirmação corrente, relativa a valer como escritura pública um termo judicial" (v. RJTJSP 81/283).

Posto isto, dá-se provimento ao agravo, de modo a afastar a exigência impugnada.


Fonte: Diário das Leis Imobiliário - 2º Decêndio - Julho/2005 - N. 20 - p. 7/8