O Superior Tribunal de Justiça determinou a retomada do julgamento de uma
disputa judicial entre dois irmãos pela posse de cinco milhões de metros
quadrados de terras no Estado do Paraná. A disputa entre Getúlio Brasil
Jorge e Jaffer Felício Jorge começou em 1982, quando Getúlio descobriu que
as terras adquiridas em 1958 foram alienadas a seu irmão em 1962 e,
posteriormente, vendidas a Jabur Agropecuária Ltda. e Agropecuária Águas de
Prata Ltda.
Por unanimidade, a Quarta Turma do STJ entendeu que a Justiça paranaense foi
omissa no julgamento dos embargos de declaração por não ter enfrentado todas
as questões propostas pelas partes. Além de anular o acórdão que extinguiu o
processo por usucapião consolidado em favor das duas agropecuárias, a Turma
determinou que os embargos sejam apreciados em toda a sua extensão.
Segundo os autos, as terras foram adquiridas em novembro de 1958, quando
Getúlio Brasil tinha pouco mais de dois anos de idade. Em 1982, no decorrer
do inventário de seu pai, Felício Jorge, falecido em 1979, constatou-se que
as terras haviam sido alienadas a seu irmão em 1962, quando Getúlio tinha 6
anos de idade. A escritura de compra e venda foi assinada por seu pai,
mediante apresentação de procuração em causa própria que teria sido
outorgada por Getúlio Brasil quando ele tinha apenas três anos de idade.
Nesta procuração, Getúlio Brasil é qualificado como maior, solteiro e
pecuarista.
No mesmo dia em que a escritura de compra e venda das referidas terras foi
lavrada, Felício Jorge, também representando o filho Getúlio, vendeu outras
terras de propriedade da família para o filho Jaffer. Nesta escritura,
Getúlio é qualificado como menor de idade. De acordo com a defesa, o fato
de, no mesmo dia, Getúlio comparecer numa escritura como maior de idade por
intermédio de procurador em causa própria e, em outra, como menor já
demonstra a ocorrência de fraude.
Na ação, Getúlio Brasil sustenta que, sendo absolutamente incapaz na data da
outorga da falsa procuração e da alienação de suas terras, é como se não
existisse a venda feita por quem não era titular do direito. Sendo assim,
ele requer a anulação da procuração, da venda e das transações subseqüentes,
bem como a devolução das terras localizadas na Colônia Paranavaí, no
município de Querência do Norte, ou outras terras com a mesma área,
qualidade e valor. Requer, ainda, o pagamento de indenização por perdas e
danos e lucros cessantes pela prática de ato ilícito fraudulento.
Em sua defesa, Jeffer Felício Jorge e os demais réus alegaram, entre outros
pontos, inépcia da inicial, ilegitimidade passiva da parte, prescrição do
direito de ação e usucapião consolidado decorrente de posse por mais de 15
anos. Jeffer Felício também sustentou que as terras não pertenciam ao irmão
Getúlio, mas sim a um homônimo seu, amigo intimo do seu pai.
Julgamento
A sentença de primeiro grau acolheu a alegação do usucapião e rejeitou as
demais preliminares, declarando o processo extinto, porque, reconhecido o
usucapião, ficavam dizimadas as pretensões de nulidade do ato jurídico,
retomada das terras e indenização por perdas e danos. Em embargos de
declaração, o Tribunal de Justiça, sem enfrentar todas as questões, anulou
parcialmente a sentença para que fosse julgado o pedido de indenização.
A defesa de Getúlio Brasil argumenta que, no caso, o prazo de prescrição da
ação para anular a venda é de 20 anos, prazo para o reconhecimento do
usucapião extraordinário, e não o de 15 anos, relativo ao usucapião
ordinário, que pressupõe a existência de justo título e boa-fé. Sustenta que
o prazo de 20 anos não havia expirado quando a ação foi iniciada.
Como a legislação determina que, quando o autor formula vários pedidos que
poderiam ser feitos em ações distintas, desacolhido um deles, deve o juiz
examinar e decidir o subseqüente sob pena de não fazer prestação
jurisdicional completa, Getúlio Brasil Jorge recorreu ao STJ alegando
nulidade da decisão pelo não-enfrentamento de todas as questões propostas.
Segundo o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, ao deixar de analisar a
questão do usucapião, o Tribunal estadual violou o artigo 535, II, do CPC
(omitido ponto sobre o qual deve pronunciar-se o juiz ou tribunal). Para
Aldir Passarinho, diante do reconhecimento da usucapião, a matéria deveria
ter sido analisada em grau de apelação.
Em seu voto, o relator destacou que a Corte estadual não poderia,
simplesmente, anular parcialmente a sentença para que o juízo singular
examinasse o pedido alternativo indenizatório, sem antes decidir se a
sentença estava ou não correta na primeira parte. “Mas silenciou a respeito,
como se estivesse ou acatando aquela conclusão de modo implícito – o que não
pode ser – ou guardando-se para um momento ulterior, para, após o juízo
monocrático decidir o pedido alternativo, apreciar os dois de uma só vez – o
que também vai contrariamente à economia processual”, concluiu o ministro.
REsp 325553
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